segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

Para fins de qualificação técnico-operacional, pode-se exigir comprovação de experiência mínima na execução de serviços continuados semelhantes ao objeto da contratação em lapso temporal superior ao prazo inicial do contrato, desde que as circunstâncias específicas da prestação do serviço assim o exijam, o que deve ser objeto de adequada fundamentação, baseada na experiência pretérita do órgão contratante e em estudos prévios à licitação.


Representação formulada por licitante noticiou possíveis irregularidades relativas ao Pregão Eletrônico 5/2018, promovido pela Universidade Federal de Campina Grande, com vistas ao registro de preços para contratação “de empresa especializada para prestação de serviços continuados de vigilância armada diurna e noturna, a serem executados no Centro de Ciências Jurídicas e Sociais da UFCG, na cidade de Sousa/PB”, por período de doze meses, podendo, por interesse da Administração, ser prorrogado o contrato por períodos iguais e sucessivos, limitada sua duração a sessenta meses. Apontou a representante que a habilitação da empresa vencedora teria sido indevida, porquanto fora aceito somatório de atestados de serviços executados de forma concomitante para a demonstração de experiência na prestação dos serviços, descumprindo cláusula do edital que exigia, para tanto, tempo mínimo de três anos. Analisando o mérito, após as oitivas regimentais, registrou o relator que o item 8.6.1 do edital previa que as empresas deveriam demonstrar a qualificação técnica por meio de “comprovação de aptidão para a prestação dos serviços em características, quantidades e prazos compatíveis com o objeto desta licitação, ou com o item pertinente, por período não inferior a três anos, mediante a apresentação de atestados fornecidos por pessoas jurídicas de direito público ou privado”. Estabelecia, ainda, o item 8.6.2.3 do instrumento convocatório que “para a comprovação da experiência mínima de 3 (três) anos, será aceito o somatório de atestados de períodos diferentes, não havendo obrigatoriedade de os três anos serem ininterruptos, conforme item 10.7.1 do Anexo VII-A da IN SEGES/MPDG nº 05/2017”; e o item 8.6.2.4, por sua vez, definia que “poderá ser admitida, para fins de comprovação de quantitativo mínimo do serviço, a apresentação de diferentes atestados de serviços executados de forma concomitante, pois essa situação se equivale, para fins de comprovação de capacidade técnico-operacional, a uma única contratação, nos termos do item 10.9 do Anexo VII-A da IN SEGES/MPDG n° 05/2017”. Assim, para o relator, ainda que referidas cláusulas estivessem em consonância com a Instrução Normativa 5/2017 (itens 10.6, b, 10.6.1 e 10.9 do anexo VI) do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão (MP), atualmente em vigor, a pregoeira se equivocou na aplicação das normas do edital: “Primeiro, porque o item 10.6.1[da IN 5/2017] dispõe que serão admitidos atestados referentes a “períodos sucessivos”, expressão que claramente afasta a possibilidade de concomitância. Segundo, porque o item 8.6.2.4 [do edital] autoriza apresentação de atestados executados concomitantemente para o fim nele previsto, qual seja, a “comprovação de quantitativo mínimo do serviço”, que não se confunde com “experiência mínima”. Não obstante o erro de interpretação do edital, entendeu o relator não ser o caso de anulação da habilitação da empresa vencedora, visto que, em resposta a impugnação do item 8.6.2.3, a pregoeira comunicara aos licitantes que seriam admitidos atestados de capacidade técnica em períodos concomitantes. “Esclarecimentos prestados administrativamente incorporam-se ao edital e, por consequência, vinculam todos os licitantes e o órgão licitante”. Além do que, segundo o relator, “também milita a favor da manutenção da habilitação o fato de IN 5/2017 conferir mera autorização para a Administração de exigir comprovação de experiência mínima de três anos. Em outros termos, era lícito que instrumento convocatório exigisse comprovação prazo de experiência mínima diversa de três anos, como passou a ser o caso”. Sobre este ponto, estendendo sua análise para além do caso concreto, enfatizou o relator que a inclusão nos normativos do MP, a partir da IN 2/2008, da possibilidade de exigência de comprovação de pelo menos três anos de experiência, como critério de qualificação técnico-operacional, decorrera de recomendação do TCU nesse sentido contida no Acórdão 1.214/2013 Plenário, o qual “teve por origem trabalho realizado por grupo de estudos formado para apresentar propostas para minimizar os problemas enfrentados pela Administração na contratação da prestação de serviços de natureza contínua” com vistas a “assegurar a solidez do futuro contrato e, com isso, a boa execução do objeto”. No entanto, continuou o relator, a questão “merece ser revisitada, para evitar a banalização que vem ocorrendo”, uma vez que o art. 30, inciso II, da Lei 8.666/1993 admite a exigência de “comprovação de aptidão para desempenho de atividade pertinente e compatível em características, quantidades e prazos com o objeto da licitação (...). Ocorre que contratos de terceirização para serviços contínuos são, em regra, firmados por prazo inicial de 12 meses, prorrogáveis sucessivamente por até 60 meses”. Destarte, “três anos de experiência mínima, para comprovação de qualificação técnico-operacional, supera o prazo estipulado na relação contratual inicial, caracterizando, em princípio, exigência incompatível com objeto licitado, contrariando o inciso II do art. 30 da Lei 8.666/1993”. Ainda segundo o relator, “o impedimento à participação de empresas com menos de três anos de existência dificulta a entrada a novos concorrentes no setor em que se insere a contratação, principalmente no caso de serviços em que o setor público é contratante proeminente, como é o caso da segurança armada”, além de restringir “a competitividade do certame, pois quanto mais exigências de qualificação, menor o número de empresas aptas a cumpri-las”. Acrescentou, ainda, que “por se tratar de exigência de qualificação com potencial de restringir o caráter competitivo do certame e o desenvolvimento do setor em que se insere o objeto da contratação, a experiência anterior em lapso temporal superior ao prazo inicial do contrato deve ser objeto de adequada fundamentação, baseada em estudos prévios à licitação e na experiência pretérita do órgão contratante, que indiquem ser tal lapso indispensável para assegurar prestação do serviço em conformidade com as necessidades específicas do órgão, por força da sua essencialidade, quantitativo, risco, complexidade ou qualquer outra particularidade. Convém, também, que o órgão contratante sopese os reflexos da restrição no desenvolvimento do setor do serviço pretendido. A exemplo de zeladoria, limpeza, conservação e dedetização de grupos sanitários, lavatórios e vestiários, há atividades em relação às quais não me parece que a empresa com três anos de experiência tenha melhores condições de execução a contento do que outra que tenha executado quantitativo equivalente em prazo inferior”. Do que expôs o relator, dentre outras deliberações, julgou o colegiado parcialmente procedente a representação e deu ciência ao órgão licitante da interpretação a ser dada aos itens 10.6, b, 10.6.1 e 10.9 do anexo VI da Instrução Normativa 5/2017-MP.
Acórdão 14951/2018 Primeira Câmara, Representação, Relator Ministro Walton Alencar Rodrigues.