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quinta-feira, 24 de agosto de 2023

COMENTÁRIO 25 (Artigo 25 da Lei 14.133/21)

 

COMENTÁRIO 25 (Artigo 25 da Lei 14.133/21)

Lei Comentada

LEI Nº 14.133, DE 1º DE ABRIL DE 2021

Lei de Licitações e Contratos Administrativos

Art. 25. O edital deverá conter o objeto da licitação e as regras relativas à convocação, ao julgamento, à habilitação, aos recursos e às penalidades da licitação, à fiscalização e à gestão do contrato, à entrega do objeto e às condições de pagamento.

§1º Sempre que o objeto permitir, a Administração adotará minutas padronizadas de edital e de contrato com cláusulas uniformes.

§2º Desde que, conforme demonstrado em estudo técnico preliminar, não sejam causados prejuízos à competitividade do processo licitatório e à eficiência do respectivo contrato, o edital poderá prever a utilização de mão de obra, materiais, tecnologias e matérias-primas existentes no local da execução, conservação e operação do bem, serviço ou obra.

§3º Todos os elementos do edital, incluídos minuta de contrato, termos de referência, anteprojeto, projetos e outros anexos, deverão ser divulgados em sítio eletrônico oficial na mesma data de divulgação do edital, sem necessidade de registro ou de identificação para acesso.

§ 4º Nas contratações de obras, serviços e fornecimentos de grande vulto, o edital deverá prever a obrigatoriedade de implantação de programa de integridade pelo licitante vencedor, no prazo de 6 (seis) meses, contado da celebração do contrato, conforme regulamento que disporá sobre as medidas a serem adotadas, a forma de comprovação e as penalidades pelo seu descumprimento.

§ 5º O edital poderá prever a responsabilidade do contratado pela:

I - obtenção do licenciamento ambiental;

II - realização da desapropriação autorizada pelo poder público.

§ 6º Os licenciamentos ambientais de obras e serviços de engenharia licitados e contratados nos termos desta Lei terão prioridade de tramitação nos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama) e deverão ser orientados pelos princípios da celeridade, da cooperação, da economicidade e da eficiência.

§ 7º Independentemente do prazo de duração do contrato, será obrigatória a previsão no edital de índice de reajustamento de preço, com data-base vinculada à data do orçamento estimado e com a possibilidade de ser estabelecido mais de um índice específico ou setorial, em conformidade com a realidade de mercado dos respectivos insumos.

§ 8º Nas licitações de serviços contínuos, observado o interregno mínimo de 1 (um) ano, o critério de reajustamento será por:

I - reajustamento em sentido estrito, quando não houver regime de dedicação exclusiva de mão de obra ou predominância de mão de obra, mediante previsão de índices específicos ou setoriais;

II - repactuação, quando houver regime de dedicação exclusiva de mão de obra ou predominância de mão de obra, mediante demonstração analítica da variação dos custos.

§ 9º O edital poderá, na forma disposta em regulamento, exigir que percentual mínimo da mão de obra responsável pela execução do objeto da contratação seja constituído por:

I - mulheres vítimas de violência doméstica;

II - oriundos ou egressos do sistema prisional.

Comentário:

§1º Sempre que o objeto permitir, a Administração adotará minutas padronizadas de edital e de contrato com cláusulas uniformes.

Os órgãos da União já adotam as minutas padronizadas de editais, contratos e atas de registro de preços da AGU – Advocacia Geral da União. Isso não impede que um órgão faça as devidas adequações das minutas da AGU a sua realidade criando suas próprias minutas.

§2º Desde que, conforme demonstrado em estudo técnico preliminar, não sejam causados prejuízos à competitividade do processo licitatório e à eficiência do respectivo contrato, o edital poderá prever a utilização de mão de obra, materiais, tecnologias e matérias-primas existentes no local da execução, conservação e operação do bem, serviço ou obra.

Comentário: essas são medidas que podem dar celeridade à execução contratual, além de trazer economias. Imaginem que a cem metros de uma obra exista uma fábrica de tijolos e a contratada compra tijolos em um outro local distante alguns quilômetros da obra. Outra situação é quanto à mão de obra existente no local da execução dos serviços, no bairro vizinho, porque ir buscar trabalhadores em locais distantes?

§3º Todos os elementos do edital, incluídos minuta de contrato, termos de referência, anteprojeto, projetos e outros anexos, deverão ser divulgados em sítio eletrônico oficial na mesma data de divulgação do edital, sem necessidade de registro ou de identificação para acesso.

Comentário: mais uma medida de transparência. Antes, só tínhamos a obrigação de disponibilizar o edital. Agora, o processo todo estará disponível nos meios eletrônicos.

A dúvida que poderia existir seria a seguinte: o sítio eletrônico é do órgão patrocinador da licitação ou do ente ao qual esse órgão pertence?

A resposta se encontra no inciso LII do Artigo 6º quando afirma que sítio eletrônico oficial é o sítio da internet, certificado digitalmente por autoridade certificadora, no qual o ente federativo divulga de forma centralizada as informações e os serviços de governo digital dos seus órgãos e entidades. Assim, os órgãos devem aguardar esse sítio, esse portal ser criado. O governo federal está bastante adiantado nisso com a criação do PNCP – Portal Nacional de Contratações públicas.

§ 4º Nas contratações de obras, serviços e fornecimentos de grande vulto, o edital deverá prever a obrigatoriedade de implantação de programa de integridade pelo licitante vencedor, no prazo de 6 (seis) meses, contado da celebração do contrato, conforme regulamento que disporá sobre as medidas a serem adotadas, a forma de comprovação e as penalidades pelo seu descumprimento.

É instituída a obrigatoriedade de programas de compliance (conformidade) com os padrões éticos nas contratações de grande vulto com a possibilidade de aplicação de sanções em caso de descumprimento de tais diretrizes éticas.

Com relação a essa questão, o Art. 60 dispõe que em caso de empate entre duas ou mais propostas um dos critérios de desempate é o do desenvolvimento pelo licitante de programa de integridade; ou seja, em caso de empate o licitante que tem consciência de que é necessário seguir padrões éticos nas suas contratações terá vantagens nos certames. Ainda, caso aconteça situação ensejadora de sanção, a empresa que tenha implantado o programa de integridade terá vantagem pois, os padrões éticos serão levados em conta como fator de atenuação ou agravante na decisão da punição.

§ 5º O edital poderá prever a responsabilidade do contratado pela:

I - obtenção do licenciamento ambiental;

II - realização da desapropriação autorizada pelo poder público.

§ 6º Os licenciamentos ambientais de obras e serviços de engenharia licitados e contratados nos termos desta Lei terão prioridade de tramitação nos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama) e deverão ser orientados pelos princípios da celeridade, da cooperação, da economicidade e da eficiência.

§ 7º Independentemente do prazo de duração do contrato, será obrigatória a previsão no edital de índice de reajustamento de preço, com data-base vinculada à data do orçamento estimado e com a possibilidade de ser estabelecido mais de um índice específico ou setorial, em conformidade com a realidade de mercado dos respectivos insumos.

Comentário: todos os contratos administrativos, não importa a vigência, terão que ter cláusula de REAJUSTE. E deve-se contar esse prazo da data do ORÇAMENTO ESTIMADO.

É importante levar em consideração que o § 1º do Art. 2º da Lei 10.192/01, estabelece que

§ 1º É nula de pleno direito qualquer estipulação de reajuste ou correção monetária de periodicidade inferior a um ano.

Então, o que antes não era necessário, por exemplo em um contrato de cinco meses, elaborar cláusula de reajuste, agora é obrigatório. Isto porque, da data de elaboração do orçamento que servirá de base para a contratação, para assinatura do contrato, pode levar vários meses. Digamos que leve 6 meses. Aí, o contrato é assinado por mais 8 (oito) meses. Se fizermos a conta, veremos que terão se passado 14 meses desde o dia em que foi elaborado o orçamento. Assim, com à redação da Nova Lei 14.133/21 e o respeito à Lei 10.192/01, a contratada teria o direito ao reajuste já no 12º mês.

§ 8º Nas licitações de serviços contínuos, observado o interregno mínimo de 1 (um) ano, o critério de reajustamento será por:

I - reajustamento em sentido estrito, quando não houver regime de dedicação exclusiva de mão de obra ou predominância de mão de obra, mediante previsão de índices específicos ou setoriais;

II - repactuação, quando houver regime de dedicação exclusiva de mão de obra ou predominância de mão de obra, mediante demonstração analítica da variação dos custos.

§ 9º O edital poderá, na forma disposta em regulamento, exigir que percentual mínimo da mão de obra responsável pela execução do objeto da contratação seja constituído por:

I - mulheres vítimas de violência doméstica;

II - oriundos ou egressos do sistema prisional.

O DECRETO Nº 11.430, DE 8 DE MARÇO DE 2023 - Regulamenta a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, para dispor sobre a exigência, em contratações públicas, de percentual mínimo de mão de obra constituída por mulheres vítimas de violência doméstica e sobre a utilização do desenvolvimento, pelo licitante, de ações de equidade entre mulheres e homens no ambiente de trabalho como critério de desempate em licitações, no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional.

Violência doméstica - tipo de violação definido no art. 5º da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006.

Os editais de LICITAÇÃO e os avisos de DISPENSA DE LICITAÇÃO para a contratação de serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra preverão o emprego de mão de obra constituída por mulheres vítimas de violência doméstica, em percentual mínimo de oito por cento das vagas. Para isso, os contratos tem que ter um mímino de vagas de VINTE E CINCO colaboradores. Contratos menores do que isso não precisam prevêr a reserva de 8% para mulheres vítimas de violência domestica.

Nesse tipo de contrato, caso uma dessas mulheres seja demitida ou peça demissão, a vaga só pode ser preenchida com outra mulher nas mesmas condições.

Essas vagas incluem mulheres trans, travestis e outras possibilidades do gênero feminino, nos termos do disposto no art. 5º da Lei nº 11.340, de 2006.

Essas vagas serão destinadas prioritariamente a mulheres pretas e pardas, observada a proporção de pessoas pretas e pardas na unidade da federação onde ocorrer a prestação do serviço, de acordo com o último censo demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.

DAS AÇÕES DE EQUIDADE ENTRE MULHERES E HOMENS

Desempate nos processos licitatórios

O desenvolvimento, pelo licitante, de ações de equidade entre mulheres e homens no ambiente de trabalho será critério de desempate em processos licitatórios, nos termos do disposto no inciso III do caput do art. 60 da Lei nº 14.133, de 2021.

Serão consideradas ações de equidade desenvolvidas pelo licitante, respeitada a seguinte ordem:

I - medidas de inserção, de participação e de ascensão profissional igualitária entre mulheres e homens, incluída a proporção de mulheres em cargos de direção do licitante;

II - ações de promoção da igualdade de oportunidades e de tratamento entre mulheres e homens em matéria de emprego e ocupação;

III - igualdade de remuneração e paridade salarial entre mulheres e homens;

IV - práticas de prevenção e de enfrentamento do assédio moral e sexual;

V - programas destinados à equidade de gênero e de raça; e

VI - ações em saúde e segurança do trabalho que considerem as diferenças entre os gêneros.

Ato do Secretário de Gestão e Inovação do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos disporá sobre a forma de aferição, pela administração, e sobre a forma de comprovação, pelo licitante, do desenvolvimento das ações de equidade entre mulheres e homens no ambiente de trabalho.

Sigilo

A administração e a empresa contratada, nos termos do disposto na Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018, assegurarão o sigilo da condição de vítima de violência doméstica da mão de obra alocada na prestação de serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra de que trata este Decreto.

Discriminação

É vedado o tratamento discriminatório à mulher vítima de violência doméstica integrante da mão de obra alocada na prestação de serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra de que trata o supracitado Decreto.

JURISPRUDÊNCIA DO TCU

É irregular reajuste contratual com prazo contado da assinatura do contrato, pois o marco a partir do qual se computa período de tempo para aplicação de índices de reajustamento é: i) a data da apresentação da proposta ou a do orçamento a que a proposta se referir, de acordo com o previsto no edital (art. 40, inciso XI, da Lei 8.666/1993); ou então ii) a data do orçamento estimado (art. 25, § 7º, da Lei 14.133/2021 – nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos).

Relatório de auditoria realizada com o objetivo de verificar a conformidade e a economicidade dos atos relativos à realização das obras de “requalificação com reforço estrutural no pavimento e melhorias físico-operacionais na Avenida Brasil”, trecho de Realengo a Santa Cruz, na cidade do Rio de Janeiro/RJ, objeto do Contrato 64/2021 – celebrado com recursos oriundos de contrato de repasse firmado entre a União, por intermédio do Ministério do Desenvolvimento Regional, representado pela Caixa Econômica Federal, e o Município do Rio de Janeiro/RJ –, apontou, entre outros achados, a existência de “cláusulas contratuais em desacordo com a Lei 8.666/1993 e a jurisprudência do TCU – previsão contratual de que ‘somente ocorrerá reajustamento do Contrato decorrido o prazo de 24 (vinte e quatro) meses contados da data da sua assinatura’”. Segundo a equipe de auditoria, a cláusula contratual que estabeleceu a data inicial para reajuste como sendo a data da assinatura do contrato contrariou o disposto no art. 40, inciso XI, da Lei 8.666/1993, segundo o qual o edital de licitação conterá “critério de reajuste, que deverá retratar a variação efetiva do custo de produção, admitida a adoção de índices específicos ou setoriais, desde a data prevista para apresentação da proposta, ou do orçamento a que essa proposta se referir, até a data do adimplemento de cada parcela” (grifos originais). E que tal desconformidade teria sido motivo, inclusive, de pedido de impugnação ao edital do certame, não acolhido pela Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro sob a alegação de que a medida se baseara no Decreto Municipal 43.612/2017, que assim dispõe sobre critérios de vigência e reajustamento de contratos no âmbito da Administração Municipal da Cidade do Rio de Janeiro: “Art. 1º Os contratos a serem firmado com a Administração Direta e Indireta não terão vigência superior a vinte e quatro meses, admitida, quando de prazo inferior, uma única prorrogação que não ultrapasse este limite, à exceção dos contratos referentes às obras e serviços de engenharia. Art. 2º Os processos de contratação da Administração Direta e Indireta, inclusive os de obras e serviços de engenharia, cujos atos venham a ser iniciados a partir da data de publicação deste Decreto, terão cláusula de reajustamento medida pela variação do Índice de Preços ao Consumidor Ampliado-Especial (IPCA-E), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, a cada período de vinte e quatro meses, a contar da data da assinatura do contrato.” (grifos originais). Ainda conforme a equipe de auditoria, a jurisprudência do TCU seria pacífica no sentido de que os contratos devem ser reajustados a partir da data limite para apresentação das propostas ou da data do orçamento estimativo da licitação, e destacou, a título exemplificativo, o seguinte enunciado extraído, com igual teor, dos Acórdãos 19/2017 e 2265/2020, ambos do Plenário: “Embora a Administração possa adotar, discricionariamente, dois marcos iniciais distintos para efeito de reajustamento dos contratos de obras públicas, (i) a data limite para apresentação das propostas ou (ii) a data do orçamento estimativo da licitação (art. 40, inciso XI, da Lei 8.666/1993 e art. 3º, § 1º, da Lei 10.192/2001), o segundo critério é o mais adequado, pois reduz os problemas advindos de orçamentos desatualizados em virtude do transcurso de vários meses entre a data-base da estimativa de custos e a data de abertura das propostas.” (grifos originais). A despeito de a irregularidade restar constatada em razão do “caráter determinante tanto das leis quanto do entendimento do TCU”, mas considerando que “a medida não afetou o desfecho da licitação e que a repactuação para recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato preservou as condições efetivas da proposta da empresa contratada”, a equipe de auditoria propôs apenas cientificar a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro a respeito da falha apontada. Em seu voto, o relator reforçou que o art. 40, inciso XI, da Lei 8.666/1993 estabelece que os editais de licitação indicarão obrigatoriamente critério de reajuste, que deverá retratar a variação efetiva do custo de produção, admitida a adoção de índices específicos ou setoriais, desde a data prevista para apresentação da proposta ou do orçamento a que essa proposta se referir, até a data do adimplemento de cada parcela. Ressaltou, no mesmo sentido, o conteúdo do art. 25, § 7º, da Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações e Contrato Administrativos), o qual prevê a obrigatoriedade, independentemente do prazo de duração do contrato, da previsão no edital de índice de reajustamento de preço, com data-base vinculada à data do orçamento estimado. A corroborar o entendimento de que o marco inicial da contagem de prazo para realização de reajuste não pode ser a data da assinatura do contrato, o relator transcreveu o seguinte trecho do Acórdão 474/2005-Plenário, proferido em processo de consulta formulada ao TCU: “9.1.1. A interpretação sistemática do inciso XXI do art. 37 da Constituição Federal, do art. 3º, § 1º, da Lei 10.192/2001 e do art. 40, inciso XI, da Lei 8.666/1993 indica que o marco inicial, a partir do qual se computa o período de um ano para a aplicação de índices de reajustamento previstos em edital, é a data da apresentação da proposta ou a do orçamento a que a proposta se referir, de acordo com o previsto no edital”. Ao final, considerando a conclusão da equipe de auditoria no sentido de que “a impropriedade não afetou o desfecho da licitação” e que teria ocorrido “repactuação do contrato para recomposição do equilíbrio econômico-financeiro, preservando as condições efetivas da proposta da empresa contratada”, o relator reputou suficiente cientificar a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, que, segundo ele, “saberá melhor avaliar” a adoção de providências internas que previnam a ocorrência de outras impropriedades semelhantes nos editais de licitação e contratos deles decorrentes financiados com recursos da União. Acolhendo então a proposição do relator, o Plenário decidiu dar ciência à Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro de que, no âmbito Contrato 64/2021, “a utilização de reajuste contratual com prazo inicial a partir da assinatura do contrato está em desacordo com o art. 40, inciso XI, da Lei 8.666/1993 e com a jurisprudência do TCU”.

Acórdão 1587/2023 Plenário, Auditoria, Relator Ministro Antonio Anastasia.

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É possível, no regime de contratação integrada da Lei 12.462/2011 (RDC), a transferência do licenciamento ambiental ao contratado, não apenas pela superveniência da Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações e Contratos), a qual admite a atribuição do licenciamento ambiental ao particular (art. 25, § 5º, inciso I), mas também para compatibilizar o emprego da contratação integrada com o referido licenciamento.

Em auditoria realizada com o objetivo fiscalizar a execução das obras de “implantação, pavimentação, restauração e obra de arte especial da BR-135/MG, Trecho Rodoviário Itacarambi/MG – Divisa MG/BA, subtrecho Manga/MG – Itacarambi/MG”, objeto do Contrato 227/2022, firmado entre o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e o consórcio vencedor da licitação proveniente do Edital RDC 90/2022, que previu o regime de contratação integrada para a execução do empreendimento, foram identificados alguns achados, entre os quais mereceu destaque o seguinte: “licitação com previsão irregular da transferência de titularidade do licenciamento ambiental e com injustificada avaliação dos impactos decorrentes da ampliação do objeto contratual”. O aludido achado se referia, em essência, à suposta irregularidade na transferência da titularidade do licenciamento ambiental para o consórcio contratado, “ao passo que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) possuiria entendimento contrário, no sentido de que o Dnit seria o empreendedor e, por conseguinte, o detentor dessa titularidade”. No entendimento da equipe de auditoria, a transferência da titularidade ao contratado, “ainda que como cotitular”, estaria em desacordo com o art. 82, incisos IV e V, da Lei 10.233/2001, assim como com os arts. 1º, inciso II; 2º, caput e § 1º; 3º, caput; 10, inciso II; 11; 13; 14; 15 e 16, todos da Resolução Conama 237/1997, e, ainda, com o entendimento do TCU estabelecido nos subitens 9.3.1 e 9.3.2 do Acórdão 1005/2003-Plenário. Consoante a equipe de auditoria, não seria então permitida a inclusão, no edital, de serviços inerentes ao processo de licenciamento ambiental, juntamente com serviços de elaboração de projetos e execução de obras, nos termos do mencionado acórdão, o qual determinara ao Dnit que não incluísse, nos editais de certames licitatórios, disposição que obrigasse os próprios licitantes a providenciarem as licenças ambientais exigidas para a execução das obras, e que ele mesmo adotasse as medidas para a obtenção de tais licenças. De acordo com a equipe de auditoria, a contratação integrada exigiria, a teor do art. 9º, §2º, inciso I, alínea “d”, da Lei 12.462/2011 (RDC), que o edital contivesse como anexo um anteprojeto com “os parâmetros de adequação ao interesse público, à economia na utilização, à facilidade na execução, aos impactos ambientais e à acessibilidade”. Com base nesses apontamentos, a equipe propôs as oitivas do consórcio contratado e do Dnit, por vislumbrar possibilidade de o TCU determinar a anulação do certame e do contrato dele decorrente. Em seu voto, o relator discordou do posicionamento da equipe de auditoria, entendendo que a irregularidade seria “insubsistente”. Em primeiro lugar, para ele, dever-se-ia reconhecer o tratamento dado à matéria pela Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações e Contratos), que dispôs, em seu art. 25, § 5º, acerca da possibilidade de transferência do licenciamento ambiental ao contratado, nos seguintes termos: “Art. 25. O edital deverá conter o objeto da licitação e as regras relativas à convocação, ao julgamento, à habilitação, aos recursos e às penalidades da licitação, à fiscalização e à gestão do contrato, à entrega do objeto e às condições de pagamento. [...] § 5º O edital poderá prever a responsabilidade do contratado pela: I - obtenção do licenciamento ambiental; II - realização da desapropriação autorizada pelo poder público” (grifo do relator). Nesse ponto, assinalou que o legislador da nova Lei de Licitações e Contratos pretendeu claramente se aproximar de práticas usadas nas concessões e parcerias público-privada (PPPs), em que há, comumente, delegação ao particular das atividades relacionadas com o licenciamento ambiental e com os procedimentos para concretizar as desapropriações necessárias ao empreendimento. A seu ver, faria sim sentido incumbir o particular de realizar essas atividades na contratação integrada, “pois a lei exige estudos de engenharia em nível de detalhamento de anteprojeto para início da licitação, enquanto vários dos órgãos ambientais exigem estudos de engenharia em nível de detalhamento de projeto básico para emissão da licença prévia ambiental”. Na sequência, após registrar que o art. 115, § 4º, da Lei 14.133/2021 também prevê que “nas contratações de obras e serviços de engenharia, sempre que a responsabilidade pelo licenciamento ambiental for da Administração, a manifestação prévia ou licença prévia, quando cabíveis, deverão ser obtidas antes da divulgação do edital” (grifo do relator), asseverou: “Contrario sensu, se a responsabilidade pelo licenciamento ambiental for do particular, por óbvio seria o caso de admitir a publicação do edital sem a licença ambiental prévia”. Dessa forma, para compatibilizar a licitação da obra no regime de contratação integrada, realizada também a partir de um anteprojeto, “o Poder Público teria dificuldades de obter o licenciamento ambiental do empreendimento. Some-se a isso as dificuldades notórias para a administração pública contratar e receber projetos e estudos ambientais”. Outrossim, pontuou que a nova Lei de Licitações e Contratos ainda dispõe que será motivo para a rescisão do contrato, nos termos do art. 137, inciso VI, o “atraso na obtenção da licença ambiental, ou impossibilidade de obtê-la, ou alteração substancial do anteprojeto que dela resultar, ainda que obtida no prazo previsto”, e que o contratado, conforme o art. 137, § 2º, inciso V, terá direito à rescisão do contrato no caso de “não liberação pela Administração, nos prazos contratuais, de área, local ou objeto, para execução de obra, serviço ou fornecimento, e de fontes de materiais naturais especificadas no projeto, inclusive devido a atraso ou descumprimento das obrigações atribuídas pelo contrato à Administração relacionadas a desapropriação, a desocupação de áreas públicas ou a licenciamento ambiental”, donde concluiu que “o risco de o poder público assumir o encargo do licenciamento ambiental é imenso, pois a experiência com a execução de obras de infraestrutura demonstra que tal etapa atrasa com frequência, interferindo na execução do contrato, podendo inclusive ensejar a sua rescisão, nos termos da Lei 14.133/2021”. Dito isso, externou seu entendimento no sentido de que a transferência de etapas do licenciamento ambiental ao contratado também seria possível no âmbito do RDC, exclusivamente quando adotado o regime de contratação integrada previsto na Lei 12.462/2011, como ocorrera no caso concreto em apreciação. Afirmou que esse regime de contratação, além de prever a elaboração do projeto básico pelo próprio contratado, admite a apresentação de projetos com metodologias diferenciadas de execução (art. 9º, § 3º), razão por que vários editais do Dnit “têm admitido que o particular desenvolva projeto geométrico da rodovia com diferentes traçados, desde que respeitadas diversas condições de contorno, o que pode impactar no licenciamento ambiental e na desapropriação do empreendimento. Não é apenas o projeto geométrico que está inter-relacionado com o licenciamento ambiental da obra, mas também a definição de jazidas, áreas de bota-fora, pedreiras e areais pelo particular, que rotineiramente tem arcado com tais riscos, os termos da alocação de riscos que costuma a ser adotada pelo Dnit em sua matriz de riscos de obras rodoviárias padronizada”. Na sequência, enfatizou não desconhecer que, no âmbito do Acórdão 2725/2016-Plenário, o TCU determinara ao Dnit que apresentasse ao Tribunal plano de ação com vistas a exigir a obtenção da licença prévia ambiental antes da licitação de obras pelo regime de contratação integrada do RDC, todavia considerou necessário revisitar esse entendimento, “não apenas pela superveniente edição da Lei 14.133/2021 admitindo a atribuição do licenciamento ambiental ao particular, mas também para compatibilizar o emprego da contratação integrada com o licenciamento ambiental”. Reforçou que, naquela oportunidade, não fora aceita a argumentação do Dnit sobre a possibilidade de se dispensar a licença prévia na fase de anteprojeto e que a obtenção das licenças durante a fase de elaboração do projeto básico/executivo conferiria maior celeridade ao processo de licenciamento. Sustentou, ademais, que, caso a empresa contratada para execução das obras apresentasse projeto básico/executivo com alterações permitidas em relação ao previsto no anteprojeto, o projeto deveria ser novamente submetido ao órgão ambiental para avaliação das novas propostas face à licença previamente concedida, “assumindo o particular o ônus e o risco de tais alterações”. Em outros termos, o relator afirmou que “a vantagem de se exigir as licenças ambientais apenas na fase de projeto básico/executivo é que as alterações implementadas com relação ao anteprojeto são discutidas de forma integrada pelas áreas de projeto, meio ambiente e desapropriação e seriam aceitas pelo Dnit previamente à submissão do projeto aos órgãos licenciadores, gerando licenças ambientais condizentes com a situação das obras”. Com relação ao entendimento disposto nos subitens 9.3.1 e 9.3.2 do Acórdão 1005/2003-Plenário, utilizados como critério de auditoria pela equipe de fiscalização, observou que “o assunto foi apreciado sob a égide da Lei 8.666/1993, cujo projeto básico exige o tratamento adequado do impacto ambiental do empreendimento”, e que, “em juízo preliminar”, não seria adequado transpor tal orientação para o regime de contratação integrada instituído por legislação superveniente (Leis 12.462/2011, 13.303/2016 e 14.133/2021), com características notadamente diversas”. Quanto à controvérsia sobre a titularidade do processo de licenciamento ambiental, considerou que a legislação citada pela unidade técnica (art. 82, incisos IV e V, da Lei 10.233/2001 e os arts. 1º, inciso II; 2º, caput; 3º, caput; 10, incisos I e II; 11; 13; 14; 15 e 16 da Resolução Conama 237/1997) não continha absolutamente nenhuma disposição que dissesse expressamente que tal incumbência seria do Dnit. Assim sendo, a discussão sobre a titularidade do processo de licenciamento decorreria de interpretações diversas do Dnit, do Ibama e da equipe de auditoria sobre os mencionados dispositivos, mas não propriamente de expressa disposição legal ou normativa. Reputou então, “nos termos da visão consequencialista trazida pelo art. 20 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro”, que a definição da titularidade do licenciamento ambiental do empreendimento seria “uma questão acessória, de pouca importância prática”, sendo suficiente a expedição de recomendação ao Ibama e ao Dnit com vistas à adoção, no âmbito de suas esferas de atribuições, das medidas cabíveis para “adequar a regulamentação interna dos processos de licenciamento ambiental e dos processos de contratação pública, respectivamente, de forma a contemplar o disposto no art. 25, § 5º, da Lei 14.133/2021, segundo o qual os editais de licitação de obras públicas podem prever a responsabilidade do contratado para a obtenção do licenciamento ambiental do empreendimento”, no que foi acompanhado pelos demais ministros.

Acórdão 1912/2023 Plenário, Auditoria, Relator Ministro Benjamin Zymler.

Caros pregoeiros e licitantes, a melhor fonte de conhecimento sobre licitações se chama TCU - Tribunal de Contas da União. Leiam atentamente os acórdãos do TCU, pois eles trazem ensinamentos e recomendações importantíssimos, e tenham a certeza de estarem realizando um grande serviço à sociedade.

Obrigado por ter lido este artigo. Se gostou, você pode ir para o comentário número 1, Artigo 1º da Lei 14.133/21.

COMENTARIO 1

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É irregular reajuste contratual com prazo contado da assinatura do contrato

 

É irregular reajuste contratual com prazo contado da assinatura do contrato, pois o marco a partir do qual se computa período de tempo para aplicação de índices de reajustamento é: i) a data da apresentação da proposta ou a do orçamento a que a proposta se referir, de acordo com o previsto no edital (art. 40, inciso XI, da Lei 8.666/1993); ou então ii) a data do orçamento estimado (art. 25, § 7º, da Lei 14.133/2021 – nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos).

Relatório de auditoria realizada com o objetivo de verificar a conformidade e a economicidade dos atos relativos à realização das obras de “requalificação com reforço estrutural no pavimento e melhorias físico-operacionais na Avenida Brasil”, trecho de Realengo a Santa Cruz, na cidade do Rio de Janeiro/RJ, objeto do Contrato 64/2021 – celebrado com recursos oriundos de contrato de repasse firmado entre a União, por intermédio do Ministério do Desenvolvimento Regional, representado pela Caixa Econômica Federal, e o Município do Rio de Janeiro/RJ –, apontou, entre outros achados, a existência de “cláusulas contratuais em desacordo com a Lei 8.666/1993 e a jurisprudência do TCU – previsão contratual de que ‘somente ocorrerá reajustamento do Contrato decorrido o prazo de 24 (vinte e quatro) meses contados da data da sua assinatura’”. Segundo a equipe de auditoria, a cláusula contratual que estabeleceu a data inicial para reajuste como sendo a data da assinatura do contrato contrariou o disposto no art. 40, inciso XI, da Lei 8.666/1993, segundo o qual o edital de licitação conterá “critério de reajuste, que deverá retratar a variação efetiva do custo de produção, admitida a adoção de índices específicos ou setoriais, desde a data prevista para apresentação da proposta, ou do orçamento a que essa proposta se referir, até a data do adimplemento de cada parcela” (grifos originais). E que tal desconformidade teria sido motivo, inclusive, de pedido de impugnação ao edital do certame, não acolhido pela Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro sob a alegação de que a medida se baseara no Decreto Municipal 43.612/2017, que assim dispõe sobre critérios de vigência e reajustamento de contratos no âmbito da Administração Municipal da Cidade do Rio de Janeiro: “Art. 1º Os contratos a serem firmado com a Administração Direta e Indireta não terão vigência superior a vinte e quatro meses, admitida, quando de prazo inferior, uma única prorrogação que não ultrapasse este limite, à exceção dos contratos referentes às obras e serviços de engenharia. Art. 2º Os processos de contratação da Administração Direta e Indireta, inclusive os de obras e serviços de engenharia, cujos atos venham a ser iniciados a partir da data de publicação deste Decreto, terão cláusula de reajustamento medida pela variação do Índice de Preços ao Consumidor Ampliado-Especial (IPCA-E), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, a cada período de vinte e quatro meses, a contar da data da assinatura do contrato.” (grifos originais). Ainda conforme a equipe de auditoria, a jurisprudência do TCU seria pacífica no sentido de que os contratos devem ser reajustados a partir da data limite para apresentação das propostas ou da data do orçamento estimativo da licitação, e destacou, a título exemplificativo, o seguinte enunciado extraído, com igual teor, dos Acórdãos 19/2017 e 2265/2020, ambos do Plenário: “Embora a Administração possa adotar, discricionariamente, dois marcos iniciais distintos para efeito de reajustamento dos contratos de obras públicas, (i) a data limite para apresentação das propostas ou (ii) a data do orçamento estimativo da licitação (art. 40, inciso XI, da Lei 8.666/1993 e art. 3º, § 1º, da Lei 10.192/2001), o segundo critério é o mais adequado, pois reduz os problemas advindos de orçamentos desatualizados em virtude do transcurso de vários meses entre a data-base da estimativa de custos e a data de abertura das propostas.” (grifos originais). A despeito de a irregularidade restar constatada em razão do “caráter determinante tanto das leis quanto do entendimento do TCU”, mas considerando que “a medida não afetou o desfecho da licitação e que a repactuação para recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato preservou as condições efetivas da proposta da empresa contratada”, a equipe de auditoria propôs apenas cientificar a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro a respeito da falha apontada. Em seu voto, o relator reforçou que o art. 40, inciso XI, da Lei 8.666/1993 estabelece que os editais de licitação indicarão obrigatoriamente critério de reajuste, que deverá retratar a variação efetiva do custo de produção, admitida a adoção de índices específicos ou setoriais, desde a data prevista para apresentação da proposta ou do orçamento a que essa proposta se referir, até a data do adimplemento de cada parcela. Ressaltou, no mesmo sentido, o conteúdo do art. 25, § 7º, da Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações e Contrato Administrativos), o qual prevê a obrigatoriedade, independentemente do prazo de duração do contrato, da previsão no edital de índice de reajustamento de preço, com data-base vinculada à data do orçamento estimado. A corroborar o entendimento de que o marco inicial da contagem de prazo para realização de reajuste não pode ser a data da assinatura do contrato, o relator transcreveu o seguinte trecho do Acórdão 474/2005-Plenário, proferido em processo de consulta formulada ao TCU: “9.1.1. A interpretação sistemática do inciso XXI do art. 37 da Constituição Federal, do art. 3º, § 1º, da Lei 10.192/2001 e do art. 40, inciso XI, da Lei 8.666/1993 indica que o marco inicial, a partir do qual se computa o período de um ano para a aplicação de índices de reajustamento previstos em edital, é a data da apresentação da proposta ou a do orçamento a que a proposta se referir, de acordo com o previsto no edital”. Ao final, considerando a conclusão da equipe de auditoria no sentido de que “a impropriedade não afetou o desfecho da licitação” e que teria ocorrido “repactuação do contrato para recomposição do equilíbrio econômico-financeiro, preservando as condições efetivas da proposta da empresa contratada”, o relator reputou suficiente cientificar a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, que, segundo ele, “saberá melhor avaliar” a adoção de providências internas que previnam a ocorrência de outras impropriedades semelhantes nos editais de licitação e contratos deles decorrentes financiados com recursos da União. Acolhendo então a proposição do relator, o Plenário decidiu dar ciência à Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro de que, no âmbito Contrato 64/2021, “a utilização de reajuste contratual com prazo inicial a partir da assinatura do contrato está em desacordo com o art. 40, inciso XI, da Lei 8.666/1993 e com a jurisprudência do TCU”.

Acórdão 1587/2023 Plenário, Auditoria, Relator Ministro Antonio Anastasia.

domingo, 12 de fevereiro de 2023

COMENTÁRIO 131 (Artigo 131 da Lei 14.133/21)

 

COMENTÁRIO 131 (Artigo 131 da Lei 14.133/21)

Lei Comentada

LEI Nº 14.133, DE 1º DE ABRIL DE 2021

Lei de Licitações e Contratos Administrativos

Art. 131. A extinção do contrato não configurará óbice para o reconhecimento do desequilíbrio econômico-financeiro, hipótese em que será concedida indenização por meio de termo indenizatório.

Parágrafo único. O pedido de restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro deverá ser formulado durante a vigência do contrato e antes de eventual prorrogação nos termos do art. 107 desta Lei.

Comentários:

Termo indenizatório: é o termo firmado unilateralmente pela Administração reconhecendo o desequilíbrio econômico-financeiro depois de extinto o contrato.

A garantia do reequilíbrio econômico-financeiro do contrato, através dos instrumentos legais do REAJUSTE, da REPACTUAÇÃO e da REVISÃO, está prevista no inciso XXI do artigo 37 da Constituição Federal de 1998.

REAJUSTE

O artigo 6º da Lei 14.133/21, em seu inciso LVIII define REAJUSTAMENTO em sentido estrito como sendo:

VIII - reajustamento em sentido estrito: forma de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro de contrato consistente na aplicação do índice de correção monetária previsto no contrato, que deve retratar a variação efetiva do custo de produção, admitida a adoção de índices específicos ou setoriais;

Nesse sentido, o contratado tem o direito de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro original do contrato com a aplicação de um índice de correção monetária previsto no próprio instrumento contratual.

O § 7º do artigo 25 da Nova Lei estabelece que “independentemente do prazo de duração do contrato, será obrigatória a previsão no edital de índice de reajustamento de preço, com data-base vinculada à data do orçamento estimado e com a possibilidade de ser estabelecido mais de um índice específico ou setorial, em conformidade com a realidade de mercado dos respectivos insumos”.

Além de prevê que não importa o prazo de duração do contrato para que o edital preveja um índice de reajustamento contratual, o § 7º ainda estabeleceu que a data-base para concessão do reajuste estará vinculada à data do orçamento estimado. Esse orçamento estimado é o mesmo orçamento que serviu para determinar o preço máximo ou preço estimado da licitação.

O restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro não será concedido “de ofício”, e sim a pedido da contratada cujo pedido ocorrerá durante a vigência do contrato e antes de eventual prorrogação.

E se o contratado assinar termo de prorrogação e só depois pedir o reequilíbrio econômico-financeiro, o que acontece? Se a administração alertou à contratada sobre a necessidade de formulação de pedido de reequilíbrio-econômico financeiro antes de prorrogar a vigência contratual e se o termo aditivo não prevê a possibilidade do pedido posteriormente, neste caso ocorre a preclusão.

REPACTUAÇÃO

O artigo 6º da Lei 14.133/21, em seu inciso LIX define REPACTUAÇÃO como sendo:

LIX - repactuação: forma de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro de contrato utilizada para serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra ou predominância de mão de obra, por meio da análise da variação dos custos contratuais, devendo estar prevista no edital com data vinculada à apresentação das propostas, para os custos decorrentes do mercado, e com data vinculada ao acordo, à convenção coletiva ou ao dissídio coletivo ao qual o orçamento esteja vinculado, para os custos decorrentes da mão de obra;

Assim, repactuação é o nome do instrumento a ser utilizado quando da obrigação de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato DEMO, ou seja, com Dedicação Exclusiva de Mão de Obra ou com PREDOMINÂNCIA de MÃO DE OBRA.

A repactuação deve refletir a variação dos custos contratuais com a mão de obra previstos em Acordo, Convenção Coletiva de Trabalho ou Dissídio Coletivo ao qual o orçamento da Administração esteja vinculado e a variação dos custos de mercado para outros itens contratuais não contemplados nos instrumentos coletivos de trabalho. Os itens que sofrem a variação dos custos de mercado, como equipamentos e materiais necessários à execução do contrato, têm sua data-base fixada a partir da data de entrega da proposta, enquanto que os custos decorrentes da mão de obra têm sua data vinculada à data de entrada em vigor do acordo, convenção ou dissídio coletivo.

Tanto o reajuste como a repactuação só podem ser aplicados após decorrido um ano da sua data-base.

REVISÃO

O instituto da Revisão visa ao reequilíbrio econômico-financeiro através da recomposição dos valores iniciais do contrato decorrentes de desequilíbrio econômico-financeiro causados no caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe ou em decorrência de fatos imprevisíveis ou previsíveis de consequências incalculáveis, que inviabilizam a execução do contrato tal como pactuado, respeitada, em qualquer caso, a repartição objetiva de risco estabelecida no contrato. (Isso é conhecido como Álea extraordinária).

Vejamos a literalidade da alínea “d” do inciso II do artigo 124 da Nova Lei:

Art. 124. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos:

I - unilateralmente pela Administração:

(...)

d) para restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe ou em decorrência de fatos imprevisíveis ou previsíveis de consequências incalculáveis, que inviabilizem a execução do contrato tal como pactuado, respeitada, em qualquer caso, a repartição objetiva de risco estabelecida no contrato.

Temos que REEQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO é:

a) REAJUSTE em sentido estrito;

b)REPACTUAÇÃO quando reajusta contratos com dedicação exclusiva de mão de obra (ou PREDÔMINÂNCIA DE MÃO DE OBRA) e,

c)REVISÃO para equilíbrio econômico-financeiro decorrente de álea extraordinária.

Para complementar os estudos sobre reajuste, repactuação e revisão indico o comentário ao artigo 124 da NL no seguinte endereço:

http://licitebrasil.blogspot.com/2023/01/comentario-124-artigo-124-da-lei-1413321.html

Caros pregoeiros e licitantes, a melhor fonte de conhecimento sobre licitações se chama TCU - Tribunal de Contas da União. Leiam atentamente os acórdãos do TCU, pois eles trazem ensinamentos e recomendações importantíssimos, e tenham a certeza de estarem realizando um grande serviço à sociedade.

Obrigado por ter lido este artigo. Se gostou, você pode ir para o comentário número 1, Artigo 1º da Lei 14.133/21.

COMENTARIO 1

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terça-feira, 6 de setembro de 2022

Não cabe reajuste, repactuação ou reequilíbrio econômico em relação à Ata de Registro de Preços

 

Não cabe reajuste, repactuação ou reequilíbrio econômico em relação à Ata de Registro de Preços

Nos termos do Parecer nº00001/2016/CPLCA/CGU/AGU não cabe reajuste, repactuação ou reequilíbrio econômico em relação à Ata de Registro de Preços, uma vez que esses institutos estão relacionados à contratação (contrato administrativo em sentido amplo).

 Veja aqui o parecer

 https://www.ufsm.br/app/uploads/sites/352/2019/07/Mem_01.2019_Reequilibrio_17.06.19.pdf

 tem também doutrina:

 https://zenite.blog.br/wp-content/uploads/2021/11/impossibilidade-juridica-de-revisao-dos-precos-registrados-em-ata-de-registro-de-precos-da-administracao-publica-luizclaudioazevedochaves.pdf

 

tem também doutrina:

https://zenite.blog.br/wp-content/uploads/2021/11/impossibilidade-juridica-de-revisao-dos-precos-registrados-em-ata-de-registro-de-precos-da-administracao-publica-luizclaudioazevedochaves.pdf

A TEORIA DA IMPREVISÃO E A (IM)POSSIBILIDADE JURÍDICA DE REVISÃO DOS PREÇOS REGISTRADOS EM ATA DE REGISTRO DE PREÇOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

LUIZ CLÁUDIO DE AZEVEDO CHAVES Pós-graduado em Direito Administrativo. Professor da Escola Nacional de Serviços Urbanos (ENSUR) e da Escola de Administração Judiciária (ESAJ/TJRJ). Professor-convidado da Fundação Getúlio Vargas e da PUC-Rio. Autor das obras Curso prático de licitações: os segredos da Lei nº 8.666/93 (Lumen Juris); Licitação pública: compra e venda governamental para leigos (Alta Books); Gerenciamento de riscos nas aquisições e contratações de serviços da administração direta, estatais e sistema “S” (JML); Diálogos sobre a nova lei de licitações e contratações: Lei nº 14.133/2021 (coautoria, JML). Palestrante, em âmbito nacional, sobre temas relacionados às contratações governamentais.

RESUMO A Constituição Federal, ao instituir o princípio do Dever Geral de Licitar (art. 37, inc. XXI), a todos os órgãos e entidades do Poder Público ou que recebam controle deste, ainda que de forma indireta, previu o dever de a Administração produzir cláusulas contratuais que permitam garantir a efetividade da proposta, ou seja, que a remuneração alvitrada pelo contratado seja respeitada por todo o período de execução contratual. Um dos institutos que operacionalizam tal comando é o da revisão dos contratos, fulcrados na Teoria da Imprevisão e que encontra subsídio normativo no art. 65, inc. II, alínea “d”, da Lei nº 8.666/1993 e no art. 124, inc. II, alínea “d”, da Lei nº 14.133/2021. Nada obstante, muito se pergunta se é cabível a revisão também nos preços registrados em ata de registro de preços, dadas as características próprias dessa ferramenta de contratação. O objetivo deste trabalho é justamente esclarecer os pontos obscuros, lançando à luz os conceitos de cada um desses institutos jurídicos, a fim de se estabilizar o entendimento sobre o tema. Palavras-chave: Licitação. Contratos. Ata. Registro de Preços. Reequilíbrio econômico.

INTRODUÇÃO

Não é novidade que os órgãos e as entidades do Poder Público encontram sérias dificuldades em adquirir coisas e contratar serviços cuja demanda se demonstra de difícil previsão. Isso porque o modelo tradicional de contratação por licitação pública é extremamente burocrático – mesmo considerando a modalidade pregão –, tornando impossível uma resposta ágil para atendimento às suas necessidades. Some-se a isso o fato de que as reavaliações de demanda encontram barreiras na própria legislação de regência, como os limites para reduções e acréscimos quantitativos. Essas dificuldades obrigam os órgãos a manter grandes estoques dos produtos que utilizam, o que atrai inúmeros problemas, tais como desperdício ou perecimento de material, alto custo com a manutenção de grandes espaços físicos destinados aos galpões e almoxarifados, custo com mão de obra (própria ou terceirizada). Também é relevante o problema do planejamento orçamentário. Ao dar preferência a fazer grandes estoques, o agente responsável pelo dimensionamento da aquisição sempre optará por prever um quantitativo de compra superior ao que planejaria normalmente caso tivesse maior agilidade nas compras. Com isso, há um compromissamento do orçamento exacerbado, o qual prejudica outros projetos que poderiam ser desenvolvidos. Até o advento do Decreto nº 3.931/2001, o Sistema de Registro de Preços, instituído no art. 15, § 3º, da Lei nº 8.666/1993, era praticamente inutilizado pelos órgãos submetidos ao dever geral de licitar, passando, a partir de então, a ganhar cada vez mais espaço como modelo de contratação de coisas e serviços na Administração Pública, nas estatais e nas entidades do chamado Sistema S. 1 de 9 O normativo federal citado foi praticamente o primeiro a ser colocado em vigor e o que trouxe melhores orientações de como poderia ser utilizado. Contribuiu decisivamente para a profusão de licitações nessa modelagem o fato de o art. 8º daquele decreto prever a possibilidade de outros órgãos se servirem de uma ata já publicada, dispensando esse órgão de realizar a própria licitação, o que, sabidamente é altamente trabalhoso e envolve um risco considerável de fracasso, deserção ou má contratação. Para as empresas, tornou-se um excelente negócio, pois poderiam participar e vencer uma única licitação, mas alvitrarem vários contratos com outros órgãos. Basta relembrar que, no ano de 2007, o Tribunal de Contas da União 1 analisou um caso em que, uma semana após publicada uma ata de serviços de publicidade pelo Ministério da Saúde, o órgão recebeu nada menos do que 62 pedidos de adesão externa de outros órgãos. Falando em números, um negócio cuja previsão era de 32 milhões de reais, em apenas uma semana, para a empresa beneficiária da ata alçaria (não tenho informações precisas sobre a efetivação dos vários contratos) faturamento da ordem de 2 bilhões de reais. Porém, essa ferramenta de contratação, em que pese rapidamente propagada, nasceu órfã de maiores estudos doutrinários acerca das implicações de sua utilização. Várias questões controvertidas começaram a surgir, porém, do início até o final da década de 2000, a economia no país se mostrava relativamente estável, e o Brasil vivia em uma espécie de bolha de falsa estabilidade da inflação. Quando essa bolha estourou, a partir de 2010, começam a surgir problemas de manutenção dos preços registrados. Essa circunstância foi tornando a situação cada vez mais crítica à medida que a inflação e os demais números da economia começaram a cair. É nesse cenário que começam a surgir os pedidos de reequilíbrio econômico-financeiro dos preços registrados em ata. Muitos acontecimentos, inclusive os mais recentes, como a greve dos caminhoneiros (2018) e a pandemia de covid-19 (2020) forçaram os beneficiários das atas a recusarem pedidos de entrega do produto registrado ou a tentar obter a revisão dos preços, alegando desequilíbrio insuportável. Com isso, muitos órgãos passaram a se perguntar se seria possível o licitante ganhar uma licitação para Registro de Preços, com compromisso de manter o preço pelo período de vigência da ata, o que raramente é inferior a 12 meses e, após publicada a ata, ver o preço registrado ser majorado com base na teoria da imprevisão. Este trabalho tem por finalidade estabelecer os limites da aplicação da Teoria da Imprevisão no instituto jurídico da ata de registro de preços, que é instrumento diverso do contrato e tem manejo distinto deste.

GARANTIA CONSTITUCIONAL DA EFETIVIDADE DA PROPOSTA

A Constituição da República estabelece o dever de a Administração contratante garantir, durante a execução do ajustado, a efetividade da proposta 2. Por efetividade da proposta entenda-se o dever manter o equilíbrio econômico-financeiro das cláusulas contratuais. Esse equilíbrio é marcado pela relação de justiça entre os benefícios alvitrados pela Administração e a remuneração do contratado. Isso porque, ao formular a proposta, o proponente calcula todas as implicações decorrentes da execução para estabelecer o preço que considera justo e suficiente para ser remunerado. Dada a configuração da presunção de equilíbrio, passa a ser dever da Administração contratante manter o nível de remuneração do contratado por toda a execução. Mas é certo que, no decorrer da execução, podem haver intercorrências, algumas previsíveis, como o aumento do custo de insumos, mão de obra etc., ou imprevisíveis, como o atraso da Administração no pagamento das faturas ou até fatos externos ao contrato, como as greves, por exemplo, que, em um cenário de normalidade, não seriam possíveis presumir. Tais intercorrências têm potencial para abalar a relação de justiça e equilíbrio estabelecida com a assinatura do ajuste, pois pode impor ao contratado (também ao contratante) um ônus insuportável que não era possível calcular no momento da precificação. Esse fenômeno pode levar à ruína de uma parte, em detrimento do enriquecimento sem causa da outra. Três são os institutos que visam manter a relação de efetividade da proposta: (a) a correção monetária; (b) o reajuste; e (c) a revisão. A correção monetária tem aplicação nos casos em que ocorre atraso no pagamento por parte da 2 de 9 Administração contratante, desde que o atraso não se tenha originado com culpa do contratado. Trata-se de cláusula obrigatória em todo contrato administrativo, nos termos do art. 55, inc. III, da Lei nº 8.666/1993: Art. 55. São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam: [...] III - o preço e as condições de pagamento, os critérios, data-base e periodicidade do reajustamento de preços, os critérios de atualização monetária entre a data do adimplemento das obrigações e a do efetivo pagamento; (Grifamos) Na Nova Lei de Licitações, a previsão se encontra no art. 92: Art. 92. São necessárias em todo contrato cláusulas que estabeleçam: [...] V - o preço e as condições de pagamento, os critérios, a data-base e a periodicidade do reajustamento de preços e os critérios de atualização monetária entre a data do adimplemento das obrigações e a do efetivo pagamento; Assim, a correção monetária deve ser paga sempre que a Administração contratante atrasar os pagamentos, desde que não tenha havido culpa do contratado. O segundo instituto, o reajuste, tem lugar para atualizar o valor do contrato, quando este se encontra desequilibrado economicamente em decorrência da elevação do custo de execução, ou seja, a majoração dos preços dos insumos, da mão de obra e de outros custos mensuráveis. É considerada causa ordinária de desequilíbrio. Tem periodicidade mínima de um ano a contar da data da proposta ou do orçamento a que ela ser referir, nos termos da Lei nº 10.192/2001 3. Finalmente, a revisão deve ser utilizada sempre que houver ocorrência de fato imprevisível ou previsível, porém de consequências incalculáveis, constituindo fato extracontratual e extraordinário. É neste que o presente trabalho irá se concentrar.

TEORIA DA IMPREVISÃO: CONCEITO, REQUISITOS E APLICABILIDADE AOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS

É regra comezinha no campo do direito das obrigações que o contrato faz lei entre as partes, o que se acha estabilizado no brocardo pacta sunt servanda. Por assim dizer, as obrigações contraídas pelas partes devem ser rigorosamente cumpridas, levando-se em conta sua função social, bem como a boa-fé entre os contratantes. No entanto, após a celebração do ajuste, situações inéditas que não poderiam ter sido previstas pelas partes poderão dar azo à revisão das cláusulas ou mesmo subsidiar a resolução contratual, quando tais situações provoquem prejuízo para uma das partes e consequente enriquecimento ilícito da outra. Nesses casos, haverá a flexibilização da cláusula pacta sunt servanda, de modo a reequilibrar a relação jurídica havida no início da avença. Essa excepcionalidade vem descrita no art. 393 do Código Civil: Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado. Parágrafo único. O caso fortuito ou força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir. A regra da cláusula pacta sunt servanda deve ser lida e harmonizada com outro corolário do direito privado, que é a regra rebus sic stantibus, cujo entendimento é no sentido de que o contrato faz lei entre as partes enquanto as coisas permanecerem na forma estabelecida na época do contrato. Trata-se do reconhecimento de que os contraentes acordaram levando em consideração as 3 de 9 circunstâncias fáticas presentes ao tempo de sua celebração, podendo invocá-la como fundamento para o rompimento caso mudanças substanciais ocorram de forma extraordinária e imprevisíveis, que modificam o equilíbrio do acordo trazendo desvantagem a uma das partes. Foi o ponto de partida para a criação das bases da Teoria da Imprevisão, caracterizada no art. 478 e ss. do Código Civil, que prevê a resolução do contrato quando ocorrer à onerosidade excessiva em decorrência de fatos extraordinários e imprevisíveis: Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação. Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar equitativamente as condições do contrato. Art. 480. Se no contrato as obrigações couberem a apenas uma das partes, poderá ela pleitear que a sua prestação seja reduzida, ou alterado o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade excessiva. Um exemplo foi um fato vivido por uma massa de consumidores em janeiro de 1999, que anotou uma maxidesvalorização do Real frente ao dólar americano. Nessa época, muitos consumidores haviam adquiridos veículos importados com financiamento em prestações baseadas no dólar americano. Do dia para a noite, o dólar teve um aumento violento, o que provocou um reajuste nas prestações de ordem de mais de 200%, motivando o Ministério Público do Rio de Janeiro a propor uma ação civil pública para o fim de obrigar as financeiras a aceitarem o pagamento com base na cotação do dia anterior à explosão cambial. Nos contratos administrativos, a aplicação da Teoria da Imprevisão é prevista no art. 65, inc. II, alínea “d”, da Lei nº 8.666/1993: Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos: [...] II - por acordo das partes: [...] d) para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual. Na nova Lei de Licitações e Contratos, a redação é idêntica: Art. 124. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos: [...] II - por acordo entre as partes: [...] d) para restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe ou em decorrência de fatos imprevisíveis ou previsíveis de consequências incalculáveis, que inviabilizem a execução do contrato tal como pactuado, respeitada, em qualquer caso, a repartição objetiva de risco estabelecida no contrato. Tais dispositivos permitem a adequação do valor do contrato, de modo a possibilitar o retorno à situação de equilíbrio estabelecida no início do pacto. Trata-se do instituto da revisão. 4 de 9 Assim, a revisão do contrato (coloquialmente chamada de reequilíbrio), é o instituto por meio do qual a efetividade da proposta é retomada quando ocorre um fato externo ao contrato, imprevisível ou previsível, mas com desdobramentos muito acima do esperado e que importem em impedimento ou retardo na execução do ajustado com a chamada onerosidade excessiva. A revisão, quando presentes seus requisitos formadores, deve ser deferida de imediato, pois estando o contrato em execução, haverá o comprometimento do cumprimento das obrigações do contratado, com claro prejuízo para ambas as partes contraentes.

O SISTEMA DE REGISTRO DE PREÇOS COMO FORMA DE CONTRATAR COM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

O Sistema de Registro de Preços é um conjunto de procedimentos efetivados mediante prévia licitação pública, que visa ao registro formal de preços para contratações futuras com o vencedor do torneio, chamado de beneficiário. Realiza-se uma única licitação que selecionará a proposta mais vantajosa entre as apresentadas, quase nos mesmos moldes da licitação tradicional, com a diferença de que, em vez de adjudicado o objeto ao vencedor no fim do torneio, este terá seu preço registrado em ata, que selará um compromisso futuro de, durante determinado período, não superior a um ano 4, em todas as vezes que a Administração necessitar e dentro das quantidades registradas, o beneficiário estar obrigado. É uma forma de contratação na qual a Administração Pública constitui uma espécie de cadastro de preços, fornecedores e quantitativos para o objeto colocado em disputa. Esse cadastro ficará à disposição da Administração (gerenciador ou participante) durante determinado tempo, dentro do qual a Administração poderá convocar as quantidades que desejar e que lhe forem necessárias, respeitados os quantitativos registrados. O SRP não gera um contrato propriamente dito, mas uma ata, que é o registro do compromisso futuro. Após sua publicação, a ata se torna eficaz e passa a gerar tantos quantos contratos a Administração pretender celebrar, desde que respeitados os quantitativos nela especificados.

A RELAÇÃO JURÍDICA NASCIDA A PARTIR DA CELEBRAÇÃO DA ATA DE REGISTRO DE PREÇOS

Como visto, a licitação para registros de preços não tem consequência prática imediata, como o é a licitação tradicional. Nesta, após homologado o resultado do certame, será gerado um contrato que, visto em execução, alcançará todas as quantidades descritas no ato convocatório. Já na licitação para fins de registro de preços, após a homologação de seu resultado, será gerada uma ata, instrumento de características diversas do contrato, conforme leciona Marçal Justen Filho (2012, p. 218), verbis: Contrato normativo constituído como um cadastro de produtos e fornecedores, selecionados mediante licitação, para contratações sucessivas de bens e serviços, respeitados lotes mínimos e outras condições previstas no edital. Esse conceito veio reafirmado no atual regulamento federal para o SRP. Nos termos do art. 2º, inc. II, do Decreto nº 7.892/2013, ata é: II – ata de registro de preços - documento vinculativo, obrigacional, com característica de compromisso para futura contratação, em que se registram os preços, fornecedores, órgãos participantes e condições a serem praticadas, conforme as disposições contidas no instrumento convocatório e propostas apresentadas; Significa que a ata não é contrato, mas um pré-contrato. Se as condições estabelecidas no précontrato se consolidarem, o contrato propriamente dito se aperfeiçoará. A ata servirá de fundamento de validade para as convocações (contratações) de quantitativos posteriores até seu esgotamento, pelo prazo (máximo de um ano) ou de suas quantidades. 5 de 9 Em resumo, o vencedor da licitação não terá a seu favor um contrato, mas a possibilidade de, no decorrer da vigência da ata, celebrar tantos quantos contratos forem possíveis, diante das quantidades registradas.

APLICAÇÃO DA TEORIA DA IMPREVISÃO SOBRE A ATA DE REGISTRO DE PREÇOS E A IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DE REVISÃO DOS PREÇOS REGISTRADOS

Em que pese constituir documento obrigacional de natureza distinta do contrato, por óbvio que, durante a vigência da ata, poderá ocorrer um fato não previsível ou cuja previsibilidade não alcançava as proporções em que ocorreram. A ata gera, para o beneficiário, a obrigação de manter inalterado o preço registrado e atender a todas as convocações do órgão que promoveu a licitação (gerenciador) e dos demais que integraram o processo ab inicio (órgãos participantes). Por isso, deve-se reconhecer que, mesmo não se constituindo em um contrato típico, situações extracontratuais e extraordinárias poderão inviabilizar ou tornar excessivamente onerosa tal obrigação. Daí a previsão do art. 17 do Decreto nº 7.892/2013: Art. 17. Os preços registrados poderão ser revistos em decorrência de eventual redução dos preços praticados no mercado ou de fato que eleve o custo dos serviços ou bens registrados, cabendo ao órgão gerenciador promover as negociações junto aos fornecedores, observadas as disposições contidas na?alínea “d” do inciso II do caput?do art. 65 da Lei nº 8.666, de 1993. Reconheço que há certa confusão quanto à possibilidade ou não de aplicação da Teoria da Imprevisão, em razão do teor do dispositivo legal ora transcrito. Afinal, tal norma faz parecer que seria possível revisar os preços registrados em ata. Porém, isso não é verdade. A revisão visa evitar que a parte contraente assuma um prejuízo insuportável diante das obrigações assumidas. Se essas obrigações ainda não se tornaram exigíveis (somente o serão com a convocação), o fato de um preço registrado se tornar defasado em virtude de fato imprevisível não trará qualquer consequência ao beneficiário, porquanto este não estará no cumprimento de qualquer obrigação contratual. A leitura do art. 17 do Decreto nº 7.892/2013 deve ser feita em conjunto com o art. 65, inc. II, alínea “d” da Lei nº 8.666/1993 que ele próprio menciona. Como visto alhures, a revisão somente será possível diante da presença conjunta de dois requisitos: (a) imprevisibilidade do fato desequilibrador; e (b) gravidade suficiente para impedir ou retardar a execução do contrato. Ora, mesmo que tenha ocorrido um fato imprevisível e grave o suficiente para impedir a execução do contrato, enquanto não vier a convocação da Administração, o beneficiário (lembrando que ainda não podemos chamá-lo de contratado) não se encontrará em ruína, pois não tem obrigações contratuais a adimplir e que seriam imediatamente impactadas pelo fato extraordinário. Nada obstante, a redação turva do art. 17 do citado regulamento, mais adiante, precisamente no art. 19, o normatizador se incumbiu de descrever quais medidas deverão ser tomadas nos casos em que os preços registrados passarem a não mais ser suportáveis pelo beneficiário. Senão vejamos: Art. 19. Quando o preço de mercado tornar-se superior aos preços registrados e o fornecedor não puder cumprir o compromisso, o órgão gerenciador poderá: I – liberar o fornecedor do compromisso assumido, caso a comunicação ocorra antes do pedido de fornecimento, e sem aplicação da penalidade se confirmada a veracidade dos motivos e comprovantes apresentados; e II – convocar os demais fornecedores para assegurar igual oportunidade de negociação. Parágrafo único. Não havendo êxito nas negociações, o órgão gerenciador deverá proceder à revogação da ata de registro de preços, adotando as medidas cabíveis para obtenção da contratação mais vantajosa. (Grifamos) De notar que o próprio Decreto Federal não prevê a revisão (majoração) dos preços registrados, mas tão somente a liberação do compromisso (de aceitar a convocação) assumido pelo beneficiário. 6 de 9 Isso porque o reequilíbrio econômico financeiro pressupõe a existência de contrato, no qual as partes estabelecem obrigações recíprocas, cujo cumprimento obrigatório ( pacta sunt servanda) acaba se tornando excessivamente oneroso para uma das partes ( rebus sic standibus), em virtude de uma das ocorrências descritas no art. 65, inc. II, alínea “d”, da Lei nº 8.666/1993 (fatos imprevisíveis, ou previsíveis, porém de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado; caso de força maior ou caso fortuito; e fato do príncipe). Ora, enquanto não houver obrigações para ambas as partes, não haverá encargos a serem igualados, o que somente ocorrerá a partir da celebração dos contratos. Em se tratando de registro de preços, no entanto, como o próprio legislador cuidou de prever expressamente no art. 15, § 4º, da Lei nº 8.666/1993: a existência de preços registrados não obriga a Administração a firmar as contratações que deles poderão advir, ficando-lhe facultada a utilização de outros meios, respeitada a legislação relativa às licitações. Logo, a redação do art. 19 do Decreto nº 7.892/2013 não é defeituosa quando comparada com o art. 17 do mesmo regulamento. Bem ao revés se mostra totalmente congruente com os fundamentos da Teoria da Imprevisão e com a norma fundamental que o regulamenta. Este último dispositivo serve ao fim de reconhecer que a Teoria da Imprevisão pode ser aplicada nas atas de registro de preços, porém, a solução para tal ocorrência não será a revisão do preço registrado, mas sim a liberação do compromisso assumido, sem imposição de penalidade ao beneficiário. O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo conta com farta jurisprudência nesse sentido. À guisa de exemplo, confira-se: Na mesma linha, reputo improcedente a crítica que recaiu sobre a vedação de reestabelecimento do equilíbrio financeiro prevista no item 3.1.2.1 do instrumento, uma vez que o entendimento jurisprudencial sobre o assunto caminha no sentido de que “cláusulas de reequilíbrio da equação econômica inicial do contrato não são admissíveis no sistema de registro de preços, por não haver como se aplicar a teoria da imprevisão quando estamos a tratar de Ata de Registro de Preços, e tampouco cabe à Administração o dever de tutelar a manutenção do exato patamar de lucratividade relacionado a preços registrados em Ata (conf. TC-2541/003/11, relatado pelo eminente Substituto de Conselheiro Sammy Wurman; e TCs 282.989.13-6 e 414.989.13). (TCE/SP, TC nº 11987.989.16-7, Relator Conselheiro Renato Martins Costa) Também em harmonia com esse modo de pensar, a Câmara Permanente de Licitações e Contratos da Consultoria-Geral da União já apontava para essa conclusão no Parecer nº 00001/2016/CPLCA/CGU/AGU, cuja ementa ficou assim consignada: I – Administrativo. Licitação. Ata de Registro de preços. Reajustabilidade. Incidência dos institutos de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro. Impossibilidade. [...] V – Não cabe reajuste, repactuação ou reequilíbrio econômico (revisão econômica) em relação à Ata de registro de preços, uma vez que esses institutos estão relacionados à contratação (contrato administrativo em sentido amplo). VI – O fato gerador da manutenção do equilíbrio econômico (reajuste, repactuação ou reequilíbrio econômico) deve ser reconhecido no âmbito da relação contratual firmada, pela autoridade competente, sem necessária interferência na Ata de registro de preços. (Grifamos) Mais recentemente, a Advocacia-Geral da União voltou a se posicionar no mesmo diapasão, reafirmando a tese da impossibilidade de aplicação do instituto da revisão de preços registrados em atas, fazendo-o por meio do Parecer nº 00211/2020/CONJUR-CGU/AGU, que restou assim ementado:

ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO.REGISTRO DE PREÇOS. ATA DE REGISTRO DE PERÇOS. TEORIA DA IMPREVISÃO. PANDEMIA COVID-19. REEQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DA ATA. IMPOSSIBILIDADE. 1. Consulta sobre a possibilidade de reequilíbrio econômico-financeiro da Ata de Registro de Preços nº 17/2020, cujo objeto é o compromisso firmado entre a Controladoria-Geral da União-CGU e a DATEN TECNOLOGIA LTDA para eventual aquisição de Desktops, incluindo demais acessórios, com garantia técnica on-site de 48 meses. 2. O instituto do reequilíbrio econômico-financeiro tem aplicação na relação contratual, não sendo 7 de 9 extensível às Atas de Registro de Preços. 3. Não é possível juridicamente a revisão econômica para aumentar os valores registrados na Ata de Registro de Preços nº 17/2020, por não ser aplicável à espécie o instituto do reequilíbrio econômico-financeiro, bem como por não haver autorização nesse sentido no art. 19 do Decreto nº 7.892/2013. (CGU/AGU, 2020, grifamos) Importante frisar que compete ao licitante formular sua proposta em condições de ser suportada pelo período de vigência previsto em edital para a ata. No entanto, o que se tem visto é que as licitações realizadas no Sistema de Registro de Preços vêm atraindo proponentes com perfil oposto a esse. O mais das vezes, os licitantes mergulham no preço, sabedores que não terão condições de suportá-lo pelo prazo de um ano e, logo após a publicação da ata, passam a “vender” adesões a outros órgãos. Passados poucos meses, alegam desequilíbrio para rever os preços registrados, ou simplesmente se esgueirar do compromisso assumido. Sendo assim, é de se reconhecer a incompatibilidade do instituto da revisão dos contratos com a ata de registro de preços.

POSSIBILIDADE REVISAR OS VALORES DOS CONTRATOS ORIUNDOS DAS ATAS DE REGISTRO DE PREÇOS

Todavia, o mesmo não se dirá dos contratos celebrados com fulcro na ata. O art. 12, § 3º, do Decreto Federal regente da espécie assim dispõe: “§ 3º Os contratos decorrentes do Sistema de Registro de Preços poderão ser alterados, observado o disposto no art. 65 da Lei nº 8.666, de 1993”. Significa que, se o beneficiário foi alçado à condição de contratado, encontrando-se no cumprimento da obrigação, poderá sofrer as consequências danosas de um fato imprevisível que cause onerosidade excessiva, fazendo jus à revisão dos preços contratados, o que não causará qualquer reflexo na ata. Bom destacar que devem ser considerados como contratados todos os beneficiários que foram convocados formalmente pelo gerenciador ou participante. A formalização do ajuste que pode dar ensejo à revisão observará os ditames do art. 62, caput, da Lei nº 8.666/1993 ou qual estabelece que o instrumento do contrato pode ser substituído, entre outros documentos, pela nota de empenho. Como é cediço, o beneficiário não pode recursar as convocações por parte do órgão gerenciador e participante. Só tem poder de recusar pedidos de órgãos não participantes (“caronas”). Assim, ao receber a nota de empenho (ou outro instrumento equivalente e com o mesmo objetivo), o beneficiário passa a se ver diante da obrigação de entregar os quantitativos nele mencionados, isto é, a relação jurídica que, antes, era de compromisso futuro aperfeiçoa-se em uma relação contratual de execução imediata. Sendo assim, a tão só emissão e recebimento da nota de empenho caracteriza a contratação e pode viabilizar a revisão dos valores contratados, conforme a AGU já se manifestou em hipótese análoga recente: ADMINISTRATIVO. CONTRATO ADMINISTRATIVO. REEQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO. TEORIA DA IMPREVISÃO. VARIAÇÃO CAMBIAL. ELEVAÇÃO DE CUSTOS. PANDEMIA (COVID-19). [...] 2. O instituto do reequilíbrio econômico-financeiro tem aplicação na relação contratual, não sendo extensível às Atas de Registro de Preços. 3. A assinatura do Contrato, ao contemplar todos os itens registrados em Ata de Registro de Preços – ARP, extinguiu os efeitos do compromisso antes definidos na ARP. A relação passou a ser de natureza contratual, esta sim, passível de pedido de reequilíbrio. A recomposição para restabelecimento do equilíbrio deverá se centrar no Contrato, não na Ata. Impossibilidade de alteração da Ata. 8 de 9 [...] 10. Pela Possibilidade de revisão do contrato (recomposição) para restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro, observadas as recomendações. Diante disso, forçoso reconhecer que é possível conceder o reequilíbrio econômico, porém restrito ao que efetivamente foi contratado, devendo ficar registrado que a eventual recomposição dos valores contratados não terá qualquer reflexo na ata. CONCLUSÕES Diante do exposto, conclui-se: a. É possível a aplicação da Teoria da Imprevisão nas atas de registro de preços. b. Por não se tratar de contrato, descabe majoração dos preços registrados, podendo, caso presentes os requisitos da imprevisibilidade do fato, bem como da onerosidade excessiva a retardar ou impedir o cumprimento da obrigação de entregar os quantitativos, liberar o beneficiário do compromisso assumido, convocando os demais na ordem de classificação para negociação ou revogar a ata. c. Caso o beneficiário tenha sido convocado, o valor do contrato oriundo da ata poderá sofrer revisão, desde que preenchidas as condições anteriores, mas sem causar qualquer reflexo nos valores registrados nas atas. REFERÊNCIAS CGU/AGU. Parecer n. 00211/2020. 17 jul. 2020. Disponível em: https://repositorio.cgu.gov.br/handle/1/46299. Acesso em: 20 out. 2021. JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 15. ed. São Paulo: Dialética, 2012. 1 TCU, Acórdão nº 1.478/2007, Plenário, Rel. Min. Valmir Campelo. No acórdão, ficou determinado que o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão revisse as regras para as adesões externas, o que somente foi feito no ano de 2013, com a edição do Decreto nº 7.892/2013, atualmente em vigor. 2 “Art. 37. [...] XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.” (Grifamos) 3 “Art. 3º Os contratos em que seja parte órgão ou entidade da Administração Pública direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, serão reajustados ou corrigidos monetariamente de acordo com as disposições desta Lei, e, no que com ela não conflitarem, da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. § 1 o A periodicidade anual nos contratos de que trata o caput deste artigo será contada a partir da data limite para apresentação da proposta ou do orçamento a que essa se referir.” 4 Lei nº 8.666/1993, art. 15, § 3º, inc. III. Como citar este texto: CHAVES, Luiz Cláudio de Azevedo. A teoria da imprevisão e a (im)possibilidade jurídica de revisão dos preços registrados em ata de registro de preços da Administração Pública. Zênite Fácil, categoria Doutrina, 11 nov. 2021. Disponível em: http://www.zenitefacil.com.br. Acesso em: dd mmm. aaaa.