COMENTÁRIO 14 (Art. 14 da Lei 14.133/21)
Lei Comentada
LEI Nº 14.133, DE 1º DE ABRIL DE 2021
Lei de Licitações e Contratos Administrativos
Art. 14. Não poderão disputar licitação ou
participar da execução de contrato, direta ou indiretamente:
I - autor do anteprojeto, do projeto
básico ou do projeto executivo, pessoa física ou jurídica, quando a licitação
versar sobre obra, serviços ou fornecimento de bens a ele relacionados;
Comentários:
Em relação ao artigo 9º da 8.666/93, que
trata do mesmo assunto, o rol de proibição foi ampliado na Nova Norma. O autor
do anteprojeto não pode participar da licitação, assim como o autor do projeto
básico, pois é evidente que esse autor conhece a fundo os instrumentos que ele
mesmo confeccionou, obtendo, assim, grande vantagem sobre seus concorrentes.
Se levarmos para o lado mais obscuro e
sombrio do submundo das licitações, diríamos que se o autor do anteprojeto ou
do projeto básico pudesse concorrer no certame licitatório, haveria uma, ainda
que minúscula, possibilidade de esse anteprojeto ou projeto básico conter algum
vício. E, claro, tal vício se transformaria em enorme vantagem na competição
para esse autor. Longe de mim afirmar que algum autor brasileiro de projeto
básico tivesse essa capacidade!
II - empresa, isoladamente ou em
consórcio, responsável pela elaboração do projeto básico ou do projeto
executivo, ou empresa da qual o autor do projeto seja dirigente, gerente,
controlador, acionista ou detentor de mais de 5% (cinco por cento) do capital
com direito a voto, responsável técnico ou subcontratado, quando a licitação
versar sobre obra, serviços ou fornecimento de bens a ela necessários;
O indivíduo ou a empresa que foi
responsável pela elaboração do projeto básico ou projeto executivo, além de não
poderem participar da licitação, transmitem esse impedimento de participar às
empresas consorciadas, às empresas subcontratadas, à empresa da qual o autor do
projeto seja dirigente, gerente, responsável técnico, controlador, acionista ou
detentor de mais de 5% (cinco por cento) do capital com direito a voto.
Esse inciso procura proteger a isonomia e
a busca pela realização de uma competição justa.
A exceção a essa regra está prevista no
§2º do artigo 46 da Nova Lei. A exceção é mais que justa. Trata-se da
CONTRATAÇÃO INTEGRADA onde o autor do projeto básico e do projeto executivo são
a própria empresa contratada.
Devemos lembrar que a empresa contratada,
no regime de execução de contratação integrada, é responsável por elaborar e
desenvolver os projetos básico e executivo, executar a obra ou o serviço de
engenharia, fornecer bens ou prestar serviços especiais e realizar montagem,
teste, pré-operação e as demais operações necessárias e suficientes para a
entrega final do objeto (Inciso XXXII do Art. 6º). Logo, não há que se falar em
prejuízos à competitividade ou isonomia neste caso.
III - pessoa física ou jurídica que se
encontre, ao tempo da licitação, impossibilitada de participar da licitação em
decorrência de sanção que lhe foi imposta;
Aqui, temos as proibições às empresas
inidôneas ou impedidas de licitar e contratar com o poder público. Essas
sanções serão aplicadas conforme previsão dos incisos III e IV do artigo 156.
O prazo máximo de aplicação da sanção de
IMPEDIMENTO DE LICITAR e contratar com o poder público e da declaração de
INDONEIDADE serão de, respectivamente, 03 anos e 06 anos. A sanção de
impedimento de licitar, agora, com a Nova Lei, não deixa mais nenhuma dúvida
quanto ao âmbito de aplicação. Ela será aplicada ao responsável pelas infrações
administrativas previstas nos incisos II, III, IV, V, VI e VII
do caput do art. 155 da Nova Lei, quando não se justificar a
imposição de penalidade mais grave, e impedirá o responsável de licitar ou
contratar no âmbito da Administração Pública direta e indireta do ENTE federativo
que tiver aplicado a sanção, pelo prazo máximo de 3 (três) anos.
Exemplos:
1 - Se uma prefeitura tornar IMPEDIDA de
LICITAR qualquer empresa, essa punição só tem validade no âmbito das licitações
realizadas por esse ente federativo, por esse município, seus órgãos e suas
entidades (Administração direta e indireta) inclusive sua Câmara legislativa
(Poder Legislativo).
2 - Se uma secretaria do governo do Estado
de Pernambuco aplicar a sanção de impedimento de licitar, essa sanção só terá
validade no âmbito das licitações realizadas por esse ENTE federativo, por esse
Estado de Pernambuco, seus órgãos e suas entidades (Administração direta e
indireta), inclusive seus Poderes Legislativo e Judiciário.
3 – Se a Justiça FEDERAL de Alagoas
aplicar a sanção de impedimento de licitar, essa sanção terá validade no âmbito
da Justiça Federal de Alagoas e de todo o Poder Judiciário FEDERAL, de todo o
Poder Legislativo FEDERAL, todo o Poder executivo FEDERAL, seus órgãos e suas
entidades (Administração direta e indireta) dos três poderes da União.
Se a sanção for a DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE,
independentemente de quem a aplicou, ela será válida no âmbito das licitações
realizadas por todos os órgão e entidades de todos os entes federativos.
A nova Lei traz claro posicionamento
quanto aquilo que já foi bastante polêmico: o alcance da sanção de impedimento
de licitar e a declaração de inidoneidade. A Nova Lei se coloca em posição
divergente do entendimento do Superior Tribunal de Justiça - STJ e parcialmente
convergente com o atual entendimento do TCU. Nesse sentido, transcrevemos
trechos de um acórdão, entre os inúmeros existentes, sobre esse tema polêmico: Acórdão
nº 3243/2012-Plenário, TC-013.294/2011-3. O Ministro Relator foi Raimundo
Carreiro. Tratava-se na ocasião de representação que apontava possíveis
irregularidades no Pregão Presencial 11/2011. A questão levantada, entre
outras, foi a exclusão de licitantes, em razão de terem sofrido a sanção
prevista no art. 87, III, da Lei nº 8.666/93, por outros órgãos e entidades
públicos. Foi discutido o alcance da norma do inciso III e IV do art. 87 da Lei
8.666/93.
O Ministro Ubiratan Aguiar, assinalou
que a jurisprudência do TCU se havia firmado no sentido de que a sanção de
impedimento de licitar e contratar tinha aplicação restrita ao órgão que aplicou
a penalidade. Já a declaração de inidoneidade (inciso IV do mesmo artigo), seus
efeitos atingiriam todos os órgãos e entidades das três esferas de governo.
O relator, tendo em vista o Acórdão nº
2.218/2011-1ª Câmara, de relatoria do Ministro Walton Alencar Rodrigues, e a
jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça - STJ, manifestou o
entendimento de que a sanção do inciso III do art. 87 também deveria produzir
efeitos para as três esferas de governo da mesma forma que o inciso IV.
O Ministro José Jorge, entendia que, em
função da gravidade da infração cometida, havia a necessidade de se perceber
que há distinção entre as sanções dos incisos III e IV. Asseverou que deveria
haver alteração na jurisprudência do TCU, para se considerar que “a sociedade apenada com base no art. 87,
III, da Lei nº 8.666/93, por órgão/entidade municipal, não poderá participar de
licitação, tampouco ser contratada, para a execução de objeto demandado por
qualquer ente público do respectivo município”.
O Ministro Raimundo Carreiro, ao
investigar o significado das expressões “Administração” e “Administração
Pública” contidos nos incisos III e IV do art. 87 da Lei nº 8.666/1993,
respectivamente, asseverou que,
“Consoante se lê dos incisos XI e XII do art.
6º da Lei nº 8.666/93, os conceitos definidos pelo legislador para
‘Administração Pública’ e para ‘Administração’ são distintos, sendo o primeiro
mais amplo do que o segundo. Desse modo, não creio que haja espaço hermenêutico
tão extenso quanto tem sustentado o Superior Tribunal de Justiça nos
precedentes citados no voto do relator no que concerne ao alcance da sanção
prevista no inciso III do art. 87”.
O Ministro ainda destacou que, as sanções
dos incisos III e IV do art. 87, “guardam
um distinto grau de intensidade da sanção”, e que os “referidos dispositivos não especificaram as hipóteses de cabimento de
uma e de outra sanção ...”. E concluiu que não seria possível admitir que o
alcance de ambas sanções seria o mesmo e que a sanção do inciso III do art. 87
da Lei de Licitações não poderia ter alcance maior que o da declaração de
inidoneidade pelo TCU (art. 46 da Lei nº 8.443/1992).
O Tribunal aprovou por maioria, a tese do
Ministro Raimundo Carreiro e decidiu:
“9.2. determinar à Prefeitura Municipal de
Cambé/PR que nas contratações efetuadas com recursos federais observe que a
sanção prevista no inciso III do art. 87 da Lei nº 8.666/93 produz efeitos
apenas em relação ao órgão ou entidade contratante”.
O entendimento do TCU de que inciso III do
art. 87 da Lei nº 8.666/93 (impedimento de licitar) produz efeitos apenas em
relação ao órgão ou entidade contratante prevalece até os dias de hoje. No STJ
permanece o entendimento de que o impedimento de licitar e contratar previsto
no inciso III do art. 87 da Lei nº 8.666/93 também produz efeitos em todos os
órgãos e entidades das três esferas de governo.
A lei atual vem, conforme já descrito
acima, reproduzir parcialmente o entendimento do TCU, pois enquanto o
impedimento de licitar e contratar, segundo o TCU, produz efeito no órgão que
aplicou a sanção, a Nova Lei prescreve que o efeito alcançara todo o ENTE ao
qual pertence o órgão que aplicou a sanção.
Polêmicas à parte, decorridos três e seis
anos das sanções de impedimento de licitar e da declaração de inidoneidade,
respectivamente, as empresas deverão ser reabilitadas independentemente de
solicitação ou de terem cumprido os requisitos do artigo 163 da Nova Lei.
A reabilitação das empresas sancionadas, antes
de cumprirem três anos da sanção de impedimento de licitar e de seis anos da
declaração de inidoneidade, será possível desde que tenham cumprido no
mínimo um ano de impedimento de licitar e três anos da declaração de
inidoneidade e ainda a infratora tenha cumprido os requisitos do artigo 163,
isto é, desde que essas empresas reparem integralmente o dano causado à
Administração e paguem as multas. Para que se concretize essa reabilitação é
necessário ainda que a empresa formalize um pedido comprovando o cumprimento de
todas as condições necessárias. Esse pedido receberá prévia análise jurídica em
que serão apreciados todos os requisitos definido na Nova Lei e, claro, no ato
que puniu a empresa. Após isso, a autoridade que emitiu a decisão de punir
estará apta a emitir simples despacho no sentido de reabilitar a empresa
infratora.
IV - aquele que mantenha vínculo de
natureza técnica, comercial, econômica, financeira, trabalhista ou civil com
dirigente do órgão ou entidade contratante ou com agente público que desempenhe
função na licitação ou atue na fiscalização ou na gestão do contrato, ou que
deles seja cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por
afinidade, até o terceiro grau, devendo essa proibição constar expressamente do
edital de licitação;
Não podem participar da disputa, os
cônjuges dos dirigentes dos órgãos ou entidades contratantes ou de agente
público que atue na licitação ou na gestão do contrato, bem como, seus pais,
avós, bisavós, filhos, netos, bisnetos, tios, sobrinhos e irmãos, e, por
afinidade, seus sogros, cunhados e noras. Ainda, conforme o inciso IV, não
podem participar da disputa, aqueles que mantêm vínculo de natureza técnica,
comercial, econômica, financeira, trabalhista ou civil com os dirigentes dos
órgãos ou entidades contratantes ou com agente público que atue na licitação ou
na gestão do contrato.
Uma coisa bastante curiosa é que a Lei
afirma expressamente que essas proibições devem constar no edital. E se não
constar, quer dizer que pode participar de uma licitação, por exemplo, a esposa
do pregoeiro? Entenderemos essa parte final do inciso IV como um alerta do
legislador. O fato de essas proibições constarem ou não no edital não significa
nada. A lei impera, neste caso, sendo reproduzida no edital ou não.
V - empresas controladoras, controladas ou
coligadas, nos termos da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976,
concorrendo entre si;
Subsidiária é uma empresa que integra
determinado grupo empresarial e é controlada pela “empresa-mãe” (controladora).
As ações da empresa controlada pertencem à controladora.
Uma empresa é coligada a outra quando uma
exerce influência relevante sobre a outra.
O legislador não confiou que pudesse haver
realmente uma disputa séria e justa entre empresas coligadas ou entre a empresa
controlada e sua controladora. Assim, a participação de uma exclui a
participação da outra em um certame licitatório.
Devemos
ficar atentos pois, especificamente a esse respeito, ou seja, essa questão da empresa
controladora, controlada ou coligada, a jurisprudência do TCU, constituída sob a
égide da Lei 8.666/93 e da Lei 10.520/02, acena no sentido de que “a participação de sociedades coligadas em um
mesmo certame, por si só, não é considerado um ato ilícito (Acórdão 1539/2014 -
Plenário)”. Diante da nova lei ESSE ENTENDIMENTO DO TCU NÃO PREVALECE.
VI - pessoa física ou jurídica que, nos 5
(cinco) anos anteriores à divulgação do edital, tenha sido condenada
judicialmente, com trânsito em julgado, por exploração de trabalho infantil,
por submissão de trabalhadores a condições análogas às de escravo ou por
contratação de adolescentes nos casos vedados pela legislação trabalhista.
Isso significa que a pessoa física ou
jurídica que for condenada judicialmente, com trânsito em julgado, por
exploração de trabalho infantil, por submissão de trabalhadores a condições
análogas às de escravo ou por contratação de adolescentes ficará impedida e não
poderão, direta ou indiretamente, disputar licitação ou participar da execução
de contrato por cinco anos.
§ 1º O impedimento de que trata o inciso
III do caput deste
artigo será também aplicado ao licitante que atue em substituição a outra
pessoa, física ou jurídica, com o intuito de burlar a efetividade da sanção a
ela aplicada, inclusive a sua controladora, controlada ou coligada, desde que
devidamente comprovado o ilícito ou a utilização fraudulenta da personalidade
jurídica do licitante.
Ainda que o artigo 78 da Lei 8.666/93, prescrevesse que seria
motivo para rescisão do contrato “a
subcontratação total ou parcial do seu objeto, a associação do contratado com
outrem, a cessão ou transferência, total ou parcial, bem como a fusão, cisão ou
incorporação, não admitidas no edital e no contrato”, o Tribunal de Contas
da União aceitava essas alterações na contratada e a continuação dos contratos
desde que fossem atendidas, conforme Acórdão 1245/2004, seguintes pontos:
"I) a possibilidade estar prevista no edital e no
contrato, nos termos do artigo 79, inciso VI, da Lei 8.666/1993;
II) serem observados, pela nova empresa, os requisitos de
habilitação estabelecidos no artigo 27 da Lei 8.666/1993, originalmente
previstos na licitação; e
III) serem mantidas as condições definidas no contrato
original".
O Acórdão nº 2.641/2010 – isentou o edital de trazer previsão de
tais alterações da contratada, bastando que o edital não contivesse proibição
nesse sentido. Esse foi o caminho aberto para as burlas à lei. Empresas
impedidas de licitar e até mesmo empresas declaradas inidôneas realizaram essas
operações aparentemente legais para burlar os impeditivos legais e ainda levaram
para a outra empresa sua expertise,
ou seja, todo a sua qualificação técnico-operacional.
Para separar o joio do trigo, a Nova Lei, se cercou de cuidados
para evitar essa bula e proibiu, desde que devidamente comprovado o ilícito ou
a utilização fraudulenta da personalidade jurídica do licitante, a participação
desse tipo de infrator.
A lei foi ainda mais rigorosa e trouxe a hipótese da
despersonificação da pessoa jurídica no artigo 160, in verbis:
Art. 160. A personalidade jurídica poderá ser
desconsiderada sempre que utilizada com abuso do direito para facilitar,
encobrir ou dissimular a prática dos atos ilícitos previstos nesta Lei ou para
provocar confusão patrimonial, e, nesse caso, todos os efeitos das sanções
aplicadas à pessoa jurídica serão estendidos aos seus administradores e sócios
com poderes de administração, a pessoa jurídica sucessora ou a empresa do mesmo
ramo com relação de coligação ou controle, de fato ou de direito, com o
sancionado, observados, em todos os casos, o contraditório, a ampla defesa e a
obrigatoriedade de análise jurídica prévia.
§ 2º A critério da Administração e
exclusivamente a seu serviço, o autor dos projetos e a empresa a que se referem
os incisos I e II do caput deste
artigo poderão participar no apoio das atividades de planejamento da
contratação, de execução da licitação ou de gestão do contrato, desde que sob
supervisão exclusiva de agentes públicos do órgão ou entidade.
§ 3º Equiparam-se aos autores do projeto
as empresas integrantes do mesmo grupo econômico.
§ 4º O disposto neste artigo não impede a
licitação ou a contratação de obra ou serviço que inclua como encargo do contratado
a elaboração do projeto básico e do projeto executivo, nas contratações
integradas, e do projeto executivo, nos demais regimes de execução.
§ 5º Em licitações e contratações
realizadas no âmbito de projetos e programas parcialmente financiados por agência
oficial de cooperação estrangeira ou por organismo financeiro internacional com
recursos do financiamento ou da contrapartida nacional, não poderá participar
pessoa física ou jurídica que integre o rol de pessoas sancionadas por essas
entidades ou que seja declarada inidônea nos termos desta Lei.
A Nova lei ainda reservou especial atenção
aos fornecedores sancionados (penalizados) pelas instituições internacionais.
Assim, uma empresa que sofreu uma sanção de impedimento de licitar com, por
exemplo, o Banco Mundial, não poderá participar também de uma licitação
promovida por um órgão brasileiro, cujos recursos para a futura contratação
sejam oriundos desse Banco Mundial. A lei vai além e proíbe que essa empresa
participe da licitação até mesmo se esses recursos advêm da contrapartida
brasileira.
Jurisprudência do TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
Com relação às proibições de participação INDIRETA de
servidores públicos em licitações, reproduziremos o Acórdão Acórdão
2099/2022 Plenário, Representação, Relator Ministro Benjamin Zymler. Esse Acórdão foi divulgado no INFORMATIVO DE
LICITAÇÕES E CONTRATOS DO TCU – Nº 466:
1. Não se enquadra na vedação prevista
no art. 9º, inciso III, da Lei 8.666/1993 a contratação de empresa que tenha,
na condição de sócio cotista, servidor do órgão contratante sem capacidade
para influenciar o resultado da licitação e sem atribuições ligadas à gestão
ou à fiscalização do contrato.
Representação
formulada ao TCU apontou possíveis irregularidades no Contrato 217/2018, celebrado
pela Superintendência da Diretoria de Administração e Logística do Ministério
da Economia no Estado de São Paulo, cujo objeto era a “prestação de serviços de perícias médicas em psiquiatria e perícias
médicas em especialidades diversas, a serem realizadas por Junta Médica,
composta por 3 profissionais médicos”. O autor da representação alegou, em
síntese, que: a) um dos sócios da empresa contratada possuiria vínculo com a
Administração Pública Federal desde 2006, sendo detentor do cargo de perito
médico federal, o qual fazia parte, originalmente, da carreira de perito médico
previdenciário e integrava o quadro de pessoal do INSS; b) após a promulgação
da MP 871/2019, convertida na Lei 13.846/2019, os integrantes da carreira de
perito médico federal passaram a se vincular ao Ministério da Economia, por
força do art. 19 da referida norma; c) atualmente, os peritos médicos federais
integram o quadro de pessoal do Ministério do Trabalho e Previdência, em
virtude da alteração promovida na aludida norma pelo art. 10 da Lei
14.261/2021; e d) considerando que aquele sócio da contratada permanece
vinculado diretamente à União, a contratação em apreço violaria o art. 9º,
inciso III, da Lei 8.666/1993. No âmbito da unidade técnica, foi promovida a
oitiva da Superintendência da Diretoria de Administração e Logística do
Ministério da Economia no Estado de São Paulo, bem como da empresa contratada,
para que se manifestassem sobre “a
manutenção do Contrato 217/2018 e a celebração de três aditivos contratuais de
prorrogação de vigência do mencionado instrumento, considerando que, a partir
de 18/1/2019 (data da edição MP 871/2019), a contratação se mostrava irregular,
por violar o art. 9º, III da Lei 8.666/1993”. Após analisar as
justificativas encaminhadas, a unidade instrutiva concluiu que a representação deveria ser considerada
procedente, por ter havido infração ao art. 9º, inciso III, da Lei 8.666/1993,
durante o período de 18/1/2019 a 27/7/2021, uma vez que um dos sócios da
contratada era detentor do cargo de perito médico federal, que integrava o
quadro de pessoal do Ministério da Economia, órgão contratante. Ponderou, no
entanto, que o mencionado ajuste não mais se encontrava em situação de
ilegalidade, porquanto o cargo de perito médico passara a integrar o quadro de
pessoal do Ministério do Trabalho e Previdência, por força do art. 10 da Lei
14.261/2021. Nesse cenário, defendeu não ser adequada a anulação do contrato ou
a vedação à sua prorrogação, haja vista o déficit
de pessoal capacitado para realizar as perícias médicas, fundamentais às
atividades do Ministério da Economia, estando assim presente o risco de dano
reverso. Ademais, invocou o art. 147 da Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações
e Contratos Administrativos), que determina análise consequencial de eventual
anulação de contrato, “não obstante a
norma não seja aplicável à avença, já que o certame fora realizado com base nas
Leis 8.666/1993 e 10.520/2002”. Em seu voto, o relator entendeu que não
subsistia a irregularidade noticiada. Para tanto, julgou oportuno transcrever,
preliminarmente, o conteúdo do art. 9º da Lei 8.666/1993: “Art. 9º. Não poderá participar, direta ou indiretamente, da
licitação ou da execução de obra ou serviço e do fornecimento de bens a eles
necessários: I - o autor do projeto, básico ou executivo, pessoa física ou
jurídica; II - empresa, isoladamente ou em consórcio, responsável pela
elaboração do projeto básico ou executivo ou da qual o autor do projeto seja
dirigente, gerente, acionista ou detentor de mais de 5% (cinco por cento) do
capital com direito a voto ou controlador, responsável técnico ou
subcontratado; III - servidor ou dirigente de órgão ou entidade contratante
ou responsável pela licitação. [...] § 3º Considera-se participação
indireta, para fins do disposto neste artigo, a existência de qualquer
vínculo de natureza técnica, comercial, econômica, financeira ou trabalhista
entre o autor do projeto, pessoa física ou jurídica, e o licitante ou
responsável pelos serviços, fornecimentos e obras, incluindo-se os
fornecimentos de bens e serviços a estes necessários. § 4º O disposto no
parágrafo anterior aplica-se aos membros da comissão de licitação”. Na
sequência, pontuou que a Lei 8.666/1993 proíbe a participação indireta de
servidor em licitação promovida pelo órgão ao qual está vinculado, mas não
disciplina como essa participação indireta seria configurada, e que, pela
literalidade da norma, o § 3º somente se aplica ao autor do projeto, pessoa
física ou jurídica, e aos membros da comissão de licitação, neste caso, por
força do § 4º. Segundo o relator, “a lei
não é clara se um servidor do órgão contratante, que não seja membro da
comissão de licitação e que possua vínculo de natureza técnica, comercial,
econômica, financeira ou trabalhista com uma empresa contratada, a exemplo de
alguém que seja sócio cotista desta, incorre na vedação do art. 9°, caput c/c o
inciso III, da Lei 8.666/1993”. Nesse cenário, a definição do que vem a ser
participação indireta, no caso de servidor do órgão contratante, estaria a
merecer interpretação. Em sua visão, o art. 9º da referida norma “quis evitar situações que pudessem
caracterizar conflito de interesses em contratações públicas. Dito de outra
forma, ele buscou afastar do certame e da execução do contrato todos os
licitantes que tivessem alguma vinculação com alguém capaz de influenciar o
resultado da licitação ou com atribuições ligadas à gestão ou à fiscalização do
ajuste”. Para o relator, tal interpretação estaria coerente com o teor do
art. 14, inciso V, da Lei 14.133/2021, que vem a ser o dispositivo equivalente
ao que se encontrava sob análise. Conforme a referida disposição, não podem
disputar licitação ou participar da execução de contrato, direta ou
indiretamente: “V - aquele que mantenha
vínculo de natureza técnica, comercial, econômica, financeira, trabalhista ou
civil com dirigente do órgão ou entidade contratante ou com agente público
que desempenhe função na licitação ou atue na fiscalização ou na gestão do
contrato, ou que deles seja cônjuge, companheiro ou parente em linha reta,
colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, devendo essa proibição constar
expressamente do edital de licitação;”. Em seguida, o relator frisou que,
embora não seja adequado interpretar o alcance da lei anterior com base no
texto da nova, a comparação entre os dispositivos “sugere uma certa evolução do legislador, no sentido de tornar mais
clara a hipótese de conflito de interesses no âmbito das contratações públicas”.
Por essa razão, “o novel estatuto pode
ser usado como inspiração para a solução do presente caso concreto, por revelar
uma solução razoável”. Considerando então que, durante o período da suposta
ocorrência da ilegalidade, aquele sócio cotista da empresa contratada estava
vinculado à Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, unidade administrativa
distinta da que promoveu a licitação e geriu o contrato, qual seja, a
Superintendência da Diretoria de Administração e Logística, integrante da
estrutura da Secretaria de Gestão Corporativa, ambas do Ministério da Economia,
o relator concluiu não restar configurada a vedação prevista no art. 9º, inciso
III, da Lei 8.666/1993, motivo pelo qual, divergindo do posicionamento da
unidade técnica, compreendeu que a representação deveria ser considerada
improcedente. Ao final do seu voto, assinalou que, ainda que fosse adotada
outra exegese do art. 9°, inciso III, da Lei 8.666/1993, no sentido de que
estaria vedada a participação indireta de qualquer servidor do Ministério da
Economia na contratação em exame, por força do § 3º do mesmo artigo, a eventual
anulação do Contrato 217/2018, ou mesmo a proibição de sua prorrogação, iria
ensejar custos administrativos ao Ministério da Economia para promover nova
licitação, em um contexto em que a situação de irregularidade não mais
persistiria. Isso porque, complementou o relator, houvera nova reestruturação
na carreira de perito médico federal, de sorte que, atualmente, aquele sócio
está vinculado a outro órgão, o Ministério do Trabalho e Previdência. O
Plenário acolheu o entendimento do relator e decidiu considerar improcedente a
representação.
Acórdão
2099/2022 Plenário, Representação, Relator Ministro Benjamin Zymler.
INFORMATIVO DE LICITAÇÕES E CONTRATOS DO TCU – Nº 466
XXXXXXXXXXXXXXX
Acórdão 1511/2022-TCU – Plenário
[Enunciado] A participação em licitações e a
contratação direta de empresas que tenham como sócios militares da ativa
servindo na organização militar contratante infringem os princípios da
moralidade e da impessoalidade e o art. 9º, inciso III, da Lei 8.666/1993.
Xxxxxxxxxxxx
Acórdão 534/2020 TCU – Primeira Câmara
[Enunciado] O órgão ou a entidade promotora do
certame não deve obstar a participação de empresa licitante com fundamento na
existência de ocorrências impeditivas indiretas de licitar constantes do
Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores (Sicaf) sem que haja
elementos suficientes para evidenciar que a sua constituição teve por objetivo
burlar penalidade aplicada a outra sociedade empresarial e sem que seja dada oportunidade
à interessada para manifestação prévia (art. 29 da IN - Seges/MPDG 3/2018).
Xxxxxxxxxxxxxx
Acórdão 7428/2019 TCU
[Enunciado] A contratação pela Administração de
empresas pertencentes a parentes ou cônjuge de gestor público envolvido no
processo de licitação caracteriza, diante do manifesto conflito de interesses,
violação aos princípios constitucionais da moralidade e da impessoalidade.
Xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
Acórdão 158/2015 TCU
[Enunciado] Conquanto não haja exata subsunção literal do fato à
proibição normativa (art. 9º da Lei 8.666/1993), a eventual participação de
empresa cujos sócios tenham relações societárias, profissionais e pessoais com
o projetista impõe a necessidade de prevenir riscos de frustração ao caráter
competitivo da licitação pública e ao princípio da isonomia entre licitantes.
Xxxxxxxxxxxxxxxxxx
Por meio do Acórdão
nº 1246/2020, o Tribunal de Contas da União (TCU), fixou entendimento sobre
a impossibilidade de prorrogar contrato administrativo de
prestação de serviços contínuos com empresa que tenha – durante sua
vigência – sido declarada inidônea para
contratar com a Administração ou que tenha os efeitos dessa
sanção a ela estendidos
Caros pregoeiros e licitantes, a
melhor fonte de conhecimento sobre licitações se chama TCU - Tribunal de Contas
da União. Leiam atentamente os acórdãos do TCU, pois eles trazem ensinamentos e
recomendações importantíssimos, e tenham a certeza de estarem realizando um
grande serviço à sociedade.
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pode ir para o comentário número 1, Artigo 1º da Lei 14.133/21.
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pode clicar aqui e ir para o COMENTÁRIO 15.