É ilegal a exigência de apresentação
de programa de integridade por parte das empresas participantes de licitação,
como critério de habilitação, uma vez que o rol de documentos constante dos
arts. 27 a 31 da Lei 8.666/1993 é taxativo.
Representação
formulada ao TCU noticiou possíveis irregularidades no Pregão Eletrônico para
Registro de Preços 1/2021, promovido pelo Comando da 12ª Região Militar (12ª
RM) com vistas à prestação de serviços de transporte aéreo de cargas e
passageiros, cujo valor anual do contrato fora estimado em R$ 7.975.738,80.
Entre as irregularidades suscitadas, mereceu destaque a “exigência de que os
licitantes apresentassem um Programa de Integridade como critério de
habilitação (item 9.11.7 do edital), da qual decorreu restrição indevida no
pregão, posto que, no caso concreto, referido item serviu como fundamento único
para a inabilitação do licitante com proposta de menor preço, resultando em
possível prejuízo ao erário de R$ 880.800,00”. Instado a se manifestar, o
órgão ofereceu razões de justificativa, as quais não foram acolhidas pela
unidade técnica. Em relação à justificativa de que a decisão do pregoeiro de
inabilitar a empresa teria sido baseada no edital, em estrita observância ao
princípio da vinculação ao instrumento convocatório, a unidade técnica ponderou
que o aspecto em discussão seria justamente o conteúdo do edital,
especificamente seu item 9.11.7, que exigira programa de integridade como
requisito de habilitação, criando restrição indevida à competitividade do certame.
Quanto ao argumento de que a referida exigência, segundo o próprio texto do
edital, teria inspiração na Lei 12.846/2013 (Lei Anticorrupção), a unidade
técnica esclareceu que não decorre da mencionada lei a possibilidade de se
exigir programa de integridade nos processos de licitação, tampouco do decreto
que a regulamenta (Decreto 8.420/2015). Segundo ela, a Lei 8.666/1993
estabelece, em seus arts. 27 a 31, rol taxativo de documentos de habilitação, e
a própria jurisprudência do TCU reconhece que a lista de requisitos de
habilitação prevista na Lei 8.666/1993 é exaustiva, a exemplo do Acórdão
2197/2007-TCU-Plenário. De acordo com
a unidade instrutiva, ainda que se pudesse admitir a aplicabilidade, por
analogia, da Lei 14.133/2021 (nova lei de licitações e contratos), a despeito
de esta prever, em seu art. 25, § 4º, a obrigatoriedade de se exigir programa
de integridade nas contratações de obras, serviços e fornecimentos de grande
vulto, a nova lei prescreve que o programa de integridade somente deve ser
exigido do licitante vencedor e no prazo de seis meses após a celebração do
contrato. No caso em exame, prosseguiu a unidade técnica, “a exigência foi
de que tal programa fosse apresentado juntamente com a documentação de
habilitação e, por consequência, por todos os licitantes (não apenas o
vencedor), sem conceder-lhes qualquer prazo para a implantação do programa após
vencida a licitação e incidindo sobre contratação cujo valor estimado
(R$7.975.738,80) era muito inferior ao que a lei estabelece como sendo de
grande vulto”. Na sequência, asseverou que, diante dessa irregularidade, a
providência natural seria declarar a nulidade do edital da licitação e de todos
os atos subsequentes. Não obstante, continuou ela, a cláusula indevida não
chegou a restringir, de fato, a competitividade do pregão em análise, uma vez
que cinco empresas apresentaram propostas, número que poderia ser considerado
razoável, dada a natureza do objeto. Por outro lado, no que concerne à
inabilitação da empresa classificada provisoriamente em primeiro lugar, em sede
de apreciação de recurso, por não haver apresentado tempestivamente o programa
de integridade exigido pelo item 9.11.7 do edital, mesmo tendo o pregoeiro
reconhecido que a empresa possuía o referido programa, situação constatada pela
própria equipe da 12ª RM por ocasião da inspeção técnica prevista no item
9.11.8 do edital, a unidade técnica assinalou que o excesso de formalismo foi
agravado pelo fato de o único fundamento considerado pelo pregoeiro para
inabilitar a empresa que apresentara o menor preço no certame ter sido
justamente seu entendimento acerca do item 9.11.7 do edital, que continha
exigência indevida, a qual, embora não tenha, de fato, restringido a
competividade no caso concreto, não possuía amparo legal. Por fim, enfatizou
que as manifestações recebidas da unidade jurisdicionada foram no sentido de
que a licitante apresentara o programa de integridade intempestivamente, isto
é, somente quando da realização da inspeção técnica prevista no item 9.1.18 do
edital, e não no momento da apresentação dos documentos de habilitação, e que
essa foi a mesma justificativa dada pelo pregoeiro para julgar improcedente o
recurso interposto pela licitante contra a sua inabilitação. Concluiu então que
a decisão do pregoeiro fora ilegal, por excesso de rigor formal e por se basear
em exigência de habilitação que extrapola o rol exaustivo previsto na
legislação e na jurisprudência do TCU. Nos termos propostos pelo relator, o
qual anuiu integralmente ao entendimento da unidade técnica, o Plenário decidiu
fixar prazo ao Comando da 12ª RM para anular a decisão do pregoeiro que
inabilitou a licitante que apresentara a proposta mais vantajosa para a
Administração no âmbito do PE/SRP 1/2021, tendo em vista que “o ato em
questão foi praticado com excesso de rigor formal e se baseou em exigência de
habilitação que extrapola o rol exaustivo previsto na legislação, em
desrespeito aos arts. 27 e 43, § 3º da Lei 8.666/1993, aos arts. 8º, inciso
XII, alínea ‘h’; 17, inciso VI; e 47 do Decreto 10.024/2019, assim como à jurisprudência
do Tribunal (Acórdão
2.302/2012-TCU-Plenário, Acórdão
1.170/2013-TCU-Plenário e Acórdão
1.211/2021-TCU-Plenário)”.
Acórdão 1467/2022
Plenário, Representação, Relator Ministro Aroldo Cedraz.