A
partir de representação formulada ao TCU dando ciência de inquérito civil
público conduzido pela Procuradoria da República no Estado do Espírito Santo,
foi instaurada tomada de contas especial com vistas a apurar possíveis
irregularidades na contratação de transporte escolar por parte da prefeitura
municipal de São Mateus-ES, com recursos do Programa Nacional do Transporte
Escolar (Pnate). Entre as irregularidades suscitadas, mereceu destaque a “ocorrência de superfaturamento e de
locupletamento da contratada em razão da subcontratação de 75% do objeto
contratual, beneficiando-se, assim, da diferença entre o valor contratual
ajustado, e recebido do município, e o valor que pagou às subcontratadas”.
A unidade técnica que atuou no feito ressaltou terem sido subcontratadas duas empresas
que haviam participado da licitação, em competição com a subcontratante, bem
como o “fato de o valor subcontratado (R$
2,30/km) corresponder ao valor anteriormente pago no contrato então vigente
corrigido pelo percentual de ajuste acumulado apurado pela própria prefeitura
(calculado em 27,3770%)”. Ao concordar com a imputação de débito, o relator
assinalou dois aspectos quanto à solicitação, por parte da contratada, de
autorização ao ex-prefeito para subcontratar o objeto pactuado: “(1) o pedido de subcontratação abrangia a
quase totalidade das linhas (75%), mas não a integralidade do contrato; (2) não
há mínima justificativa sobre a necessidade de tal subcontratação, seja sobre o
atendimento de algum interesse da administração, seja sobre a melhor prestação
do serviço”. E o então prefeito teria encaminhado resposta à contratada autorizando
“não só a subcontratação parcial
requerida, mas, ainda mais: a subcontratação/transferência total da execução
dos serviços”. Ao invocar o art. 72 da Lei
8.666/1993, o relator pontou que “a
subcontratação, se autorizada, é admitida somente parcialmente. E só é
admissível quando seja compatível com a natureza do objeto, devendo a
Administração fixar limite, para que a contratação de obras, serviços ou
fornecimento não seja convolada em integral ou preponderante serviço de
intermediação ou de administração de contratos, caracterizando efetiva burla ao
princípio da licitação e, consequentemente, potencial pagamento por serviços
não contratados e não executados: a intermediação/administração de contratos”.
No caso concreto, acrescentou o relator, “a
autorização para subcontratar revela-se flagrantemente ilegal, pois inexistente
argumento de necessidade apresentado pela contratada; inexistente avaliação de
conveniência para a Administração; inexistentes pareceres que expusessem
fundamentos fáticos dessa natureza; situações que se somam ao fato de o então
prefeito ter ampliado o atendimento do pedido inicial feito pela contratada, ao
autorizar subcontratação/transferência total do objeto contratual, quando foi
requerido apenas subcontratação parcial, e permitindo a efetiva e concreta
mutação da situação de fato da contratada: de prestadora direta de serviços
para mera intermediária entre a administração municipal e as empresas que
efetivamente realizaram o transporte escolar”. E arrematou: “o objeto (transporte escolar) era
constituído por um conjunto de linhas de transporte. Cada linha poderia ser
operada isoladamente pela subcontratada. O que se subcontratou não foram
atividades partes de uma operação mais abrangente conduzida sob a
responsabilidade da contratada, como, por exemplo, uma determinada linha se
transporte. A contratada subcontratou várias linhas, que no total representaram
75% do conjunto das linhas licitado. Cada uma delas operada integralmente pela
subcontratada”. Destarte, o trabalho da contratada nessas linhas consistiu tão
somente em “emitir a nota fiscal para a
prefeitura de São Mateus, receber o pagamento (R$ 2,59/km) e repassar o
equivalente a R$ 2,30/km para as subcontratadas, apropriando-se, sem justa
causa, do diferencial (deduzidos os impostos recolhidos). Tal ganho ilegítimo,
perceptível a um administrador diligente, foi viabilizado pela autorização, não
fundamentada e desarrazoada, concedida pelo ex-prefeito, que não agiu com o
cuidado devido, necessário e esperado”. Ao final, o relator registrou que,
ao autorizar a subcontratação, “ainda que
sustentada em parecer da procuradoria do município - inepto, no caso -, o ex-prefeito
viabilizou a concretização de ganhos indevidos da empresa contratada”.
Acolhendo a proposição do relator, o colegiado decidiu julgar irregulares as
contas dos responsáveis e condená-los, solidariamente, em débito.
Acórdão
14193/2018 Primeira Câmara, Tomada de Contas Especial, Relator
Ministro-Substituto Weder de Oliveira.