domingo, 21 de novembro de 2021

É irregular a exigência de atendimento a normas técnicas da ABNT

 

É irregular a exigência de atendimento a normas técnicas da ABNT, declarações de qualidade, certificações, laudos técnicos e certificados de conformidade sem a demonstração da essencialidade dessas exigências para se garantir a qualidade e o desempenho suficientes do objeto a ser contratado.

Representação formulada ao TCU apontou possíveis irregularidades no Pregão Eletrônico SRP 9/2020, promovido pelo Colégio Militar de Brasília, cujo objeto era o registro de preços para eventual aquisição de mobiliários em madeira e assentos em geral. Uma das irregularidades destacadas referiu-se à “exigência de atendimento a normas NBR, declarações de qualidade, certificações¸ laudos técnicos e/ou certificados de conformidade contidos nas descrições dos itens licitados, conforme listagem do termo de referência, sem a demonstração da essencialidade dessas exigências para garantir a qualidade e o desempenho suficientes do objeto, se afigurando excessivamente restritiva, o que foi corroborado pelo baixo nível de competitividade verificado no certame, em afronta ao art. 3º da Lei 10.520/2002”. Em seu voto, o relator mencionou “que diversas leis contêm previsão de aplicação das normas da ABNT às contratações governamentais, tal como a Lei 4.150/1962, que estabelece a observância dessas normas técnicas nos contratos de obras e compras do serviço público. A própria Lei 8.666/1993, em seu art. 6º, inciso X, prevê a elaboração do projeto executivo de acordo com as normas da ABNT. O Código de Defesa do Consumidor, por sua vez, veda ao fornecedor de produtos ou serviços colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou serviço em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes ou, se não existirem normas específicas, pela Associação Brasileira de Normas Técnicas ou por outra entidade credenciada pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Conmetro)”. Mencionou, inclusive, que a nova Lei de Licitações, no seu art. 42, também prevê que a prova de qualidade de produto apresentado pelos proponentes como similar ao das marcas eventualmente indicadas no edital será admitida pela comprovação de que o produto está de acordo com as normas técnicas determinadas pelos órgãos oficiais competentes, pela ABNT ou por outra entidade credenciada pelo Inmetro. Nada obstante, alertou que as “disposições legais acima devem ser interpretadas e relativizadas, principalmente tendo em vista a imensa quantidade de normas técnicas hoje existentes. As leis devem ser interpretadas não só de forma literal, mas também a partir de uma visão sistêmica e teleológica que decorra também da evolução do quadro da realidade. Uma postura exacerbada na aplicação desses diplomas legais levaria a situações de inconstitucionalidade, uma vez que teríamos restrições de competitividade vedadas pelo art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal”. Acrescentou que, conforme sua manifestação no voto condutor do Acórdão 1.668/2021-Plenário, no qual foram analisadas exigências semelhantes adotadas em outros pregões para aquisição de mobiliário, “estou convicto de que a indicação do atendimento de normas da ABNT, na descrição do objeto licitado, é matéria totalmente discricionária, cabendo um indispensável juízo de conveniência e oportunidade ao indicar o atendimento à determinada norma técnica na especificação do produto a ser adquirido, exigindo, por conseguinte, a devida motivação pelo gestor”. E mesmo que se defenda que a exigência de diversas certificações objetive assegurar a qualidade dos bens adquiridos, prosseguiu, “é possível afirmar que a certificação de acordo com normas da ABNT não é a única maneira de o órgão contratante assegurar-se de que o produto licitado possui determinados requisitos de qualidade e de desempenho, havendo diversos outros meios mais efetivos para tal fim, tais como (i) a realização prévia de procedimento de pré-qualificação objetiva; (ii) a exigência de amostras dos produtos ofertados pela licitante que esteja provisoriamente classificada em primeiro lugar; ou (iii) a indicação de uma cesta de marcas e modelos de móveis que atendam às exigências do órgão licitante, admitindo-se, em qualquer caso, a oferta de outros produtos similares ou de melhor qualidade”, podendo ainda o catálogo eletrônico de padronização previsto no art. 19 da nova Lei de Licitações, como sugerido pela unidade técnica, ser utilizado como forma de garantir a qualidade almejada sem prejudicar a padronização e a compatibilidade do mobiliário. Então, para o relator, a “exigência de certificação não pode ser entendida como um processo absolutamente infalível para obter o desempenho requerido do objeto contratado, pois, ainda que o participante do certame entregue o documento requerido, em diversas situações os agentes públicos não dispõem de meios ou qualificação para verificar se o bem entregue corresponde ao produto que foi atestado pela entidade certificadora”. Após externar preocupação quanto às condições de o órgão promotor do certame atestar o conteúdo material de declaração exigida em outro item do edital, visto que a verificação exigiria ensaios específicos em laboratórios, o relator concluiu ver “com ressalvas a exigência de atendimento a todas as certificações, declarações de qualidade, normas técnicas, laudos técnicos e/ou certificados de conformidade contidos nas descrições dos itens licitados, na medida em que tais instrumentos, em última análise, não garantem a qualidade dos produtos ofertados à administração, mas criam vários custos e entraves para a oferta de propostas vantajosas ao poder público”. E que a “busca pela qualidade não pode ocorrer em prejuízo da economicidade e da ampliação da competitividade das licitações, devendo ser avaliado, em cada caso, se as exigências e as condições estabelecidas são pertinentes em relação ao objeto licitado, inclusive no intuito de garantir que o produto a ser fornecido tenha a qualidade desejada. É exatamente nesse ponto que reside a importância de haver a adequada motivação de todos os requisitos a serem cumpridos pelos produtos a serem fornecidos, o que não ocorreu no âmbito da licitação em tela. A grande diversidade de testes e ensaios a serem realizados no objeto licitado, somada aos gastos incorridos com entidades certificadoras, além incrementar os preços dos produtos ofertados à administração, poderia inviabilizar a participação de licitantes, notadamente os que não são fabricantes dos produtos, mas somente seus revendedores”. Nos termos da proposta do relator, o Plenário decidiu determinar ao Colégio Militar de Brasília a adoção de providências com vistas a anular o Pregão Eletrônico SRP 9/2020, em razão dessa e de outras irregularidades constatadas na representação.

Acórdão 2129/2021 Plenário, Representação, Relator Ministro Benjamin Zymler.

INFORMATIVO DE LICITAÇÕES E CONTRATOS Nº422 DO TCU