domingo, 21 de novembro de 2021

Em certame para fornecimento de mobiliário, não se pode exigir do licitante a apresentação de documentos referentes aos fabricantes dos móveis

 Em certame para fornecimento de mobiliário, não se pode exigir do licitante a apresentação de documentos referentes aos fabricantes dos móveis, como regularidade perante o Ibama, licença de operação ambiental, certificado ambiental de cadeia de custódia. O rol exaustivo de elementos para habilitação (arts. 27 a 31 da Lei 8.666/1993) refere-se a documentos do próprio interessado em participar do processo licitatório, e não de terceiros estranhos ao certame e à relação contratual superveniente.

Representação formulada ao TCU apontou possíveis irregularidades no Pregão Eletrônico SRP 9/2020, promovido pelo Colégio Militar de Brasília, cujo objeto era o registro de preços para eventual aquisição de mobiliários em madeira e assentos em geral, composto por 101 itens divididos em dois grupos, um com 68 itens de mobiliário em geral (armários, estantes, gaveteiros, mesas, painéis, cabine de estudo, suporte para CPU, biombo divisor de ambiente, rack e aparador), e outro com 33 itens de assentos em geral (poltronas, cadeiras, sofás, longarinas e poltronas de auditório). Entre as irregularidades suscitadas, mereceu destaque a elaboração dos estudos técnicos preliminares, termo de referência e edital do certame contendo “exigências de declarações referentes às fabricantes dos produtos ofertados, a exemplo de certificados de registro de pessoa jurídica e regularidade perante o IBAMA e licença de operação, que restam em desacordo com a jurisprudência do TCU (e.g. Acórdãos 3.368/2015 e 1.498/2020, ambos do Plenário), por estabelecerem obrigações alheias à relação jurídica entre o órgão contratante e a futura contratada”. Foram exigidos, entre outros, os seguintes documentos aos licitantes: “a) certificado de registro de pessoa jurídica do fabricante do produto; b) licença de operação do fabricante; c) documento do fabricante para comprovação de tratamento de resíduos líquidos; d) documento do fabricante referente ao plano de gerenciamento de resíduos sólidos; e) certificado ambiental de cadeia de custódia do FSC ou Cerflor, em nome do fabricante do mobiliário, comprovando a procedência da madeira proveniente de manejo florestal responsável ou de reflorestamento f) certificado do fabricante de regularidade perante o IBAMA; e g) documento que comprove pintura isenta de materiais pesados, apresentado em papel timbrado do fabricante da tinta”. Em seu voto, o relator destacou que tais exigências são voltadas aos fabricantes, os quais não necessariamente serão os contratados, ou seja, atingem relação alheia ao universo de possíveis licitantes, o que, segundo ele, estaria em desacordo com a jurisprudência do TCU. O relator pontuou que o rol exaustivo de elementos previstos nos arts. 27 a 31 da Lei 8.666/1993, para habilitação dos licitantes, refere-se aos documentos do próprio interessado em participar do certame, e não de terceiros estranhos ao processo licitatório e à relação contratual superveniente. Na situação em apreço, seria “muito difícil, quiçá impossível, que um revendedor ou empresa varejista que comercialize mobiliário obtenha algum documento comprovando que a pintura do móvel é isenta de materiais pesados, apresentando declaração em papel timbrado do próprio fabricante da tinta”. Na prática, seria “inviável identificar visualmente o fabricante da tinta a partir da inspeção do mobiliário fornecido, exigindo que o fornecedor do item obtenha tal informação com o seu fabricante. A partir daí, o licitante ainda teria que contactar o fabricante da tinta (que pode ser inclusive uma empresa estrangeira), com vistas a obter a declaração solicitada”. Além do que “o fabricante da tinta pode simplesmente se negar a fornecer tal documento ou direcioná-lo a apenas um grupo de interessados em participar do certame licitatório, restringindo ilegalmente a ampla competição, bem como criando custos desnecessários para outros licitantes ofertarem suas propostas (que possivelmente serão repassados ao poder público)”. O relator enfatizou ainda que a Administração não dispõe de meios para verificar se o conteúdo da referida declaração é materialmente verdadeiro, pois tal checagem exigiria a realização de testes de laboratório com equipamentos sofisticados. Quanto às outras exigências de cunho ambiental, ele considerou que todas eram inaplicáveis a empresas que apenas vendem móveis, atividade que não se encontra listada no anexo 1 da Resolução Conama 237/1997, a qual relaciona as atividades sujeitas ao licenciamento ambiental. E arrematou: “se, por um lado, a fabricação de móveis efetivamente requer o licenciamento ambiental, nos termos do referido ato normativo, a mera comercialização do mobiliário não exige a obtenção de licença ambiental, sendo desarrazoado que se requeira do revendedor a documentação do licenciamento ambiental atinente à outra pessoa jurídica, o fabricante do móvel”. Nos termos da proposta do relator, o Plenário decidiu determinar ao Colégio Militar de Brasília a adoção de providências com vistas a anular o Pregão Eletrônico SRP 9/2020, em razão dessa e de outras irregularidades constatadas na representação.

Acórdão 2129/2021 Plenário, Representação, Relator Ministro Benjamin Zymler.

INFORMATIVO DE LICITAÇÕES E CONTRATOS Nº421 DO TCU