O sistema de registro de preços não
é aplicável à contratação de obras de engenharia, uma vez que o objeto não se enquadra
em nenhuma das hipóteses previstas no art. 3º do Decreto 7.892/2013 e, também,
porque, na contratação de obras, não há demanda por itens isolados, pois os
serviços não podem ser dissociados uns dos outros.
Representação
formulada pela Procuradoria da República no Rio Grande do Sul apontou indícios
de irregularidades na construção do “Campus Litoral Norte” da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), no Município de Tramandaí.
Entre os pontos abordados na instrução dos autos, a unidade técnica constatou
que, em “substituição ao regular procedimento licitatório para a construção
do novo campus, a UFRGS utilizou doze atas de registro de preço de
fornecimento de serviços de manutenção e reformas, nas quais figurava como
entidade gerenciadora, e, para aqueles serviços que não estão previstos nas
referidas atas, a universidade aproveitou a mão de obra de funcionários da
empresa terceirizada então contratada e o material disponível no seu
almoxarifado”. Em decorrência dessa constatação, houve a realização de
audiência do pregoeiro e de três gestores da UFRGS. Como resposta, os gestores
informaram que tentaram realizar as obras por meio de procedimento licitatório
próprio, mas o certame fora revogado e justificaram que o aproveitamento das
atas de registro de preços (ARP) “foi a solução encontrada para atender, com
a maior brevidade, o compromisso assumido com o Ministério da Educação e os
alunos universitários de construir o campus”. O pregoeiro, por sua vez,
alegou que o uso das ARP “foi motivado pela proximidade do início do ano
letivo universitário e do término do prazo de implementação do campus
previsto como condição para a doação do terreno pelo Município de Tramandaí”,
e atribuiu a escolha por essa opção aos gestores da UFRGS. Ao se manifestar no
voto, o relator, após examinar e rejeitar as preliminares de prescrição,
reforçou que a irregularidade tratada nos autos diz respeito à construção do campus
a partir do uso de ARP gerenciadas pela universidade, “em detrimento da
prévia elaboração de projetos básico e executivo, com a posterior contratação
de pessoa jurídica selecionada por intermédio de procedimento licitatório
específico para o empreendimento”. Observou que, apesar de haver evidências
de que a UFRGS promovera duas tentativas para contratar serviços de elaboração
dos projetos de arquitetura e engenharia para a confecção do termo de
referência, a entidade, sem os devidos esclarecimentos, “desistiu de dar
prosseguimento à contratação da empresa responsável pela elaboração de tais
documentos e a posterior execução da obra para, em substituição, utilizar-se,
de forma indevida, das atas de registro de preços vigentes”. Diante disso,
o relator ponderou que, a despeito de não haver indícios de dano ao erário, a
justificar a imputação de débito, a conduta dos responsáveis configurava grave
infração à norma de natureza legal e regulamentar. Sob a ótica da Lei de
Licitações e Contratos, enquadrou o relator, “as condutas configuram afronta
ao dever de licitar e à obrigação de elaborar projetos básico e executivo e
estimativa de custos para a execução da obra (arts. 2º, 7º, incisos I e II, e
8º da Lei 8.666/1993)”. Além disso, “a metodologia empregada pela UFRGS
representou violação às modalidades de licitação previstas no art. 23 da Lei
8.666/1993, uma vez que as obras e serviços de engenharia, que não possuam a
natureza comum, devem ser contratadas mediante a prévia realização de convite,
de tomada de preços ou de concorrência, a depender do valor estimado da
contratação, e não por meio de pregão”. Assim, o relator concluiu que a
universidade incorrera em grave violação à norma ao promover a execução de
obras de engenharia por intermédio de registro de preços, conforme assentado em
enunciados da jurisprudência selecionada do TCU, entre eles o extraído do Acórdão
1.238/2019-Plenário, que estabelece:
“O sistema de registro de preços não é aplicável à contratação de obras,
pelo fato de não haver demanda por itens isolados, uma vez que os serviços não
podem ser dissociados uns dos outros”. Em reforço ao seu posicionamento, o
relator destacou que as “hipóteses definidas para o emprego do sistema de
registro de preços não se amoldam ao empreendimento da UFRGS, por não se tratar
de contratações frequentes, nem de entregas parceladas ou para o atendimento a
mais de um órgão ou entidade, razão pela qual a construção do campus não
preenche os requisitos previstos no art. 3º do Decreto 7.982/2013”. Por
fim, o relator asseverou que não consta no processo administrativo das
contratações nenhum estudo econômico-financeiro que demonstre vantajosidade da
opção pelo uso das ARP em detrimento da realização do regular certame
licitatório. Voltando a atenção para a conduta dos agentes ouvidos em
audiência, o relator, adotando como razões de decidir as análises realizadas
pela unidade técnica, acolheu a defesa do pregoeiro e de um dos gestores da
entidade, “por não haver evidências de terem agido de forma omissiva ou
comissiva na sistemática adotada para esquivar-se do regular processo
licitatório”. Quanto aos outros dois gestores, um, por ter diretamente
solicitado o empenho de ARP e assinado as respectivas notas de empenho para o
pagamento dos serviços; e o outro, pela omissão em não adotar as medidas
necessárias para impedir as graves infrações praticadas pelo seu subordinado
imediato, o relator votou para que fossem rejeitas as suas razões de
justificativa e lhes aplicada a multa prevista no art. 58, inciso II, da Lei
8.443/1992, no que foi acompanhado pelo colegiado.
Acórdão
720/2023 Primeira Câmara, Representação, Relator Ministro Walton Alencar
Rodrigues.