quarta-feira, 4 de junho de 2025

Para efeitos de qualificação econômico-financeira em licitação de serviços continuados, o índice de 16,66% do Capital Circulante Líquido ou Capital de Giro, previsto no Anexo VII-A, item 11.1.b, da IN Seges-MPDG 5/2017 (aplicada no âmbito da Lei 14.133/2021 por força do art. 1º da IN Seges-ME 98/2022), deve ser apurado em função do preço estimado da contratação para o período de doze meses, independentemente da duração do contrato, sob o risco de restrição à competitividade e direcionamento do certame.

 

Para efeitos de qualificação econômico-financeira em licitação de serviços continuados, o índice de 16,66% do Capital Circulante Líquido ou Capital de Giro, previsto no Anexo VII-A, item 11.1.b, da IN Seges-MPDG 5/2017 (aplicada no âmbito da Lei 14.133/2021 por força do art. 1º da IN Seges-ME 98/2022), deve ser apurado em função do preço estimado da contratação para o período de doze meses, independentemente da duração do contrato, sob o risco de restrição à competitividade e direcionamento do certame.

Representação formulada ao TCU apontou possíveis irregularidades no Pregão Eletrônico 90013/2024, sob a responsabilidade do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), com valor estimado anual de R$ 17.475.559,28, cujo objeto era a contratação de “serviço continuado de transporte coletivo para atender as necessidades de deslocamento da força de trabalho do Instituto, composta por servidores, colaboradores, estagiários e bolsistas, entre outros, até o Campus de Inovação e Metrologia localizado em Xerém, Duque de Caxias/RJ, bem como a disponibilização de veículos para uso eventual”. O objeto do pregão fora dividido em dois grupos, de acordo com as linhas de ônibus atendidas. O grupo 1 compreendia onze linhas e os serviços eventuais, com despesas estimadas em R$ 7.427.824,88/ano, ao passo que o grupo 2, quatorze linhas, com despesas previstas de R$ 10.047.734,40/ano. Entre as irregularidades suscitadas, mereceu destaque a exigência, para fins de qualificação econômico-financeira das licitantes, de “comprovação de capital circulante líquido ou capital de giro (Ativo Circulante – Passivo Circulante) de, no mínimo, 16,66% do valor estimado dos cinco anos da contratação”. Especificamente quanto ao grupo 2, do qual participara a empresa autora da representação, o valor exigido para o Capital Circulante Líquido (CCL) mínimo fora de R$ 8.369.762,75, considerando o valor total do contrato para os cinco anos de sua duração (R$ 50.238.672,00), portanto cinco vezes maior do que o CCL mínimo comprovado por aquela empresa, inicialmente classificada em primeiro lugar. Realizada oitiva, o Inmetro alegou que a jurisprudência do TCU, as normas de regência, notadamente a IN Seges-MPDG 5/2017, e os modelos de termos de referência fornecidos pela AGU estabelecem que o Capital Circulante Líquido (CCL) mínimo exigido é baseado no valor estimado da contratação. Afirmou não haver localizado, na base de dados do Tribunal, “jurisprudência ou recomendação de avaliação do critério de qualificação econômico-financeira levando-se em consideração apenas 12 (doze) meses de contrato sob a égide da nova Lei 14.133/2021”, situação que o teria levado, “no momento do planejamento da contratação e julgamento das propostas, à aplicação literal do art. 106, inciso I, da Lei 14.133/2021 e do item 11.1.b do Anexo VII-A da IN Seges-MPDG 5/2017. Advogou que as normas de regência teriam sido rigorosamente observadas, porém seria cabível a expedição, por parte do TCU, de “recomendações ou determinações aos órgãos competentes para a alteração das minutas e instruções existentes a fim de que seja estabelecido que o capital líquido deverá ser calculado apenas durante o período de 12 (doze) meses ou do primeiro ano do contrato”. Ao analisar tais argumentos, a unidade técnica rememorou o estudo produzido no âmbito do processo que originara o Acórdão 1214/2013-TCU-Plenário, por meio do qual o Tribunal, ao se debruçar sobre as dificuldades enfrentadas pela Administração Pública no que concerne à temática dos contratos de natureza continuada, entendera ser possível exigir, como condição de habilitação econômico-financeira, o índice de Capital Circulante (CCL) de, no mínimo, 16,66% do valor estimado da contratação. Tal percentual, enfatizou a unidade instrutiva, fora estabelecido com base na necessidade de a prestadora dos serviços ter condições de honrar seus compromissos sem depender da contraprestação pecuniária por parte da Administração, equivalendo ao período de dois meses. Além disso, a unidade técnica asseverou que a leitura do edital do Pregão 90013/2024 e da IN Seges-MPDG 5/2017 deveria ser feita à luz da jurisprudência do TCU – a exemplo dos Acórdãos 1214/2013, 2763/2016, 1335/2010 e 2.268/2022, todos do Plenário –, segundo a qual o valor considerado para o cálculo do índice contábil é o valor equivalente ao período de doze meses de contrato, sendo irregular, portanto, exigência de índice com base no valor total estimado da contratação. Conquanto os acórdãos mencionados tenham sido prolatados antes da vigência da Lei 14.133/2021, a unidade instrutiva rejeitou o argumento de que “não há jurisprudência sob a égide da nova lei de licitações”, uma vez que o seu art. 69, o qual versa sobre a comprovação da boa situação financeira da licitante, a ser realizada por meio de índices contábeis, “não sofreu alterações em relação ao disposto no art. 31, § 5º, da Lei 8.666/1993, seu análogo”. Ao mencionar a IN Seges-ME 98/2022, cujo art. 1º autoriza a aplicação da IN Seges-MPDG 5/2017 nas contratações regidas pela Lei 14.133/2021, a unidade técnica arrematou que “a jurisprudência do TCU permanece aplicável”, restando assim configurada a ilegalidade da desclassificação das licitantes inicialmente mais bem classificadas no PE 90013/2024, por não apresentarem o índice de CCL definido em função do valor total estimado do contrato, este com vigência prevista de cinco anos. Em seu voto, o relator reforçou, preliminarmente, que o racional que levou ao estabelecimento de percentual mínimo para o índice em apreço, estabelecido no âmbito do Acórdão 1214/2013-TCU-Plenário, fora construído ante a necessidade de a empresa contratada ter condições operacionais por prazo suficiente para sua atuação independente dos pagamentos da parte contratante, necessidade observada especialmente em início de contrato, devido a diversos custos por ela assumidos. Frisou que, conforme o voto condutor do aludido aresto, compreendera-se que esse prazo seria de dois meses, o que, com base no art. 57, caput, da Lei 8.666/1993 – estabelecia o prazo dos contratos “em vinculação à duração dos créditos orçamentários anuais” –, representaria dois doze avos do valor estimado do contrato. Nesse sentido, julgou oportuno transcrever o seguinte excerto daquele voto condutor: “O grupo de estudos registrou que as exigências de qualificação econômico-financeira previstas na maioria dos editais não estão sendo capazes de evitar a contratação de empresas sem a devida capacidade econômico-financeira para honrar os compromissos pertinentes à prestação dos serviços. O grupo ressalta que empresas de prestação de serviço são altamente demandantes de recursos financeiros de curto prazo para honrar seus compromissos, sendo necessário que elas tenham recursos suficientes para honrar no mínimo dois meses de contratação sem depender do pagamento por parte do contratante. Assim, propõe que se exija dos licitantes que eles tenham capital circulante líquido de no mínimo 16,66% (equivalente a 2/12) do valor estimado para a contratação (período de um ano).” (grifos do relator). Por outro lado, acrescentou o relator, não teria havido nenhuma conclusão acerca da obrigatoriedade da celebração de contratos limitados a doze meses, conclusão depreendida do seguinte trecho daquele mesmo voto condutor: “Considerando que a legislação não determina expressamente que esse tipo de contrato deve ter prazo inicial de vigência de 12 meses, levando em conta os aspectos mencionados nos parágrafos anteriores, entendo que não se deva fixar uma orientação geral de que a administração deve ou não fazer contratos para prestação de serviços continuados com prazo de 12, 24 ou 60 meses. É uma avaliação que deve ser feita a cada caso concreto, tendo em conta as características específicas daquela contratação. Cabe à administração justificar no procedimento administrativo o porquê da escolha de um ou outro prazo, levando-se em conta os aspectos aqui discutidos e outros porventura pertinentes para aquele tipo de serviço.”. Portanto, a seu ver, o conteúdo do art. 106 da Lei 14.133/2021, que permite à Administração celebrar contratos de serviços contínuos com prazo de até cinco anos, “não representa uma inovação prática e que demande atualização jurisprudencial”. Nesse contexto, não restariam dúvidas de que “esta Corte tem entendimento, assentado e anterior à edição da Lei 14.133/2021, de que as exigências econômico-financeiras devem se ater ao valor estimado para o período de 12 (doze) meses de contrato, independente da sua duração, sob o risco de restrição à competitividade e direcionamento do certame”. Assim sendo, não poderia ser acolhido o argumento do Inmetro de que a suposta ausência de jurisprudência formada sob a égide da Lei 14.133/2021 ensejaria a adoção da literalidade do disposto na IN Seges-MPDG 5/2017 e, como consequência, a estipulação da exigência do CCL mínimo considerando o período integral (de cinco anos) da contratação. No caso concreto, a diferença de valor do CCL mínimo exigido “acarretou a desclassificação das licitantes mais bem classificadas nos grupos e, portanto, operou em sentido restritivo à competitividade do certame”. Também em decorrência da sua explanação, deveria ser considerado improcedente o argumento do Inmetro de que, ante a ausência de jurisprudência do TCU sobre essa matéria após a entrada em vigor da Lei 14.133/2021, deveria o TCU tão somente expedir “recomendação ou determinação” para ajustes na redação da IN Seges-MPDG 5/017 e dos modelos de termos de referência fornecidos pela AGU. Ao final, o relator propôs, e o Plenário decidiu, entre outras providências, fixar prazo ao Inmetro para promover a “anulação dos atos de homologação, adjudicação e habilitação do Pregão Eletrônico 90013/2024”, com o consequente retorno à fase de habilitação e julgamento das propostas, com a convocação das empresas que apresentaram melhores preços para apresentação de suas propostas ajustadas, dando-se prosseguimento ao certame, considerando, desta vez, quando da análise dos documentos de habilitação, que o índice do Capital Circulante Líquido, de 16,66%, deve ser calculado em relação ao valor estimado para 12 (doze) meses do contrato”. Outrossim, decidiu o Pleno dar ciência à Secretaria de Gestão e Inovação do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (Seges/MGI) do teor da representação, a fim de avaliar a “conveniência e oportunidade de ajustar a redação do item 11.1.b, do Anexo VII-A, da IN Seges/MP 5/2017, que prevê a exigência de que o Capital Circulante Líquido ou Capital de Giro (Ativo Circulante – Passivo Circulante) seja de, no mínimo, 16,66% do valor estimado da contratação, no sentido de prover maior clareza informativa e/ou expedir orientações aos órgãos jurisdicionados da Administração Pública Federal Direta e Indireta quanto à observação jurisprudencial deste Tribunal acerca da matéria, que informa que para efeitos de qualificação econômico-financeira, o índice de 16,66% do Capital Circulante Líquido deve ser apurado em função do valor estimado da contratação para o período de doze meses (Acórdãos 1.214/2013-TCU-Plenário, Relator Ministro Aroldo Cedraz, 2.763/2016-TCU-Plenário, Relator Ministro Augusto Nardes, 1.335/2010-TCU-Plenário, Relator Ministro José Mucio, e 2.268/2022-TCU-Plenário, Relator Ministro Antônio Anastasia), com vistas a prevenir equívocos sobre sua aplicação em relação à Lei 14.133/2021”; bem como cientificar a Câmara Nacional de Modelos de Licitações e Contratos da Consultoria-Geral da União, integrante da Advocacia-Geral da União (CNMLC/CGU/AGU), do teor da representação, para que “avalie a conveniência e oportunidade de ajustar a redação de seus modelos de termos de referência para a contratação dos serviços contínuos, que preveem a exigência de que o Capital Circulante Líquido ou Capital de Giro (Ativo Circulante - Passivo Circulante) seja de, no mínimo, 16,66% do valor estimado da contratação, no sentido de prover maior clareza informativa e/ou expedir orientações aos órgãos jurisdicionados da Administração Pública Federal Direta e Indireta quanto à observação jurisprudencial deste Tribunal acerca da matéria”.

Acórdão 1087/2025 Plenário, Agravo, Relator Ministro Aroldo Cedraz.

É regular a exigência de certificação ISO para habilitação de licitante, com base no art. 17, § 6º, inciso III, da Lei 14.133/2021.

 

É regular a exigência de certificação ISO para habilitação de licitante, com base no art. 17, § 6º, inciso III, da Lei 14.133/2021. A exigência de certificação em relação a “material” e “corpo técnico”, referenciados no aludido dispositivo legal, pode ser entendida como a demonstração da capacidade técnica do quadro de pessoal integrada com a experiência organizacional da empresa e seus meios de produção, ou seja, a sua própria capacidade operacional (art. 67, caput e inciso III, da Lei 14.133/2021).

Representação formulada ao TCU indicou possíveis irregularidades no Pregão Eletrônico 427/2024, promovido pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) sob a regência da Lei 14.133/2021, com valor estimado de R$ 7.772.946,59, cujo objeto era a contratação de empresa especializada na prestação de serviços de sustentação de infraestrutura do ambiente tecnológico do Dnit. A empresa representante alegou, em suma, que sua inabilitação fora indevida, por decorrer da exigência ilegal de certificação ISO 9001 na fase de habilitação, o que teria restringido a competitividade do certame. Argumentou que seus atestados de conformidade já seriam suficientes para comprovar a qualificação técnica exigida, além de sustentar que a ISO 20000 já contemplaria os principais requisitos da ISO 9001, tornando a exigência cumulativa desnecessária. Em sua instrução inicial, a unidade técnica destacou que o edital do PE 427/2024 exigira, como condição de habilitação, a apresentação de certificações ISO 9001, ISO 20000 e ISO 27001, o que poderia, sim, configurar cláusula restritiva à competitividade, sobretudo por “ausência de justificativa técnica objetiva e proporcionalidade entre as exigências e o objeto contratado”. Em razão disso, propôs, no mérito, o envio de ciência ao Dnit quanto às impropriedades constatadas. O relator não acolheu a proposta, decidindo por, preliminarmente, realizar oitiva a fim de que fossem apresentadas justificativas acerca da “exigência de certificações ISO 9001, 20000 e 27001 como requisitos de habilitação, inclusive demonstrando a adequação da exigência à Lei 14.133/2021; razões por que as certificações não podem ser exigidas apenas da futura contratada, com prazo adequado para esta obtê-las; eventual sobreposição desnecessária de requisitos, pois a ISO 20000 abrangeria o contido na ISO 9001”. Em resposta, o Dnit afirmou que a exigência das certificações ISO 9001, ISO 20000 e ISO 27001 se dera com fundamento nos arts. 17, § 6º, e 42, inciso III, da Lei 14.133/2021, os quais permitem, segundo sua interpretação, a exigência de certificações como requisitos de habilitação técnica, especialmente quando justificadas tecnicamente em função da complexidade do objeto. Pontuou que a criticidade da infraestrutura de TI da autarquia, composta por “aproximadamente 695 máquinas virtuais, sendo 250 responsáveis por aplicações estratégicas como SIOR, SIAC, SUPRA e SEI”, justificava a necessidade de elevado padrão técnico-operacional das empresas contratadas. Defendeu, ainda, que a futura migração de serviços para a nuvem reforçava a necessidade de maturidade técnica e aderência a padrões internacionais de qualidade e segurança, os quais seriam demonstrados pelas certificações exigidas. Quanto à ISO 9001, o Dnit salientou que sua exigência decorrera da necessidade de padronização de processos e melhoria contínua, especialmente no contexto da implantação de “ambientes DevOps e DevSecOps”. A ISO 20000, por sua vez, fora considerada essencial por estar alinhada às “melhores práticas do ITIL”, assegurando eficiência na operação e na gestão dos serviços de TI. Já a ISO 27001 teria sido solicitada em razão do elevado volume de ataques cibernéticos no país, exigindo da contratada estrutura e processos robustos de segurança da informação, com a contratação de equipes especializadas (“Red Team e Blue Team”). A entidade também justificou a exigência das certificações na fase de habilitação, e não apenas da empresa contratada, sob o argumento de que os prazos para obtenção dessas certificações seriam longos, podendo alcançar até doze meses, envolvendo um processo contínuo e complexo, que não estaria limitado à obtenção do selo. Acrescentou que “a certificação exige a implementação de padrões e a comprovação de experiência prévia nesses padrões de qualidade e segurança”, os quais, segundo a entidade, não poderiam ser garantidos por empresa que já não tivesse as certificações exigidas. Por fim, o Dnit registrou não ter havido restrição à competitividade, haja vista que oito empresas participaram do certame, e que outras licitantes teriam sido excluídas da disputa por motivos diversos da ausência das certificações. A diferença de apenas R$ 0,60 entre a proposta da empresa representante e a da empresa vencedora da licitação também foi utilizada pelo Dnit como argumento de que não teria havido impacto econômico relevante decorrente da exigência impugnada. Para a unidade instrutiva, a defesa do Dnit baseara-se em fundamentos genéricos e descolados de análise técnica específica e contextualizada. Em nenhum momento, segundo ela, fora demonstrado de forma objetiva por que a exigência de cada uma das certificações, especialmente da ISO 9001, seria imprescindível ao alcance dos objetivos contratuais. A entidade também não teria apresentado estudo técnico, avaliação de riscos, falhas pregressas ou evidência empírica que permitisse inferir que a exigência cumulativa das três certificações seria a única forma de mitigar riscos à execução do objeto. Ainda de acordo com a unidade instrutiva, o conteúdo da Nota Técnica 9/2025/CGTI/DAF, trazida aos autos pelo Dnit, limitara-se a apresentar conceitos e enumerações de boas práticas, sem realizar a devida correlação técnica entre os requisitos normativos e as especificidades do contrato, estando assim em conflito com o entendimento consolidado do TCU de que a exigência de certificações ISO na fase de habilitação é vedada, exceto se demonstrada, de forma técnica e objetiva, sua essencialidade para a execução do contrato, o que não foi evidenciado no presente caso”. Assinalou, ainda, que o Tribunal já se posicionara reiteradamente contra esse tipo de exigência, pois “pode restringir a competitividade e afastar concorrentes que, embora não certificados, possuam plena capacidade técnica para executar o objeto licitado”, a exemplo dos Acórdãos 1085/2011, 539/2015 e 2129/2021, todos do Plenário. Consoante a unidade técnica, as justificativas apresentadas não teriam indicado, por exemplo, por que a ISO 20000, norma voltada especificamente à gestão de serviços de TI, não seria suficiente para assegurar os padrões de qualidade e eficiência almejados pela Administração. Tampouco se demonstrara por que a ISO 9001, de escopo genérico, seria imprescindível à execução de um contrato com objeto claramente delimitado à área de tecnologia da informação. O Dnit também não teria respondido, de forma específica, o questionamento quanto à sobreposição entre as normas ISO 9001 e ISO 20000, limitando-se a reafirmar sua tese inicial de complementaridade entre os sistemas de gestão. Na sequência, a unidade instrutiva ponderou que, embora reconhecesse que a exigência cumulativa das certificações não teria sido, no caso concreto, justificada de forma técnica e objetiva, seria razoável considerar que “as certificações ISO 20000 e ISO 27001 guardam relação mais direta com o objeto da contratação, qual seja, a sustentação da infraestrutura tecnológica do Dnit. A ISO 20000 é uma norma internacional voltada especificamente à gestão de serviços de TI, sendo, portanto, inerente ao escopo dos serviços contratados. Já a ISO 27001, por sua vez, trata da segurança da informação, elemento essencial em ambientes com grande volume de dados sensíveis e operações críticas, como no caso da autarquia”, além do que “diversos princípios de gestão da qualidade previstos na ISO 9001 – como a melhoria contínua, a padronização de processos e o foco no cliente – estão incorporados nos requisitos da ISO 20000”. Destarte, à luz da razoabilidade, uma exigência fundamentada exclusivamente na ISO 20000 e na ISO 27001 poderia, a seu ver, ser considerada mais proporcional e condizente com os objetivos contratuais, “desde que devidamente motivada”. Em relação à possibilidade de exigência das certificações ISO apenas da empresa contratada, a unidade técnica considerou que as justificativas apresentadas pelo Dnit careciam de robustez técnica e não eram corroboradas pelos elementos constantes dos autos. Apesar de a entidade ter afirmado que o processo de certificação levaria entre seis e doze meses, os documentos juntados pela empresa autora da representação apontariam uma realidade distinta, com evidências de que o processo poderia ser concluído em prazo significativamente inferior ao alegado, colocando em dúvida a generalização apresentada pela entidade. Quanto à argumentação do Dnit de que a obtenção da certificação não se resumiria ao recebimento do selo, envolvendo um processo de maturação organizacional que incluiria experiência prática nos padrões certificados, a unidade técnica entendeu que ela não se sustentava, uma vez que “a certificação, por definição, pressupõe que a organização já opere conforme os padrões estabelecidos pela norma. A emissão do certificado apenas chancela formalmente a capacidade de uma organização, razão pela qual a exigência de experiência prévia nos padrões certificados perde força lógica. Da mesma forma, a posse do selo não garante, por si só, que os processos certificados estejam sendo efetivamente praticados.”. A despeito de reconhecer a dificuldade que é, muitas vezes, para a Administração contratante avaliar e assegurar os padrões de qualidade exigidos na certificação, na sua ótica “não se justifica a exigência da certificação como critério de habilitação”, pois a licitante “já pode operar com esses padrões, mas apenas não fez a certificação exigida, até mesmo porque envolve custos. Nada impede, todavia, que uma vez vencedora do certame, adote as providências para retirar sua certificação.”. No que diz respeito à alegação de que a presença de oito empresas no certame teria afastado a restrição à competitividade, a unidade instrutiva retrucou que tal argumento não se sustentava à luz da jurisprudência do TCU, tendo em vista que a análise da restrição à competitividade “não pode se limitar à quantidade de licitantes, mas deve considerar se as condições estabelecidas no edital produziram efeitos concretos de exclusão indevida”, a exemplo dos Acórdãos 2066/2016 e 3306/2014, ambos do Plenário. E arrematou: “a exigência das certificações ISO 9001, 20000 e 27001 como critério de habilitação, sem a devida motivação técnica específica e objetiva de que tais certificações seriam imprescindíveis à execução do objeto, configura violação ao princípio da competitividade, além de contrariar a jurisprudência consolidada deste Tribunal”. Nada obstante a indevida exigência da certificação ISO como critério de habilitação, sem a demonstração, de forma técnica e objetiva, de sua essencialidade para a execução do contrato, mas levando em conta que a exigência não resultara em prejuízo econômico para a Administração – a diferença de preço entre a proposta da empresa representante e o valor ofertado pela empresa vencedora fora de apenas R$ 0,60 –, a unidade técnica considerou suficiente dar ciência ao Dnit sobre as irregularidades identificadas. Em seu voto, para início de abordagem, o relator transcreveu os seguintes dispositivos da Lei 14.133/2021: “Art. 17. O processo de licitação observará as seguintes fases, em sequência: § 6º A Administração poderá exigir certificação por organização independente acreditada pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) como condição para aceitação de: I - estudos, anteprojetos, projetos básicos e projetos executivos; II - conclusão de fases ou de objetos de contratos; III - material e corpo técnico apresentados por empresa para fins de habilitação.(...) Art. 42. A prova de qualidade de produto apresentado pelos proponentes como similar ao das marcas eventualmente indicadas no edital será admitida por qualquer um dos seguintes meios: III - certificação, certificado, laudo laboratorial ou documento similar que possibilite a aferição da qualidade e da conformidade do produto ou do processo de fabricação, inclusive sob o aspecto ambiental, emitido por instituição oficial competente ou por entidade credenciada” (grifos do relator). Depreendeu então que, “em relação ao estatuto anterior de licitações, a nova norma guarda mais flexibilidade no tocante à exigência de certificações técnicas como requisitos de habilitação e classificação”, ao permitir a exigência de certificação como “requisito de habilitação em relação ao material e corpo técnico da licitante (art. 17, § 6º, inciso III)”. E como a habilitação diz respeito ao “conjunto de informações e documentos necessários e suficientes para demonstrar a capacidade do licitante de realizar o objeto da licitação”, a exigência de certificação referente a “material e corpo técnico”, a seu ver, enquadrar-se-ia no atendimento dos requisitos técnicos de habilitação, ou seja, na “demonstração da capacidade de adequadamente executar o objeto do contrato”. Dito de outra forma, essa certificação enquadrar-se-ia nos requisitos técnico-profissional e técnico-operacional, pois seria possível compreender que “os elementos da capacidade operacional de uma empresa, previstos no inciso III do art. 67 da Lei 14.133/2021, são mão de obra, equipamentos e tecnologia, os quais podem ser entendidos nos termos legais de ‘material’ e ‘corpo técnico’ a que se refere o art. 17, inciso III, da Lei 14.133/2021”. Resumindo, a exigência de certificação em relação a esses dois requisitos poderia ser entendida como a “demonstração da capacidade técnica do quadro de pessoal integrada com a experiência organizacional da empresa e seus meios de produção, ou seja, a sua própria capacidade operacional”. Retomando o caso concreto, o relator asseverou que a controvérsia se encontrava na exigência simultânea das normas ISO 9001 e 20000, as quais, seguindo a autora da representação, seriam redundantes, mas que, em princípio, as justificativas do Dnit para a exigência de ambas as certificações “foram exercidas dentro do poder discricionário do gestor”, vislumbrando “espaço, pois, para a aplicação do princípio da deferência administrativa”. Nesse sentido, não seria o caso de o TCU se manifestar sobre o mérito da exigência cumulativa de ambas as certificações, até porque “a exigência das duas certificações simultâneas não apresentou prejuízo em concreto ou afetou a competitividade do certame, pois ambas as empresas – a representante, sem a certificação ISO 9001, e a provisoriamente vencedora, com a certificação ISO 9001 – apresentaram propostas com valores praticamente idênticos”. Especificamente quanto ao momento da exigência da apresentação das certificações, ele enfatizou que “a norma legal rege que ocorrerá quando da habilitação. Assim, sob esse aspecto, não há o que se questionar da conduta do Dnit”. Deixou assente também que, caso se exigissem as certificações apenas da empresa vencedora, como requisito da celebração do contrato, seria possível evitar que as empresas incorressem em custos para a sua obtenção apenas com o propósito de participar da licitação e, assim, seria aumentada a competitividade do certame. No entanto, a obtenção das certificações pelas empresas “não seria automática e poderia demorar meses”, prejudicando assim “a entrega dos serviços e comprometendo a continuidade das operações”, de forma que, no caso concreto, as alegações do Dnit a respeito estariam dentro do seu espaço de discricionariedade. Ao final, acolhendo a proposição do relator, o Plenário decidiu considerar improcedente a representação.

Acórdão 1091/2025 Plenário, Representação, Relator Ministro Benjamin Zymler.

quinta-feira, 15 de maio de 2025

Em licitações de serviços de administração, gerenciamento, emissão e fornecimento de auxílio-alimentação, caso diversos concorrentes ofertem a mesma taxa de administração zero, situação que impede as microempresas e empresas de pequeno porte de exercerem o direito de preferência

 

Em licitações de serviços de administração, gerenciamento, emissão e fornecimento de auxílio-alimentação, caso diversos concorrentes ofertem a mesma taxa de administração zero, situação que impede as microempresas e empresas de pequeno porte de exercerem o direito de preferência previsto no art. 45 da LC 123/2006, haja vista a proibição de taxa de administração negativa (art. 3º, inciso I, da Lei 14.442/2022), é cabível, como critério de desempate, a realização de sorteio entre todos os licitantes empatados.

Representação formulada ao TCU apontou possíveis irregularidades no Pregão Eletrônico 118/2025, sob a responsabilidade do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), cujo objeto era a contratação de empresa especializada na prestação de serviços de administração, gerenciamento, emissão e fornecimento de auxílio-alimentação, em forma de cartão eletrônico. Entre as irregularidades suscitadas quanto ao aludido certame, regido pela Lei 13.303/2016 (Lei das Estatais) e pelo regulamento próprio da entidade, destacara-se o descumprimento do direito de preferência de microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP), uma vez que o sorteio definidor da empresa vencedora, após empate, teria incluído todas as licitantes empatadas, e não apenas as ME/EPP. O representante alegou que, em caso de empate, a solução admitida pela lei seria, com fundamento no art. 45, III, da Lei Complementar 123/2006, o sorteio entre as microempresas e empresas de pequeno porte participantes do certame, e não um sorteio entre todos os licitantes com lances empatados”. O mencionado dispositivo legal, transcrito no voto do relator, assim dispõe: “Art. 45. Para efeito do disposto no art. 44 desta Lei Complementar, ocorrendo o empate, proceder-se-á da seguinte forma: I - a microempresa ou empresa de pequeno porte mais bem classificada poderá apresentar proposta de preço inferior àquela considerada vencedora do certame, situação em que será adjudicado em seu favor o objeto licitado; II - não ocorrendo a contratação da microempresa ou empresa de pequeno porte, na forma do inciso I do caput deste artigo, serão convocadas as remanescentes que porventura se enquadrem na hipótese dos §§ 1º e 2º do art. 44 desta Lei Complementar, na ordem classificatória, para o exercício do mesmo direito; III - no caso de equivalência dos valores apresentados pelas microempresas e empresas de pequeno porte que se encontrem nos intervalos estabelecidos nos §§ 1º e 2º do art. 44 desta Lei Complementar [empate ficto nas faixas de até 10% e 5%, respectivamente], será realizado sorteio entre elas para que se identifique aquela que primeiro poderá apresentar melhor oferta” (grifos e acréscimo do original). A alegação do representante fora objeto de impugnação no âmbito do procedimento licitatório e a conclusão externada em parecer jurídico do HCPA respondera que: “Assim, em caso de empate, diante da hipótese do oferecimento de taxa de administração zero (proibição de deságio nos termos do art. 3º, I, da Lei 14.442/2022), não será possível a empresa de pequeno porte ME/EPP oferecer preço inferior, razão pela qual o tratamento diferenciado para microempresa ou empresa de pequeno porte fica sem condições de aplicabilidade, do contrário, caso fosse permitido, equivaleria a dizer que, nesses casos, as ME e EPP sempre estariam em vantagem, ferindo os princípios constitucionais da isonomia, legalidade e livre concorrência (grifos do original). Ao analisar o caso, a unidade técnica adotou como referência o Acórdão 2.107/2023-1ª Câmara, prolatado por relação, em sede de  representação na qual o autor também questionara o descumprimento dos arts. 44, §§ 1º e 2º, e 45, inciso III, da LC 123/2006, sustentando, em essência, que somente as licitantes classificadas como ME e EPP poderiam ter participado do sorteio previsto na lei. Naquela ocasião, a área técnica defendera que não seria possível convocar apenas as licitantes que eram ME ou EPP, diante das seguintes considerações: “12. Nesse ponto, importa destacar, que a interpretação dada aos arts. 44 e 45 da LC 123/2006, deve sempre ser realizada da forma mais restritiva possível, tendo em vista tratar-se de exceção ao princípio constitucional da isonomia. 13. Portanto, como as ME e EPP não poderiam ser convocadas para apresentarem proposta de preço inferior àquela considerada vencedora do certame, nos precisos termos do art. 45, inciso I, da LC 123/2006, o sorteio realmente teria que ser realizado entre todos os licitantes, seguindo o que estabelece o art. 37, parágrafo único, do Decreto 10.024/2019 e o item 5.31 do edital” (grifos do original). Manifestando-se pelo acolhimento das conclusões da unidade instrutiva, o relator justificou que a realização do sorteio previsto no art. 45, inciso III, da LC 123/2006 “não pode ser considerada isoladamente em benefício de ME/EPPs, na medida em que é parte de um conjunto de critérios previsto em lei para solucionar o empate, em situação na qual se aplique a preferência de contratação para ME/EPPs”. Nesse sentido, destacou que, segundo a ordem definida no art. 45 da mencionada lei complementar, o sorteio é o terceiro critério de desempate, que só deve ser utilizado se os dois primeiros critérios – estabelecidos nos incisos I e II do mesmo artigo – não forem suficientes para determinar o vencedor da licitação. Em decorrência das características específicas do objeto licitado, em que não há possibilidade de oferta de lances inferiores após o empate entre as propostas com taxa de administração zero, o relator entendeu que a solução prevista no art. 45 da LC 123/2006, “como um todo, não se mostra aplicável, não se admitindo a aplicação isolada de seu inciso III”, ressaltando que o “§ 2º do art. 45 da LC 123/2006 estabelece sua aplicação exclusivamente em casos em que a melhor oferta inicial não tiver sido apresentada por ME/EPP”. Voltando a atenção para o caso concreto, o relator observou que as dezessete empresas participantes da licitação apresentaram o mesmo valor de lance (taxa de administração de 0%), que correspondia ao mínimo possível, tendo em vista o disposto no art. 3º, inciso I, da Lei 14.442/2022, que proíbe qualquer tipo de deságio ou imposição de descontos sobre o valor contratado. Observou, ainda, que das dezessete licitantes, quatorze não eram microempresas ou empresas de pequeno porte, sendo a disputa finalizada por meio de sorteio, no qual uma empresa não enquadrada como ME ou EPP fora declarada vencedora. Assim, diante do fato de todas as licitantes terem ofertado o mesmo valor, o relator concluiu que não seria possível ao HCPA aplicar o direito de preferência previsto no art. 45, inciso I, da LC 123/2006 e convocar somente as três licitantes enquadradas como EPP para apresentar uma melhor oferta para o desempate. Do que expôs, o relator asseverou que não foram confirmados os indícios de irregularidade suscitados na representação, razão por que propôs, e o Plenário decidiu, pelo conhecimento e pela improcedência da representação.

Acórdão 792/2025 Plenário, Representação, Relator Ministro-Substituto Augusto Sherman.

Na licitação para prestação de serviços de administração, gerenciamento, emissão e fornecimento de auxílio-alimentação, é regular a exigência, em edital, de que a empresa vencedora apresente, para fins de celebração do contrato, rede credenciada contendo supermercados específicos.

 

Na licitação para prestação de serviços de administração, gerenciamento, emissão e fornecimento de auxílio-alimentação, é regular a exigência, em edital, de que a empresa vencedora apresente, para fins de celebração do contrato, rede credenciada contendo supermercados específicos. Os requisitos definidos para a conformação da rede credenciada devem compatibilizar o caráter competitivo do certame com a satisfação das necessidades da entidade, de modo a garantir conforto e liberdade de escolha aos usuários.
Representação formulada ao TCU apontou possíveis irregularidades no Pregão Eletrônico 118/2025, sob a responsabilidade do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), cujo objeto era a contratação de empresa especializada na prestação de serviços de administração, gerenciamento, emissão e fornecimento de auxílio-alimentação, em forma de cartão eletrônico com chip. Entre as irregularidades suscitadas quanto ao aludido certame, regido pela Lei 13.303/2016 (Lei das Estatais) e pelo regulamento próprio da entidade, mereceram destaque as seguintes: a) “exigência de credenciamento de estabelecimentos específicos pelo nome empresarial, ao exigir, em edital, que a empresa vencedora comprove o credenciamento de supermercados específicos”, em vez de simplesmente definir “critérios objetivos como tipo de estabelecimento, porte ou Cnae”, o que restringiria a competitividade e beneficiaria determinadas empresas; b) fixação de prazo excessivamente curto para comprovação de rede credenciada, ao exigir que a empresa contratada comprovasse o credenciamento de 70% da rede de estabelecimentos em quinze dias úteis e 100% em trinta dias corridos, o que favoreceria empresas que possuíssem “rede estabelecida na região”. Em seu voto, o relator destacou, preliminarmente, que essas supostas irregularidades já haviam sido objeto de representação perante o TCU no ano de 2020, versando sobre contratação do HCPA de mesmo objeto, tendo sido julgada improcedente por meio do Acórdão 2600/2020-1ª Câmara. Afirmou, ademais, que as mesmas questões trazidas ao conhecimento do TCU foram objeto de impugnação ao edital do referido Pregão 118/2025, e consideradas, a seu ver, adequadamente respondidas pela pregoeira da entidade. Especificamente acerca do item “a” supra, a pregoeira assinalara, naquela oportunidade, que “a rede credenciada solicitada se baseia nas reais necessidades dos funcionários do HCPA, uma vez que esses estabelecimentos comerciais foram mapeados com base na elevada utilização pelos empregados”, razão pela qual fora mantido o subitem 9.3 do termo de referência, relativo ao credenciamento das redes de supermercado. Nesse ponto, o relator frisou que, de acordo com a jurisprudência do TCU, a exemplo dos Acórdãos 2802/2013 e 2.547/2007, ambos do Plenário, os requisitos definidos em edital voltados à rede credenciada devem buscar compatibilizar o caráter competitivo do certame com a satisfação das necessidades da entidade, visando a garantir “o conforto e a liberdade de escolha dos funcionários da instituição para a aquisição de gêneros alimentícios”, afigurando-se, pois, “razoável” a exigência contida no mencionado subitem 9.3 do termo de referência. No tocante ao item “b” acima, relacionado ao prazo fixado no edital para credenciamento dos estabelecimentos, qual seja, quinze dias úteis após a assinatura do contrato para a licitante vencedora comprovar 70% da rede e trinta dias corridos para o restante, o relator salientou que a jurisprudência do TCU é no sentido de que a exigência da apresentação de rede credenciada pelo licitante, em contratação de empresa no fornecimento e manuseio de cartão alimentação, deve ocorrer para fins de celebração do contrato, como ocorrera no caso em análise, devendo ainda ser estabelecido prazo razoável para que a vencedora do certame credencie os estabelecimentos comerciais fornecedores de refeição. Na sequência, ele invocou o Acórdão 961/2013-Plenário, que apreciara representação apontando possível irregularidade no edital do Pregão Presencial 2/2013, conduzido pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Estado de São Paulo (Crea/SP) e versando sobre o mesmo objeto em tela. Naquela assentada, não fora considerado desarrazoado o prazo de vinte dias que a empresa contratada teria para “entregar a relação de estabelecimentos credenciados” ao Crea/SP. Tomando então como parâmetro o que restara decidido no Acórdão 961/2013-Plenário, o relator considerou que, no caso concreto, o prazo fixado teria sido razoável. Destarte, não confirmados os indícios de irregularidade suscitados na representação, o relator propôs, e o Plenário decidiu, considerá-la improcedente.



Acórdão 790/2025 Plenário, Representação, Relator Ministro-Substituto Augusto Sherman.

quinta-feira, 24 de abril de 2025

A revogação de certame licitatório só pode ocorrer diante de fatos supervenientes que demonstrem que a contratação pretendida tenha se tornado inconveniente e inoportuna ao interesse público.

 

A revogação de certame licitatório só pode ocorrer diante de fatos supervenientes que demonstrem que a contratação pretendida tenha se tornado inconveniente e inoportuna ao interesse público. Ao constatar que a motivação da revogação foi genérica e incapaz de demonstrar sua real necessidade, pode o TCU determinar ao jurisdicionado que anule o ato revogatório, a fim de permitir a continuidade da licitação.

Representação formulada ao TCU apontou supostas inconformidades nos Pregões Eletrônicos (PE) 90840/2024 e 90057/2025, conduzidos pelo Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) com vistas à “aquisição de plataforma de integração de aplicações”. O primeiro certame contara com a participação de cinco licitantes, tendo a empresa vencedora oferecido o melhor lance; considerando que a empresa atendera aos requisitos documentais, o Serpro a convocou para realização de prova de conceito e concluiu que houvera o cumprimento integral das exigências técnicas. No entanto, ao analisar recurso administrativo interposto por licitante e as contrarrazões apresentadas pela vencedora, a estatal “alterou o seu posicionamento e inabilitou esta última”, revogando o pregão, sob o argumento de que seriam necessários ajustes no edital. Posteriormente, fora publicado o PE 90057/2025, com o mesmo objeto da licitação anterior. A representante alegara, em síntese: a) falhas na condução da prova de conceito do PE 90840/2024, por ter sido realizada de forma “confusa e inadequada”, além de haver sido desconsiderado que a vencedora deixara de cumprir diversos requisitos; b) inabilitação da vencedora apenas na fase recursal, a indicar “possível conivência anterior por parte da equipe técnica responsável pelo certame”; c) revogação da licitação sem motivação idônea; d) publicação do edital do PE 90057/2025 contendo requisitos semelhantes aos do pregão anterior, a sugerir “possível favorecimento” à empresa vencedora, pois lhe permitiria “ajustar o seu produto para participar novamente do processo competitivo”. Em resposta à oitiva prévia realizada, o Serpro refutou as alegações da autora da representação, defendeu a adequação das decisões proferidas naqueles certames e enfatizou a importância da contratação. Nada obstante, informou que havia suspendido a última licitação, sem previsão de data para retomada. Em sua instrução, a unidade técnica propôs considerar improcedentes as alegações da representante e arquivar o processo. Em seu voto, o relator, por um lado, concordou com a unidade instrutiva no sentido de que não havia evidências capazes de comprovar a ocorrência de falhas graves na realização da prova de conceito da vencedora, sobretudo ao se levar em conta que a empresa “veio a ser inabilitada na fase recursal do PE 90840/2024 em razão de desatendimento ao requisito técnico constante do subitem 2.1.2.6.5 do correspondente instrumento convocatório, conforme explicado pelo Serpro (grifos do relator): “O item 2.1.2.6.5 exige que a solução possua uma interface WEB centralizada para consulta de, no mínimo, logs, erros, alertas, tracing e acessos, referentes aos componentes da plataforma. Durante a avaliação, constatou-se que a solução da empresa atende plenamente a todos esses requisitos, com exceção da centralização da interface. Embora os dados de logs, erros, alertas e acessos estejam disponíveis em uma única interface WEB, os dados de tracing são acessados por meio de uma interface separada. Dessa forma, o requisito específico de centralização não foi plenamente atendido, pois exige o uso de mais de uma interface para acesso às informações”. Por outro lado, o relator assinalou que, após detida análise do conjunto probatório, divergia do posicionamento da unidade técnica quanto à comparação entre os editais dos certames e, também, em relação à motivação invocada para a revogação do PE 90840/2024. Nesse ponto, destacou que a empresa estatal motivara o ato de revogação nos seguintes termos: “Senhores Representantes, desta forma para garantir que os requisitos do edital estejam alinhados às necessidades técnicas e negócio do Serpro, a Área Técnica do Serpro solicitou a REVOGAÇÃO do Pregão para ajustes. Esta medida assegurará a transparência e a clareza no processo de contratação, eliminando dúvidas e evitando futuros questionamentos e buscando a proposta mais vantajosa que atenda às necessidades do Serpro” (grifos do relator). Ele retrucou que as nove modificações promovidas no edital do PE 90057/2025 consistiriam, na verdade, em “meros ajustes de redação, sem alterações das características do objeto e da essência dos requisitos a serem observados pelos participantes”, o que inclusive teria sido reconhecido pela própria estatal em sua resposta à oitiva, destacada a seguir (grifos do relator): “Portanto, os ajustes promovidos foram apenas de redação, sem alterar o conteúdo dos requisitos, mas sim para tornar mais claros os aspectos técnicos desejados pelo SERPRO. Essas modificações foram elaboradas para adequar os requisitos às práticas e necessidades do SERPRO e incentivar a participação do maior número possível de empresas no pregão eletrônico, sem comprometer a competitividade ou a isonomia do certame. [...] A revogação do Pregão Eletrônico nº 90840/2024 decorreu da identificação de ajustes necessários em alguns dos requisitos técnicos originalmente estabelecidos no edital. Inicialmente, verificou-se um erro material crítico no item 2.1.2.1, que exigia a utilização do sistema operacional CentOS. Este sistema operacional foi oficialmente descontinuado pela RedHat, conforme informado no site [omissis]. Tal fato tornou inviável homologar o requisito mencionado, uma vez que este perdeu seu objetivo e nenhuma empresa poderia atender ao requisito. Diante deste contexto tornou-se necessária a adequação para viabilizar o atendimento ao requisito e possibilitar a participação do maior número de licitantes, visando a contratação do objeto de acordo com as necessidades do Serpro (p. 43). Outro ponto relevante que justificou a revogação foi a alocação do requisito relacionado à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) entre os requisitos não funcionais, de forma que gerou interpretações conflitantes, especialmente por já existir cláusula específica tratando dessa temática (Cláusula Décima Terceira do Anexo III – minuta do contrato). Para assegurar uma interpretação clara conforme o artigo 33 da Lei nº 13.303/2026, evitar questionamentos futuros, conferir a necessária segurança jurídica ao processo, tornou-se imprescindível realocar corretamente o requisito exclusivamente na referida cláusula contratual. Ademais, foi identificada a necessidade de ajustes pontuais em certas palavras na redação de alguns requisitos, de modo a torná-los mais claros para o mercado, sem alterar a essência das obrigações técnicas estabelecidas”. Sob a ótica do relator, a exclusão da referência ao sistema operacional CentOS não representara alteração relevante, pois a redação original do primeiro edital previra que a plataforma ofertada na solução do licitante deve permitir a instalação diretamente em sistema operacional Red Hat Linux e CentOS (nas versões suportadas pelos fabricantes), virtualizado ou não, em ambiente on-premise no SERPRO (grifos do relator). Ele ressaltou que, “como o CentOS já havia sido oficialmente descontinuado (incluído no edital por mero equívoco), inexistia versão suportada pelo seu fabricante. Em função dessa ‘perda parcial de objeto’, o requisito poderia ser satisfeito mediante a comprovação de que a plataforma permitia a instalação diretamente no sistema operacional Red Hat Linux”, exatamente o que fora feito na prova de conceito da vencedora. E arrematou: “Prova disso é que, apesar de não ter demonstrado a utilização da plataforma no primeiro sistema operacional, o fez no segundo, tendo o Serpro considerado a condição atendida, mesmo após a reanálise efetuada na fase recursal, posicionamento ratificado em sua resposta à oitiva prévia” (grifos do relator). Dito isso, salientou que, nesse contexto, permanecia para ele a seguinte dúvida: caso a empresa “tivesse atendido ao requisito da web centralizada (único considerado descumprido), o Serpro a teria declarado vencedora ou revogado o certame para ajustes redacionais no edital?”. Acrescentou também não haver nos autos nenhum registro de impugnação ou de pedido de esclarecimento relacionado ao CentOS entre a data de publicação do edital e a de apresentação das propostas pelos licitantes, sequer havia evidências de potenciais interessados que teriam deixado de participar do primeiro pregão em razão da menção a esse sistema operacional, a reforçar o seu entendimento de que o ajuste de redação não implicara modificação substancial do certame. Quanto à exigência relacionada à LGPD, frisou que a previsão de sua verificação na prova de conceito fora excluída do segundo edital apenas pelo fato de a estatal considerar que “o conteúdo relacionado à privacidade de dados pessoais já está contemplado em um documento mais abrangente (minuta do contrato, anexo III do edital) e não precisava figurar como requisito não funcional no Anexo I” (grifos do relator), o que significaria dizer, em termos práticos, que o vencedor da nova licitação continuaria a ter que atender às mesmas exigências durante a execução contratual. Nesse cenário, concluiu que a justificativa que embasou a revogação fora genérica e não comprovava, “de forma clara e fundamentada, que os ajustes meramente redacionais seriam capazes de ampliar significativamente a competitividade do certame, atraindo outros potenciais interessados que teriam sido impedidos de participar da licitação anterior em razão das exigências originais” (grifos do relator). Na sequência, pontuou que a jurisprudência do TCU, a exemplo do Acórdão 364/2022-Plenário, acena no sentido de que a publicação de revogação de licitação promovida por empresa estatal, sem explicitação do fato superveniente que teria tornado o procedimento inconveniente ou inoportuno, representa ofensa ao art. 31 da Lei 13.303/2016 e aos princípios da transparência e da ampla defesa. Nesse mesmo sentido, julgou oportuno transcrever o seguinte trecho do voto condutor do Acórdão 3066/2020-Plenário: “22. No que tange à informação prestada pela Fiocruz de que pretende revogar o certame ora em apreciação, permito-me observar que a revogação de processo licitatório é condicionada à ocorrência de fato superveniente, devidamente comprovado, que justifique tal medida. 23. O art. 49 da Lei 8.666/1993, também aplicável aos certames fundamentados no RDC, dispõe que ‘a autoridade competente para aprovação do procedimento somente poderá revogar a licitação por razões de interesse público decorrente de fato superveniente devidamente comprovado...’. Em primeira análise, o mero aprimoramento do edital para que se obtenha um suposto aumento da competitividade não parece ser uma motivação satisfatória, já que o processo licitatório em análise resultou na participação de cinco licitantes e foi aparentemente competitivo. 24. Assim, além das propostas consignadas pela unidade técnica, cabe alertar a Fundação Oswaldo Cruz de que a revogação de certame licitatório, nos termos do art. 49 da Lei 8.666/1993 (aplicável ao Regime Diferenciado de Contratações Públicas), só pode ocorrer diante de fatos supervenientes que demonstrem que a contratação pretendida tenha se tornada inconveniente e inoportuna ao interesse público” (grifos do relator). Trouxe ainda a informação de que, por meio do aludido acórdão, o TCU determinara a anulação da inabilitação indevida de licitante, e que, no caso sob exame, também teria havido a participação de cinco interessadas em ambiente competitivo de lances, a enfraquecer assim o argumento do Serpro, desacompanhado de evidências, de que a revogação do primeiro certame servira para ampliar a competitividade. Ademais, reproduziu em seu voto dois outros excertos de jurisprudência que possuiriam correlação com a situação analisada (grifos do relator): a) “a teoria dos motivos determinantes conduz à conclusão de que a validade do ato administrativo está vinculada à veracidade e à suficiência dos motivos que o fundamentam, de tal modo que, se inexistentes ou falsos, implicam a sua nulidade” (enunciado extraído do Acórdão 1147/2010-Plenário); b) “o TCU pode determinar medidas corretivas a ato praticado na esfera de discricionariedade das agências reguladoras, desde que viciado em seus requisitos, a exemplo da inexistência do motivo determinante e declarado; em tais hipóteses, se a irregularidade for grave, pode até mesmo determinar a anulação do ato” (enunciado extraído do Acórdão 435/2020-Plenário). Após enfatizar que a motivação da revogação fora genérica e incapaz de demonstrar sua real necessidade, mormente quando se constatava que o pregão posterior mantivera as mesmas características do objeto e, em essência, os mesmos requisitos dos licitantes previstos na primeira licitação, o relator propôs, e o colegiado decidiu, fixar prazo ao Serpro para que “anule o ato de revogação do Pregão Eletrônico 90840/2024 e todo o Pregão Eletrônico 90057/2025, a fim de permitir a continuidade do primeiro certame, por meio do chamamento da segunda colocada, em observância ao art. 31 da Lei 13.303/2016, aos princípios da competitividade e da isonomia, à teoria dos motivos determinantes e à reiterada jurisprudência desta Corte de Contas, consubstanciada nos Acórdãos 1.147/2010, 435/2020, 3.066/2020 e 364/2022, todos do Plenário”.

Acórdão 2251/2025 Primeira Câmara, Representação, Relator Ministro Jhonatan de Jesus.

quarta-feira, 23 de abril de 2025

COMENTÁRIO 7 (Artigo 7º da Lei 14.133/21)

COMENTÁRIO 7 (Artigo 7º da Lei 14.133/21)

Lei Comentada

LEI Nº 14.133, DE 1º DE ABRIL DE 2021

Lei de Licitações e Contratos Administrativos

 

CAPÍTULO IV

DOS AGENTES PÚBLICOS

Art. 7º Caberá à autoridade máxima do órgão ou da entidade, ou a quem as normas de organização administrativa indicarem, promover gestão por competências e designar agentes públicos para o desempenho das funções essenciais à execução desta Lei que preencham os seguintes requisitos:

Comentários:

A indicação a que se refere o caput será feita através de portaria assinada pela autoridade máxima do órgão. As pessoas indicadas, não necessariamente precisam atuar na área de direito, mas precisam ter o perfil adequado, ter atribuições relacionadas a licitações e contratos, ou possuam formação compatível, ou qualificação atestada por certificação profissional emitida por escola de governo criada e mantida pelo poder público. Necessariamente essas pessoas precisam participar de curso de capacitação conforme prescreve o inciso X do §1º do artigo 18 da Nova Lei, que exige capacitação para servidores ou empregados públicos que atuarem como gestores ou fiscais de contrato. Também o inciso I do §3º do artigo 169 da Nova Lei trata da capacitação dos agentes responsáveis que integram as linhas de defesa, na gestão de risco, a que são submetidas as contratações públicas. Ainda nesse sentido, o Artigo 173 atribui aos tribunais de contas, por meio de suas escolas de contas, a promoção de eventos de capacitação de servidores e empregados públicos designados para as funções essenciais à execução da Nova Lei.

Pelo artigo 173, fica claro que aquele servidor ou empregado público que for designado para o desempenho das funções essenciais à execução da Nova Lei terá que se capacitar. E o presente artigo dá essa missão de capacitação aos tribunais de contas através das suas escolas.

Sigamos com os comentários a respeito do Artigo 7º:

I - sejam, preferencialmente, servidor efetivo ou empregado público dos quadros permanentes da Administração Pública;

Aqui fazemos um alerta sobre a palavra “preferencialmente”. Se não for servidor efetivo ou empregado público, que outra pessoa poderia ser? Aqui estaria aberta a porta para terceirização da função de pregoeiro, agente de contratação, membro da Comissão de Licitação ou Comissão de contratação?

Para responder devemos estar atentos ao caput deste artigo 7º quando diz que a autoridade deve designar “agente público”. E agente público está definido pela mesma Lei no inciso V do artigo 6º como sendo,

“indivíduo que, em virtude de eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, exerce mandato, cargo, emprego ou função em pessoa jurídica integrante da Administração Pública”

Neste caso, está descartada a possibilidade de terceirização, mas não se descarta a possibilidade de servidores temporários exercerem essas funções.

E como ficam as prefeituras dos municípios?

 

Art. 176. Os Municípios com até 20.000 (vinte mil) habitantes terão o prazo de 6 (seis) anos, contado da data de publicação desta Lei, para cumprimento:

I - dos requisitos estabelecidos no art. 7º e no caput do art. 8º desta Lei;

 

Os municípios com até 20.000 habitantes terão seis anos para se adequarem, para contratar e treinar seus AGENTES PÚBLICOS para serem agentes de contratação, pregoeiros, membros de comissão de contratação. Nesse mesmo período de seis anos, esses municípios não estão obrigados a fazer licitação eletrônica nem a divulgarem em sítios oficiais.

II - tenham atribuições relacionadas a licitações e contratos ou possuam formação compatível ou qualificação atestada por certificação profissional emitida por escola de governo criada e mantida pelo poder público; e

Aqui temos os atores que poderão desempenhar as funções essenciais à execução da Nova Lei de licitações.

III - não sejam cônjuge ou companheiro de licitantes ou contratados habituais da Administração nem tenham com eles vínculo de parentesco, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, ou de natureza técnica, comercial, econômica, financeira, trabalhista e civil.

Esse inciso afasta o nepotismo.

§ 1º A autoridade referida no caput deste artigo deverá observar o princípio da segregação de funções, vedada a designação do mesmo agente público para atuação simultânea em funções mais suscetíveis a riscos, de modo a reduzir a possibilidade de ocultação de erros e de ocorrência de fraudes na respectiva contratação.

A Lei 14.133/21 privilegia os acórdãos do TCU. Vejamos o Acórdão nº 686/2011-Plenário, de 23.03.2011, TC-001.594/2007-6, da relatoria do Ministro-Substituto, André Luís de Carvalho.

Foram trazidas informações ao TCU a respeito de possíveis irregularidades em processos licitatórios da Secretaria Municipal de Saúde do Município de Cachoeiro de Itapemirim. Foi verificado, e isso teve reprovação do relator, que um dos membros da Comissão de Licitação também era Chefe do Setor de Compras do órgão. Tal situação seria inadequada, pois o referido membro, ao exercer a dupla função de elaborar os editais licitatórios e de participar do julgamento das propostas, agiria em desconformidade com o princípio de segregação de funções. Assim, propôs o relator a expedição determinações corretivas ao referido município para evitar falhas semelhantes nas futuras licitações que envolvam recursos públicos federais, em especial a inobservância da segregação de funções. Acórdão nº 686/2011-Plenário, TC-001.594/2007-6, rel. Min-Subst. André Luís de Carvalho, 23.03.2011.

O Artigo 7º da Lei 14.133/21 prega o seguinte:

 

Quem regulamentou esse artigo 7º da Lei 14.133/21, foi o artigo 12 do Decretos 11.246/22. Ele diz assim:

Art. 12.  O princípio da segregação das funções veda a designação do mesmo agente público para atuação simultânea em funções mais suscetíveis a riscos, de modo a reduzir a possibilidade de ocultação de erros e de ocorrência de fraudes na contratação.

Parágrafo único.  A aplicação do princípio da segregação de funções de que trata o caput:

I -  será avaliada na situação fática processual; e

II - poderá ser ajustada, no caso concreto, em razão:

a) da consolidação das linhas de defesa; e

b) de características do caso concreto tais como o valor e a complexidade do objeto da contratação.

 

Deve ser analisado o CASO CONCRETO. E poderá ter AJUSTE, NO CASO CONCRETO.

Na aplicação da segregação é preciso ver a situação de cada ÓRGÃO PÚBLICO. Para isso, cada órgão pode emitir sua portaria disciplinando os casos.

 

§ 2º O disposto no caput e no § 1º deste artigo, inclusive os requisitos estabelecidos, também se aplica aos órgãos de assessoramento jurídico e de controle interno da Administração.

Comentários:

Houve um tempo, não muito distante, em que nas repartições públicas escolhiam um servidor e o nomeavam como “MEMBRO DA COMISSÃO DE LICITAÇÃO”. Não importava sua qualificação, seus conhecimentos, sua aptidão. O resultado era desastroso: processos licitatórios confusos, mal elaborados, cheios de vícios e decididos de forma desarrazoada onde imperava o FORMALISMO EXAGERADO em detrimento da obtenção da melhor proposta para atender o interesse público.

Atualmente, CAPACITAR é a regra, sem exceção. Através do Acórdão 1176/2016, o Plenário do Tribunal de Contas da União assim se pronunciou:

“A falta de capacitação do agente público para a realização de tarefa específica a ele atribuída não impede sua responsabilização por eventual prejuízo causado ao erário. Ciente de sua falta de capacidade para o exercício da tarefa, deve o agente reportar a situação aos seus superiores para se liberar da atividade, uma vez que, ao executá-la, assume os riscos inerentes aos resultados produzidos”. 

O Decreto-Lei nº 4.657, de 04 de setembro de 1942, Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, plenamente em vigor, em seu Artigo 22 preceitua que,

Art. 22.  Na interpretação de normas sobre gestão pública, serão considerados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu cargo, sem prejuízo dos direitos dos administrados.

§ 1º  Em decisão sobre regularidade de conduta ou validade de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, serão consideradas as circunstâncias práticas que houverem imposto, limitado ou condicionado a ação do agente.

§ 2º  Na aplicação de sanções, serão consideradas a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para a administração pública, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes do agente.

§ 3º  As sanções aplicadas ao agente serão levadas em conta na dosimetria das demais sanções de mesma natureza e relativas ao mesmo fato.

O artigo 28 do mesmo Decreto ordena que,

Art. 28.  O agente público responderá pessoalmente por suas decisões ou opiniões técnicas em caso de dolo ou erro grosseiro.

Vejamos algumas definições de ERRO:

O “ERRO MATERIAL” é conceituado como equívoco ou inexatidão relacionados a aspectos objetivos como um cálculo errado, troca de palavras, erros de digitação, grafia equivocada, troca de nome etc. Erro material compreende as inexatidões materiais como erros de cálculo, previstos no artigo 494, I do Novo CPC. São erros que podem ser reconhecidos e que não alteram o resultado de uma decisão.

O ERRO FORMAL é um erro na forma do documento ou erro de procedimento quando este é realizado incorretamente.

O erro formal acarreta a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, conforme o art. 283 do CPC:

Art. 283. O erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, devendo ser praticados os que forem necessários a fim de se observarem as prescrições legais.


Parágrafo único. Dar-se-á o aproveitamento dos atos praticados desde que não resulte prejuízo à defesa de qualquer parte.

Como exemplo de erro formal temos a produção de documento feita de maneira diferente do prescrito em lei.

Erro grosseiro.

Trazemos a definição de erro grosseiro prevista no Art. 2º da Medida Provisória 966 de 13 de maio de 2020:

art. 2º: “Para fins do disposto nesta Medida Provisória, considera-se erro grosseiro o erro manifesto, evidente e inescusável praticado com culpa grave, caracterizado por ação ou omissão com elevado grau de negligência, imprudência ou imperícia”.

 Acórdão 1264/2019 - TCU - Plenário

"Para fins do exercício do poder sancionatório do TCU, pode ser tipificado como erro grosseiro (art. 28 do Decreto-lei 4.657/1942 - Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro) o direcionamento de licitação para marca específica sem a devida justificativa técnica".

 Acórdão 9294/2020 - TCU - Primeira Câmara

"Para fins do exercício do poder sancionatório do TCU, pode ser tipificado como erro grosseiro (art. 28 do Decreto-lei 4.657/1942 - Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro) a aprovação, pelo parecerista jurídico (art. 38, parágrafo único, da Lei 8.666/93), de minuta de edital contendo vícios que não envolvam controvérsias jurídicas ou complexidades técnicas".

Caros pregoeiros e licitantes, a melhor fonte de conhecimento sobre licitações se chama TCU - Tribunal de Contas da União. Leiam atentamente os acórdãos do TCU, pois eles trazem ensinamentos e recomendações importantíssimos, e tenham a certeza de estarem realizando um grande serviço à sociedade.

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quarta-feira, 9 de abril de 2025

Certidão do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) que indique o não cumprimento do percentual exigido pelo art. 93 da Lei 8.213/1991 não é suficiente, por si só, para a inabilitação de licitante

 

Certidão do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) que indique o não cumprimento do percentual exigido pelo art. 93 da Lei 8.213/1991 não é suficiente, por si só, para a inabilitação de licitante que declarou cumprir as exigências de reserva de cargos para pessoas com deficiência e para reabilitados da Previdência Social (art. 63, inciso IV, da Lei 14.133/2021). É necessário oferecer ao licitante a oportunidade de comprovar a veracidade de sua declaração por meio de outras evidências, a exemplo de extratos dos dados registrados no e-Social.

Representação formulada ao TCU por sociedade empresária apontou possível irregularidade no Pregão 90014/2024, conduzido pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e tendo como objeto a prestação de serviço de prevenção contra incêndio e pânico. Em síntese, a empresa representante argumentou que a empresa declarada vencedora do certame não teria comprovado o atendimento ao requisito previsto no art. 63, inciso IV, da Lei 14.133/2021, que trata das exigências de reserva de cargos para pessoas com deficiência e para reabilitados da Previdência Social. Ao analisar os esclarecimentos e os documentos oferecidos pela Anatel e pela empresa vencedora, instadas a se manifestarem acerca da ausência de elementos suficientes para indicar o atendimento, por parte da licitante vencedora, da reserva de vagas estabelecida no art. 93 da Lei 8.213/1991, o relator destacou, preliminarmente, que o art. 63 da Lei 14.133/2021 é uma das muitas inovações trazidas “pelo diploma legal frente à Lei 8.666/1993”, ao exigir a apresentação, na fase de habilitação, de declaração quanto ao cumprimento das exigências de reserva de cargos para pessoas com deficiência e para reabilitados da Previdência Social, comando este que “se vincula operacionalmente” ao disposto no art. 93 da Lei 8.213/1991. Na sequência, o relator transcreveu os referidos dispositivos legais: “Lei 14.133/2021: Art. 63. Na fase de habilitação das licitações serão observadas as seguintes disposições: (…) IV – será exigida do licitante declaração de que cumpre as exigências de reserva de cargos para pessoa com deficiência e para reabilitado da Previdência Social, previstas em lei e em outras normas específicas. Lei 8.213/1991: Art. 93. A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas, na seguinte proporção: I – até 200 empregados...2%; II – de 201 a 500…3%; III – de 501 a 1.000…4%; IV – de 1.001 em diante...5%”. Conforme o relator, a inovação introduzida no processo licitatório tem o objetivo claro de se tornar mecanismo de política pública destinado a “reduzir o quadro de desigualdade e vulnerabilidade de categorias específicas”. Nesse contexto, ele invocou também o art. 92, inciso XVII, da Lei 14.133/2021, o qual exige a inclusão, como cláusula do contrato a ser firmado com a licitante vencedora, do cumprimento das aludidas reservas de vagas durante a vigência contratual. Esclareceu, ainda, que a exigência legal, na fase de habilitação, é apenas a declaração formal da licitante de que cumpre as exigências de reserva de cargos para pessoas com deficiência e para reabilitados da Previdência Social, “presumindo-se sua veracidade com base nos princípios da boa-fé e da lealdade processual”, o que, na sua visão, “não impede, obviamente, que essa declaração seja questionada de ofício ou a partir de elementos trazidos ao processo licitatório, no âmbito de recurso administrativo, no qual se argumente no sentido da inveracidade de declaração”. Para ele, foram exatamente essas as circunstâncias que envolveram o caso discutido na representação, em que a empresa representante interpusera recurso no âmbito do processo licitatório, apresentara certidões do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) que atestavam o não cumprimento das cotas por parte da empresa vencedora e, assim, alegara que esta teria prestado declaração falsa e que, portanto, deveria ter sido inabilitada do certame. Nesse ponto, o relator julgou oportuno transcrever o seguinte excerto do Parecer 414/2024/PFE-ANATEL/PGF/AGU: “a) Para fins de habilitação é válida a autodeclaração realizada pela licitante no sistema. Porém se houver qualquer recurso de outra licitante questionando a autodeclaração, como é o caso em apreço, a Administração deverá avaliar a suficiência ou não da documentação comprobatória apresentada pela empresa para o cumprimento dos requisitos previstos no item 28 do referido Parecer; b) A Lei nº 14.133/2021, em seu art. 63, IV, especifica claramente a exigência de apresentação de uma ‘declaração’ pelo próprio licitante sobre o cumprimento das reservas de cargos para pessoas com deficiência e para reabilitados da Previdência Social, conforme previsto na Lei nº 8.213/1991. Esta exigência não deve ser confundida com a necessidade de apresentação de uma certidão emitida pelo Ministério do Trabalho e Emprego que comprove o efetivo cumprimento do percentual estabelecido pelo art. 93 da Lei nº 8.213/1991. Portanto, a certidão emitida pelo MTE não é suficiente para inabilitar a licitante” (grifos do original). Ao concordar com esse entendimento, arrematou: “De fato, a certidão emitida pelo MTE é uma das formas de se evidenciar o cumprimento da exigência legal da reserva de cotas aqui tratada. Contudo, não é a única. Na mesma linha, a apresentação de certidão que ateste a inconformidade de licitante quanto ao requisito não é motivo suficiente para sua inabilitação”. Ele salientou que a própria certidão do MTE registra a possibilidade de o seu conteúdo não representar a realidade no exato momento de sua emissão, haja vista não ser uma certidão emitida com dados on line, de sorte que eventuais registros de admissão ou de desligamento “podem não estar ali representados em razão da defasagem na atualização de dados registrados no e-Social”. Enfatizou que a certidão do MTE se propõe a atestar uma situação com inerente caráter dinâmico, pelas constantes alterações de quantitativos decorrentes de admissões e de desligamentos e, por consequência, de enquadramento nas faixas de percentuais exigidos pela lei. Tomando como exemplo o próprio caso concreto, asseverou que teriam sido juntadas aos autos diversas certidões emitidas pelo MTE, em um intervalo de menos de quatro meses, e que os resultados “alternam ao concluir que a interessada estava empregando percentual INFERIOR, IGUAL ou SUPERIOR ao percentual mínimo exigido pela Lei”. Esse fato, sob a sua ótica, comprovaria tanto o caráter dinâmico da situação que a certidão do MTE pretende atestar, quanto a necessidade de se buscarem mais evidências para a tomada de decisão acerca da possível inabilitação de licitante baseada nesse critério. Destarte, a certidão do MTE que atesta o não cumprimento do percentual estabelecido pelo art. 93 da Lei 8.213/1991 “não é suficiente, por si só, para inabilitar um licitante, sendo necessário que se abra espaço para que a empresa que prestou a declaração de cumprimento do item em tela reúna evidências da veracidade de sua declaração”. Com base nas manifestações da Anatel e da empresa vencedora do certame, o relator assinalou que restara comprovado, primeiramente, o esforço da vencedora para o preenchimento de vagas reservadas a pessoas reabilitadas ou portadoras de deficiência conforme percentuais estabelecidos na legislação, a exemplo da publicação de anúncios em redes sociais e em jornais, bem como da “manutenção de contrato com o Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE)”. Após mencionar decisões do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e de instâncias inferiores da justiça trabalhista, que apontam para a isenção de responsabilidade das empresas pelo insucesso em alcançar a contratação mínima exigida pelo artigo 93 da Lei 8.213/1991, desde que demonstrado o esforço para cumprir essa meta, o relator deixou assente que, no caso em apreciação, ficara comprovado, mediante dados do e-Social emitidos em data anterior à primeira sessão pública do Pregão 90014/2024, que a empresa vencedora possuía 749 empregados, dos quais trinta detinham a condição de pessoa com deficiência ou de beneficiário reabilitado da Previdência Social, “cumprindo exatamente o percentual de 4% exigido pelo inciso III do art. 93 da Lei 8.213/1991”. Adicionalmente, ressaltou que, em resposta a diligência, a Anatel frisara que a empresa vencedora teria informado que, “além dos 30 empregados na condição de pessoa com deficiência anteriormente registrados, estavam em processo de contratação mais três, o que totalizaria 33 empregados nessa condição”, e que tal assertiva fora corroborada por certidão emitida pelo MTE, em 20/8/2024, ou seja, ainda durante o processo licitatório, atestando que a empresa vencedora empregava funcionários em número superior ao percentual mínimo exigido pela legislação. Assim sendo, mesmo com a apresentação de certidão do MTE que atestava o não cumprimento, em dado momento temporal, do percentual estabelecido pelo art. 93 da Lei 8.213/1991, “restou comprovada, por meio de outras evidências, a veracidade da declaração por esta apresentada”. Dito isso, o relator então concluiu que estavam presentes nos autos evidências suficientes para afastar o indício de irregularidade apontado na representação, no que foi acompanhado pelos demais ministros presentes à sessão.

Acórdão 523/2025 Plenário, Representação, Relator Ministro Jorge Oliveira.