(...) Uma
das empresas embargantes aduziu que “sua
proposta decorreu de ação de agentes públicos que participaram da elaboração do
ato convocatório do Pregão Presencial 10/2006 e que a empresa observou os
limites impostos pelo orçamento estimativo do edital, razão pela qual não
haveria qualquer razão para eventual presunção da prática de sobrepreço. ”
A empresa entendeu, assim, que “inexistiria
qualquer conduta dolosa ou culposa por ela praticada, sendo irrazoável sua
condenação a devolver os valores ditos como superfaturados. ” O relator do
processo esclareceu que o “fato de a
empresa não ter participado da elaboração do edital e do orçamento base da
licitação ocorre em todos os casos em apuração no Tribunal, afinal tais atividades
são atribuição exclusiva da Administração Pública. Nas hipóteses em que essa
situação não é verificada, há ocorrência de ilícito de extrema gravidade,
difícil de ser detectado sem meios próprios de investigação policial.
Entretanto, isso não é relevante para o deslinde da matéria, uma vez que, como
será demonstrado a seguir, cabia à licitante, sponte própria, cumprir a regra
deduzida do art. 43, inciso IV, da Lei 8.666/1993, qual seja, ofertar preços
compatíveis com os praticados pelo mercado, independentemente de eventual erro
cometido pela Administração quando da elaboração do edital e do orçamento”.
Na mesma linha, o relator continuou sua argumentação: “Ainda que a Administração, por meio de seus agentes, tenha incorrido em
erro, ao definir, no Pregão Presencial 10/2006, um orçamento-base
superestimado, a conduta da empresa contratada de propor preços acima dos
valores de mercado constituiu ato ilícito, na medida em que infringiu o dever
jurídico preceituado no art. 43, inciso IV, da Lei 8.666/1993. Tal
comportamento foi concausa relevante do prejuízo causado ao erário, pois sem
ele não teria havido o superfaturamento. Ainda que os preços ofertados pelas distribuidoras de medicamentos
estivessem em consonância com os limites fixados no orçamento-base do certame,
é de se ressaltar que, se por um lado orçamento estimativo da licitação serve
de parâmetro para apreciação das propostas da licitação, por outro, torna-se
necessário, para que haja atendimento ao critério legal previsto no art. 43,
inciso IV, da Lei 8.666/1993, ou seja, que os preços praticados na licitação e
no referido orçamento reflitam os paradigmas de mercado, caso contrário, caberá
a responsabilização solidária da empresa contratada – beneficiária dos valores
superestimados - com os agentes públicos que praticaram os atos irregulares.
Embora o valor orçado pela administração se situe além dos preços praticados no
mercado, o particular poderia ofertar proposta aderente aos valores de mercado.
” O relator ressaltou ainda que “que os
comandos da Lei 8.666/1993 se direcionam tanto ao agente público quanto ao
privado, que renuncia em alguma medida ao ambiente de liberdade econômica que
prevalece nos contratos privados. ” Para fundamentar sua posição, o relator
citou, inclusive, dois precedentes do STF: “recentemente
o Supremo Tribunal Federal manteve condenação de ressarcimento ao erário
imposta pelo TCU à empresa contratada pela Administração Pública. Tal decisão
foi adotada no âmbito do Mandado de Segurança 29.599, impetrado por uma
empreiteira com o objetivo de anular ato do Tribunal de Contas da União, o qual
condenou a empresa a devolver valores ao erário em razão de superfaturamento de
preços. Naquele julgado, a situação era análoga ao caso em apreciação, pois o
particular alegava exatamente ter participado de regular processo licitatório,
tendo cumprido todas as especificações do edital, inclusive com relação ao
preço dos serviços a serem executados. Assim, a contratada entendia não haver
nenhuma ilegalidade em sua conduta e que o TCU não possuía competência
constitucional para promover alteração retroativa e unilateral dos preços,
modificando cláusulas econômico-financeiras do contrato. Porém, ao contrário do
que afirmara a construtora, entendeu o STF que ela não foi condenada a
restituir os valores recebidos em razão da execução do contrato, mas a
restituição aos cofres públicos da diferença dos valores em que se identificou
o sobrepreço na forma calculada pelo TCU. É relevante citar também decisão
monocrática do Ministro Luiz Fux no âmbito do MS 30.924, em que o consórcio
contratado para executar obra de usina hidroelétrica buscava a anulação do item
9.4 do Acórdão 2.234/2011 do Plenário
do TCU, o qual teria determinado a retenção de parte do preço contratado entre
o consórcio impetrante e a empresa Furnas Centrais Elétricas S.A. Entre outros
pontos, a inicial do writ argumentava que o TCU não poderia interferir no
conteúdo econômico-financeiro do contrato para impor unilateral e
retroativamente os preços teóricos calculados pelos seus técnicos, inclusive
com relação a serviços já executados e pagos. O pedido formulado foi denegado
pelo relator, que entendeu não haver dúvidas de que o Tribunal de Contas pode
exercer controle de economicidade de atos administrativos, sem que se possa
vislumbrar nisso qualquer inconstitucionalidade. Ademais, foi reconhecido que o
Tribunal de Contas pode determinar a retenção de valores contratados em sede
cautelar, conforme o inciso IX do art. 71 da Lei Maior. ” Ao final, o relator propôs o conhecimento dos
embargos e o seu acolhimento parcial, pelo colegiado, para incorporar o § 2º do
art. 16 da Lei 8.443/1992 como fundamento legal para a condenação solidária das
empresas ao ressarcimento do débito, proposta acatada pelo Plenário.
Acórdão
1304/2017 Plenário, Embargos de Declaração, Relator Ministro Benjamin
Zymler.