Dosimetria na aplicação da penalidade de impedimento de
licitar e contratar prevista no art. 7º da Lei nº 10.520.
Com o objetivo de definir parâmetros à apuração de responsabilidade em
certames na modalidade pregão, a Presidência da República publicou a Instrução
Normativa nº 01/2017 que estabelece critérios sobre conduta e dosimetria na
aplicação da penalidade de impedimento de licitar e contratar prevista no art.
7º da Lei nº 10.520.
O referido documento apresenta de maneira mais detalhada as condutas
elencadas no art. 7º da lei nº 10.520/02 e que merecem as reprimendas
administrativas de impedimento do direito de licitar e contratar com a União e
descredenciamento do SICAF.
A Instrução Normativa nº 01/17 tem aplicação no âmbito da Presidência da
República, relaciona as condutas com suas respectivas previsões do período em
que as sanções deverão ser aplicadas e estabelece circunstâncias que podem
atenuar ou agravar a “pena-base” em 50%, até o limite de 60 (sessenta) meses.
Nota: Em março de 2017, foi publicada a Norma Operacional nº 02/Dirad/MP que estabeleceu procedimentos
para a definição da dosimetria na aplicação da penalidade de impedimento de
licitar e contratar no âmbito do Ministério do Planejamento,
Desenvolvimento e Gestão.
Instrução Normativa nº 01/2017 da Presidência da
República:
O SECRETÁRIO DE ADMINISTRAÇÃO DA SECRETARIA-GERAL DA PRESIDÊNCIA DA
REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o inciso VII, do art. 7º, do
Anexo V do Decreto nº 9.038, de 26 de abril de 2017, e Considerando o teor das
determinações 9.5.1 e 9.5.2 do Acórdão nº 754/2015-TCU-Plenário, expedido pelo
Tribunal de Contas da União, as quais foram objeto de divulgação aos órgãos do
Sistema de Serviços Gerais – SISG no Portal de Compras do Governo Federal;
Considerando a necessidade de instrução processual administrativa no âmbito da
Presidência da República com adequação entre meios e fins, com vedação a
imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas
estritamente necessárias ao atendimento do interesse público, resolve:
Art. 1º Estabelecer
procedimentos para a definição da dosimetria na aplicação da penalidade de
impedimento de licitar e contratar prevista no art. 7º da Lei nº 10.520, de 17
de julho de 2002, no âmbito da Presidência da República.
Art. 2º Nas
licitações na modalidade pregão realizadas no âmbito da Presidência da
República é obrigatória a instauração de procedimento administrativo para a
aplicação das respectivas sanções, quando da ocorrência das condutas a seguir
relacionadas:
I – não assinar o contrato/ata de registro de preços ou não
aceitar/retirar o instrumento equivalente, quando convocado dentro do prazo de
validade de sua proposta:
Pena – impedimento do direito de licitar e contratar com a União e
descredenciamento do Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores – SICAF
pelo período de 4 (quatro) meses;
II – deixar de entregar documentação exigida para o certame:
Pena – impedimento do direito de licitar e contratar com a União e
descredenciamento do SICAF pelo período de 2 (dois) meses;
III – fizer declaração falsa ou apresentar documentação falsa:
Pena – impedimento do direito de licitar e contratar com a União e
descredenciamento do SICAF pelo período de 24 (vinte e quatro) meses;
IV – ensejar o retardamento da execução do objeto:
Pena – impedimento do direito de licitar e contratar com a União e
descredenciamento do SICAF pelo período de 4 (quatro) meses;
V – não manter a proposta:
Pena – impedimento do direito de licitar e contratar com a União e
descredenciamento do SICAF pelo período de 4 (quatro) meses;
VI – falhar na execução do contrato:
Pena – impedimento do direito de licitar e contratar com a União e
descredenciamento do SICAF pelo período de 12 (doze) meses;
VII – fraudar na execução do contrato:
Pena – impedimento do direito de licitar e contratar com a União e
descredenciamento do SICAF pelo período de 30 (trinta) meses;
VIII – comportar-se de modo inidôneo:
Pena – impedimento do direito de licitar e contratar com a União e
descredenciamento do SICAF pelo período de 24 (vinte e quatro) meses; e
IX – cometer fraude fiscal:
Pena – impedimento do direito de licitar e contratar com a União e
descredenciamento do SICAF pelo período de 40 (quarenta) meses;
Parágrafo único. Para os fins desta Instrução Normativa, considera-se:
I – retardar a execução do objeto qualquer ação ou omissão do licitante
que prejudique o bom andamento da licitação, inclusive deixar de entregar a
amostra no prazo assinalado no edital, que evidencie tentativa de indução a
erro no julgamento, ou que atrase a assinatura do contrato ou da ata de
registro de preços;
II – não manter a proposta a ausência de seu envio, bem como a recusa do
envio de seu detalhamento, quando exigível, ou ainda o pedido, pelo licitante,
da desclassificação de sua proposta, quando encerrada a etapa competitiva,
desde que não esteja fundamentada na demonstração de vício ou falha na sua
elaboração, que evidencie a impossibilidade de seu cumprimento;
III – falhar na execução contratual o inadimplemento grave ou
inescusável de obrigação assumida pelo contratado;
IV – fraudar na execução contratual a prática de qualquer ato destinado
à obtenção de vantagem ilícita, induzindo ou mantendo em erro a Administração
Pública; e
V – comportar-se de modo inidôneo a prática de atos direcionados a
prejudicar o bom andamento do certame ou do contrato, tais como a fraude ou
frustração do caráter competitivo do procedimento licitatório, ação em conluio
ou em desconformidade com a lei, indução deliberada a erro no julgamento,
prestação falsa de informações, apresentação de documentação com informações
inverídicas, ou que contenha emenda ou rasura, destinados a prejudicar a
veracidade de seu teor original.
Art. 3º As sanções
previstas nos incisos I a IX do art. 2º poderão ser majoradas em 50% (cinquenta
por cento), para cada agravante, até o limite de 60 (sessenta) meses, em
decorrência do seguinte:.
I – quando restar comprovado que o licitante ou contratado tenha
registro no Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores – SICAF de
penalidade aplicada no âmbito da Presidência da República, em decorrência da
prática de qualquer das condutas tipificadas na presente norma, nos 12 (doze)
meses que antecederam o fato em decorrência do qual será aplicada a penalidade;
II – quando restar comprovado que o licitante tenha sido desclassificado
ou inabilitado por não atender às condições do edital, quando for notória a sua
impossibilidade de atendimento ao estabelecido;
III – quando o licitante, deliberadamente, não responder às diligências
destinadas a esclarecer ou a complementar a instrução do processo licitatório;
ou
IV – quando restar comprovado que o licitante tenha prestado declaração
falsa de que é beneficiário do tratamento diferenciado concedido em legislação
específica.
Art. 4º As penas
previstas nos incisos I, II, IV e V do art. 2º poderão ser reduzidas em 50%
(cinquenta por cento), uma única vez, após a incidência do previsto no art. 3º,
quando não tenha havido nenhum dano à Administração, em decorrência de qualquer
das seguintes atenuantes:
I – a conduta praticada tenha sido, desde que devidamente comprovada,
decorrente de falha escusável do licitante ou contratado;
II – a conduta praticada seja decorrente da apresentação de documentação
que contenha vícios ou omissões para os quais não tenha contribuído, ou que não
sejam de fácil identificação, desde que devidamente comprovado; ou
III – a conduta praticada seja decorrente da apresentação de
documentação que não atendeu às exigências do edital, desde que reste
evidenciado equívoco em seu encaminhamento e a ausência de dolo.
Art. 5º A
penalidade a que se refere o inciso II do art. 2º será afastada quando a
entrega da documentação ocorrer fora dos prazos estabelecidos, desde que não
tenha acarretado prejuízos à Administração, observando-se ainda,
cumulativamente, que:
I – a documentação entregue esteja correta e adequada ao que fora
solicitado;
II – o eventual atraso no cumprimento dos prazos não seja superior a sua
quarta parte;
III – não tenha ocorrido nenhuma solicitação de prorrogação dos prazos;
IV – não tenha ocorrido nenhuma hipótese de agravantes prevista no art.
3º; e
V – o licitante faltoso não tenha sofrido registro de penalidade no
SICAF em decorrência da prática de quaisquer condutas tipificadas na presente
norma em procedimentos licitatórios ou em contratações ocorridas nos 12 (doze)
meses que antecederam o fato em razão do qual será aplicada a penalidade.
Art. 6º Quando a
ação ou omissão do licitante ou contratante ensejar o enquadramento de concurso
de condutas, aplicar-se-á a pena mais grave. Art. 7º A aplicação das
penas previstas nesta Instrução Normativa não exclui a possibilidade de
aplicação de outras sanções previstas no edital, no contrato ou na legislação
vigente, sem prejuízo das responsabilidades civil e criminal, inclusive por
perdas e danos causados à Administração. Art. 8º Na apuração dos fatos
de que trata a presente Instrução, a Administração atuará com base no princípio
da boa-fé objetiva, assegurando ao licitante ou ao contratante a ampla defesa e
o contraditório, o direito de juntar todo e qualquer meio de prova necessário à
sua defesa, podendo, inclusive, requerer diligências.
Parágrafo único. A Administração Pública formará sua convicção com base
na livre apreciação dos fatos e condutas praticadas, devendo, quando
necessário, promover diligências para a apuração da veracidade das informações
e provas apresentadas pela defesa.
Art. 9º. Esta
Instrução Normativa entra em vigor na data de sua publicação.
ANTONIO CARLOS PAIVA FUTURO
Confira também artigo sobre a aplicabilidade das sanções da Lei nº 8.666/93 à modalidade pregão.
A abrangência e a aplicabilidade das diversas sanções relacionadas a licitações e contratos administrativos são temas que, há muito, causam dúvidas no campo doutrinário e jurisprudencial.
É bem verdade que as discussões sobre seu alcance têm obtido respostas uniformes da jurisprudência do TCU nos últimos tempos, ao passo que ainda não havia clara manifestação deste Tribunal acerca da possibilidade de aplicação das sanções previstas na Lei nº 8.666/93 à modalidade pregão, uma vez que sua lei de regência – Lei nº 10.520/02 – também possui regime sancionatório próprio.
No entanto, o tema foi tratado no Acórdão 2530/2015 – Plenário/TCU, cujas nuances se pretende apresentar neste breve artigo..
ABRANGÊNCIA DAS SANÇÕES
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A tônica do referido julgado foi noticiada pelo Informativo de Licitações e Contratos nº 263-TCU nos seguintes termos:
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Quanto à abrangência da sanção, o impedimento de contratar e licitar com o ente federativo que promove o pregão e fiscaliza o contrato (art. 7º da Lei 10.520/02) é pena mais rígida do que a suspensão temporária de participação em licitação e o impedimento de contratar com um órgão da Administração (art. 87, inciso III, da Lei 8.666/93), e mais branda do que a declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com toda a Administração Pública (art. 87, inciso IV, da Lei 8.666/93).
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Assim, o Plenário do TCU indicou que as sanções incidentes nas infrações cometidas em licitações e contratos administrativos previstas no art. 7º da Lei nº 10.520/02 e nos incisos III e IV da nº Lei 8.666/93 possuem graus de aplicação distintos e podem ser ordenadas de acordo com sua rigidez. Para tanto, valeu-se o Tribunal de diversos julgados recentemente proferidos e dos textos legais que assim dispõem:
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Após revisar sua jurisprudência ampliativa que harmonizava com o entendimento do STJ, o Tribunal de Contas da União passou a considerar a suspensão temporária (Art. 87, III, LLC) a mais branda das sanções comparadas e a indicar que seus efeitos somente impossibilitam o apenado de participar de licitações junto ao órgão ou entidade que a aplicou (cf. Acórdãos 2242/2013-P e 842/2013-P).
Quanto à sanção de impedimento de licitar e contratar do art. 7º da Lei do Pregão, a jurisprudência do TCU é firme no sentido de que tal penalidade “produz efeitos não apenas no âmbito do órgão/entidade aplicador da penalidade, mas em toda a esfera do respectivo ente federativo (União ou estado ou município ou Distrito Federal) (cf. Acórdãos 2242/2013-P e 2081/2014-P).
Por sua vez, a declaração de inidoneidade (Art. 87, IV, LLC) tem abrangência sobre toda a Administração Pública, na forma do art. 6º, XI, da Lei nº 8666/93, compreendida como a “a administração direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, abrangendo inclusive as entidades com personalidade jurídica de direito privado sob controle do poder público e das fundações por ele instituídas ou mantidas”. No mesmo sentido decidiu o Superior Tribunal de Justiça no REsp 520.553/RJ, publicado em 10.02.2011:
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Infere-se da leitura dos dispositivos que o legislador conferiu maior abrangência à declaração de inidoneidade ao utilizar a expressão Administração Pública, definida no art. 6º da Lei 8.666/1993. Dessa maneira, conseqüência lógica da amplitude do termo utilizado é que o contratado é inidôneo perante qualquer órgão público do País.
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VEJAMOS O ENTENDIMENTO DO TCU da seguinte maneira:
APLICABILIDADE DAS SANÇÕES DA LEI 8.666/93 À MODALIDADE PREGÃO
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Desde a edição da Lei 10.520/2002, se questiona a possibilidade de aplicação das diferentes sanções dispostas na Lei de Licitações aos certames realizados na modalidade pregão.
Desde a edição da Lei 10.520/2002, se questiona a possibilidade de aplicação das diferentes sanções dispostas na Lei de Licitações aos certames realizados na modalidade pregão.
Em síntese, a existência do debate se dá em razão de a Lei do Pregão tipificar diversas infrações em um único dispositivo, enquanto a Lei nº 8.666/93 apresenta gradação que vai desde a simples advertência até a declaração de inidoneidade.
Considerando que, à sua maneira, a Lei nº 10.520/02 discorreu sobre sanções administrativas e que as normas do Estatuto das Licitações se aplicam à modalidade pregão de forma subsidiária, indaga-se: seria permitida a imposição de sanções típicas da Lei nº 8.666/93, como a suspensão temporária e a declaração de inidoneidade, no âmbito de um pregão?
A depender do critério de interpretação utilizado e dos princípios que se pretende homenagear, ao menos duas respostas são possíveis a esse questionamento:
Com a adoção de métodos tradicionais de resolução de conflitos aparentes de normas (antinomias), a primeira tese indica que a Lei do Pregão deve prevalecer em virtude da aplicação do critério da especialidade, sendo a lei geral (Lei nº 8.666/93) completamente afastada. Em outras palavras, não seria permitido suspender temporariamente ou declarar inidôneos os contratados a partir de certames realizados na modalidade pregão.
Ocorre que a adoção deste raciocínio poderia trazer problemas relacionados à dosimetria da pena e desrespeito aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, tendo em vista que estaria a Administração obrigada a aplicar a mesma sanção (impedimento de licitar e contratar) em situações de gravidade muito diferentes, p. ex., um singelo retardamento da execução do contrato e uma fraude fiscal penalmente tipificada como crime.
Outro ponto de vista dessa mesma tese seria reservar a sanção do art. 7º da Lei do Pregão apenas às condutas mais gravosas. No entanto, nesta hipótese, a impunidade das infrações mais leves surgiria como um risco.
Apesar disso, vale observar que o Tribunal de Contas da União já acenou para essa possibilidade no Acórdão 653/2008 do Plenário:
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“É certo, poderá haver situações que, à luz da Lei 8.666/93, mereceriam, por exemplo, somente uma advertência, enquanto pela lei do pregão a penalidade prevista seria o impedimento de licitar ou contratar com a Administração. (…) a referida penalidade por ser extremamente gravosa, deve ser aplicada somente nos casos em que se perceba ou há indícios de que o licitante faltoso tenha agido de má-fé”.
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Os adeptos de uma segunda corrente de pensamento, por outro lado, admitem a aplicação das sanções previstas no art. 87 da Lei de Licitações em conjunto com a disposta no art. 7º da Lei nº 10.520/02.
Os adeptos de uma segunda corrente de pensamento, por outro lado, admitem a aplicação das sanções previstas no art. 87 da Lei de Licitações em conjunto com a disposta no art. 7º da Lei nº 10.520/02.
A conclusão pela incidência coordenada dos dois normativos pode ser alcançada a partir de modernas teorias interpretativistas já aceitas pelo Poder Judiciário, como a do “diálogo das fontes”, tal qual esquadrinhou a Câmara Permanente de Licitações e Contratos da Advocacia-Geral da União – AGU no Parecer nº 05/2015/CPLC, ou pelo entendimento de que ambas as leis (8.666/93 e 10.520/02) igualmente tratam de normas gerais de licitação – sanções e modalidade licitatórias – devendo suas disposições serem acomodadas, e não excludentes entre si.
O Ministro Bruno Dantas, responsável pelo voto-condutor do Acórdão 2530/15 – Plenário/TCU, assim se manifestou sobre o tema:
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Os dispositivos estão inseridos em leis diferentes e tratam do assunto dando tratamento diferenciado em cada situação. 8. No meu entender, a Lei 10.520/2002 criou mais uma sanção que pode integrar-se às previstas na Lei 8.666/1993.
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Portanto, a despeito de o tema ter sido apenas tangenciado pela Corte de Contas, restou claro o seu posicionamento de que a Lei do Pregão teria criado sanção que pode ser integrada com as previstas no Estatuto das Licitações.
De qualquer modo, o debate certamente retornará à pauta do Tribunal de Contas da União que poderá analisar seus fundamentos de maneira mais exaustiva e, assim, trazer maior segurança aos que lidam no espinhoso – mas instigante – ramo das licitações públicas e contratos administrativos.
Fontes: Acórdão 2530/2015-Plenário, TC 016.312/2015-5, relator Ministro Bruno Dantas, 14.10.2015 e InfoTCU nº263/2015.