Em processo apartado, constituído a partir de
representação que apontava fraudes em licitações conduzidas pela Petrobras,
relacionadas às obras de implantação da Refinaria Abreu e Lima, em Ipojuca/PE,
a conduta de determinada empresa ao não apresentar proposta em licitações para
as quais fora convidada restou inserida no seguinte contexto fático: “As condutas anticompetitivas consistiram em
acordos de (i) fixação de preços, condições, vantagens e abstenção de
participação, e (ii) divisão de mercado entre concorrentes, em licitações
públicas de obras de montagem industrial ‘onshore’ da Petrobras do Brasil.
Estas condutas foram viabilizadas, principalmente, por meio de reuniões
presenciais, contatos telefônicos e SMS’s entre os representantes das empresas,
voltados à supressão/redução de competividade nas licitações/contratações
realizadas pela Petrobras nas obras de montagem industrial ‘onshore’, com
prévio acerto do vencedor, preços apresentados, condições, divisões de lotes,
abstenções, propostas de cobertura, dentre outros”. Em sua defesa, a
empresa aduziu que a simples ausência da apresentação de propostas em certames
licitatórios não constituiria, por si só, prática de ato ilícito. A despeito de
concordar com essa afirmativa, o relator asseverou em seu voto que, de acordo
com os autos, havia “elementos
suficientes para se concluir que as omissões em questão constituíram em
condutas deliberadas para dar azo ao funcionamento do cartel”. A partir
dessa constatação, o relator passou a examinar a subsunção da conduta da
empresa ao previsto no art. 46 da Lei 8.443/1992 (Verificada a ocorrência de fraude comprovada à licitação, o Tribunal
declarará a inidoneidade do licitante fraudador para participar, por até cinco
anos, de licitação na Administração Pública Federal), deixando assente, em
preliminar, que a referida norma estabelece a condição de licitante para que a
conduta do sujeito ativo se enquadre na figura típica, e que, nessa situação, a
empresa não necessariamente figuraria na condição de licitante, já que “o entendimento usual da matéria é ser
licitante aquele que participa do certame mediante a apresentação de propostas”. Ponderou, contudo, que não existia uma
definição legal de licitante e, a seu sentir, não havia obstáculos “para esse conceito ser entendido como o
particular que de alguma forma participa do procedimento licitatório na condição
de potencial contratado e interfere na disputa e no resultado”. Esse
entendimento, a seu ver, “parece ser o
que melhor busca concretizar a vontade da lei e impede o seu desvirtuamento,
que constituiria no afastamento de sua incidência de condutas que evidentemente
atentam contra o bem jurídico protegido – lisura das licitações efetuadas pela
Administração Pública”. Na ótica do relator, estar-se-ia “diante de interpretação extensiva, a qual
guarda restrição a sua aplicação no direito sancionatório em razão do princípio
in dubio pro reo”, entretanto essa restrição não seria absoluta, tendo em
vista que em precedente do STF, a Egrégia Corte já teria decidido que a “interpretação extensiva no direito penal é
vedada apenas naquelas situações em que se identifica um desvirtuamento na mens
legis”. No caso concreto, a empresa fora convidada para o certame e,
deliberadamente, absteve-se de apresentar proposta para beneficiar terceiros.
Nesse cenário, o relator vislumbrou “uma
conduta omissiva efetuada com o objetivo específico de interferir nos certames
ilicitamente, de forma que a empresa se amolda ao estabelecido no art. 46 da
Lei 8.443/1992”. E arrematou: “mesmo
que se admita que a empresa não detenha a condição de licitante, o fato é que,
com sua conduta, contribuiu para que outras empresas, na condição de
licitantes, fraudassem os certames em análise”. Dessa forma, a empresa “assumiria a condição de partícipe e
igualmente deveria responder pelo ilícito na medida de sua culpabilidade”.
Ao final, o relator propôs e o Plenário decidiu declarar, com fundamento no
art. 46 da Lei 8.443/1992, a inidoneidade da empresa para participar, por três
anos, de licitação na Administração Pública Federal.
Acórdão
300/2018 Plenário, Representação, Relator Ministro Benjamin Zymler.