Cabe ao pregoeiro indicar de forma
clara e objetiva as inconsistências que devem ser corrigidas na planilha de
preços apresentada pelo licitante, sem alteração do valor final da proposta,
não se limitando a informar apenas os itens, submódulos ou módulos da planilha
onde os erros se encontram, sem especificar o que está errado. Essa indicação,
desde que realizada de forma indistinta em relação a todos os licitantes,
favorece a transparência e viabiliza o efetivo exercício do contraditório e da
ampla defesa, possibilitando o aproveitamento de propostas mais vantajosas
pela Administração.
Representação
formulada ao TCU apontou possível irregularidade no Pregão Eletrônico 2/2022,
promovido pela Superintendência Regional Nordeste do Instituto Nacional do
Seguro Social, cujo objeto era a prestação de “serviço continuado de
vigilância patrimonial orgânica desarmada”. A suposta irregularidade
estaria associada à condução do certame pelo pregoeiro, que desclassificara
licitantes sob fundamento de que haveria inconsistências nas respectivas
planilhas de custos, sem, contudo, identificá-las, dificultando assim a retificação
e o aproveitamento das propostas. Em sua instrução, após analisar as razões de
justificativa apresentadas pelo pregoeiro, a unidade técnica entendeu que, de
fato, ele incorrera em falha, descrita na matriz de responsabilização como “Desclassificar
licitantes do certame sob fundamento de inconsistência na planilha de custos e
formação de preços, sem identificar a alegada inconsistência”. Para chegar
a tal conclusão, a unidade instrutiva deixou assente, preliminarmente, que a
ata da sessão pública registrara a recusa de seis propostas, sob as seguintes
motivações: I) “Recusa de proposta 29/03/2022 13:56:39 Recusa da proposta.
Fornecedor: [empresa A], pelo melhor lance de R$ 1.700.000,0000. Motivo:
Proposta recusada, na forma do subitem 8.4, alíneas ‘a’ e ‘e’ do Edital, por
ocasião da não correção de todas as inconsistências contidas na planilha de
custo. Dentre estas, a cotação de tarifa para municípios que não têm transporte
urbano regulamentado por Lei/Decreto.”; II) “Recusa de proposta
29/03/2022 14:20:18 Recusa da proposta. Fornecedor: [empresa B], pelo
melhor lance de R$ 1.706.946,9600. Motivo: Proposta recusada por ocasião do
licitante ter-se recusado a encaminhar sua planilha de custo adaptada ao seu
menor lance.”; III) “Recusa de proposta 30/03/2022 12:31:40 Recusa da
proposta. Fornecedor: [empresa C], pelo melhor lance de R$
1.755.044,0000. Motivo: Proposta recusada, na forma do subitem 8.4, alíneas ‘a’
e ‘e’ do Edital, por ocasião da não correção de todas as inconsistências
contidas na planilha de custo. Dentre estas, a cotação de tarifa para
municípios que não têm transporte urbano regulamentado por Lei/Decreto.”;
IV) “Recusa de proposta 31/03/2022 11:12:28 Recusa da proposta. Fornecedor: [empresa
D], pelo melhor lance de R$ 1.822.415,7100. Motivo: Proposta recusada, na
forma do subitem 8.4, alíneas ‘a’ e ‘e’ do Edital, por ocasião da não correção
de todas as inconsistências contidas na planilha de custo. Dentre estas, a
cotação do valor da hora extraordinária em desacordo com o § 1º da Cláusula 3ª
da CCT.”; V) “Recusa de proposta 01/04/2022 11:50:01 Recusa da proposta.
Fornecedor: [empresa E], pelo melhor lance de R$ 1.836.829,6500. Motivo:
Proposta recusada, na forma do subitem 8.4, alíneas ‘a’ e ‘e’ do Edital, por
ocasião da não correção de todas as inconsistências contidas na planilha de
custo. Dentre estas, cotação incorreta do ISSQN para cinco municípios.”;
VI) “Recusa de proposta 01/04/2022 16:00:18 Recusa da proposta. Fornecedor: [empresa
F], pelo melhor lance de R$ 1.913.000,6400. Motivo: Proposta recusada, na
forma da alínea ‘a’ do subitem 8.4 do Edital, por ocasião do não envio das
planilhas de custo e formação de preços devidamente preenchidas, na forma da
observação posta ao final do Anexo III do mesmo documento.”. Na sequência,
a unidade técnica assinalou que a Convenção Coletiva de Trabalho (CCT)
utilizada pelo órgão na elaboração do orçamento estimativo do certame havia
expirado poucos dias antes da abertura da sessão pública do pregão, fato que
resultara na desistência dos licitantes detentores das duas melhores propostas
após a fase competitiva. Mais especificamente, a empresa [A], embora tenha
enviado sua planilha retificada, logo depois encaminhou ao órgão pedido de
escusas pela equivocada utilização da CCT 2021 e informou que, com os ajustes
solicitados pelo pregoeiro, não poderia manter os valores ofertados em seu
lance final. Por sua vez, a empresa [B], segunda colocada, abdicou do direito
de apresentar sua planilha retificada e informou que recorreria
administrativamente contra a obrigatoriedade de utilização da CCT 2022, já que
os valores apresentados no edital estavam baseados na convenção de 2021. Os
três licitantes seguintes [empresas C, D e E] tiveram, nessa ordem de
classificação, suas propostas eliminadas em função do não saneamento de todas
as inconsistências identificadas em suas planilhas de custos, apesar das
sucessivas tentativas de correção durante o prazo concedido para os ajustes.
Tal cenário conduziria à presunção de que as retificações exigidas pelo
pregoeiro não puderam ser claramente detectadas pelos licitantes, aspecto que,
possivelmente, resultara na “eliminação de proposta(s) economicamente mais
vantajosa(s) ao erário”. Destacou ainda que, em mensagens enviadas no curso
da sessão pública, o pregoeiro citara os princípios da isonomia, da igualdade e
da impessoalidade, além de informar que, na solicitação de correção, estariam
indicados os itens, submódulos e/ou módulos da planilha onde os erros se
encontravam, mas sem informar o que estava errado, “cabendo somente ao
licitante envolvido revisá-los com base no edital e seus anexos e na legislação
pertinente”. Ao final, a unidade técnica propôs a rejeição das razões de
justificativa do pregoeiro, bem como a “aplicação de multa e inabilitação
para o exercício de cargo em comissão ou função de confiança”. Em seu voto,
anuindo ao entendimento da unidade técnica quanto à irregularidade constatada,
o relator salientou que, “nessa etapa da licitação, em que o resultado
provisório já é de domínio público”, os princípios invocados pelo pregoeiro
não obstavam a precisa divulgação das falhas observadas nas planilhas de
formação de custos. Segundo o relator, a indicação clara e objetiva das
inconsistências, desde que realizada de forma indistinta em relação a todos os
licitantes, além de não caracterizar violação aos referidos princípios, “favorece
a transparência e, ao explicitar os motivos que levaram às desclassificações,
viabiliza o efetivo exercício do contraditório e da ampla defesa”. Acrescentou
que a postura colaborativa do órgão nessa fase do certame facilitaria a
correção de erros sanáveis e abriria a possibilidade de aproveitamento de
propostas pela Administração, conferindo efetividade aos princípios da
economicidade e da seleção da proposta mais vantajosa. Enfatizou que, no
aludido certame, as indicações dos erros nas planilhas de formação de custos
dos licitantes seguiram o modelo empregado nas mensagens “Pregoeiro
29/03/2022 15:26:19 Para [empresa C] - Informamos que as planilhas de
custos enviadas por essa empresa apresentam inconsistências nos seguintes
segmentos: módulo 1-C e F; submódulo 2.1-B; submódulo 2.3-A (planilhas 2% e 5%)
e ausência de Auxílio Creche; módulo 3-A a F;... Pregoeiro 29/03/2022 15:26:58
Para [empresa C] - ...submódulo 4.1-A a D; submódulo 4.2-A; submódulo
4.3-A; módulo 6-C.3 (ISS incorre para alguns municípios); e cotação incorreta
do valor da hora extraordinária”, onde o pregoeiro indicava ao licitante os
códigos dos módulos/submódulos inconsistentes, cujas descrições poderiam ser
identificadas, sem maiores dificuldades, nas próprias planilhas, entretanto os
erros não teriam sido descritos detalhadamente. Por fim, o relator ressaltou
que, conforme informações prestadas pelo Instituto Nacional do Seguro Social, o
Pregão Eletrônico 2/2022 havia sido anulado em função da controvérsia relativa
à CCT a ser seguida nas planilhas de formação de custos dos licitantes e que
motivara a desclassificação de duas propostas, não havendo, portanto, que se
cogitar a “ocorrência de prejuízo ao erário relacionado a contrato firmado a
partir do certame ora analisado”. E arrematou: “Desse modo, ainda que o
pregoeiro tenha falhado quanto à indicação clara e objetiva das inconsistências
verificadas nas planilhas dos licitantes”, o encaminhamento proposto pela
unidade técnica, no sentido da rejeição das suas razões de justificativa,
aplicação de multa e inabilitação para o exercício de cargo em comissão ou
função de confiança, “revela-se desproporcional à sua conduta no caso em
apreciação”. Nos termos propostos pelo relator, o Plenário decidiu
considerar a representação parcialmente procedente e acolher, de forma parcial,
as razões de justificativa apresentadas pelo pregoeiro, sem prejuízo de
cientificar o Instituto Nacional do Seguro Social de que “a simples
indicação dos módulos/submódulos das planilhas de composição de custos, sem a
clara descrição das inconsistências identificadas na etapa de julgamento das
propostas, por dificultar a retificação e o aproveitamento daquelas sanáveis,
não se alinha aos princípios que regem as contratações públicas, notadamente os
da transparência, da economicidade e da seleção da proposta mais vantajosa”.
Acórdão
4370/2023 Primeira Câmara, Representação, Relator Ministro Jhonatan de Jesus.