quinta-feira, 17 de julho de 2025

É irregular a utilização, pelo órgão gerenciador, do sistema de registro de preços para realização de contratação única e integral do objeto registrado, ocasionando a extinção da ata na primeira contratação, por afronta aos princípios da razoabilidade e da finalidade.

 

É irregular a utilização, pelo órgão gerenciador, do sistema de registro de preços para realização de contratação única e integral do objeto registrado, ocasionando a extinção da ata na primeira contratação, por afronta aos princípios da razoabilidade e da finalidade.

Denúncia formulada ao TCU apontara supostas irregularidades no Pregão Eletrônico 90.003/2024, promovido pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), campus de Guarulhos, com vistas ao registro de preços para contratação de “serviços continuados de restaurante universitário, preparo e fornecimento de refeições, com concessão onerosa de uso das dependências do restaurante universitário, no aludido campus”. Por intermédio do Acórdão 546/2024-TCU-Plenário, o Tribunal decidiu considerá-la parcialmente procedente, sem prejuízo de cientificar a unidade jurisdicionada sobre as impropriedades identificadas na licitação, merecendo destaque a seguinte: “utilização do sistema de registro de preços quando as peculiaridades do objeto e a sua localização indicam que só será possível uma única contratação, exaurindo os quantitativos registrados, o que afronta a jurisprudência do TCU, em especial os Acórdãos 1.443/2015-Plenário e 1.712/2015-Plenário.”. Irresignada, a Unifesp interpôs pedido de reexame, argumentando, quanto à aludida impropriedade, que: a) o caráter contínuo de um serviço não impede, por si só, a utilização do SRP pela Administração Pública, de forma que a avaliação sobre a pertinência ou a compatibilidade do SRP com os serviços contínuos deve ser feita de acordo com as nuances do caso concreto; b) com o advento da nova legislação sobre o SRP (Lei 14.133/2021 e Decreto 11.462/2023), houve sensível alteração na regulamentação da matéria; c) o art. 3º do Decreto 11.462/2023 estabelece que o SRP pode ser adotado quando a Administração julgar pertinente, apresentando rol meramente exemplificativo das hipóteses de sua aplicação; d) a simples comparação entre a redação da regulamentação anterior (art. 3º do Decreto 7.892/2013) e a do novo regramento (art. 3º do Decreto 11.462/2023) não deixa dúvidas quanto ao caráter exemplificativo que passou a ter o rol de hipóteses autorizadoras do SRP; e) os precedentes jurisprudenciais invocados no acórdão recorrido definiram os contornos da aplicação do SRP ao tempo da vigência da legislação revogada, e não da legislação atualmente em vigor; f) ao contrário do que restara assentado no acórdão guerreado, não há empecilho, nem na Lei 14.133/2021, nem no Decreto 11.462/2023, para utilização do SRP visando a uma contratação única, cabendo ao gestor apresentar a devida motivação no caso concreto; g) “a Administração justificou a adoção do Sistema de Registro de Preços pois, pela natureza do objeto, não é possível definir previamente com exatidão o quantitativo a ser demandado pela Administração (inc. V), o que encontra amparo legal, bem como pode decorrer de razões diversas, a exemplo da variação do quantitativo durante os meses ao longo de cada exercício (item 8 do estudo técnico preliminar), bem como a incerteza quanto ao quantitativo de alimentação a ser fornecido durante todo o curso do contrato de natureza continuada e possíveis prorrogações, face a eventos futuros e incertos, tais como a variação na demanda de alunos inscritos a cada semestre, o que aumenta o grau de incerteza quanto ao exato quantitativo mensal e anual a ser demandado pela Administração e ratifica o cabimento do sistema de registro de preços (inc. V)”; h) a AGU examinara previamente o procedimento licitatório em comento, nos termos do art. 53 da Lei 14.133/2021, e considerara cabível a adoção do SRP; i) por se tratar da contratação de serviços remunerados por unidade de medida, “como se observa nos itens 1.5 do termo de referência e 2.1 da ata de registro de preços anexos ao edital”, o SRP poderia ser sim utilizado, nos termos do art. 3º, inciso II, do Decreto 11.462/2023; j) a contratação de alimento perecível, hipótese dos autos, tem tratamento diferenciado, conforme o art. 4º, inciso II, do Decreto 11.462/2023,  que permite a adoção de SRP com indicação limitada a unidades de contratação, inclusive sem a indicação do total a ser adquirido, vedada a participação de outro órgão ou entidade. Ao apreciar essas razões recursais, a unidade técnica destacou que, de fato, a “novel alteração legislativa que dispõe sobre o SRP” ampliara as hipóteses de adoção do procedimento auxiliar de registro de preços, mas o fato de a alteração promovida não vedar expressamente a contratação única não poderia ser compreendido como autorização para tal prática, justamente ao contrário do que sustentou a recorrente. Segundo a unidade instrutiva, pelas características do objeto contratado – fornecimento de refeições em um único local –, não haveria possibilidade de contratações frequentes e entregas parceladas, razão por que a contratação em tela, da forma como foi feita, exaurindo os quantitativos registrados já na primeira contratação, “desvirtua o SRP, na medida em que não há necessidade de se manter preços registrados, com possibilidade de contratações futuras, se já se sabe, a priori, que isso não vai acontecer”. Na sequência, ela assinalou que o fato de o objeto da contratação referir-se a serviço contínuo realmente não seria obstáculo à utilização do SRP, mas “não foi essa a razão da ciência que foi dada à recorrente” por meio do acórdão recorrido. Para ela, o objeto da contratação “não se amolda a nenhuma hipótese entre as especificadas no art. 3º do Decreto 11.462/2023, em especial às dos incisos II e V”, pois ele não envolve a aquisição de bens com previsão de entregas parceladas, “no contexto de várias contratações permanentes ou frequentes”, tampouco diz respeito a “serviços com quantitativos impossíveis de serem estimados”. Enfatizou também aquilo que já havia sido ressaltado pelo relator da deliberação recorrida, ao pontuar que “a extinção da ata na primeira contratação afronta os princípios da razoabilidade e da finalidade”. Por fim, refutou o argumento da recorrente de que a contratação em tela estava relacionada a alimento perecível e que, em razão disso, restaria viabilizada a adoção do SRP. Consoante a unidade técnica, o fato de a contratação envolver alimentos perecíveis “apenas permite à Administração o registro de preços com indicação limitada a unidades de contratação, sem indicação do total a ser adquirido, nos termos estabelecidos no art. 4º, inc. II, do Decreto 11.462/2023, mas não garante a adoção SRP quando incompatível com os princípios e normas que regem a matéria”. Em seu voto, anuindo à manifestação da unidade instrutiva, o relator reputou como improcedente a alegação recursal acerca da validade da utilização do sistema de registro de preços para contratação única e imediata, sob o simples argumento de ser o rol constante do art. 3º do Decreto 11.462/2023 meramente exemplificativo. Na sua ótica, a deliberação recorrida deixou bem consignado que a contratação da forma como fora realizada, exaurindo os quantitativos registrados na primeira contratação, “desvirtuou o sistema de registro de preços, na medida em que não havia necessidade de se manter preços registrados, com possibilidade de contratações futuras”. Concluiu então que, nesse ponto específico, deveria ser negado provimento ao pedido de reexame, no que foi acompanhado pelos demais ministros presentes à sessão.

Acórdão 1351/2025 Plenário, Pedido de Reexame, Relator Ministro Walton Alencar Rodrigues.