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terça-feira, 16 de julho de 2024

COMENTÁRIO 122 (Artigo 122 da Lei 14.133/21)

 

COMENTÁRIO 122 (Artigo 122 da Lei 14.133/21)

Lei Comentada

LEI Nº 14.133, DE 1º DE ABRIL DE 2021

Lei de Licitações e Contratos Administrativos

Art. 122. Na execução do contrato e sem prejuízo das responsabilidades contratuais e legais, o contratado poderá subcontratar partes da obra, do serviço ou do fornecimento até o limite autorizado, em cada caso, pela Administração.

§ 1º O contratado apresentará à Administração documentação que comprove a capacidade técnica do subcontratado, que será avaliada e juntada aos autos do processo correspondente.

§ 2º Regulamento ou edital de licitação poderão vedar, restringir ou estabelecer condições para a subcontratação.

§ 3º Será vedada a subcontratação de pessoa física ou jurídica, se aquela ou os dirigentes desta mantiverem vínculo de natureza técnica, comercial, econômica, financeira, trabalhista ou civil com dirigente do órgão ou entidade contratante ou com agente público que desempenhe função na licitação ou atue na fiscalização ou na gestão do contrato, ou se deles forem cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral, ou por afinidade, até o terceiro grau, devendo essa proibição constar expressamente do edital de licitação.

Comentários:

Há mercados em que determinadas etapas de serviços são executadas por várias empresas. Citamos como exemplo a coleta, transporte e destinação de resíduos sólidos (lixo). Pode haver empresas, em número mínimo, que executam todas as fases: coleta, transporte e destinação final dos resíduos. E é fato que há empresas especializadas apenas na coleta e transporte. Outras são especializadas na destinação final dos resíduos, a exemplo de empresas que fazem a seleção do material aproveitável para finalmente destinar a parte imprestável aos aterros sanitários. Há outras empresas especializadas no tratamento por incineração e destinação final.

Em mercados como este, uma licitação que vise contratar empresa que efetue todas as partes da coleta de lixo até o seu destino final, por ser menos competitivo (existem poucas empresas) terminam por onerar a contratação. Assim, a subcontratação deve ser admitida para ampliar a competitividade e a própria eficiência na execução contratual.

 Há que se observar que o fato de se permitir a subcontratação não permite a subcontratação da totalidade do objeto. Salvo melhor interpretação, o § 9º do artigo 67 da Lei n. 14133/2021, além de estabelecer que vários licitantes podem apresentar a mesma empresa como subcontratada, parece sugerir um limite de 25% para a subcontratação do objeto. Vejamos:

§ 9º O edital poderá prever, para aspectos técnicos específicos, que a qualificação técnica seja demonstrada por meio de atestados relativos a potencial subcontratado, limitado a 25% (vinte e cinco por cento) do objeto a ser licitado, hipótese em que mais de um licitante poderá apresentar atestado relativo ao mesmo potencial subcontratado.

 

Na hipótese de se permitir a opção administrativa pela subcontratação, o edital deverá fixar um limite, vedando a subcontratação total da parcela principal do objeto.

No relatório que deu origem ao Acórdão 14193/18, Primeira Câmara, o relator, Ministro-Substituto Weder de Oliveira, pontuou que,

“a subcontratação, se autorizada, é admitida somente parcialmente. E só é admissível quando seja compatível com a natureza do objeto, devendo a Administração fixar limite, para que a contratação de obras, serviços ou fornecimento não seja convolada em integral ou preponderante serviço de intermediação ou de administração de contratos, caracterizando efetiva burla ao princípio da licitação e, consequentemente, potencial pagamento por serviços não contratados e não executados: a intermediação/administração de contratos”.

 

 No caso concreto, acrescentou o relator,

 

“a autorização para subcontratar revela-se flagrantemente ilegal, pois inexistente argumento de necessidade apresentado pela contratada; inexistente avaliação de conveniência para a Administração; inexistentes pareceres que expusessem fundamentos fáticos dessa natureza; situações que se somam ao fato de o então prefeito ter ampliado o atendimento do pedido inicial feito pela contratada, ao autorizar subcontratação/transferência total do objeto contratual, quando foi requerido apenas subcontratação parcial, e permitindo a efetiva e concreta mutação da situação de fato da contratada: de prestadora direta de serviços para mera intermediária entre a administração municipal e as empresas que efetivamente realizaram o transporte escolar”. 

 

Entendemos que cabe à Administração eleger e fazer constar no edital a(s) parcela(s) do objeto que poderá ser subcontratada.

O contratado deverá formalizar previamente, junto à contratante, pedido de autorização de execução, pelo subcontratado, de parcelas do objeto do contrato, especificando claramente que parcelas estarão a cargo deste (subcontratado).

Como se pode observar, no § 1º do artigo 122, da Nova Lei 14133/2021, cabe ao contratado apresentar a Administração documentação que comprove a capacidade técnica do subcontratado, a qual avaliará a documentação juntada. Entendemos que cumpre à Administração exigir os documentos capazes de comprovar a idoneidade e a capacidade técnica do interessado para desempenhar as parcelas que serão objeto da subcontratação. Isso se deve por conta do princípio da indisponibilidade do interesse público, que impõe a obrigação de, ainda que o subcontratado não participe da contratação, adotar cautelas tendentes a garantir seu resultado e, assim, proteger o interesse público. Dessa forma, os requisitos de habilitação que deverão ser comprovados pela subcontratada deverão ser aqueles que, segundo previsão no edital, mostrem-se indispensáveis para demonstrar a capacidade e idoneidade para realizar a parcela a ser subcontratada. Para tanto, deverão ser apresentados os documentos capazes de demonstrar que a subcontratada tem habilitação jurídica, regularidade fiscal e trabalhista e cumpre o disposto no inc. XXXIII do art. 7º da Constituição, além daqueles pertinentes à comprovação de sua qualificação técnica, os quais deverão replicar os requisitos constantes do edital de licitação para a parcela que se pretende subcontratar.

JURISPRUDÊNCIA – TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO

No caso de subcontratação de parcela do objeto para a qual houve exigência de atestados de qualificação técnica na licitação ou no processo de contratação direta, a Administração deve exigir da contratada, como condicionante de autorização para execução dos serviços, documentação que comprove a capacidade técnica da subcontratada (art. 122, § 1º, da Lei 14.133/2021).

Representação formulada ao TCU apontou possíveis irregularidades na Dispensa Eletrônica Emergencial 90002/2024, conduzida pelo Ministério dos Povos Indígenas (MPI) com vistas à contratação de empresa especializada nos serviços de locação de aeronaves de asa fixa e de asa rotativa para subsidiar as atividades de apoio logístico às ações emergenciais de distribuição de cestas de alimentos em benefício da população Yanomami. A dispensa de licitação teve por fundamento o art. 75, inciso VIII, da Lei 14.133/2021, com critério de julgamento pelo menor preço global, regime de execução por empreitada por preço unitário e prazo de vigência da contratação fixado em doze meses, contados da assinatura do contrato (verificada em 15/3/2024), improrrogáveis por força legal. O termo de referência previu três itens: i) locação de quatro aeronaves de asas fixas com capacidade de carga útil mínima de 1,5 tonelada, destinadas exclusivamente para transporte de cestas (quantidade máxima anual de horas de voo para cada aeronave: 8.640); ii) locação de uma aeronave de asas fixas com capacidade de carga útil mínima de 1,5 tonelada, para transporte exclusivo de combustível de aviação (quantidade máxima anual de horas de voo: 2.160); e iii) locação de duas aeronaves de asas rotativas (helicópteros). As aeronaves de asa fixa seriam utilizadas no deslocamento de Boa Vista/RR aos pelotões especiais de fronteira localizados em Surucucu e Auaris, onde ocorreria a estocagem temporária dos alimentos. Já os helicópteros seriam utilizados para a distribuição efetiva das cestas, chegando até as 128 aldeias do Território Yanomami. O preço de referência da Administração fora de R$ 223.250.126,40, valor global referente à locação anual de todas as aeronaves. Participaram da disputa da dispensa eletrônica cinco empresas, incluindo a autora da representação. A vencedora ofertou proposta no valor de R$ 185.917.505,02, ficando a representante em segundo lugar, com proposta comercial de R$ 204.900.000,00. Entre as irregularidades suscitadas, a representante alegou que a proposta apresentada pela empresa vencedora seria inexequível, com valores abaixo dos praticados no mercado, e que as três empresas subcontratadas não preencheriam as condições técnicas para prestação dos serviços pactuados, em especial no tocante à “experiência prévia de 4.320 horas de voo de Caravan”. Alegou, também, que houvera parcelamento do objeto, vedado pelo instrumento convocatório. Em seu voto, acerca da exequibilidade dos preços praticados, o relator mencionou que o valor de referência obtido pela Administração derivou de pesquisa que levara em conta a média de onze valores, sendo nove obtidos no sistema de compras públicas e dois oriundos de cotações no mercado, e que, em sua quase totalidade, a quantidade de horas de voo nessas onze pesquisas era significativamente inferior às estimadas para o certame do MPI, de modo que, no caso concreto, em razão do ganho de escala, “era razoável estimar que a contratação se daria em patamares mais baixos, sobretudo diante de um cenário com a participação de cinco empresas”. Ademais, comparando-se os preços contratados com os orçados pela Administração, teria havido redução de 25,48% nos itens envolvendo asas fixas e de 11,14% para as asas rotativas. Ele destacou que a Lei 14.133/2021 não possui parâmetro objetivo para aferição da inexequibilidade das propostas envolvendo serviços de locação de aeronaves, e que o limite de 75% previsto no art. 59, § 4º, da referida lei diz respeito apenas às obras e aos serviços de engenharia. Por outro lado, aduziu o relator, a IN Seges/ME 73/2022 estabelece que, no caso de fornecimento de bens ou prestação de serviços em geral, haverá indício de inexequibilidade quando as propostas comerciais contiverem valores inferiores a 50% do valor orçado pela Administração, devendo o agente ou a comissão de contratação, “mesmo nesses casos”, realizar diligência, de modo que a confirmação da inviabilidade da oferta dependerá da comprovação de que o custo do licitante ultrapassa o valor da proposta e, concomitantemente, de que inexistem custos de oportunidade capazes de justificar o vulto da oferta. Retomando o caso concreto, o relator pontuou que esse limite de 50% não fora atingido, tanto unitária quanto globalmente. Além de frisar que a proposta da empresa contratada se encontrava distante desse patamar, ressaltou não haver indícios da prática de preços inexequíveis. Pelo contrário, houve, a seu ver, um “desconto em razão da concorrência de cinco empresas” na sessão pública de lances, somado ao fato de que os preços referenciais da Administração não contemplaram o ganho de escala da contratação. Ainda para ele, haveria outra evidência apontando para a adequação dos preços propostos pela contratada, qual seja, “a própria representante é signatária de dois contratos com o Governo Federal em que pratica preços de horas de voo de aeronaves de asa fixa – item com maior desconto no caso concreto – em patamares próximos aos praticados” pela empresa vencedora. Por essas razões, o relator rejeitou a alegação de inexequibilidade dos preços constantes do contrato decorrente da Dispensa de Licitação 90002/2024. Na sequência, ele assinalou que a contratação direta reunira duas “características interessantes”: se, por um lado, permitira a subcontratação parcial do objeto, limitada a 60% do valor total do contrato, por outro, vedara o parcelamento, de modo que a empresa contratada deveria ficar responsável pela execução de todo o objeto. Quanto a esse ponto, o MPI justificara, no estudo técnico preliminar, que buscaria no mercado uma empresa capaz de fornecer solução logística integrada da distribuição de cestas de alimentos pelo modal aéreo. Embora fosse possível dividir a contratação em “dois eixos”, um para cada tipo de aeronave, o relator entendeu que o Tribunal deveria endossar a escolha do contratante, pois, diante da situação emergencial de notório conhecimento, o parcelamento poderia contribuir para o insucesso da política pública, dificultando inclusive eventual responsabilização dos agentes envolvidos. Segundo ele, além do ganho de eficiência na gestão de um único contrato, privilegiar-se-ia um modelo em que “a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e o MPI ficam encarregados do planejamento da distribuição das cestas e a empresa contratada, pela operacionalização da entrega, incluindo o planejamento logístico”. Para o relator, a fixação do limite de subcontratação em 60% do valor total do contrato fora adequadamente justificada nos autos. Apesar de o percentual ser elevado e de ser possível a transferência de parte significativa dos serviços de transporte aéreo, ele avaliou que essa decisão fora tomada para permitir a participação de um número maior de interessadas na fase de lances, afinal de contas, existiriam poucas empresas no mercado aptas à “execução direta” de todo o objeto. Dito de outro modo, o MPI optara por permitir a participação de empresas especializadas na locação de um único tipo de aeronave (helicóptero ou avião), e o percentual de 60% atenderia a essa lógica, pois, como explicado pelo ministério, “na eventualidade de a empresa vencedora da disputa ser especializada em asa rotativa, ela terá de subcontratar o trecho de asa fixa para transporte de cestas e combustível, sendo o trecho que consome mais horas voo”. Prosseguindo na sua análise, chamou a atenção para o fato de que o TCU admite a previsão de subcontratação de parte relevante do objeto quando, de antemão, a Administração sabe que existem poucas empresas no mercado aptas à sua execução, invocando, nesse sentido, o Acórdão 2021/2020-Plenário. Na ótica do relator, a realidade da empresa contratada se aproximava dessa “situação hipotética”, tendo em vista que ela ficaria encarregada diretamente do transporte de combustível de Boa Vista/RR para os pelotões especiais de fronteira e da distribuição, por meio de helicópteros, dos insumos às 128 aldeias do Território Yanomami. Por outro lado, o serviço de transporte das cestas de alimentos “será subcontratado junto a empresas especializadas”. Quanto ao ponto levantado na representação de que as empresas subcontratadas precisariam demonstrar capacidade técnica para prestar os serviços que lhes seriam repassados, “à semelhança do que ocorre com a empresa que participou da dispensa de licitação”, o relator enfatizou que, na vigência da Lei 8.666/1993, ao examinar contratos precedidos de concorrências, o Tribunal constituíra “jurisprudência majoritária no sentido de que o subcontratado deve cumprir, no mínimo, as mesmas exigências estabelecidas para o contratado”, a exemplo do Acórdão 1998/2008-Plenário, por meio do qual o TCU, ao apreciar auditoria nas obras de construção do edifício-sede do Tribunal Superior Eleitoral, determinara ao órgão que somente autorizasse “a subcontratação de serviços no âmbito do Contrato nº 010/2007 por ofício, nos termos estabelecidos na sua Cláusula Quarta, item 13, mediante a avaliação da especialidade requerida e da habilitação do subcontratado (empresa ou profissional), devidamente demonstrada em documentos que a subsidie, observando, em relação aos serviços estabelecidos como requisito de qualificação técnico-operacional do Consórcio, que o subcontratado deve cumprir, no mínimo, as mesmas exigências estabelecidas para a licitação”. Além disso, continuou o relator, no Acórdão 2992/2011-Plenário, entre outros pontos, fora discutida possível restrição à competitividade decorrente da vedação à subcontratação de serviços tradicionalmente terceirizados em obras aeroportuárias. Naquela assentada, o Pleno entendera que, no caso da subcontratação de parcela da obra para a qual tivesse havido solicitação de atestados de qualificação técnica na licitação, o órgão ou a entidade pública deveria exigir, da contratada, como condicionante de autorização para execução dos serviços, a “comprovação de experiência das subcontratadas para verificação de sua capacidade técnica”. O relator então salientou que tal entendimento está positivado no art. 122, § 1º, da Lei 14.133/2021, nos seguintes termos: “Art. 122. Na execução do contrato e sem prejuízo das responsabilidades contratuais e legais, o contratado poderá subcontratar partes da obra, do serviço ou do fornecimento até o limite autorizado, em cada caso, pela Administração. § 1º O contratado apresentará à Administração documentação que comprove a capacidade técnica do subcontratado, que será avaliada e juntada aos autos do processo correspondente”. E arrematou que, “na topografia da norma, o dispositivo está inserido no título destinado aos contratos administrativos, sendo irrelevante a origem do negócio jurídico, isto é, se oriundo de alguma modalidade licitatória, de dispensa ou de inexigibilidade”. Registrou que, na situação em apreço, o termo de referência da contratação, no capítulo destinado à qualificação técnica, exigira das interessadas, entre outras, a seguinte documentação: “35.4. apresentação de certidões ou atestados que comprovem experiência mínima de três anos na prestação do serviço de locação de aeronaves de asa fixa ou rotativa em quantidade correspondente a, no mínimo, 50% do total de horas voo previsto para os itens “locação de quatro aeronaves de asas fixas com capacidade de carga útil mínima de 1,5 tonelada, destinadas exclusivamente para transporte de cestas (quantidade máxima anual de horas de voo para cada aeronave: 8.640)” e “locação de duas aeronaves de asas rotativas (helicópteros)”. Asseverou que, de fato, não foram apresentados os atestados das subcontratadas que comprovassem as horas de voo, “proporcionalmente às parcelas que lhes foram repassadas”, e, justamente por não restar comprovada a experiência pretérita das subcontratadas em relação ao quantitativo mínimo de voo, entendeu que o Tribunal deveria dar ciência dessa ocorrência aos órgãos envolvidos. Anuindo à proposição do relator, o Plenário decidiu considerar a representação parcialmente procedente, sem prejuízo de, entre outras providências, cientificar o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) e o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) de que, no âmbito da Contratação Direta 90002/2024, “a falta de verificação, em relação às empresas subcontratadas, do cumprimento aos requisitos previstos no subitem 8.3.10.5 do Termo de Referência, especialmente quanto à comprovação de experiência na execução de serviços de complexidade tecnológica e operacional equivalente ou superior, proporcionalmente à respectiva subcontratação, contraria o art. 122, § 1º, da Lei 14.133/2021, os princípios da vinculação ao instrumento convocatório, da legalidade, da eficiência e da segurança jurídica, e os Acórdãos 1.998/2008-Plenário, 2.992/2011-Plenário e 2.021/2020-Plenário”.

Acórdão 963/2024 Plenário, Representação, Relator Ministro Benjamin Zymler.

 

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Caros pregoeiros e licitantes, a melhor fonte de conhecimento sobre licitações se chama TCU - Tribunal de Contas da União. Leiam atentamente os acórdãos do TCU, pois eles trazem ensinamentos e recomendações importantíssimos, e tenham a certeza de estarem realizando um grande serviço à sociedade.

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COMENTARIO 1

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domingo, 8 de outubro de 2023

COMENTÁRIO 4 (Artigo 4º da Lei 14.133/21)

 

COMENTÁRIO 4 (Artigo 4º da Lei 14.133/21)

Lei Comentada

LEI Nº 14.133, DE 1º DE ABRIL DE 2021

Lei de Licitações e Contratos Administrativos

TÍTULO I

DISPOSIÇÕES PRELIMINARES

CAPÍTULO I

DO ÂMBITO DE APLICAÇÃO DESTA LEI

Art. 4º Aplicam-se às licitações e contratos disciplinados por esta Lei as disposições constantes dos arts. 42 a 49 da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006.

Comentários:

Os citados artigos da LC 123/06 fazem referências, entre outras, à documentação de regularidade fiscal das microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP), o critério de desempate e a processos licitatórios destinados exclusivamente às ME e EPP.

É importante destacar que quando nos referimos às MEs e às EPPs devemos ter em mente que nos referimos à MICROEMPRESA, EMPRESA DE PEQUENO PORTE, MICROEMPREENDEDOR INDIVIDUAL, PRODUTOR RURAL PESSOA FÍSICA, AGRICULTOR FAMILIAR e SOCIEDADE COOPERATIVA, pois todas devem receber os mesmos tratamentos destinados às MEs e EPPs (DECRETO: 8.538/2015).

Agora vamos abordar, em nossa opinião, uma pequena confusão entre o artigo 42 e o §1º do Artigo 43 da supracitada Lei Complementar. Tal confusão se dá quanto ao momento de se exigir a documentação de regularidade fiscal e trabalhista das MEs e Epps. Vejamos:

1 - Nas licitações públicas, a comprovação de regularidade fiscal e trabalhista das MEs (microempresas) e das EPPs (empresas de pequeno porte) (cujos documentos devem ser apresentados ainda que possuam alguma restrição) somente será exigida para efeito de assinatura do contrato. Isso é o que diz o Art. 42 da Lei Complementar 123/06.

Entenda-se por restrição, a certidão vencida ou pendente de regularização perante os órgãos INSS, ou Receita Federal, ou Caixa Econômica Federal, etc.

2 - Havendo alguma restrição na comprovação da regularidade fiscal e trabalhista, será assegurado o prazo de cinco dias úteis, cujo termo inicial corresponderá ao momento em que o proponente for declarado vencedor do certame, prorrogável por igual período, a critério da Administração Pública, para regularização da documentação, para pagamento ou parcelamento do débito e para a emissão de eventuais certidões negativa ou positiva com efeito de negativa. Essa redação é dada pelo §1º do Artigo 43 da LC 123/06.

Nota-se que esse parágrafo (§1º do Artigo 43) concede cinco dias úteis para regularização, contados da data em que a ME ou EPP foi DECLARADA VENCEDORA. Neste momento, a micro é declarada vencedora, mas a licitação ainda não terminou: falta o momento para intenção de recurso e se houver intenção, interpõe-se o recurso propriamente dito; depois vem contrarrazão, julgamento de recurso, adjudicação, homologação e emissão de empenho e/ou contrato, quando for o caso, e ASSINATURA DO CONTRATO.

Art. 42. Nas licitações públicas, a comprovação de regularidade fiscal e trabalhista das microempresas e empresas de pequeno porte somente será exigida para efeito de assinatura do contrato.

Notemos que há uma grande diferença entre o Art. 42 e o §1º do Artigo 43 da LC 123/06 quanto ao momento de se exigir a regularidade fiscal e trabalhista. O primeiro, fala da DECLARAÇÃO DO VENCEDOR (licitação em andamento) e o segundo fala da CONTRATAÇÃO DO VENCEDOR (aqui, a licitação já terminou). Tratam-se de momentos distintos e de grande diferença entre os dois.

Para complicar mais, o § 2º diz que a não regularização da documentação, no prazo de cinco dias úteis contados da data em que a ME ou EPP foi declarada vencedora, implicará decadência do direito à CONTRATAÇÃO, sem prejuízo de sanções.

Se a Administração, no decorrer do processo, inabilitar a ME ou EPP que não regularizou sua situação fiscal nos cinco dias úteis, a contar da DECLARAÇÃO DO VENCEDOR, concedidos pelo §1º do Art. 43 da Lei 123/06, a licitante ME ou EPP entrará com recurso alegando que sua documentação fiscal só deverá ser exigida para efeito de assinatura do contrato, conforme prevê o Artigo 42. Enquanto não houver um contrato para ser assinado, não se deve iniciar a contagem do prazo de cinco dias úteis. Assim, parece-nos que os artigos 42 e 43 da LC 123/06 estão em desacordo.

Vejamos como se manifestou o Tribunal de Contas da União no Acórdão n.º 976/2012-Plenário, TC 034.666/2011-7, rel. Min. José Jorge, 25.4.2012:

A comprovação de regularidade fiscal das microempresas e empresas de pequeno porte nas licitações públicas somente deve ser exigida quando da assinatura do contrato com a Administração, consoante disposto nos arts. 42 e 43 da Lei Complementar nº 123/2006. Representação de licitante apontou possíveis irregularidades na Tomada de Preços nº 03/2011, conduzida pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro - IFRJ, que tem por objeto “a contratação de serviços de reforma do Campus de Arraial do Cabo”. Alegou ter sido afastada indevidamente do certame em decorrência de débito para com a fazenda municipal, uma vez que, por ser microempresa, estaria obrigada a comprovar a regularidade fiscal somente quando da assinatura do respectivo contrato e não no curso do certame. O relator, em linha de consonância com a unidade técnica, considerou terem sido violados os comandos dos arts. 42 e 43 da Lei Complementar nº 123/2006, a seguir reproduzidos. Segundo o primeiro deles, “Art. 42. Nas licitações públicas, a comprovação de regularidade fiscal das microempresas e empresas de pequeno porte somente será exigida para efeito de assinatura do contrato”. E: “Art. 43. As microempresas e empresas de pequeno porte, por ocasião da participação em certames licitatórios, deverão apresentar toda a documentação exigida para efeito de comprovação de regularidade fiscal, mesmo que esta apresente alguma restrição. § 1º Havendo alguma restrição na comprovação da regularidade fiscal, será assegurado o prazo de 2 (dois) dias úteis, cujo termo inicial corresponderá ao momento em que o proponente for declarado o vencedor do certame, prorrogáveis por igual período, a critério da Administração Pública, para a regularização da documentação, pagamento ou parcelamento do débito, e emissão de eventuais certidões negativas ou positivas com efeito de certidão negativa” – grifos do relator. Invocou ainda o art. 4º do Decreto nº 6.204/2007, que regulamentou o tratamento favorecido, diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte, que reitera a faculdade de esses agentes comprovarem a regularidade fiscal somente quando da assinatura do respectivo contrato. O Tribunal, principalmente em face dessa ocorrência, ao acolher proposta do relator, decidiu determinar ao IFRJ que adote providências no sentido de anular a Tomada de Preços nº 03/2011 do IFRJ. Acórdão n.º 976/2012-Plenário, TC 034.666/2011-7, rel. Min. José Jorge, 25.4.2012.

Consideramos resolvida essa questão do desacordo entre o os Artigos 42 e 43 da LC 123/06, com a interpretação do TCU que diz, em síntese, que no decorrer do processo licitatório não cabe inabilitação de ME (microempresa) ou EPP (empresa de pequeno porte) por conta de alguma restrição em sua documentação de regularidade fiscal.

Nos editais, não deve ser considerada a redação do §1º do artigo 43 quando se refere ao momento da declaração do vencedor. O momento correto é o da assinatura do contrato.

A propósito, o §1º do artigo 43 sofreu alteração pela Lei Complementar 155/2016. Assim, onde se lê no acórdão acima 02 (dois) dias úteis, leia-se 05 (cinco) dias úteis.

 

 No artigo 44 foi adotado um critério de desempate em favor das MEs e das EPPs que assegura, nas LICITAÇÕES, a preferência dessas empresas em fazer um último lance ou PROPOSTA, caso se configure o empate de propostas. Para se configurar o empate, basta que a proposta da ME ou EPP esteja com um valor de até 10% acima do valor da proposta de outra empresa concorrente que não seja ME ou EPP. Quando se tratar da modalidade pregão, esse percentual cai para 5%.

Um detalhe é que, estando a proposta da ME ou EPP 10% ou 5% (no caso de pregão) acima do valor da proposta da sua concorrente (Não ME ou não EPP), ela terá direito a apresentar uma proposta MENOR do que a proposta da concorrente. Será, então, vencedora a ME ou EPP que apresentar, após o estabelecimento de critério de desempate, proposta menor em relação ao seu concorrente que não é nem ME nem EPP.

Configurando-se o empate, no caso de pregão, a ME ou EPP mais bem classificada será convocada para apresentar nova proposta no prazo máximo de 5 (cinco) minutos após o encerramento dos lances, sob pena de preclusão.

Conforme prevê o inciso I do artigo 48 da LC 123/06 a Administração pública deverá realizar processo licitatório destinado exclusivamente à participação de ME e EPP nos itens de contratação cujo valor seja de até R$ 80.000,00 (oitenta mil reais). Cabe destacar que não se trata de licitação cujo valor total seja de oitenta mil reais. O valor referencial citado é por ITEM ou LOTE do objeto da licitação.

Assim, pode-se realizar uma licitação milionária e ainda assim, a participação será exclusiva de ME ou EPP. Basta que nenhum ITEM ou LOTE do objeto tenha valor superior a R$ 80.000,00.

Devemos ficar cientes de que numa licitação que tem, por exemplo, apenas três itens cujos valores são respectivamente: R$30.000,00, R$ 40.000,00 e R$ 50.000,00, teremos a seguinte situação:

a) Se a adjudicação for por ITEM, será uma licitação exclusiva em todos os itens para ME ou EPP.

b) Se a Adjudicação for por LOTE e os três itens citados fizerem parte do único lote, o valor total do lote ultrapassa os R$ 80.000,00. Neste caso, a licitação não será exclusiva para participação de ME ou EPP.

A Administração PODERÁ ainda, em relação aos processos licitatórios destinados à aquisição, obras e serviços, exigir dos licitantes a subcontratação de microempresa ou empresa de pequeno porte. Neste caso, a Administração pode confeccionar empenho para posterior pagamento direto à subcontratada ME ou EPP.

Caso se licite a compra de bens que se pode dividir (inciso III do Art. 48 da LC 123/06), parcelar a Administração DEVERÁ (não é uma faculdade) estabelecer cota de ATÉ 25% (vinte e cinco por cento) do objeto para a contratação de ME ou EPP. É o caso de se fazer uma licitação para comprar 100 microcomputadores. Trata-se de um item do objeto licitatório que se pode fracionar. Assim, o órgão pode destinar a compra, de ATÉ 25 computadores, somente a ME ou EPP.

Mas isso quer dizer que necessariamente a ME vencedora dos 25% irá vender seus computadores ao órgão licitante? Não! Devemos observar a vantajosidade!!! Vejamos o que estabelece os seguintes incisos do artigo 49:

Art. 47.  Nas contratações públicas da administração direta e indireta, autárquica e fundacional, federal, estadual e municipal, deverá ser concedido tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte objetivando a promoção do desenvolvimento econômico e social no âmbito municipal e regional, a ampliação da eficiência das políticas públicas e o incentivo à inovação tecnológica. 

Art. 48.  Para o cumprimento do disposto no art. 47 desta Lei Complementar, a administração pública: 

 

Art. 49. Não se aplica o disposto nos arts. 47 e 48 desta Lei Complementar quando:         (Vide Lei nº 14.133, de 2021

I - (Revogado);  

II - não houver um mínimo de 3 (três) fornecedores competitivos enquadrados como microempresas ou empresas de pequeno porte sediados local ou regionalmente e capazes de cumprir as exigências estabelecidas no instrumento convocatório;

III - o tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte não for vantajoso para a administração pública ou representar prejuízo ao conjunto ou complexo do objeto a ser contratado;

IV - a licitação for dispensável ou inexigível, nos termos dos arts. 24 e 25 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, excetuando-se as dispensas tratadas pelos incisos I e II do art. 24 da mesma Lei, nas quais a compra deverá ser feita preferencialmente de microempresas e empresas de pequeno porte, aplicando-se o disposto no inciso I do art. 48.   

Assim, se numa licitação de 100 computadores a Administração destinar a compra de 25 computadores às microempresas e esses 25 computadores tiverem preços unitários superior aos valores unitários dos outros 75 computadores, isso, em nossa opinião, acarretará a DESVANTAGEM prevista no inciso III do Art. 49.

Quanto ao inciso III, usando o exemplo anterior, digamos que a Administração queira adquirir 100 computadores, no entanto, esses 100 computadores serão interligados de modo que todos precisam ter a mesma configuração e tecnologia aplicada para o perfeito funcionamento de determinada rede de computadores. Nesse caso, fica prejudicado o fracionamento, pois isso poderá causar o PREJUÍZO de que trata o inciso III do artigo 49 e o inciso III do artigo 48, uma vez que não se pode dividir esse objeto sem o risco de causar prejuízo.

Outra questão que se pode pensar é: e se constatarmos, após a fase de lances, que a cota de 25% foi disputada por apenas duas empresas? Neste caso poderíamos enquadrar a questão no II do artigo 49? Acredito que sim. Vejamos:

II - não houver um mínimo de 3 (três) fornecedores competitivos enquadrados como microempresas ou empresas de pequeno porte sediados local ou regionalmente e capazes de cumprir as exigências estabelecidas no instrumento convocatório;

Microempresa – FRACASSO na Cota de até 25%

O que pode acontecer caso se opere o FRACASSO na cota de até 25% do objeto destinada às microempresas e EPPs previsto no artigo 48 da Lei 123/06?

 

Vejamos o que estabelece o §2º do artigo 8º do Decreto 8.538/15:

 

DECRETO Nº 8.538, DE 6 DE OUTUBRO DE 2015

Art. 8º Nas licitações para a aquisição de bens de natureza divisível, e desde que não haja prejuízo para o conjunto ou o complexo do objeto, os órgãos e as entidades contratantes deverão reservar cota de até 25% (vinte e cinco por cento) do objeto para a contratação de microempresas e empresas de pequeno porte.

§ 1º O disposto neste artigo não impede a contratação das microempresas ou das empresas de pequeno porte na totalidade do objeto.

§ 2º O instrumento convocatório deverá prever que, na hipótese de não haver vencedor para a cota reservada, esta poderá ser adjudicada ao vencedor da cota principal ou, diante de sua recusa, aos licitantes remanescentes, desde que pratiquem o preço do primeiro colocado da cota principal.

§ 3º Se a mesma empresa vencer a cota reservada e a cota principal, a contratação das cotas deverá ocorrer pelo menor preço.

 

Devemos atentar para o seguinte detalhe do citado parágrafo: O instrumento convocatório deverá prever, ou seja, se essa previsão não estiver fixada no edital a cota que fracassou ou que foi deserta não poderá ser adjudicada ao licitante vencedor da cota principal.

 

 

ENQUADRAMENTO COMO MICROEMPRESA, COOPERATIVA, PEQUENA EMPRESA, ETC. DECRETO 8.538/2015

 

Dos artigos abaixo transcritos destacamos:

 

1 – As empresas que se beneficiam com o tratamento diferenciado previsto na Lei 123/06 SÃO OBRIGADAS, sob pena de serem responsabilizadas, a promoverem seu DESENQUADRAMENTO da condição de microempresa ou empresa de pequeno porte quando houverem ultrapassado o limite de faturamento estabelecido no art. 3º da Lei Complementar nº 123, de 2006 , no ano fiscal anterior;

2 – O edital deve conter a exigência de declaração, sob total responsabilidade do declarante, de que cumpre os requisitos legais para a qualificação como microempresa ou empresa de pequeno porte, microempreendedor individual, produtor rural pessoa física, agricultor familiar ou sociedade cooperativa, sem a qual o licitante se tornará INAPTO a usufruir do tratamento favorecido estabelecido nos art. 42 ao art. 49 da Lei Complementar nº 123, de 2006.            (Redação dada pelo Decreto nº 10273, de 2020)

 

MODELO DE DECLARAÇÃO

MODELO DE DECLARAÇÃO PARA MICROEMPRESA OU EMPRESA DE PEQUENO PORTE, OU MICROEMPREENDEDOR INDIVIDUAL, OU PRODUTOR RURAL PESSOA FÍSICA, OU AGRICULTOR FAMILIAR OU SOCIEDADE COOPERATIVA

 

A empresa _______________________,inscrita no CNPJ sob nº ___________________, por meio de seu representante legal (ou procurador) Sr. __________, CPF ___(nº)___, DECLARA sob as sanções administrativas cabíveis e sob as penas da lei, que cumpre os requisitos legais para a qualificação como _________________(microempresa ou empresa de pequeno porte, ou microempreendedor individual, ou produtor rural pessoa física, ou agricultor familiar ou sociedade cooperativa), nos termos do Art. 13 do Decreto 8.538/2015 e demais legislação vigente, não possuindo nenhum dos impedimentos previstos no parágrafo 4º do art. 3º da Lei Complementar nº 123/2006, e que, de acordo com o  § 2º do artigo 4º da Lei 14.133/21, neste ano ainda não celebrou contratos com a Administração Pública cujos valores somados extrapolam a receita bruta máxima admitida para fins de enquadramento como empresa de pequeno porte.

Local e Data

Nome e Assinatura do Representante

Nome e Assinatura do Contador – CRC

 

Declaração de microempresa com base na Nova Lei de Licitações (Art. 4º  da Lei 14.133/2024)

Art. 4º Aplicam-se às licitações e contratos disciplinados por esta Lei as disposições constantes dos arts. 42 a 49 da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006.

§ 1º As disposições a que se refere o caput deste artigo não são aplicadas:

I - no caso de licitação para aquisição de bens ou contratação de serviços em geral, ao item cujo valor estimado for superior à receita bruta máxima admitida para fins de enquadramento como empresa de pequeno porte;

II - no caso de contratação de obras e serviços de engenharia, às licitações cujo valor estimado for superior à receita bruta máxima admitida para fins de enquadramento como empresa de pequeno porte.

§ 2º A obtenção de benefícios a que se refere o caput deste artigo fica limitada às microempresas e às empresas de pequeno porte que, no ano-calendário de realização da licitação, ainda não tenham celebrado contratos com a Administração Pública cujos valores somados extrapolem a receita bruta máxima admitida para fins de enquadramento como empresa de pequeno porte, devendo o órgão ou entidade exigir do licitante declaração de observância desse limite na licitação.

§ 3º Nas contratações com prazo de vigência superior a 1 (um) ano, será considerado o valor anual do contrato na aplicação dos limites previstos nos §§ 1º e 2º deste artigo.

 

DECLARAÇÃO DE MICROEMPRESA

 Declaro que a empresa xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx, minha representada, está apta a receber os benefícios da Lei Complementar 123/06, por ser microempresa ou empresa de porte, e atende ao disposto no §2º do artigo 4º da Lei 14.133/21, uma vez que no ano-calendário da realização deste pregão 90033/2024 NÃO, ou seja, neste ano, ainda não celebrou contratos com a Administração Pública cujos valores somados extrapolem a receita bruta máxima admitida para fins de enquadramento como empresa de pequeno porte.

Representante da empresa

 

 

 

 

3- Microempresas e pequenas empresa reunidas em consórcio podem se beneficiar com o tratamento da Lei 123/2006, desde que a soma das receitas brutas anuais não ultrapassem o limite previsto no inciso II do caput do art. 3º da Lei Complementar nº 123, de 2006.

O inciso II do caput do art. 3º da Lei 123/2006 estabelece que,

Art. 3º Para os efeitos desta Lei Complementar, consideram-se microempresas ou empresas de pequeno porte, a sociedade empresária, a sociedade simples, a empresa individual de responsabilidade limitada e o empresário a que se refere o art. 966 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), devidamente registrados no Registro de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme o caso, desde que:

(...)

II - no caso de empresa de pequeno porte, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta superior a R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais) e igual ou inferior a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais).

 

Agora vamos a leitura do supracitado artigo 13 do DECRETO 8.538/2015

Art. 13. Para fins do disposto neste Decreto, o enquadramento como:

I - microempresa ou empresa de pequeno porte se dará nos termos do art. 3º, caput incisos I II , e § 4º da Lei Complementar nº 123, de 2006 ;

II - agricultor familiar se dará nos termos da Lei nº 11.326, de 24 de julho de 2006 ;

III - produtor rural pessoa física se dará nos termos da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991 ;

IV - microempreendedor individual se dará nos termos do § 1º do art. 18-A da Lei Complementar nº 123, de 2006 ; e

V - sociedade cooperativa se dará nos termos do art. 34 da Lei nº 11.488, de 15 de junho de 2007 , e do art. 4º da Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971 .

§ 1º O licitante é responsável por solicitar seu desenquadramento da condição de microempresa ou empresa de pequeno porte quando houver ultrapassado o limite de faturamento estabelecido no art. 3º da Lei Complementar nº 123, de 2006 , no ano fiscal anterior, sob pena de ser declarado inidôneo para licitar e contratar com a administração pública, sem prejuízo das demais sanções, caso usufrua ou tente usufruir indevidamente dos benefícios previstos neste Decreto.

§ 2º  Deverá ser exigida do licitante a ser beneficiado a declaração, sob as penas da lei, de que cumpre os requisitos legais para a qualificação como microempresa ou empresa de pequeno porte, microempreendedor individual, produtor rural pessoa física, agricultor familiar ou sociedade cooperativa, o que o tornará apto a usufruir do tratamento favorecido estabelecido nos art. 42 ao art. 49 da Lei Complementar nº 123, de 2006.            (Redação dada pelo Decreto nº 10273, de 2020)

Art. 13-A.  O disposto neste Decreto se aplica aos consórcios formados exclusivamente por microempresas e empresas de pequeno porte, desde que a soma das receitas brutas anuais não ultrapassem o limite previsto no inciso II do caput do art. 3º da Lei Complementar nº 123, de 2006.           (Incluído pelo Decreto nº 10273, de 2020)

Art. 14.  O Ministério da Economia poderá editar normas complementares para a execução do disposto neste Decreto.            (Redação dada pelo Decreto nº 10273, de 2020)

Art. 15. Este Decreto entra em vigor noventa dias após a data de sua publicação.

Parágrafo único. Não se aplica o disposto neste Decreto aos processos com instrumentos convocatórios publicados antes da data de sua entrada em vigor.

Art. 16. Fica revogado o Decreto nº 6.204, de 5 de setembro de 2007 .

Depois desse breve comentário sobre as MICRO, vamos continuar com a análise do Artigo 4º da Nova Lei:

 

Art. 4º Aplicam-se às licitações e contratos disciplinados por esta Lei as disposições constantes dos arts. 42 a 49 da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006.

 

§ 1º As disposições a que se refere o caput deste artigo não são aplicadas:

I - no caso de licitação para aquisição de bens ou contratação de serviços em geral, ao item cujo valor estimado for superior à receita bruta máxima admitida para fins de enquadramento como empresa de pequeno porte;

II - no caso de contratação de obras e serviços de engenharia, às licitações cujo valor estimado for superior à receita bruta máxima admitida para fins de enquadramento como empresa de pequeno porte.

Aqui, nesses dois incisos do §1º, a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos traz uma novidade. O direito de preferência das ME ou EPP previsto nos Artigos 42 a 49 da LC 123/06 não será aplicado se o valor do ITEM for superior ao valor de R$ 4.800.000,00 que é, atualmente, o valor máximo da receita bruta admitida, em cada ano-calendário, para que uma empresa se enquadre como Empresa de Pequeno Porte (EPP). Se o valor do item for maior do que R$ 4.800.000,00 a ME ou EPP podem participar normalmente, mas não podem auferir nenhum benefício prescrito na LC 123/2021. Antes não havia limite de valor para que as MEs e EPPs pudessem auferir benefícios.

É de se notar que há uma sensível diferença entre os dois incisos desse § 1º:

a) o inciso I deixa claro que no ITEM cujo valor estimado seja superior à receita bruta máxima admitida para fins de enquadramento como empresa de pequeno porte (R$4.800.000,00) as microempresas e EPPs podem participar normalmente, mas não podem auferir no ITEM de valor maior que R$ 4.800.000,00 nenhum benefício prescrito na LC 123/2021. Assim, em outro item de menor valor as ME’s e Epp’s podem participar e auferir as vantagens da LC 123. Aqui, a vedação está no ITEM da licitação.

 

b) o inciso II deixa claro que, no caso de contratação de obras e serviços de engenharia, nas LICITAÇÕES cujo valor estimado seja superior à receita bruta máxima admitida para fins de enquadramento como empresa de pequeno porte, as microempresas e EPPs podem participar normalmente, mas não podem auferir naquela LICITAÇÃO, ainda que ela contenha item de valor inferior à R$ 4.800.000,00, nenhum benefício prescrito na LC 123/2021. Aqui, a vedação está em toda a licitação.

 

O inciso XII do Art. 17 da LC 123/06 dispõe que as MEs e as EPPs não poderão recolher seus impostos na forma do SIMPLES se estiverem prestando serviços com cessão de mão de obra. Isso não quer dizer que essas empresas não poderão realizar esses serviços. Só não poderão auferir benefícios tributários.

Vejamos a síntese do Acórdão do TCU - 1113/2018, Plenário, Representação, Relator Ministro Bruno Dantas:

Em seu voto, o relator assinalou que o art. 17, inciso XII, da LC 123/2006 “não serve para alijar as micro e pequenas empresas optantes do Simples Nacional de licitações visando à terceirização de mão-de-obra, mas tão somente dispor que essas empresas, ao optarem pela realização de serviços de cessão ou locação de mão-de-obra, devem ser excluídas do regime do Simples Nacional”.

Assim, a ME ou a EPP optante pelo Simples Nacional podem participar de licitação para a prestação de serviços com dedicação exclusiva de mão de obra a exemplo de limpeza, conservação e higienização, desde que já na sua proposta se comprove que não houve a utilização dos benefícios tributários desse regime diferenciado. Caso seja declarada vencedora, a empresa deverá solicitar a exclusão do referido regime.

§ 2º A obtenção de benefícios a que se refere o caput deste artigo fica limitada às microempresas e às empresas de pequeno porte que, no ano-calendário de realização da licitação, ainda não tenham celebrado contratos com a Administração Pública cujos valores somados extrapolem a receita bruta máxima admitida para fins de enquadramento como empresa de pequeno porte, devendo o órgão ou entidade exigir do licitante declaração de observância desse limite na licitação.

Eis aqui a previsão na Nova Lei de Licitações da exigência de mais um documento: Declaração de não extrapolação de limite da receita Bruta Máxima admitida para enquadramento das EPPs.

Atenção: Devemos atentar para o que significa RECEITA BRUTA para a Lei. Vejamos o que diz o §1º do Artigo 3º da LC 123: Considera-se receita bruta, para fins do disposto no caput deste artigo, o produto da venda de bens e serviços nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado nas operações em conta alheia, não incluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos.

Agora, vejamos o que o TCU pensa sobre o enquadramento como microempresa e o que diz o §2º citado acima:

Para fins de enquadramento como microempresa ou empresa de pequeno porte, de acordo com os parâmetros de receita bruta definidos pelo art. 3º da LC 123/2006, considera-se o período de apuração das receitas auferidas pela empresa como sendo de janeiro a dezembro do ano-calendário anterior à licitação, e não os doze meses anteriores ao certame. Acórdão 250/2021, Plenário, Relator Ministro-Substituto Weder de Oliveira.

O §2º do artigo 4º que estamos estudando deixa claro que as ME’s terão o benefício se NO ANO-CALENDÁRIO DA REALIZAÇÃO DA LICITAÇÃO ainda não tenham celebrado contratos com a Administração Pública cujos valores somados extrapolem a receita bruta máxima admitida para fins de enquadramento como empresa de pequeno porte.

O TCU entende que:

Para fins de enquadramento como microempresa ou empresa de pequeno porte, de acordo com os parâmetros de receita bruta definidos pelo art. 3º da LC 123/2006, considera-se o período de apuração das receitas auferidas pela empresa como sendo de janeiro a dezembro do ano-calendário anterior à licitação, e não os doze meses anteriores ao certame. Acórdão 250/2021.

Conclusão:

1 – Um ano-calendário tem seu período iniciado em 1º de janeiro e final em 31 de dezembro;

2 - De fato, a LC 123 diz que se enquadra como microempresa quem venha a auferir, EM CADA ANO-CALENDÁRIO, receita bruta igual ou inferior a R$ 360.000,00 e EPP aquela que venha a auferir 4.800.000,00.

3 - Ora, o ano-calendário a que ela se refere é de janeiro a dezembro. Como saberemos, por exemplo, em junho, se uma empresa se enquadra como microempresa se o ano calendário ainda não terminou? Não podemos saber. Não é possível saber. O entendimento lógico é no sentido de que se uma empresa no ano-calendário anterior ao ano que estamos auferiu receita inferior a 360.000,00, ela se enquadra neste ano que estamos como MICROEMPRESA. Podemos até dizer que ela foi microempresa durante todo ano, mas não sabia que era. Não sabia porque só poderia saber quando o ano terminasse em 31 de dezembro. Terminado o ano, é lógico que a empresa sabe que se enquadra como microempresa. E ela vai faturando e tendo a certeza de que é microempresa neste ano, mas não sabe se no ano que vem o será porque isso depende da receita auferida neste ano.

4 - Não faz o menor sentido observar os doze meses anteriores ao certame como disse o ministro Weder de Oliveira no Acórdão 250/2021. A Lei Complementar 123/06 não diz isso. Ela fala que considera microempresa quem no  ano-calendário (o qual compreende o período de janeiro a dezembro) auferiu receita bruta igual ou inferior a 360.000,00.

5 – A Nova Lei 14.133/21, no §2 do artigo 4º, diz:

§ 2º A obtenção de benefícios a que se refere o caput deste artigo fica limitada às microempresas e às empresas de pequeno porte que, no ano-calendário de realização da licitação, ainda não tenham celebrado contratos com a Administração Pública cujos valores somados extrapolem a receita bruta máxima admitida para fins de enquadramento como empresa de pequeno porte, devendo o órgão ou entidade exigir do licitante declaração de observância desse limite na licitação.

5 – A nova lei não mexeu com o entendimento do TCU nem afastou a Lei Complementar 123. O que a nova lei fez foi, diante de uma ME ou EPP, garantir-lhes os benefícios na participação em uma licitação, desde que essa ME ou EPP, no ano-calendário de realização da licitação, ainda não tenham celebrado contratos com a Administração Pública cujos valores somados extrapolem a receita bruta máxima admitida para fins de enquadramento como empresa de pequeno porte. Antes, para se obter os benefícios só precisava ser microempresa ou empresa de pequeno porte. Agora, além de ser enquadrada, e esse enquadramento se dará após a análise (de janeiro a dezembro) da receita bruta do ano anterior, tem que cumprir a condição de não ter celebrado contratos com a Administração Pública cujos valores somados extrapolem a receita bruta máxima admitida para fins de enquadramento como empresa de pequeno porte.

§ 3º Nas contratações com prazo de vigência superior a 1 (um) ano, será considerado o valor anual do contrato na aplicação dos limites previstos nos §§ 1º e 2º deste artigo.

Ainda que o prazo de vigência do contrato seja superior a um ano, deve-se considerar apenas o montante que será gasto em um ano. Se o valor de um ano de contrato for superior a R$ 4.800.000,00, a ME ou EPP que participar da licitação não poderá gozar de nenhum privilégio da LC 123/06.

Caros pregoeiros e licitantes, a melhor fonte de conhecimento sobre licitações se chama TCU - Tribunal de Contas da União. Leiam atentamente os acórdãos do TCU, pois eles trazem ensinamentos e recomendações importantíssimos, e tenham a certeza de estarem realizando um grande serviço à sociedade.

Obrigado por ter lido este artigo. Se gostou, você pode ir para o comentário número 1, Artigo 1º da Lei 14.133/21.

COMENTARIO 1

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quinta-feira, 28 de setembro de 2023

COMENTÁRIO 125 (Artigo 125 da Lei 14.133/21)

 

COMENTÁRIO 125 (Artigo 125 da Lei 14.133/21)

Lei Comentada

LEI Nº 14.133, DE 1º DE ABRIL DE 2021

Lei de Licitações e Contratos Administrativos

Art. 125. Nas alterações unilaterais a que se refere o inciso I do caput do art. 124 desta Lei, o contratado será obrigado a aceitar, nas mesmas condições contratuais, acréscimos ou supressões de até 25% (vinte e cinco por cento) do valor inicial atualizado do contrato que se fizerem nas obras, nos serviços ou nas compras, e, no caso de reforma de edifício ou de equipamento, o limite para os acréscimos será de 50% (cinquenta por cento).

Comentários:

O artigo 124 da Nova Lei 14.133/21 (NL), em seu inciso I, estabelece que os contratos regidos pela NL poderão ser alterados UNILATERALMENTE, com as devidas justificativas, nos seguintes casos:

a) quando houver modificação do projeto ou das especificações, para melhor adequação técnica a seus objetivos;

b) quando for necessária a modificação do valor contratual em decorrência de acréscimo ou diminuição quantitativa de seu objeto, nos limites permitidos pela Nova Lei.

Para que não tivéssemos nenhuma polêmica sobre as alterações unilaterais e seus limites, o legislador não acrescentou na alínea “a”, como fez na alínea “b”, as palavras: “nos limites permitidos pela Nova Lei”.

Em nossa modesta opinião, a interpretação que sugerimos, com relação às citadas alíneas e os limites de 25% e 50%, definidos no artigo 125 é a seguinte:

I – Lendo o artigo 125 concluímos que não há dúvidas de que o artigo esse artigo oferece limites para a alínea “b”, alterações quantitativas, do inciso I do artigo 124;

II – Quando utilizamos, no decorrer de uma obra, serviço ou compra, a alínea “a” do inciso I do artigo 124, ou seja, quando modificamos o projeto ou as especificações qualitativas do objeto, para melhor adequação técnica aos objetivos da Administração, é possível que como CONSEQUÊNCIA disso seja inevitável a aplicação da alínea “b” (alteração QUANTITATIVA) do inciso I do artigo 124. E, uma vez que apliquemos a alínea “b”, essa aplicação não poderá exceder os limites do artigo 125;

III - Se a alteração na alínea “a” (qualitativa) refletir na alínea “b” (quantitativa), NÃO SE PODE ultrapassar os limites do artigo 125, a menos que, com as devidas justificativas, com a máxima prudência, utilize-se a Decisão 215/1999 – Plenário do Tribunal de Contas da União.

Ressaltamos que: a) essa Decisão foi aplicada em um caso concreto e sob a vigência da Lei 8.666/93; b) uma vez que a Lei 8.666/93 e a Nova Lei 14.133/21 trazem redações similares, não acreditamos que o TCU vá mudar seu entendimento; c) quem quiser aplicar a citada decisão a uma alteração qualitativa, desde que sejam CONSENSUAIS, em um caso concreto, deve ler toda a decisão que está transcrita aqui no final deste post.

Vejamos um minúsculo trecho dessa decisão:

 

(...)

é lícito fazer aditamento ao contrato acima citado, (...), tendo em vista que as modificações de projeto ou especificações não resultariam em transmudar o objeto licitado, que continuaria sendo o mesmo, ou seja, construção de açude com mesmo porte e capacidade, porém executado com melhor tipo de tecnologia?

 

(...)

a) tanto as alterações contratuais unilaterais quantitativas – que modificam a dimensão do objeto - quanto as unilaterais qualitativas que mantém intangível o objeto, em natureza e em dimensão, estão sujeitas aos limites preestabelecidos nos §§ 1.º e 2.º da Lei 8.666/93, em face do respeito aos direitos do contratado, prescrito no art. 58, I, da mesma Lei, do princípio da proporcionalidade e da necessidade de esses limites serem obrigatoriamente fixados em lei;

 

b) é permitido à Administração ultrapassar os aludidos limites, na hipótese de alterações contratuais consensuais, qualitativas e excepcionalíssimas, no sentido de que só seriam aceitáveis quando, no caso específico, a outra alternativa - a rescisão do contrato por interesse público, seguida de nova licitação e contratação - significar sacrifício insuportável ao interesse coletivo primário a ser atendido, pela obra ou serviço; ou seja, a revisão contratual qualitativa e consensual, que ultrapasse os limites preestabelecidos no art. 65, § 1.º, da Lei 8.666/93, somente seria justificável, no caso concreto, quando as conseqüências da outra alternativa - a rescisão contratual, seguida de nova licitação e contratação - forem gravíssimas ao interesse público primário."

 

No decorrer deste post falaremos sobre as alterações contratuais “quantitativas” e “qualitativas”, demonstraremos através na tabela abaixo como calcular os limites do artigo 125 e anexaremos a supracitada decisão 215 do TCU.

A alínea “b” do inciso I do artigo 124 prescreve a alteração do valor e não das quantidades porventura envolvidas. Não se acresce ou diminui, usando-se o limite de 25%, quantidades, mas valor. Não importa o quanto as quantidades aumentaram, mas importa o quanto o valor aumentou ou diminuiu e, claro, essa variação não pode ultrapassar os 25%. É necessário ter em mente que aqui, nessa alínea “b”, o PRÓPRIO OBJETO contratual aumenta ou diminui de tamanho. A consequência disso é o aumento ou diminuição do valor e isto fica limitado a 25%. No caso de reforma de edifício ou de equipamento, o limite para os acréscimos será de 50% (cinquenta por cento). Pode-se fazer diminuição de 50%? Não. Só acréscimo. Se for diminuir, o limite é de 25%.

A alínea “b” do inciso I do artigo 124 prevê a alteração UNILATERAL QUANTITATIVA, ou seja, quando for necessária a modificação do valor contratual em decorrência de acréscimo ou diminuição quantitativa do seu objeto, nos limites permitidos pela Lei, ou seja nos limites permitidos pelo artigo 125. Aqui, altera-se a dimensão do objeto. Ele fica maior ou menor do que originalmente previsto, logo é alteração quantitativa.

A alínea “a” do inciso I do artigo 124 traz regra sobre a alteração UNILATERAL QUALITATIVA, ou seja, quando houver modificação do projeto ou das especificações, para melhor adequação técnica a seus objetivos. Neste caso, altera-se quantidades sem alterar sua dimensão. O objeto contratual não fica maior ou menor com esse tipo de alteração. E qual é o percentual autorizado? A Nova Lei, conforme sugerimos acima, estabelece que essa alteração não pode afetar a alínea “b” em mais de 25% para os acréscimos e diminuição e, no caso de reforma de edifício ou de equipamento, o limite para os acréscimos será de 50% (cinquenta por cento). Compreenderemos essa questão de alteração “qualitativa” e “quantitativa” com os dois exemplos abaixo:

Exemplo 1: contrato de limpeza (por área e não por posto de trabalho) cuja área, contendo duas salas a serem limpas, é de 10 metros quadrados. Foi observado no Estudo Técnico Preliminar que o fluxo de pessoas nas duas salas comportava o trabalho de um faxineiro para manter limpas as salas. Frise-se: o objeto do contrato versa sobre a quantidade de metros quadrados a ser limpa.

Uma alteração na política da empresa fez com que o fluxo de pessoas nas duas salas duplicasse. Consequentemente, foi verificado que um faxineiro não estava conseguindo manter a limpeza das duas salas e a solução encontrada foi duplicar a quantidade de faxineiros, ou seja, o contrato foi alterado para acrescentar mais um faxineiro. Essa alteração contratual foi QUALITATIVA ou QUANTITATIVA?

Resposta:

a) houve alteração da área a ser limpa? Não, logo, o objeto não sofreu alteração em sua dimensão.

b) a alteração no contrato foi essencial ou voluntária? Essencial pois, com a duplicação do fluxo de pessoas nas duas salas, houve maior acúmulo de sujeira e isso precisava ser resolvido. O gestor podia optar em contratar ou não mais um faxineiro? Não. Não havia opção porque o lixo teria que ser retirado.

Conclusão: apesar de a alteração ter ocorrido na quantidade de postos de trabalho de faxineiro (objeto acessório) e consequentemente ter aumentado o valor a ser pago à contratada, o objeto principal do contrato (área de 10 metros quadrados a ser limpa) continuou inalterado. Tal alteração contratual foi QUALITATIVA. Assim, ainda que a decisão do TCU tenha ocorrido na vigência da Lei 8.666/93,  na presença da atual Lei 14.133/21, em nossa opinião, tal decisão continua perfeitamente válida, ou seja, nas alterações QUALITATIVAS os limites de 25% 50%, com as devidas justificativas, podem ser ultrapassados.

Vamos ver mais um exemplo de distinção entre alterações quantitativas e qualitativas.

Exemplo 2: desta vez a situação hipotética foi dada por Eros Roberto Grau (1995, p. 29):

“(a) contrata-se a pavimentação de 100km de rodovia; se a Administração estender a pavimentação por mais 10km, estará acrescendo, quantitativamente, o seu objeto – a dimensão do objeto foi alterada; (b) previa-se, para a realização do objeto, a execução de serviços de terraplanagem de 1000m3; se circunstâncias supervenientes importarem que se tenha de executar serviços de terraplanagem de 1200m3, estará sendo acrescida a quantidade de obras, sem que, contudo, se esteja a alterar a dimensão do objeto – a execução de mais 200m3 de serviços de terraplanagem viabiliza a execução do objeto originalmente contratado” (Grifamos)

A letra “b” do exemplo acima trata da alteração QUALITATIVA, enquanto que a letra “a” trata da alteração QUANTITATIVA.

Dica para saber se a alteração é QUALITATIVA ou QUANTITATIVA:

Se a alteração for QUANTITATIVA você pode viver sem ela. Ela é voluntária.

Quando a alteração é QUALITATIVA você mexe no projeto, você tem que fazer, não pode viver sem ela. Ela é necessária. É por isso que somos da opinião de que, ainda que a decisão do TCU tenha ocorrido na vigência da Lei 8.666/93,  na presença da atual Lei 14.133/21, tal decisão continua perfeitamente válida, ou seja, nas alterações QUALITATIVAS os limites de 25% 50%, com as devidas justificativas, podem ser ultrapassados porque não se trata de uma alteração voluntária, mas obrigatória. Pode acontece algo durante um contrato que se a alteração não for feita no projeto haverá o risco de que todo processo de contratação fique inviabilizado.

 

Tanto na alteração UNILATERAL QUANTITATIVA como na QUALITATIVA, a contratada é obrigada a aceitar, nas mesmas condições contratuais, supressões ou acréscimo de até 25% do valor INICIAL do contrato ATUALIZADO.

O percentual de 25% ou de 50% não é calculado sobre as quantidades, mas sobre o valor atualizado do contrato.

As alterações unilaterais não poderão transfigurar o objeto da contratação (artigo 126).

No caso de reforma de edifício ou de equipamento, o limite percentual aumenta, APENAS PARA OS ACRÉSCIMOS, para até 50%. (art. 125).

Vejamos como a legislação anterior, digo, Lei 8.666/93 lidava com esse assunto.

A Lei 8.666/93 não era (é) clara a esse respeito e a doutrina dava conta de que as alterações QUALITATIVAS não estavam submetidas aos limites de 25% e 50% previstos no § 1º do artigo 65 da Lei 8.666/93.

Vejamos o que estabelecem as alíneas “a” e “b” do inciso I do artigo 65 da 8.666/93, que trata das alterações qualitativas e quantitativas:

Art. 65.  Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos:

I - unilateralmente pela Administração:

a) quando houver modificação do projeto ou das especificações, para melhor adequação técnica aos seus objetivos;

b) quando necessária a modificação do valor contratual em decorrência de acréscimo ou diminuição quantitativa de seu objeto, nos limites permitidos por esta Lei; (Grifamos)

Agora vamos identificar o alvo dos comandos do § 1º do mesmo artigo 65. Esse alvo seria a alínea “a”? Seria a alínea “b” ou ambas as alíneas?

§ 1º  O contratado fica obrigado a aceitar, nas mesmas condições contratuais, os acréscimos ou supressões que se fizerem nas obras, serviços ou compras, até 25% (vinte e cinco por cento) do valor inicial atualizado do contrato, e, no caso particular de reforma de edifício ou de equipamento, até o limite de 50% (cinquenta por cento) para os seus acréscimos.

O § 1º não trata de alteração em parcela do objeto, mas alteração no valor total atualizado do objeto, ou seja, no próprio objeto. Isso se traduz em ALTERAÇÃO QUANTITATIVA apenas.

Nota-se que o § 1º acima citado QUE TRATA DOS LIMITES DA LEI (25% e 50%) não trata das alterações QUALITATIVAS (alínea “a”) e sim, das alterações QUANTITATIVAS do OBJETO, da alteração na dimensão do objeto. O objeto resultante fica maior ou menor. Em contrapartida, a alínea “b” também tem foco na alteração da dimensão do objeto e ainda faz referências a “nos limites permitidos por esta lei”. E tais limites estão previstos no § 1º.

A alínea “a” não diz que sua alteração QUALITATIVA está condicionada aos limites permitidos por essa lei. Essa alínea não faz nenhuma referência ao § 1º e vice-versa. Logo, as alterações qualitativas ficaram sem rédeas e o limite para alteração era o “infinito e além”, exceto para as SUPRESSÕES contratuais acordadas com a empresa contratada. Se fosse para diminuir, o limite poderia ser mais de 25% ou mais de 50% conforme estabelece o §2º do artigo 65 da 8.666/93, in verbis:

 

§ 2o  Nenhum acréscimo ou supressão poderá exceder os limites estabelecidos no parágrafo anterior, salvo: 

(...)

II - as supressões resultantes de acordo celebrado entre os contratantes.    

 

Essa conclusão de que a alínea “a” do inciso I do artigo 65 não tinha limite definido na lei deixava uma enorme brecha e foi necessária uma prudente e oportuna “intervenção” do Tribunal de Contas da União.

Para o Tribunal de Contas da União, a princípio, tanto as alterações quantitativas, quanto as qualitativas, estão sujeitas aos limites legais dos §§ 1º e 2º do art. 65 da Lei nº 8.666/1993. No entanto, pode-se admitir excepcionalmente a superação de tais limites no que tange às alterações QUALITATIVAS quando preenchidas as condições estabelecidas na Decisão 215/1999 – Plenário.

No Final deste documento reproduzimos o texto integral da citada Decisão Tribunal de Contas da União.

 

Agora vamos aprender,

 

COMO VERIFICAR O VALOR DA APURAÇÃO DOS LIMITES PERCENTUAIS INDICADOS (25% e 50%, artigo 125 da Lei 14.133/21)

Os limites percentuais estabelecidos no Art. 125 da Lei de Licitações para as alterações contratuais realizadas pela Administração Pública devem ser calculados com base no valor inicial atualizado do contrato.

Assim, a base de cálculo será sempre o valor inicial atualizado do contrato, sendo que esse valor somente sofrerá alteração por força do REAJUSTE/REVISÃO.

 

Os acréscimos e supressões quantitativas NÃO alteram a base de cálculo para novas alterações quantitativas.

 

EXEMPLOS:

 

VALOR ORIGINAL

DO

CONTRATO

ALTERAÇÕES

REAJUSTES

ACRESCIMOS

PERCENTUAL

TOTAL DO CONTRATO

100.000,00

Reajuste de 10%

10.000,00

-----------------

----------------

110.000,00

110.000,00

Acréscimo de 10%

----------------

11.000,00

10%

121.000,00

121.000,00

Reajuste de 5%

6.050,00

-----------------

5%

127.050,00

Faremos agora um novo acréscimo. QUANTO EU PODEREI DAR DE ACRÉSCIMO? Resposta: ATÉ 15. COMO FAZER ISSO?

VALOR original DO

CONTRATO/

Atualizado

ALTERAÇÕES

REAJUSTES

ACRESCIMOS

PERCENTUAL

TOTAL DO CONTRATO

100.000,00

Reajuste de 10%

10.000,00

-----------------

10%

110.000,00

110.000,00

Reajuste de 5%

5.500,00

----------------

5%

115.500,00

115.500,00

115.500,00 é o total atualizado do contrato com apenas os reajustes. Note que não entram os acréscimos. Se incluíssemos os acréscimos, ficaria errado porque seria, agora, o mesmo que fazer acréscimo sobre acréscimo. Uma vez que já acrescentamos 10% a esse contrato, resta-nos acrescer agora até 15% = 17.325,00.

-----------------

17.325,00

15%

127.050,00 + 17.325,00 =

 

Agora faremos as SUPRESSÕES. Vamos pegar um exemplo de um contrato de valor R$ 100.000,00.

 

VALOR ORIGINAL

DO

CONTRATO

ALTERAÇÕES

REAJUSTES

Supressão

PERCENTUAL

TOTAL DO CONTRATO

100.000,00

Reajuste de 10%

10.000,00

-----------------

10%

110.000,00

110.000,00

Supressão de 10%

----------------

11.000,00

10%

99.000,00

OBS: Note que você REAJUSTOU = 10%, depois SUPRIMIU 10%. É diferente de você ACRESCER 10% e SUPRIMIR 10%.

 

O contrato acima pode, agora, sofrer SUPRESSÃO DE ATÉ QUANTO? Resposta: até 15%. Vamos suprimir 15%? Vamos:

VALOR original DO

CONTRATO/

atualizado

ALTERAÇÕES

Supressão

ACRESCIMOS

PERCENTUAL

TOTAL DO CONTRATO

R$110.000,00. Você pode achar que o valor do contrato agora seria R$99.000,00.

Supressão de 15%

110.000,00 x 15% = 16.500,00.

 

99.000,00 – 16.500,00 = 82.500,00.

Note que o valor agora é 99.000,00

-----------------

15%

82.500,00

Atenção: não pode haver compensação entre os ACRÉSCIMOS e SUPRESSÕES. Os cálculos devem ser feitos à parte. No entanto, tratando-se de mesmo item não há que se falar em compensação. Só ocorre a compensação proibida entre itens DIFERENTES do contrato. (Acórdão TCU 66/2021 - Plenário).

A Portaria AGU Nº 140, de 26 de abril de 2022, altera a Orientação Normativa nº 50, de 25 de abril de 2014. A orientação trata do limite percentual de 25% nos termos aditivos aos contratos administrativos. Estabelece a portaria que o limite legal de 25% para acréscimos ou supressões deve ser considerado de forma isolada. É vedada a compensação de acréscimos e supressões entre itens distintos, não se admitindo, ainda, que a supressão de quantitativos de um ou mais itens seja compensada por acréscimos de itens diferentes ou pela inclusão de novos itens. Vejamos:

"I - OS ACRÉSCIMOS E AS SUPRESSÕES DO OBJETO CONTRATUAL DEVEM SER SEMPRE CALCULADOS SOBRE O VALOR INICIAL DO CONTRATO ATUALIZADO, APLICANDO-SE DE FORMA ISOLADA OS LIMITES PERCENTUAIS PREVISTOS EM LEI AO CONJUNTO DE ACRÉSCIMOS E SUPRESSÕES, VEDADA A COMPENSAÇÃO DE ACRÉSCIMOS E SUPRESSÕES ENTRE ITENS DISTINTOS, NÃO SE ADMITINDO QUE A SUPRESSÃO DE QUANTITATIVOS DE UM OU MAIS ITENS SEJA COMPENSADA POR ACRÉSCIMOS DE ITENS DIFERENTES OU PELA INCLUSÃO DE NOVOS ITENS.

II - NO ÂMBITO DO MESMO ITEM, O RESTABELECIMENTO PARCIAL OU TOTAL DE QUANTITATIVO ANTERIORMENTE SUPRIMIDO NÃO REPRESENTA COMPENSAÇÃO VEDADA, DESDE QUE SEJAM OBSERVADAS AS MESMAS CONDIÇÕES E PREÇOS INICIAIS PACTUADOS, NÃO HAJA FRAUDE AO CERTAME OU À CONTRATAÇÃO DIRETA, JOGO DE PLANILHA, NEM DESCARACTERIZAÇÃO DO OBJETO, SENDO JURIDICAMENTE POSSÍVEL, ALÉM DO RESTABELECIMENTO, A REALIZAÇÃO DE ADITAMENTOS PARA NOVOS ACRÉSCIMOS OU SUPRESSÕES, OBSERVADOS OS LIMITES LEGAIS PARA ALTERAÇÕES DO OBJETO EM RELAÇÃO AO VALOR INICIAL E ATUALIZADO DO CONTRATO."

REFERÊNCIA: art. 124, inciso I, alínea "b", e arts. 125 e 126 da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021; art. 65, inciso I, alínea "b", e § 1º, da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993; Parecer PGFN/CJU/CLC/nº 28/2009, Parecer nº 1359/2010/LC/NAJSP/AGU, Parecer nº 16/2021/DECOR/CGU/AGU, Despacho nº 158/2021/Decor/CGU/AGU e Despacho nº 172/2021/DECOR/CGU/AGU.

 

 

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO

Número do documento:  

DC-0215-18/99-P

 

Identidade do documento:  

Decisão 215/1999 - Plenário

 

Ementa:  

Consulta formulada pelo Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal. Possibilidade de alteração de contrato administrativo em valor excedente ao limite estabelecido na Lei 8.666/93, visando à utilização de nova tecnologia na execução das obras. Caso concreto. Considerações levantadas pelo Ministério Público junto ao TCU quanto à relevância da matéria para o interesse público.

Comunicação. Arquivamento.

 

- Alteração contratual. Considerações.

 

Grupo/Classe/Colegiado:  

Grupo II - CLASSE III - Plenário

 

Processo:  

930.039/1998-0

Natureza:  Consulta.

 

Entidade:  

Órgão de Origem: Ministério do Meio Ambiente (ex-Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal).

 

Interessados:  

Interessado: Gustavo Krause Gonçalves Sobrinho, ex-Ministro.

 

Dados materiais:  

DOU de  21/05/1999

 

2º Revisor: MINISTRO ADHEMAR PALADINI GHISI

 

Sumário:  

Consulta sobre a possibilidade de alteração de contrato administrativo em valor que excederia os limites estabelecidos na Lei n. 8.666/93.

Conhecimento. Esclarecimentos à autoridade consulente. Arquivamento.

 

Relatório:  

Inteiro teor do Relatório, Voto e Proposta de  Decisão emitida pelo Relator, Ministro-Substituto José Antonio Barreto de Macedo (Ata nº 10/99), bem como do Voto apresentado, nesta data, pelo 1º Revisor, Ministro Adylson Motta, no tocante ao processo nº 930.039/1998-0, cuja votação foi, novamente, suspensa, ante novo pedido de vista dessa feita formulado pelo Ministro Adhemar Paladini Ghisi, de acordo com o artigo 56 do Regimento Interno.

 

Adoto como Relatório o Parecer da lavra do ilustre Subprocurador-Geral do Ministério Público junto a este Tribunal, Dr. Lucas Rocha Furtado (fls. 11/17):

 

"Trata-se de Consulta formulada pelo ex-Ministro de Estado do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, o excelentíssimo senhor GUSTAVO KRAUSE GONÇALVES SOBRINHO, acerca de  alteração de contrato administrativo que excede, em valor, os limites legais preestabelecidos.

 

Apresenta o consulente (fl.1), a título de suposições, a existência de obra pública, para construção de barragem, em adiantado estágio de execução, em que se verificou a necessidade de acréscimos nos quantitativos de obras e serviços, em virtude da situação encontrada quando das escavações da fundação.

 

Continuando sua exposição, argumenta que a substituição do maciço de terra, originalmente previsto no projeto básico e no contrato, por maciço em concreto compactado a rolo - CCR, traria benefícios econômicos e sociais à comunidade alcançada pela obra (quase três milhões de pessoas), como: a redução do prazo total de conclusão da barragem; a possibilidade de estocar água à medida em que o maciço CCR vai sendo elevado, antecipando a acumulação de água na região em dois ou três anos; a segurança no abastecimento de água para projetos industriais, turísticos e de irrigação, em vias de implantação na região (fls. 1/2).

 

Acrescenta, ainda, que a tecnologia CCR quase não era utilizada na construção de barragens no Brasil, à época da elaboração do projeto básico; que a utilização dessa tecnologia não comprometerá a segurança da obra nem alterará as suas características, pois que será mantido o volume original de acumulação de água e serão preservados todos os seus múltiplos usos, como a produção de pescado, o controle de enchentes e o fornecimento de água para consumo humano e industrial, bem como para irrigação.

 

Por fim, salienta que os acréscimos em obras e serviços necessários para concluir a barragem, tanto mantendo o processo construtivo original (maciço de terra) quanto modificando-o, utilizando-se a tecnologia CCR, implicam a elevação do valor inicialmente contratado em patamar superior ao limite legalmente permitido de 25%.

 

Colocados os fatos, o consulente, salientando que o contrato mencionado é regido pelo Decreto-Lei n.º 2.300/86 (arts. 48, I, 55, I, a, e 55, § 4.º), oferece as seguintes questões:

 

'I) é lícito fazer aditamento ao contrato acima citado, no sentido de alterar o tipo de tecnologia de construção do trecho central do maciço, na calha do rio, de barragem de terra para barragem de concreto compactado a rolo, arrimado nos permissivos da legislação acima mencionada, com vistas à otimização do objeto contratado, tendo em vista que as modificações de projeto ou especificações não resultariam em transmudar o objeto licitado, que continuaria sendo o mesmo, ou seja, construção de açude com mesmo porte e capacidade, porém executado com melhor tipo de tecnologia?

 

II) as extensões contratuais ditadas por razões de natureza 'qualitativa' - caso acima mencionado - ainda que impliquem em acréscimos de quantidades, podem ser aditadas em contrato, mesmo estando estas sujeitas aos limites do § 1.º do art. 55 do Decreto-Lei n.º 2.300/86, apesar do que preceitua o § 4.º do mesmo diploma legal?' (grifos do original).

 

Trazendo a colação entendimentos doutrinários sobre o assunto, o consulente conclui asserindo que as extensões contratuais ditadas por razões de natureza qualitativa, ainda que impliquem acréscimos em quantidades de obras e serviços, não estão sujeitas aos limites estabelecidos no art. 55, § 1.º, do Decreto-Lei n.º 2.300/86 ou no art. 65 da Lei n.º 8.666/93.

 

II

 

A Unidade Técnica, ressaltando a legitimidade do então Ministro de Estado do MMA para formular consulta a este Tribunal (art. 216, II, do Regimento Interno), opina no sentido de que dela não se conheça por versar sobre caso concreto (art. 217 do Regimento Interno) ou, caso o Tribunal decida conhecê-la, que responda ao consulente, quanto ao primeiro quesito, que as alterações em contratos de obras públicas envolvendo mudanças de projeto básico, em face de nova tecnologia, exigem a realização de novo procedimento licitatório; quanto ao segundo, que, nas alterações contratuais, devem ser observados os limites estabelecidos no art. 55, § 1.º, do Decreto-Lei n.º 2.300/86 e no art. 65, § 2.º, c/c o art. 121 da Lei 8666/93 (fl. 9).

 

Honra este parquet a oitiva solicitada mediante o r. despacho de V. Exa. à fl. 10.

 

III

 

Tendo em vista a minudência do caso narrado pelo consulente, é bem possível que a presente consulta esteja ancorada em um caso concreto, de modo que seria justificável a incidência do art. 217 do Regimento Interno, como pretende a 6.ª SECEX.

 

Contudo, é de ver que, em regra, a consulta ao Tribunal, quanto a dúvidas suscitadas na aplicação de dispositivos legais ou regulamentares, tem em vista a solução de caso concreto, mesmo que não revelado no texto. Afinal, é para isso - para a solução de casos concretos - que servem as normas. Entender de outro modo seria admitir que este Tribunal estaria, no uso dessa competência, prestando-se a solução de questões jurídicas meramente teóricas ou acadêmicas, sem interesse imediato para a Administração.

 

Se a presente consulta tivesse sido formulada de outra maneira, sem detalhar o caso, mas apenas argüindo a possibilidade de extensões de contratos administrativos além dos limites legais preestabelecidos, ou argüindo a submissão das alterações unilaterais dos contratos administrativos, em face de mudanças de projeto ou especificações, aos mencionados limites, nada se poderia opor a ela quanto à concretude. Se o Tribunal vier a rejeitá-la, nada impediria o consulente de repeti-la sem mencionar o caso concreto, retirando-lhe o óbice à admissibilidade.

 

O que importa, a nosso ver, nesse caso, é que a consulta versa indiscutivelmente sobre questão jurídica em tese, da maior relevância para a Administração Pública. Aliás, são duas questões, como explicitado no parágrafo precedente.

 

Com base nisso - de que se cuida também de questão em tese relevante -, opinamos no sentido de que seja superada a incidência do art. 217 do Regimento Interno, para que seja conhecida a presente consulta.

 

IV

 

Na hipótese de vir a ser acolhida essa opinião, cumpre-nos então agora percorrer o árido e tormentoso caminho que nos levará a compreender e solver as aludidas questões jurídicas.

 

Cabe esclarecer que os dispositivos legais objeto da interpretação que se irá conduzir são os arts. 58, inciso I, e 65, inciso I, e §§ 1.º e 2.º da Lei 8.666/93, alterada pelas Leis 8.883/94 e 9.648/98, sucedâneos dos arts. 48, caput e inciso I, e 55, inciso I, e §§ 1.º e 4.º do Decreto-Lei 2.300/86.

 

Isso, porque o art. 121 da Lei 8.666/93 prescreve a incidência dos §§ 1.º e 2.º do seu art. 65 aos contratos celebrados anteriormente à sua vigência. Embora a constitucionalidade desse dispositivo seja duvidosa, não cabe discuti-la nesta oportunidade.

 

Desde já adiantamos que a adoção dos dispositivos do Decreto-lei, em vez dos da Lei, levaria ao mesmo resultado interpretativo.

 

Como se trata de apreciação em abstrato de questão jurídica, evitaremos de fazer remissão ao caso suscitado na consulta, até mesmo na resposta que iremos propor.

 

Iniciamos o percurso, lembrando que a mutabilidade é da própria natureza do contrato administrativo, é imanente a ele.

 

Pode-se dizer que, faltando a prerrogativa, ou melhor, o dever-poder da Administração para instabilizar o vínculo, mediante alteração ou rescisão unilateral, não existe contrato administrativo.

 

Bom de ver que tal prerrogativa não decorre de uma condição de superioridade própria da Administração em relação ao contratado, mas senão de sua condição de curadora dos interesses públicos primários, também denominados interesses coletivos primários.

 

É a supremacia do interesse público e a indisponibilidade deles que fundamenta a existência do contrato administrativo e do seu traço distintivo: a mutabilidade.

 

É o que se dessume do art. 58, I, da Lei de Licitações e Contratos, in verbis:

 

'Art. 58 O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de:

 

I - modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às finalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado'.

 

Esse entendimento sobre a sua mutabilidade e o seu fundamento - a realização do interesse público primário - pode ser confirmado observando-se o próprio conceito de contrato administrativo.

 

CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO define-o como 'um tipo de avença travada entre a Administração e terceiros na qual, por força de lei, de cláusulas pactuadas ou do tipo de objeto, a permanência do vínculo e as condições preestabelecidas sujeitam-se a cambiáveis imposições de interesse público, ressalvados os interesses patrimoniais do contratante privado' (Curso de Direito Administrativo, 10.ª ed, São Paulo: Malheiros, 1998, p. 401) (grifamos).

 

Trazemos também à luz a lição de CARLOS ARI SUNDFELD sobre a matéria:

 

'É perfeitamente natural ao contrato administrativo a faculdade de o Estado introduzir alterações unilaterais. Trata-se de instrumentá-lo com os poderes indispensáveis à persecução do interesse público. Caso a administração ficasse totalmente vinculada pelo que avençou, com o correlato direito de o particular exigir a integral observância do pacto, eventuais alterações do interesse público - decorrentes de fatos supervenientes ao contrato - não teriam como ser atendidas. Em suma, a possibilidade de o Poder Público modificar unilateralmente o vínculo constituído é corolário da prioridade do interesse público em relação ao privado, bem assim de sua indisponibilidade' ('Contratos Administrativos - Acréscimos de obras e serviços - Alteração'. Revista Trimestral de Direito Público n.º 2, São Paulo:Malheiros, p. 152).

 

O interesse público primário - às vezes distinto do interesse da Administração, que é o interesse público secundário - é não só o fundamento da mutabilidade nos contratos administrativos, como também o seu real limite, como se verá.

 

V

 

Enfrentemos, inicialmente, a questão colocada sobre a possibilidade de aditamento de contrato administrativo, imposto unilateralmente pela Administração, que supere, em valor, os limites estabelecidos no § 1.º do art. 65 da Lei 8.666/93.

 

Neste ponto, cumpre distinguir as alterações contratuais quantitativas das qualitativas.

 

Considerando que o objeto do contrato distingue-se em natureza e dimensão, tem-se a natureza sempre intangível, tanto nas alterações quantitativas quanto nas qualitativas.

 

Não se pode transformar a aquisição de bicicletas em compra de aviões, ou a prestação de serviços de marcenaria em serralheria.

 

Contudo, nas modificações quantitativas, a dimensão do objeto pode ser modificada dentro dos limites previstos no § 1.º do art. 65 da Lei 8.666/93, isto é, pode ser adquirida uma quantidade de bicicletas maior do que o originalmente previsto, desde que o acréscimo, em valor, não ultrapasse 25% do valor inicial atualizado do contrato.

 

As alterações qualitativas, por sua vez, decorrem de modificações necessárias ou convenientes nas quantidades de obras ou serviços sem, entretanto, implicarem mudanças no objeto contratual, seja em natureza ou dimensão.

 

Convém distinguir dimensão do objeto de quantidade de obras ou serviços necessários à realização do objeto. Servimo-nos dos ensinamentos de EROS ROBERTO GRAU, verbis:

 

'(a) contrata-se a pavimentação de 100km de rodovia; se a Administração estender a pavimentação por mais 10km, estará acrescendo, quantitativamente, o seu objeto - a dimensão do objeto foi alterada; (b) previa-se, para a realização do objeto, a execução de serviços de terraplanagem de 1000m3; se circunstâncias supervenientes importarem que se tenha de executar serviços de terraplanagem de 1200m3, estará sendo acrescida a quantidade de obras, sem que, contudo, se esteja a alterar a dimensão do objeto - a execução de mais 200m3 de serviços de terraplanagem viabiliza a execução do objeto originalmente contratado' (Licitação e Contrato Administrativo. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 29).

 

Quase sempre, as alterações qualitativas são necessárias e imprescindíveis à realização do objeto e, consequentemente, à realização do interesse público primário, pois que este se confunde com aquele.

 

As alterações qualitativas podem derivar tanto de modificações de projeto ou de especificação do objeto quanto da necessidade de acréscimo ou supressão de obras, serviços ou materiais, decorrentes de situações de fato vislumbradas após a contratação.

 

Conquanto não se modifique o objeto contratual, em natureza ou dimensão, é de ressaltar que a implementação de alterações qualitativas requerem, em regra, mudanças no valor original do contrato.

 

Enfrentemos a questão então colocada.

 

De início, é de ver que fere não só o Direito como também o senso comum a hipótese de alterações contratuais ilimitadas no âmbito administrativo, sobretudo as unilaterais.

 

Os limites genéricos importam o respeito ao direito dos contratados e a interdição da fraude à licitação.

 

O respeito ao contratado - explicitamente exigido no art. 58, I, da Lei 8.666/93 -consubstancia-se na mantença do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, na intangibilidade do objeto e, nas alterações unilaterais, na imposição objetiva de limite máximo aos acréscimos e supressões. Evidente que, nas alterações consensuais, o contratado manifesta sua vontade, podendo rejeitar acréscimos ou supressões indesejáveis, dentro das fronteiras legais.

 

Nas alterações unilaterais quantitativas, previstas no art. 65, I, b, da Lei 8.666/93, a referência aos limites é expressa, uma vez que os contratos podem ser alterados unilateralmente 'quando necessária a modificação do valor contratual em decorrência de acréscimo ou diminuição quantitativa de seu objeto, nos limites permitidos por esta Lei'. Estão eles previstos no § 1.º do referido artigo.

 

Assim, em relação às alterações unilaterais quantitativas (art. 65, I, b), não se tem dúvida sobre a incidência dos limites legais.

 

Nas alterações unilaterais qualitativas, consubstanciadas no art. 65, I, a, da aludida Lei, não há referência expressa a esses limites, pois os contratos podem ser alterados 'quando houver modificação do projeto ou das especificações, para melhor adequação técnica aos seus objetivos'.

 

Nas opiniões de eminentes doutrinadores, algumas até colacionadas no texto da presente consulta, como CAIO TÁCITO, MARÇAL JUSTEN FILHO e ANTONIO MARCELO DA SILVA, não se aplicam às alterações qualitativas unilaterais os limites previstos no § 1.º do art. 65 da Lei, porque a mencionada alínea a não lhes faz referência.

 

Pedimos vênia por não nos filiarmos a esse pensamento.

 

Nesse ponto, preferimos a orientação de HELY LOPES MEIRELLES, JESSÉ TORRES PEREIRA, TOSHIO MUKAI - como faz referência JUSTEN FILHO no seu parecer publicado no Informativo de Licitação e Contratos n.º 42, agosto/97, p. 611 -, bem como a de CARLOS ARI SUNDFELD, in verbis:

 

'2.1. Modificação unilateral

 

Genericamente previsto no art. 58-I, está condicionado por seu objetivo: a 'melhor adequação às finalidades de interesse público'.

 

Pode decorrer da modificação do projeto ou das especificações para, segundo o art. 65-I, 'melhor adequação técnica aos seus objetivos'. Essa alteração encontra, contudo, barreiras e condicionantes. De um lado, nos direitos do contratado, a quem se assegura a intangibilidade do equilíbrio econômico-financeiro e da natureza do objeto do contrato, além de um limite máximo de valor para os acréscimos e supressões (art. 65-§1.º)' (Licitação e Contrato Administrativo. São Paulo: Malheiros, 1994, pp. 227/228) (grifamos).

 

Mesmo que se entenda que não se possa extrair diretamente do art. 65, I, a, essa ilação, em virtude da não-referência aos limites máximos de acréscimo e supressão de valor, a inexistência desses limites não se coaduna com o Direito, pois pode ser deduzida a partir do art. 58, I, da Lei de Licitações e Contratos, anelado pelo princípio da proporcionalidade, em virtude da observância aos direitos do contratado.

 

A utilização da proporção adequada nos atos da Administração é condição de legalidade deles. O atendimento ao interesse público não deve ser esteio a sacrifícios desnecessários do interesse privado. É o que reza o princípio da proporcionalidade, que proíbe os excessos da Administração.

 

CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO esclarece: 'as competências administrativas só podem ser validamente exercidas na extensão e intensidade proporcionais ao que seja realmente demandado para cumprimento da finalidade de interesse público a que estão atreladas' (ob. cit., p. 67).

 

A hipótese de supressão ilimitada no valor contratual é que nos leva a compreender melhor os excessos que podem advir da inexistência dessas barreiras.

 

Imagine-se, como exemplo, a disponibilidade de nova tecnologia que pudesse reduzir os custos de determinada obra em 80%. Seria possível à Administração impor ao contratado, unilateralmente, a obrigação de ele adotá-la na execução da obra, reduzindo o valor inicial do contrato na mesma proporção, sem considerar a manifestação de sua vontade ou recusa?

 

Evidente que se trata de uma supressão de valor contratual desarrazoada. Mas o que seria razoável? 70%? 60%? 50% .... 25%?. A fixação desse limite, pensamos, inclui-se na discricionariedade do legislador.

 

Cumpre, aqui, esclarecer que, a fim de não submeter o contratado a alteração contratual unilateral que não seja razoável ou proporcional, a opção que restaria à Administração seria a de rescindir unilateralmente o contrato, nos termos do art. 78, XII, da Lei n º 8.666/93, e proceder a nova licitação e contratar o novo objeto.

 

Referidos limites, em nossa opinião, têm de ser claros, objetivos e preestabelecidos em lei, pois é a partir deles que o possível contratado dimensiona os riscos que deve suportar, na hipótese de uma alteração unilateral imposta pela Administração.

 

Acreditamos até que poucos contratariam com a Administração se não houvesse limites objetivos, claros e fixados em lei a esse poder de alteração unilateral a ela concedido.

 

Chamamos mais uma vez a esclarecedora orientação de CARLOS ARI SUNDFELD:

 

'Ao contratar com a Administração, a empresa privada já sabe que, até certo limite, pode ser constrangida a realizar quantidade de prestações superior à inicialmente estipulada. Quando participa de licitação e, especialmente, quando trava um contrato, deve se preparar para tal eventualidade' ('Contratos Administrativos - Acréscimos de obras e serviços - Alteração', p. 153).

 

Por isso, alinhamo-nos à tese de que as alterações unilaterais qualitativas estão sujeitas aos mesmos limites escolhidos pelo legislador para as alterações unilaterais quantitativas, previstos no art. 65, § 1.º, da Lei 8.666/93, não obstante a falta de referência a eles no art. 65, I, a.

 

Fundamentamo-nos na necessidade de previsão de limites objetivos e claros em Lei, no princípio da proporcionalidade e no respeito aos direitos do contratado, prescrito no art. 58, I, da Lei 8.666/93.

 

Note-se que a supressão, por parte da Administração, de obras, serviços ou compras, que excedam os limites prescritos no art. 65, § 1.º, é também causa de rescisão do contrato, por inexecução pela Administração, conforme prevê o art. 78, XIII, da Lei 8.666/93. O que reforça a nossa tese, de observância a esses limites nas alterações unilaterais, sejam quantitativas ou qualitativas.

 

Embora nossa exemplificação tenha-se baseado na hipótese de supressão de serviços, porque é mais evidente a onerosidade ao contratado, cabe ressaltar que a não-imposição de barreiras aos acréscimos unilaterais pode também ser fonte de ônus desnecessário ao contratado.

 

Vejam-se as palavras de CARLOS ARI SUNDFELD sobre o assunto, in verbis:

 

'Se a Administração pudesse impor ao particular a ampliação desmesurada de suas obrigações, mesmo com a garantia de incremento da remuneração, poderia, em muitos casos, inviabilizar o cumprimento do contrato. É que, de um lado, a empresa pode não ter capacidade operacional para atender ao aumento de suas obrigações; de outro, a realização das prestações acrescidas, pelo mesmo preço unitário previsto no contrato, pode resultar excessivamente onerosa' ('Contratos Administrativos Acréscimos de obras e serviços - Alteração', p. 153).

 

VI

 

Isso não significa, entretanto, que, na realização do interesse público, a Administração não possa, em caráter excepcional, ultrapassar referidos limites.

 

Em nossa opinião, poderia fazê-lo, em situações excepcionalíssimas, na hipótese de alterações qualitativas, revisando, não unilateralmente, mas consensualmente, as obrigações e o valor do contrato.

 

Novamente nos socorremos das lições de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, in verbis:

 

'Embora a lei não o diga, entendemos que, por mútuo acordo, caberia ainda, modificação efetuada acima dos limites previstos no § 1.º do art. 65, se ocorrer verdadeira e induvidosamente alguma situação anômala, excepcionalíssima, ou então perante as chamadas 'sujeições imprevistas'; isto é: quando dificuldades naturais insuspeitadas se antepõem à realização da obra ou serviço, exigindo tal acréscimo' (ob. cit, p. 407).

 

Tais alterações devem ser efetuadas por acordo mútuo - bilaterais -, pois dessa maneira evita-se a excessiva onerosidade nas obrigações do contratado, vez que o novo pacto passa a depender da manifestação de sua vontade.

 

Além de consensuais, sustentamos que tais alterações devem ser necessariamente qualitativas. Estas, diferentemente das quantitativas que não configuram embaraços à execução do objeto como inicialmente avençado -, ou são imprescindíveis ou viabilizam a realização do objeto.

 

Sem a implementação das modificações qualitativas não há objeto e, por conseguinte, não há a satisfação do interesse público primário que determinou a celebração do contrato. Relembrando o exemplo de alterações qualitativas que aduzimos, verifica-se que, sem o acréscimo dos serviços de terraplanagem, não seria possível a realização dos 100km de pavimentação.

 

Distinta é a situação, quando a modificação contratual visa a aumentar a extensão da via de 100 para 150km - alteração quantitativa. Nesse caso, a não-alteração do contrato não impede a realização do interesse público que determinou a sua celebração, pelo menos parcialmente, uma vez que não configura óbice à execução dos 100km da via, inicialmente contratados.

 

Alterações qualitativas são também aquelas decorrentes de modificações de projeto ou de especificações, para melhor adequação técnica aos objetivos da Administração (art. 65, I, a). Objetivo da Administração é a satisfação do interesse público.

 

A modificação do projeto ou especificação pode ser necessária independentemente de o fato motivador ser superveniente ou de conhecimento superveniente. Tal fato, comungando a opinião de ANTÔNIO CARLOS CINTRA DO AMARAL (ob. cit., pp. 128/129), pode ser um 'fato da natureza quanto outro', desde que extrínsecos à relação contratual, pode ser, ainda, o 'domínio de nova tecnologia mais avançada' ou a 'disponibilidade de equipamentos tecnicamente mais aperfeiçoados'.

 

Além de bilaterais e qualitativas, sustentamos que tais alterações sejam excepcionalíssimas, no sentido de que sejam realizadas quando a outra alternativa - a rescisão do contrato, seguida de nova licitação e contratação - significar sacrifício insuportável do interesse coletivo primário a ser atendido pela obra ou serviço. Caso contrário, poder-se-ia estar abrindo precedente para, de modo astucioso, contornar-se a exigência constitucional do procedimento licitatório e a obediência ao princípio da isonomia.

 

Ora, se o interesse coletivo primário exigir a revisão contratual, esta deve ser implementada pela Administração, porque aquele é seu objetivo, ademais indisponível.

 

Sabe-se que a rescisão contratual, por interesse público, com vistas a nova licitação e contratação, a que já se fez referência, traz uma série de conseqüências: a indenização de prejuízos causados ao ex-contratado, como, por exemplo, os custos com a dispensa dos empregados específicos para aquela obra; o pagamento ao ex-contratado do custo da desmobilização; os pagamentos devidos pela execução do contrato anterior até a data da rescisão; a diluição da responsabilidade pela execução da obra; e a paralisação da obra por tempo relativamente longo - até a conclusão do novo processo de contratação e a mobilização do novo contratado -, atrasando o atendimento da coletividade beneficiada.

 

Somente quando tais conseqüências forem gravíssimas ao interesse coletivo primário é que se justificaria a revisão contratual, qualitativa e consensual, que importe em superação dos limites econômico-financeiros previstos nos §§ 1º e 2º da Lei 8.666/93.

 

Ressalve-se somente a hipótese de supressões contratuais quantitativas, além dos limites referidos, em que se exige apenas a consensualidade, nos termos do inciso II, do § 2.º, do art. 65, da Lei 8.666/93, incluído pela Lei 9.648/98.

 

VII

 

Isso posto, com base no art. 1.º, § 2.º, da Lei 8.443/92, e no art. 216 do Regimento Interno, sugerimos que este Tribunal conheça da presente consulta, para responder ao consulente que:

 

a) tanto as alterações contratuais unilaterais quantitativas – que modificam a dimensão do objeto - quanto as unilaterais qualitativas que mantém intangível o objeto, em natureza e em dimensão, estão sujeitas aos limites preestabelecidos nos §§ 1.º e 2.º da Lei 8.666/93, em face do respeito aos direitos do contratado, prescrito no art. 58, I, da mesma Lei, do princípio da proporcionalidade e da necessidade de esses limites serem obrigatoriamente fixados em lei;

 

b) é permitido à Administração ultrapassar os aludidos limites, na hipótese de alterações contratuais consensuais, qualitativas e excepcionalíssimas, no sentido de que só seriam aceitáveis quando, no caso específico, a outra alternativa - a rescisão do contrato por interesse público, seguida de nova licitação e contratação - significar sacrifício insuportável ao interesse coletivo primário a ser atendido, pela obra ou serviço; ou seja, a revisão contratual qualitativa e consensual, que ultrapasse os limites preestabelecidos no art. 65, § 1.º, da Lei 8.666/93, somente seria justificável, no caso concreto, quando as conseqüências da outra alternativa - a rescisão contratual, seguida de nova licitação e contratação - forem gravíssimas ao interesse público primário."

 

2.É o relatório.

 

Voto:  

Consoante assinala a instrução a cargo da 6a SECEX (fls. 6/9), o Aviso ministerial às fls. 1/5 contém diversos elementos, a seguir transcritos, reveladores de que a presente Consulta versa sobre caso concreto:

 

"(...)

 

a) que se trata de uma barragem de terra que está sendo construída sem o desvio do leito do rio, onde a construção do maciço de terra na calha central do rio somente poderá ser feita nos períodos de estiagem obrigando, em vista disso, que o ritmo de construção das obras fique diretamente relacionado ao ciclo hidrológico da área, cuja consequência é a suspensão das referidas obras em terra, durante vários meses do ano;

 

b) que a mencionada obra se encontra em adiantado estágio de execução, mas exige um aditamento ao contrato por alteração dos quantitativos de serviços, em razão da constatação de fatos supervenientes verificados quando das escavações na fundação da barragem;

 

c) que uma mudança no processo construtivo na calha central do rio, previsto no projeto inicial como sendo um maciço de terra, para um maciço de Concreto Compactado a Rolo (CCR) apresentaria, dentre outras, as vantagens abaixo relacionadas:

 

i) (...) acrescente-se que, à época da elaboração do Projeto Básico da barragem, concebido em maciço de terra,  a técnica construtiva de concreto compactado a rolo era pouco  ou quase não utilizada em obras de barragem no Brasil;

 

ii) a possibilidade de estocar água, à medida em que o maciço de CCR vai sendo elevado, o que não ocorreria no caso do processo construtivo ser mantido de acordo com o projeto original, ou seja, barragem de terra. (...) Assim, podem ser destacadas, entre as vantagens econômicas e sociais, a da antecipação de 2 ou 3 anos de acumulação de água na região, a garantia de abastecimento de água para uma população de quase 3 milhões de pessoas, e a segurança do abastecimento de água para grandes projetos industriais, de irrigação e turismo, em vias de implantação na área de abrangência do atendimento previsto para a barragem;

 

iii) (...);

 

d) que os acréscimos tidos como necessários e essenciais para complementar a obra em questão, mantido o processo construtivo do projeto original ou por outro lado modificando-se a tecnologia construtiva para CCR, induzirão elevação dos custos em patamar superior a 25% (vinte e cinco por cento) do valor inicial do contrato, e que não será conveniente tentar resolver o problema mediante uma nova licitação, devido às incertezas próprias dos eventos de licitação.

 

2.Isto posto, e considerando que a obra supracitada é objeto de contrato regido pelo Decreto-Lei n. 2.300/86 (...)".

 

2.Nestas condições, com a devida vênia da douta Procuradoria, estou de acordo com a conclusão da Unidade Técnica, tendo em vista o disposto no art. 217 do Regimento Interno, segundo o qual "o Relator ou o Tribunal não conhecerá de Consulta" que "verse sobre caso concreto, devendo o processo ser arquivado após comunicação ao consulente".

 

3.Essa, aliás, é a jurisprudência predominante deste Tribunal, haja vista as seguintes decisões plenárias, entre outras: Decisão n. 796/96 - in Ata n. 50/96; Decisão n. 331/98 - in Ata n. 20/98; Decisão n. 47/96 - in Ata n. 06/96; Decisão n. 95/93 - in Ata n. 11/93; Decisão n. 91/95 - in Ata n. 09/95.

 

Rejeitada a preliminar de que a Consulta versa sobre caso concreto, vencido que foi este Relator, voto por que se conheça da Consulta para respondê-la nos termos propostos pelo Ministério Público.

 

Assunto:  

III - Consulta

 

Relator:  

JOSÉ ANTONIO B. DE MACEDO

 

Representante do Ministério Público:  

LUCAS ROCHA FURTADO

 

Unidade técnica:  

6ª SECEX

 

Quórum:  

1  Ministros presentes na sessão de 24/03/1999: Iram Saraiva

(Presidente), Marcos Vinicios Rodrigues Vilaça, Humberto Guimarães Souto, Valmir Campelo, Adylson Motta e os Ministros-Substitutos José Antonio Barreto de Macedo (Relator), Lincoln Magalhães da Rocha e Benjamin Zymler.

 

2  Ministros presentes na sessão de 14/04/1999: Iram Saraiva

(Presidente), Adhemar Paladini Ghisi (Revisor), Marcos Vinicios Rodrigues Vilaça, Homero Santos, Humberto Guimarães Souto, Bento José Bugarin, Valmir Campelo, Adylson Motta (Revisor) e Walton Alencar Rodrigues.

 

3  Ministros presentes nesta sessão: Iram Saraiva (Presidente), Adhemar Paladini Ghisi (Revisor), Marcos Vinicios Rodrigues Vilaça, Homero

Santos, Humberto Guimarães Souto, Bento José Bugarin, Adylson Motta (Revisor), Walton Alencar Rodrigues e o Ministro-Substituto Lincoln Magalhães da Rocha.

 

4  Ministro que não votou: Homero Santos (art. 57, parágrafo único, do Regimento Interno).

 

Sessão:  

T.C.U., Sala de Sessões, em 12 de maio de 1999

 

Decisão:  

O Tribunal Pleno, diante das razões expostas pelo Relator, DECIDE:

 

8.1. com fundamento no art. 1º, inciso XVII, § 2º da Lei nº 8.443/92, e no art. 216, inciso II, do Regimento Interno deste Tribunal, responder à Consulta formulada pelo ex-Ministro de Estado de Estado do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, Gustavo Krause Gonçalves Sobrinho, nos seguintes termos:

 

a)             tanto as alterações contratuais quantitativas - que modificam a dimensão do objeto - quanto as unilaterais qualitativas - que mantêm intangível o objeto, em natureza e em dimensão, estão sujeitas aos limites preestabelecidos nos §§ 1º e 2º do art. 65 da Lei nº 8.666/93, em face do respeito aos direitos do contratado, prescrito no art. 58, I, da mesma Lei, do princípio da proporcionalidade e da necessidade de esses limites serem obrigatoriamente fixados em lei;

 

b)             nas hipóteses de alterações contratuais consensuais, qualitativas e excepcionalíssimas de contratos de obras e serviços, é facultado à Administração ultrapassar os limites aludidos no item anterior, observados os princípios da finalidade, da razoabilidade e da proporcionalidade, além dos direitos patrimoniais do contratante privado, desde que satisfeitos cumulativamente os seguintes pressupostos:

 

I                - não acarretar para a Administração encargos contratuais superiores aos oriundos de uma eventual rescisão contratual por razões de interesse público, acrescidos aos custos da elaboração de um novo procedimento licitatório;

 

II               - não possibilitar a inexecução contratual, à vista do nível de capacidade técnica e econômico-financeira do contratado;

 

III             - decorrer de fatos supervenientes que impliquem em dificuldades não previstas ou imprevisíveis por ocasião da contratação inicial;

 

IV            - não ocasionar a transfiguração do objeto originalmente contratado em outro de natureza e  propósito diversos;

 

V              - ser necessárias  à completa execução do objeto original do contrato, à otimização do cronograma de execução e à antecipação dos benefícios sociais e econômicos decorrentes;

 

VI            - demonstrar-se - na motivação do ato que autorizar o aditamento contratual que extrapole os limites legais mencionados na alínea "a", supra - que as consequências da outra alternativa (a rescisão contratual, seguida de nova licitação e contratação) importam sacrifício insuportável ao interesse público primário (interesse coletivo) a ser atendido pela obra ou serviço, ou seja gravíssimas a esse interesse; inclusive quanto à sua urgência e emergência;

 

8.2.  encaminhar à autoridade consulente cópia do inteiro teor desta

Decisão, bem como dos Relatórios e Votos que a fundamentaram;

 

8.3.  determinar o arquivamento do presente processo.

 

Revisor:  

PROSSEGUIMENTO DE VOTAÇÃO SUSPENSA  EM  FACE DE PEDIDO DE VISTA

 

Inteiros teores do Relatório e Voto emitido pelo Relator,

Ministro-Substituto José Antonio Barreto de Macedo,  na Sessão de

24.03.1999 (Ata nº 10/1999),  do Voto do 1º Revisor, Ministro Adylson

Motta, na Sessão de 14.04.1999 (Ata nº 14/1999) e do Voto 2º Revisor,

Ministro Adhemar Paladini Ghisi proferido nesta Sessão, e, ainda,  da Decisão nº 215/99,  aprovada, por unanimidade,  uma vez que o Relator, Ministro-Substituto José Antonio Barreto de Macedo que se encontra de férias, aderira à proposta apresentada pelo 1º Revisor, referente à Consulta formulada pelo ex-Ministro de Estado do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, sobre a possibilidade de alteração de contrato administrativo em valor que excederia os limites estabelecidos na Lei nº 8.666/93 (Proc. nº 930.039 1998-0).

 

VOTO REVISOR

 

Como consignado no bem lançado Relatório, os presentes autos tratam de consulta do então Ministro de Estado do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, Dr. Gustavo Krause Gonçalves Sobrinho, a respeito da viabilidade de enquadramento da modificação do método construtivo como alteração qualitativa, prevista no art. 65, inciso I, alínea "a", da Lei nº 8.666/93, e de sua sujeição aos limites prescritos no § 1º do mesmo artigo.

 

Para a formulação das questões que submete à apreciação desta Corte, embora não faça referência a nomes e lugares, aquela autoridade faz minucioso relato da execução de um contrato firmado sob a égide do Decreto-lei nº 2.300/86, cujo objeto é a construção de uma barragem. Segundo o consignado, a obra encontra-se em adiantado estado de execução, mas, em razão de fatos supervenientes, precisa de acréscimos que ultrapassam o limite de 25% do valor inicial do contrato. A adoção de um novo método construtivo, embora não contribuísse para a redução dos referidos acréscimos ao limite legal, traria como vantagens a diminuição do prazo de conclusão da obra e o início antecipado da acumulação de água na barragem, sem qualquer comprometimento técnico ou de segurança.

 

Ao final, submete a este Tribunal as questões sintetizadas a seguir:

 

a)  pode-se fazer aditamento ao contrato inicial para se alterar o

método construtivo, sem alteração do seu objeto?

 

b)  tal aditamento, ainda que acarrete aumento ou supressão na obra, está sujeito aos limites estabelecidos no art. 55, § 1º , do Decreto-lei nº 2.300/86?

 

O ilustre representante do Ministério Público junto a esta Corte, com seu costumeiro brilhantismo, enfrenta corajosamente essas questões tormentosas, resultando valiosa contribuição para seu deslinde.

 

Considerando a ressalva do art. 121 da Lei nº 8.666/93, que determina a aplicação de regras vigentes de alteração contratual aos contratos firmados sob o abrigo do Decreto-lei nº 2.300/86, primeiramente entende, com toda razão, que o resultado da tarefa de interpretação das normas atualmente aplicáveis não perde sua validade pelo fato de o contrato hipotético sub examine ter sido assinado com arrimo na pretérita lei de licitações.

 

Entende que a mutabilidade é da própria natureza do contrato administrativo, cujo fundamento é a supremacia do interesse público e sua indisponibilidade. No entanto, as alterações contratuais ilimitadas ferem o senso comum e o Direito, pois os limites legais são a garantia do respeito dos princípios da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato e da obrigatoriedade de licitação.

 

Constata que a referência legal aos limites é expressa quanto às alterações quantitativas (art. 65, inciso I, alínea "b"), mas que, ao tratar das alterações qualitativas, a lei é omissa. Não obstante, defende que tais limites podem ser deduzidos a partir da ressalva aos direitos dos contratados feita pelo art. 58, inciso I, in fine, em conjunto com o princípio da proporcionalidade do atos da Administração.

 

No que concerne à segunda questão, adota o posicionamento de que a Administração, na realização do interesse público, pode excepcionalmente ultrapassar esses limites em comum acordo com o contratado, desde que tais alterações sejam qualitativas, ou seja, imprescindíveis ou viabilizadoras da realização do objeto. Isto se dá porque sem a implementação das alterações qualitativas não há satisfação do interesse público que determinou a celebração do contrato. Ressalta, no entanto, que tais alterações devem ser excepcionalíssimas e só devem ser adotadas quando a rescisão do contrato e suas repercussões financeiras, seguida de nova licitação e contratação, significar sacrifício insuportável do interesse coletivo primário a ser atendido, pois, do contrário, poder-se-ia configurar fuga da exigência constitucional do procedimento licitatório e da obediência ao princípio da isonomia.

 

Face às razões sumariadas nos parágrafos anteriores, com o acolhimento do eminente Ministro-Relator, propõe responder à autoridade consulente que:

 

"a) tanto em alterações contratuais unilaterais quantitativas - que modificam a dimensão do objeto -, quanto as unilaterais qualitativas que mantém intangível o objeto, em natureza e em dimensão  -, estão sujeitas aos limites preestabelecidos nos § § 1º e 2º do art . 65 da lei 8.666/93, em face do respeito aos direitos do contratado, prescrito no art. 57, I, da mesma Lei, do princípio da proporcionalidade e da necessidade de esses limites serem obrigatoriamente fixados em lei;

 

b) é permitido à Administração ultrapassar os aludidos limites, na hipótese de alterações contratuais consensuais, qualitativas e excepcionalíssimas, no sentido de que só seriam aceitáveis quando, no caso específico, a outra alternativa - a rescisão do contrato por interesse público, seguida de nova licitação e contratação - significar sacrifício insuportável ao interesse coletivo a ser atendido, pela obra ou serviço; ou seja, a revisão contratual qualitativa e consensual, que ultrapasse os limite preestabelecidos no art. 65, § 1º , da Lei 8.666/93, somente seria justificável, no caso concreto, quando as conseqüências da outra alternativa - a rescisão contratual, seguida de nova licitação e contratação - forem gravíssimas ao interesse público primário".

 

II

 

Como afirma o Professor Adilson Abreu Dallari, a doutrina é pacífica em afirmar que o contrato administrativo tem como característica identificadora a instabilidade do vínculo, cuja permanência e condições se subordinam às variáveis imposições do interesse público, sem prejuízo da salvaguarda dos interesses patrimoniais privados do contratado. O autor, arrimando-se na lição do célebre administrativista Celso Antônio Bandeira de Mello, distingue-o com maestria dos contratos privados em uma frase que considero lapidar: "a imutabilidade das cláusulas do contrato privado converte-se, no âmbito administrativo, em imutabilidade do fim" (1)

 

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(1) DALLARI, Adilson Abreu, Limites à Alterabilidade do Contrato de Obra Pública, in BLC, V. 9, Nº 10, p. 465.

 

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Tal fim público consubstancia-se na consecução do objeto da avença, cuja conceituação considero ser o verdadeiro ponto de partida para a elucidação das questões respondidas com grande habilidade pelo digno representante do Ministério Público junto a esta Corte.

 

Na lição de Marçal Justen Filho,

 

"O objeto do contrato é o seu núcleo. Consiste nas pretensões que as partes se obrigam a realizar. O objeto imediato do contrato administrativo é a conduta humana (consistente em um dar, fazer ou não fazer). O objeto mediato do contrato administrativo é o bem jurídico sobre o qual versa a prestação de dar, fazer ou não fazer"(2)

 

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JUSTEN FILHO, Marçal, Comentários à Lei de Licitações e Contratos

Administrativos, Aide Editora, 4ª edição, Rio de Janeiro, 1996, P. 349.

 

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Pode-se asseverar, com base nos doutrinadores, que o objeto mediato possui como elementos a natureza, imutável por força dos princípios da obrigatoriedade de licitação e da isonomia que regem as licitações, e a dimensão, que pode ser passível de alteração para o atendimento do interesse público primário, ressalvados os direitos dos contratados (3) Esta peculiaridade, a meu ver, determina as características das alterações quantitativas e qualitativas.

 

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(3) SUNDFELD, Carlos Ari, Contratos Administrativos - Acréscimo de Obras e Serviços - Alteração, in RTDP, p. 156.

 

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Permitindo-me não me alongar demasiadamente em definições já exaustivamente explanadas, posso afirmar que as alterações qualitativas decorrem de modificações necessárias ou convenientes nas quantidades de obras e serviços, consistentes na obrigação de fazer contraída pelo contratado (objeto imediato), sem, no entanto, implicarem mudanças na natureza e dimensão do objeto mediato (exempli gratia, a construção visada).

 

Baseando-se no mestre venezuelano Alan Randolph Brewer-Carias, Dallari afirma que as alterações qualitativas "comportam uma subdivisão em obras extras, complementares ou novas. São obras extras aquelas compreendidas nos planos e especificações, mas não computadas no orçamento. São obras complementares as que não figuram nem nos planos, nem nos orçamentos, mas cuja execução é essencial para o perfeito funcionamento da obra. São obras novas as modificações ordenadas pelo contratante" (4)

 

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(4) DALLARI, Adilson Abreu, Limites à Alterabilidade ..., cit,. p. 469

 

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As alterações qualitativas, portanto, visam apenas à consecução ótima do objeto mediato, que se mantém inalterado em sua natureza e dimensão, por meio do aumento ou supressão do objeto imediato, utilizando-se de obras extras, complementares ou novas em relação às já contratadas, e também requerem, via de regra, mudanças no valor original do contrato. Por sua vez, as alterações quantitativas visam à modificação na dimensão do objeto mediato igualmente por meio do aumento e supressão do objeto imediato e acarretam invariavelmente abalos na equação econômico-financeira do vínculo contratual.

 

A leitura do art. 65, § 1º, leva-nos a constatar que, não obstante aparentemente referir-se somente às alterações quantitativas, esse dispositivo utiliza-se do termo "obras" que, consoante se depreende do art. 6º , inciso I, enquadra-se com perfeição no conceito de objeto imediato ( toda "construção", ou seja, ação de construir; "reforma", ação de reformar etc.). Ademais, tal preceptivo utiliza-se do valor do contrato e não da prestação correspondente (objeto imediato) como parâmetro sobre o qual incidirá os percentuais-limite de 25% e 50 %. À vista das razões apresentadas no Parecer e do fato de que as alterações qualitativas também implicam aumentos e supressões de obras e serviços para a consecução do objeto mediato, originadas pela "modificação do projeto ou das especificações, para melhor adequação técnica aos seus objetivos" (art. 65, inciso I, alínea "a"), perfilho o posicionamento de que nenhum óbice se apresenta à aplicação da referida norma às alterações qualitativas. (5)

 

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(5) DALLARI, Adilson Abreu, Limites à Alterabilidade"..., cit., p. 467.

 

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Essas, por abranger apenas o objeto imediato, mantidas a natureza e dimensão do objeto mediato, quase sempre significarão um aumento ou supressão em obras e serviços que tornam possível a obtenção do objeto mediato, com os conseqüentes reflexos financeiros no contrato. Logo, repito, não vejo nenhum empecilho em se estender a esses casos a observância dos limites prescritos no art. 65, § 1º , da Lei de

Licitações e acolho o entendimento do douto representante do Ministério Público.

 

III

 

No que concerne à segunda questão colocada pela autoridade, sobre se as alterações qualitativas estão sujeitas aos limites estabelecidos na lei de licitações , deve-se primeiramente afirmar que a lei vigente, ao suprimir a anterior possibilidade de as alterações quantitativas ultrapassassem os limites de 25 e 50%, demostrou claramente sua intenção de coibir as práticas abusivas até então efetivadas com base no Decreto-lei nº 2.300/86. Embora não digam respeito diretamente às alterações qualitativas, visto que o novo e atual tratamento a elas reservado pela lei vigente possui características e finalidades próprias (6) entendo que é um claro sinal de que o aditamento de alterações qualitativas ao objeto fora dos limites legais deve ser considerado sob o ângulo da estrita excepcionalidade, com a fixação necessária de limites implícitos e explícitos à atividade discricionária dela decorrente.

 

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(6)  TÁCITO, Caio, Contrato Administrativo: Alteração Quantitativa e Qualitativa; Limites de Valor, in BLC, V. 10, Nº 3, p. 118.

 

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A esse respeito, ressalta dos autos a peculiaridade da questão posta pelo Consulente, que consiste no fato de que a hipotética alteração qualitativa, embora não contribuísse para a redução dos referidos acréscimos ao limite legal, traria como vantagens a diminuição do prazo de conclusão da obra e o início antecipado da acumulação de água na barragem. Entendo que esta particularidade, por si só, não tem o condão de justificar a superação dos limites legais de alteração contratual.

Vivemos em um país com enormes carências crônicas de toda ordem, com emergências e urgências constantes na alocação de recursos públicos em várias áreas prioritárias como saúde, educação e segurança, e nessas circunstâncias é muito temerário afirmar com segurança se a satisfação do interesse público primário se dá pelo satisfação incontinenti de necessidades específicas de um grupo social determinado ou se pela busca do melhor preço pela Administração por meio de nova licitação, dando maior poder de compra aos parcos recursos públicos e possibilitando a satisfação desta e de outras carências tão prementes quanto a primeira.

 

Quanto aos casos em que o fator tempo é preponderante para a satisfação eficiente do interesse público primário, entendo que eles se restringem apenas às hipóteses legalmente reguladas de dispensa de licitação,

desde que atendidos os requisitos da urgência, estado de calamidade etc. (art. 24, inciso IV). Logo, descabe aventar, de forma exclusiva, a diminuição do prazo de conclusão como razão suficiente para o aditamento além dos limites legais.

 

Com relação a esses limites, verifica-se inegável preocupação da doutrina em identificá-los e fixá-los. Na lição de Caio Tácito, embora a mutabilidade seja característica inconteste do contrato administrativo e a atividade de alteração unilateral qualitativa figurar no âmbito da discricionariedade, essa faculdade da Administração não é livre, depende da ocorrência comprovada de determinados pressupostos. (7)

 

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(7) DALLARI, Adilson Abreu, Limites à Alterabilidade..., cit., p. 467.

 

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Com o arrimo na preleção de doutrinadores como Marçal Justen Filho, Adilson Dallari, Carlos Ari Sundfeld, Sérgio Ferraz e Brewer-Carias, verifica-se que o primeiro deles é a basilar observância do princípio constitucional da obrigatoriedade de licitação e da isonomia, e o respeito necessário aos direitos patrimoniais do contratante privado, além dos princípios da finalidade, da razoabilidade e da proporcionalidade

 

Considerados tais balisadores como limites gerais às alterações qualitativas, eles têm como conseqüência a restrição das modificações qualitativas, além dos limites legais estabelecidos, apenas à hipótese de ocorrência cumulativa dos seguintes pressupostos: a) não acarretar para a Administração encargos contratuais superiores aos oriundos de uma eventual rescisão contratual por razões de interesse público acrescidos aos custos da elaboração de um novo procedimento licitatório; e b) não possibilitar a inexecução contratual, à vista do nível de capacidade técnica e econômico-financeira do contratado.

 

As modificações qualitativas devem ser decorrentes de fatos supervenientes que impliquem em "dificuldades não previstas ou imprevisíveis por ocasião do pacto inicial", devendo corresponder ainda a uma alteração de circunstâncias fáticas levadas em consideração por ocasião da avença.(8) A Administração há que também evidenciar que "a solução localizada na fase da licitação não se revelou, posteriormente, como a mais adequada". No entanto, a modificação decorrente não pode ser de vulto tal que venha a transfigurar o objeto original em outro, frustrando os princípios da obrigatoriedade de licitação e da isonomia.(9)

 

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(8)     SUNDFELD, Carlos Ari, Contratos Administrativos..., cit., p. 159 eDALLARI, Adilson Abreu, "Limites à Alterabilidade..., cit., p. 470.

 

(9)     DALLARI, Adilson Abreu, Limites à Alterabilidade..., cit., p.469/470; JUSTEN FILHO, Marçal, ob. cit., p. 394; e TÁCITO, Caio, Contrato Administrativo..., cit., p. 118.

 

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Brewer-Carias, citado por Dallari,  aventa ainda como limite derivado das regras que informam as contratações administrativas o princípio da boa-fé contratual, consistente no dever da Administração de respeitar a equação econômico-financeira avençada e do contratado em não se evadir das obrigações assumidas, incluídos os encargos suplementares ("os contratos devem ser executados de boa-fé, sem que uma parte procure levar vantagem em detrimento da outra") (10)

 

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(10)  DALLARI, Adilson Abreu, Limites à Alterbilidade..., cit., pp. 469,

470, 471; e BANDEIRA MELLO, Celso Antônio, Curso de Direito Administrativo. Editora Malheiros, 4ª edição, São Paulo, 1993, pp.

296/297.

 

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Carlos Ari Sundfeld sintetiza "as condições em que, sem qualquer violação das normas constitucionais, os contratos administrativos admitem alteração, para acréscimo de quantidades, acima de 25% do valor original (ou 50%, no caso de reforma)", sob a forma seguinte:

 

"a) deve-se tratar de contrato de obras ou serviços;

 

b)  a alteração há de ser feita por acordo de vontades;

 

c)  não pode haver mudança na natureza da prestação prevista no contrato;

 

d)  não pode haver ampliação da dimensão do objeto contratado, mas apenas aumento da quantidade de trabalhos necessários à sua cabal execução;

 

e)  os trabalhos a serem acrescidos devem ser motivados por dificuldades de ordem técnica não previstas e razoavelmente imprevisíveis desde o início;

 

f)    os novos trabalhos devem ser necessários e indispensáveis à completa execução do objeto original do contrato" (11)

 

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(11) SUNDFELD, Carlos Ari, "Contratos Administrativos"..., cit., p.

160.

 

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IV

 

Como visto, as conclusões doutrinárias transcritas em nada destoam da apresentada pelo douto Procurador-Geral em exercício. Todavia, dispõe o § 2º do art. 1º da Lei Orgânica que a resposta à consulta tem caráter normativo e constitui prejulgamento da tese, e isto me faz apreensivo quanto aos efeitos da resposta proposta por Sua Excelência no que pertine à segunda questão examinada. Entendo que estabelecer simplesmente que "a revisão contratual qualitativa e consensual, que ultrapasse os limite preestabelecidos no art. 65, § 1º , da Lei 8.666/93, somente seria justificável, no caso concreto, quando as conseqüências da outra alternativa - a rescisão contratual, seguida de nova licitação e contratação - forem gravíssimas ao interesse público primário", é deixar desidiosamente ao talante do administrador, sem a observância de quaisquer limites a sua atividade discricionária, a verificação da ocorrência ou não de graves prejuízos ao interesse público primário, o que certamente poderá ensejar abusos inadmissíveis. Se a quaestio juris ainda não tivesse sido suficientemente analisada pelos especialistas, talvez poder-se-ia adotá-la como ponto de partida para uma ulterior construção jurisprudencial, mas, como demonstrado exaustivamente nos parágrafos anteriores, há farta doutrina no sentido de delimitação de pressupostos para o exercício dessa faculdade deferida à Administração pelo ordenamento jurídico brasileiro.

 

Isto posto, Voto por que o Tribunal adote a Decisão que ora submeto a deliberação deste Plenário.

 

T.C.U., Sala das Sessões, em 14 de abril de 1999.

 

ADYLSON MOTTA

 

Ministro-Revisor

 

VOTO REVISOR

 

A matéria tratada nos presentes autos é, de fato, conforme salientado pelo ilustre Representante do Ministério Público, Procurador-Geral em exercício Dr.  Lucas Rocha Furtado, de extrema relevância para a Administração Pública. Assim entendido, e considerando que estive ausente da Sessão deste Colegiado, realizada em 24.03.99, oportunidade em que, pela primeira vez, foi esta Consulta apreciada, solicitei vista dos autos para que pudesse, de forma mais aprofundada, inteirar-me das questões então discutidas.

 

2.Gostaria de registrar, inicialmente, que, no  concernente  à preliminar de conhecimento, apesar de já ultrapassada naquela assentada, conforme Decisão nº 101/99 - TCU - Plenário, entendo não terem sido preenchidos os requisitos estabelecidos no art. 216 do Regimento Interno. Logo, em assim sendo, não deveria ser conhecida a Consulta, haja vista conter todos os elementos de caso concreto, aliás, fato reconhecido tanto pelos ilustres Ministros que atuaram nos autos, como pelo Representante do Ministério Público. Todavia, uma vez superada essa etapa, não caberia retomar tal discussão.

 

3.Permito-me, pois,  na fase atual dos exames, tecer algumas considerações acerca da tese defendida pelo ilustre Órgão  do Ministério Público e pelo eminente  Ministro Adylson Motta. Com efeito, ressalto que o ponto tido como determinante para o deslinde da matéria - o interesse público - há que ser identificado caso a caso, diante das situações fáticas específicas oportunamente  colocadas.

 

4. Valho-me para tanto dos ensinamentos do administrativista Celso

Antônio Bandeira de Mello que, em sua obra, "Curso de Direito Administrativo", Malheiros Editores, 5ª edição, preleciona, ao discorrer sobre o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado: "Quem exerce 'função administrativa' está adstrito a satisfazer interesses públicos, ou seja, interesses de outrem: a coletividade. Por isso, o uso de prerrogativas da Administração é legítimo se, quando e na medida indispensável ao atendimento dos interesses públicos; vale dizer, do povo, porquanto nos Estados democráticos o poder emana do povo e em seu proveito terá de ser exercido." E prossegue, após distinguir o interesse primário do secundário, este relacionado ao Estado, à Administração, e aquele, aos interesses da coletividade como um todo: "Não estaria, entretanto, atendendo ao interesse público, ao interesse primário, isto é, àquele que a lei aponta como sendo o interesse da coletividade: o da observância da ordem jurídica estabelecida a título de bem curar o interesse de todos."

 

5.Nesse sentido, considerando, portanto, que, em Estados democráticos de direito, há que se buscar resguardar o cumprimento das leis, perseguindo-se, como corolário natural, a segurança jurídica das relações estabelecidas na sociedade, o interesse público, em princípio, estará sempre estampado nos textos legais aprovados pelo Congresso Nacional, como decorrência da expressão máxima da vontade do povo. A propósito, define o citado autor: "Interesse público ou primário é o pertinente à sociedade como um todo e só ele pode ser validamente objetivado, pois este é o interesse que a lei consagra e entrega à compita do Estado como representante do corpo social."

 

6.Por conseguinte, em respeito à busca incessante da manutenção do Estado Democrático de Direito, julgo mais apropriado, em princípio, reservar-se a esta Corte de Contas o direito de exercer sua competência legal de manifestar-se em processos de consultas, exarando entendimento de caráter normativo, apenas e tão-somente, na forma especificada na Lei Orgânica e no Regimento Interno deste Tribunal, ou seja, quando a consulta não versar sobre caso concreto.

 

7.Por essas razões e tendo em vista que a Consulta trouxe ao descortino desta Corte uma questão concreta, entendo que a  mesma  não pode e não deve ser respondida em tese,  especialmente  em face da necessidade de que seja identificado o interesse público em cada um dos casos específicos submetidos à apreciação deste Tribunal, para que se possa, então, em cada situação particular, verificar a aplicabilidade da tese sustentada pelo ilustre Representante do  Ministério Público e pelo ilustre  Ministro.

 

8.Por outro lado, estudada a questão sob a ótica do caso concreto aqui versado, salientando-se, em especial, o cuidado e a profundidade com que a matéria foi abordada pelo  Sr. Procurador-Geral em exercício, Dr. Lucas Rocha Furtado e pelo Senhor  Ministro Adylson Motta, julgo de todo apropriada a aplicação do entendimento então defendido à obra descrita na peça consultiva. Na situação presente, restou demonstrado o interesse público no acréscimo pretendido, razão que me faz opinar por que se responda à autoridade consulente, no caso concreto descrito nos autos, em caráter excepcional, nos termos já sugeridos pelo Ministro 1º Revisor.

 

9.Outrossim,  com o objetivo de contribuir para o aperfeiçoamento do

texto  oferecido pelo ilustre Ministro Adylson Motta,  consoante a posição por nós assumida neste processo, constante deste Voto Revisor, sugerimos as alterações parciais dos textos do item 8.1, letra b, itens IV e V, e do item 8.2, conforme nossa proposta de Decisão Anexa.

 

10.Acompanhando, no mérito, portanto, o ilustre Representante do Ministério Público, Procurador-Geral em exercício Dr. Lucas Rocha Furtado, e o Ministro Adylson Motta, que tão brilhantemente defenderam a tese trazida à discussão deste Colegiado, Voto por que o Tribunal adote a Decisão que ora submeto à deliberação deste Plenário.

 

T.C.U., Sala das Sessões Ministro Luciano Brandão Alves de Souza, em 12 de maio de 1999.

 

ADHEMAR PALADINI GHISI

 

Ministro-Relator

 

ADYLSON MOTTA

 

Ministro-Revisor

 

 

Caros pregoeiros e licitantes, a melhor fonte de conhecimento sobre licitações se chama TCU - Tribunal de Contas da União. Leiam atentamente os acórdãos do TCU, pois eles trazem ensinamentos e recomendações importantíssimos, e tenham a certeza de estarem realizando um grande serviço à sociedade.

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