sexta-feira, 19 de outubro de 2018

Contratos celebrados entre entidades pertencentes à Administração Pública


Nos contratos celebrados entre entidades pertencentes à Administração Pública, são inaplicáveis as cláusulas exorbitantes, previstas nos arts. 58 e 59 da Lei 8.666/1993, porquanto se trata de avenças acordadas por entidades detentoras de prerrogativas de Poder Público, onde há situação de igualdade entre as partes. Assim, qualquer alteração em contratos da espécie somente pode ocorrer por acordo das partes, não havendo espaço, ainda, para anulação ou rescisão pela via administrativa.
Em representação autuada com o objetivo de apreciar questões afetas ao contrato celebrado entre a Petrobras, o Estado de Pernambuco e o Complexo Industrial Portuário Governador Eraldo Gueiros (Suape), tendo por objeto o estabelecimento das “condições em que seriam operacionalizados os investimentos por Suape no Porto de Suape com recursos do adiantamento de tarifa promovido pela Petrobrás em favor de Suape, definir a sistemática de compensação desse adiantamento; e estabelecer as responsabilidades de cada uma das partes”, o TCU identificou, entre outras irregularidades, a “adoção de metodologia e/ou parâmetros econômicos inadequados para a definição da viabilidade econômico-financeira do empreendimento”. Segundo o ajuste, o Estado de Pernambuco e Suape assumiriam a obrigação de utilizar os recursos repassados pela Petrobras, a título de adiantamento de tarifas portuárias, para construir a infraestrutura do Pier de Granéis Líquidos 3. O ponto principal de análise e discussão foi a adequação do valor da tarifa portuária a ser cobrada da Petrobras. O auditor responsável pela instrução propôs determinação à Petrobras para que fosse realizado aditivo ao contrato, “a fim de restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro da avença, excluindo o valor da tarifa da tabela 3 (subitem 3.1.1 - Mercadorias a granel no PGL por tonelada ou fração) do Porto de Suape do cálculo de reembolso do adiantamento dos recursos por meio do TAT [Termo de Adiantamento de Tarifas], uma vez que não há incidência deste preço na transferência dos produtos do píer (PGL-3) à Rnest, que se localiza fora do porto organizado, recalculando as toneladas para fins de ressarcimento dos valores transferidos por meio do TAT”. Os dirigentes da unidade técnica, por sua vez, entenderam não ser possível concluir pela inadequação da tarifa cobrada, propondo recomendação à Petrobras no sentido de avaliar “a conveniência e a oportunidade de renegociar [...] os termos de cobrança da Tabela 3 do Porto de Suape, referente à cobrança de infraestrutura terrestre, no intuito de obter desconto em relação aos itens da composição da referida tarifa portuária não incorridos pela sua planta logística, o que contribuiria para a maior realidade tarifária da contratação”. Ao enfrentar a matéria, o relator, concordando em parte com a unidade técnica, observou que, embora “a Petrobras não utilize ou utilize de forma reduzida a infraestrutura terrestre do porto, [...] a parcela da tarifa da tabela 3 serve para custear utilidades que, em tese, a Petrobras, na condição de usuária, de algum modo usufrui, de forma direta ou indireta”. Apesar disso, ponderou que a cobrança da tarifa em seu valor cheio não se mostrava adequada, tendo em vista “que a Petrobras não utilizará, como os demais usuários do porto, as instalações de armazenagem e demais utilidades existentes no Porto e, ainda, aparentemente não movimentará a infraestrutura terrestre na extensão de um usuário que movimenta granéis sólidos e contêineres, por exemplo, parece despropositada a inclusão do valor integral da aludida tarifa na equação matemática realizada para a definição da carga objeto de compensação”. Desse modo, concluiu que as partes deveriam ser instigadas a encontrar “um valor compatível às peculiaridades da movimentação de carga realizada pela Rnest”, sendo inapropriada a expedição de determinação à Petrobras para a celebração de aditivo visando o reestabelecimento do equilíbrio econômico e financeiro do contrato, tendo em vista o ajuste ser regido predominantemente por normas de direito privado e o disposto “no art. 58, § 1º, da Lei 8.666/1993, que estabelece que as cláusulas econômico-financeiras e monetárias dos contratos administrativos não poderão ser alteradas sem prévia concordância do contratado”. No entanto, prosseguiu, “não haveria óbice jurídico para que o TCU determinasse não a celebração de aditivo, mas a realização de tratativas junto à Suape visando a sua efetivação – obrigação de meio, não de fim. Nessa hipótese, o insucesso na negociação poderia ensejar determinação para que a Petrobras anulasse o contrato, tendo em vista a sua lesividade ao erário federal. Ocorre que o presente ajuste possui relevante especificidade que impede a adoção dessa medida terminativa. Considerando que Suape é uma empresa pública do Estado de Pernambuco, nos termos da Lei Estadual 7.763, de 7 de novembro de 1978, e que o referido ente subnacional também é parte do Contrato 8500.0000011.09‑4, todas as partes do ajuste pertencem à Administração Pública, ou seja, detêm prerrogativas de Poder Público. Com isso, diante da situação de igualdade das partes do ajuste em análise, são inaplicáveis as cláusulas exorbitantes especificadas nos arts. 58 e 59 da Lei 8.666/1993. Nesse sentido, qualquer alteração no aludido ajuste, somente pode ocorrer por acordo entre as partes, não havendo espaço, ainda, para anulação ou rescisão pela via administrativa”. Por fim, considerando que apenas a Petrobras encontra-se sob a jurisdição do TCU, o relator concluiu que “a única medida processual cabível, diante da cobrança da tarifa em seu valor cheio, é instar a entidade a percorrer a via negocial, ou seja, buscar um acordo amigável com o Estado de Pernambuco e Suape, objetivando obter alguma redução no valor da aludida tarifa”. Assim, acolhendo o voto apresentado, o Plenário decidiu expedir determinação à Petrobras no sentido de promover tratativas junto ao Estado de Pernambuco e a Suape quanto aos termos de cobrança de tarifa relativa à infraestrutura terrestre, no intuito de obter desconto em relação aos itens da composição da referida tarifa portuária não incorridos pela sua planta logística, o que contribuiria para a maior realidade tarifária da contratação. No caso de insucesso na negociação, conforme a determinação encaminhada, a Estatal deve avaliar a oportunidade e conveniência de submeter a matéria aos órgãos e entidades responsáveis pela arbitragem de conflitos.
Acórdão 1953/2018 Plenário, Representação, Relator Ministro Benjamin Zymler.