Nos contratos celebrados entre
entidades pertencentes à Administração Pública, são inaplicáveis as cláusulas
exorbitantes, previstas nos arts. 58 e 59 da Lei 8.666/1993, porquanto se
trata de avenças acordadas por entidades detentoras de prerrogativas de Poder
Público, onde há situação de igualdade entre as partes. Assim, qualquer
alteração em contratos da espécie somente pode ocorrer por acordo das partes, não
havendo espaço, ainda, para anulação ou rescisão pela via administrativa.
Em
representação autuada com o objetivo de apreciar questões afetas ao contrato
celebrado entre a Petrobras, o Estado de Pernambuco e o Complexo Industrial
Portuário Governador Eraldo Gueiros (Suape), tendo por objeto o estabelecimento
das “condições em que seriam
operacionalizados os investimentos por Suape no Porto de Suape com recursos do
adiantamento de tarifa promovido pela Petrobrás em favor de Suape, definir a
sistemática de compensação desse adiantamento; e estabelecer as
responsabilidades de cada uma das partes”, o TCU identificou, entre outras
irregularidades, a “adoção de metodologia
e/ou parâmetros econômicos inadequados para a definição da viabilidade econômico-financeira
do empreendimento”. Segundo o ajuste, o Estado de Pernambuco e Suape
assumiriam a obrigação de utilizar os recursos repassados pela Petrobras, a
título de adiantamento de tarifas portuárias, para construir a infraestrutura
do Pier de Granéis Líquidos 3. O ponto principal de análise e discussão foi a
adequação do valor da tarifa portuária a ser cobrada da Petrobras. O auditor
responsável pela instrução propôs determinação à Petrobras para que fosse
realizado aditivo ao contrato, “a fim de
restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro da avença, excluindo o valor da
tarifa da tabela 3 (subitem 3.1.1 - Mercadorias a granel no PGL por tonelada ou
fração) do Porto de Suape do cálculo de reembolso do adiantamento dos recursos
por meio do TAT [Termo de Adiantamento de Tarifas], uma vez que não há incidência deste preço na transferência dos
produtos do píer (PGL-3) à Rnest, que se localiza fora do porto organizado,
recalculando as toneladas para fins de ressarcimento dos valores transferidos
por meio do TAT”. Os dirigentes da unidade técnica, por sua vez, entenderam
não ser possível concluir pela inadequação da tarifa cobrada, propondo
recomendação à Petrobras no sentido de avaliar “a conveniência e a oportunidade de renegociar [...] os termos de cobrança da Tabela 3 do Porto
de Suape, referente à cobrança de infraestrutura terrestre, no intuito de obter
desconto em relação aos itens da composição da referida tarifa portuária não
incorridos pela sua planta logística, o que contribuiria para a maior realidade
tarifária da contratação”. Ao enfrentar a matéria, o relator, concordando
em parte com a unidade técnica, observou que, embora “a Petrobras não utilize ou utilize de forma reduzida a infraestrutura
terrestre do porto, [...] a parcela
da tarifa da tabela 3 serve para custear utilidades que, em tese, a Petrobras,
na condição de usuária, de algum modo usufrui, de forma direta ou indireta”. Apesar
disso, ponderou que a cobrança da tarifa em seu valor cheio não se mostrava
adequada, tendo em vista “que a Petrobras
não utilizará, como os demais usuários do porto, as instalações de armazenagem
e demais utilidades existentes no Porto e, ainda, aparentemente não movimentará
a infraestrutura terrestre na extensão de um usuário que movimenta granéis
sólidos e contêineres, por exemplo, parece despropositada a inclusão do valor
integral da aludida tarifa na equação matemática realizada para a definição da
carga objeto de compensação”. Desse modo, concluiu que as partes deveriam
ser instigadas a encontrar “um valor
compatível às peculiaridades da movimentação de carga realizada pela Rnest”,
sendo inapropriada a expedição de determinação à Petrobras para a celebração de
aditivo visando o reestabelecimento do equilíbrio econômico e financeiro do
contrato, tendo em vista o ajuste ser regido predominantemente por normas de
direito privado e o disposto “no art. 58,
§ 1º, da Lei 8.666/1993, que
estabelece que as cláusulas econômico-financeiras e monetárias dos contratos
administrativos não poderão ser alteradas sem prévia concordância do contratado”.
No entanto, prosseguiu, “não haveria
óbice jurídico para que o TCU determinasse não a celebração de aditivo, mas a
realização de tratativas junto à Suape visando a sua efetivação – obrigação de
meio, não de fim. Nessa hipótese, o insucesso na negociação poderia ensejar
determinação para que a Petrobras anulasse o contrato, tendo em vista a sua
lesividade ao erário federal. Ocorre que o presente ajuste possui relevante
especificidade que impede a adoção dessa medida terminativa. Considerando que
Suape é uma empresa pública do Estado de Pernambuco, nos termos da Lei Estadual
7.763, de 7 de novembro de 1978, e que o referido ente subnacional também é
parte do Contrato 8500.0000011.09‑4, todas as partes do ajuste pertencem à Administração
Pública, ou seja, detêm prerrogativas de Poder Público. Com isso, diante da
situação de igualdade das partes do ajuste em análise, são inaplicáveis as
cláusulas exorbitantes especificadas nos arts. 58 e 59 da Lei 8.666/1993. Nesse
sentido, qualquer alteração no aludido ajuste, somente pode ocorrer por acordo
entre as partes, não havendo espaço, ainda, para anulação ou rescisão pela via
administrativa”. Por fim, considerando que apenas a Petrobras encontra-se
sob a jurisdição do TCU, o relator concluiu que “a única medida processual cabível, diante da cobrança da tarifa em seu
valor cheio, é instar a entidade a percorrer a via negocial, ou seja, buscar um
acordo amigável com o Estado de Pernambuco e Suape, objetivando obter alguma
redução no valor da aludida tarifa”. Assim, acolhendo o voto apresentado, o
Plenário decidiu expedir determinação à Petrobras no sentido de promover
tratativas junto ao Estado de Pernambuco e a Suape quanto aos termos de
cobrança de tarifa relativa à infraestrutura terrestre, no intuito de obter
desconto em relação aos itens da composição da referida tarifa portuária não
incorridos pela sua planta logística, o que contribuiria para a maior realidade
tarifária da contratação. No caso de insucesso na negociação, conforme a determinação
encaminhada, a Estatal deve avaliar a oportunidade e conveniência de submeter a
matéria aos órgãos e entidades responsáveis pela arbitragem de conflitos.
Acórdão
1953/2018 Plenário, Representação, Relator Ministro Benjamin Zymler.