A vedação à inclusão de novo documento, prevista no art. 43, § 3º, da Lei 8.666/1993 e no art. 64 da Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações), não alcança documento ausente, comprobatório de condição atendida pelo licitante quando apresentou sua proposta, que não foi juntado com os demais comprovantes de habilitação e da proposta, por equívoco ou falha, o qual deverá ser solicitado e avaliado pelo pregoeiro.
Representação
formulada ao TCU noticiou possível irregularidade no Pregão Eletrônico SRP
11/2020, promovido pela Diretoria de Abastecimento da Marinha (DAbM), cujo
objeto era a “contratação de serviços técnicos especializados de
desenvolvimento/manutenção de sistemas e soluções de tecnologia da informação”.
O representante alegou que o pregoeiro concedera aos licitantes,
irregularmente, nova oportunidade de envio da documentação de habilitação, após
a abertura da sessão pública, o que teria beneficiado um único licitante, ao
final declarado vencedor do certame, afrontando assim o disposto no Decreto
10.024/2019 e no próprio edital de licitação. Em seu voto, preliminarmente, o
relator esclareceu que, embora a regra atual seja a apresentação da
documentação de habilitação até a data e o horário estabelecidos para abertura
da sessão pública, podendo o licitante, nos termos do art. 26, caput, do
Decreto 10.024/2019, retirá-la ou substituí-la até então, o art. 47 do mesmo
normativo abre a possibilidade, tanto na fase de julgamento das propostas
quanto na de habilitação, de o pregoeiro sanar erros ou falhas que não alterem
a substância das propostas, dos documentos e sua validade jurídica, mediante
decisão fundamentada, registrada em ata e acessível aos licitantes. Ao retomar
o caso concreto, o relator historiou que, “em 30/4/2020, às 11:58:36, o
pregoeiro encerrou a fase de lances e anunciou o início do julgamento das
propostas. Às 14:03:22 do mesmo dia, suspendeu a sessão para análise da
documentação, já informando a reabertura no dia 5/5/2020. Nesse dia, às
9:55:25, reabriu a sessão e, em seguida, iniciou o chat para uma nova
oportunidade para envio da documentação, no prazo de 30 minutos”,
informando que seriam convocadas todas as empresas. Quatro empresas enviaram
documentos, uma delas, que foi posteriormente declarada vencedora, dentro do
prazo estabelecido, e “as demais com atrasos de até 51 minutos. Às 14:05:14
do mesmo dia, o pregoeiro suspendeu a sessão para análise da nova documentação
de habilitação anexada, marcando a reabertura para o dia seguinte”. Em
relação à atuação do pregoeiro no episódio, o relator ressaltou que ele não
fundamentou seu ato, contrariando assim o art. 8º, inciso XII, alínea “h”, e o
art. 47, parágrafo único, do Decreto 10.024/2019, bem como o edital de
licitação. Ademais, a ausência de fundamentação teria impossibilitado aos
licitantes a análise das razões do ato, haja vista que o pregoeiro não declinou
quais seriam os erros e falhas passíveis de saneamento, dentro da margem de
correção possibilitada pelos normativos incidentes. E concluiu então o relator
pela procedência das alegações do representante no que concerne à irregularidade
do aludido ato. Na sequência, discorreu sobre a abrangência do procedimento de
saneamento de “erros ou falhas que não alterem a substância das propostas,
dos documentos e sua validade jurídica”, previsto no art. 47 do Decreto
10.024/2019. Para tanto, assinalou que o art. 26, § 9º, do mesmo normativo
estabelece que “os documentos complementares à proposta e à habilitação,
quando necessários à confirmação daqueles exigidos no edital e já apresentados,
serão encaminhados pelo licitante melhor classificado após o encerramento do
envio de lances, observado o prazo de que trata o § 2º do art. 38”, bem
como que o art. 43, § 3º, da Lei 8.666/1993, aplicado subsidiariamente à
modalidade de pregão, dispõe que “é facultada à Comissão ou autoridade
superior, em qualquer fase da licitação, a promoção de diligência destinada a
esclarecer ou a complementar a instrução do processo, vedada a inclusão
posterior de documento ou informação que deveria constar originariamente da
proposta”. Dito isso, o relator ponderou que a interpretação literal do
termo “[documentos] já apresentados” do art. 26, § 9º, do Decreto
10.024/2019 e da vedação à inclusão de documento “que deveria constar
originariamente da proposta”, prevista no art. 43, § 3º, da Lei 8.666/1993,
poderia levar à prática de atos dissociados do interesse público, em que “o
procedimento licitatório (meio) prevalece e ganha maior importância que o
resultado almejado, qual seja, a obtenção da proposta mais vantajosa para a
Administração (fim)”. Em alinhamento com esse entendimento, asseverou que a
vedação à inclusão de documento “que deveria constar originariamente da
proposta”, prevista no art. 43, § 3º, da Lei 8.666/1993, “deve se
restringir ao que o licitante não dispunha materialmente no momento da
licitação”. Destarte, caso o documento ausente “se refira a condição
atendida pelo licitante quando apresentou sua proposta, e não foi entregue
juntamente com os demais comprovantes de habilitação ou da proposta por
equívoco ou falha, haverá de ser solicitado e avaliado pelo pregoeiro”. O
relator transcreveu ainda o disposto no art. 64 da Lei 14.133/2021 (nova Lei de
Licitações) e afirmou que esse dispositivo reproduz a vedação à inclusão de
novos documentos, prevista no art. 43, § 3º, da Lei 8.666/1993, porém “deixa
salvaguardada a possibilidade de diligência para a complementação de
informações necessárias à apuração de fatos existentes à época da abertura do
certame, o que se alinha com a interpretação de que é possível e necessária a
requisição de documentos para sanear os comprovantes de habilitação ou da
proposta, atestando condição pré-existente à abertura da sessão pública do
certame”. Assim sendo, arrematou que não haveria vedação ao envio de
documento que não alterasse ou modificasse aquele anteriormente encaminhado.
Considerando a informação nos autos de que o certame teria sido revogado, o
relator apresentou proposta, acolhida pelo demais ministros, no sentido de
cientificar o órgão acerca da irregularidade perpetrada pelo pregoeiro, bem como
“deixar assente que o pregoeiro, durante as fases de julgamento das
propostas e/ou habilitação, deve sanear eventuais erros ou falhas que não
alterem a substância das propostas, dos documentos e sua validade jurídica,
mediante decisão fundamentada, registrada em ata e acessível aos licitantes,
nos termos dos arts. 8º, inciso XII, alínea ‘h’; 17, inciso VI; e 47 do Decreto
10.024/2019; sendo que a vedação à inclusão de novo documento, prevista no art.
43, §3º, da Lei 8.666/1993 e no art. 64 da Nova Lei de Licitações (Lei
14.133/2021), não alcança documento ausente, comprobatório de condição atendida
pelo licitante quando apresentou sua proposta, que não foi juntado com os
demais comprovantes de habilitação e/ou da proposta, por equívoco ou falha, o
qual deverá ser solicitado e avaliado pelo pregoeiro”.
Acórdão
1211/2021 Plenário, Representação, Relator Ministro Walton Alencar
Rodrigues.