sábado, 13 de julho de 2024

TROCA DE MARCA

A troca da marca do equipamento ofertado na proposta do licitante vencedor e indicada no contrato exige a devida justificativa acerca da impossibilidade de se cumprir o originalmente proposto e a formalização por meio de termo aditivo, em observância aos princípios da legalidade, da vinculação ao instrumento convocatório, da publicidade, da impessoalidade e da igualdade.
Representação formulada ao TCU apontou possíveis irregularidades no contrato decorrente do Pregão Presencial 27/2021, promovido pelo Serviço Social da Indústria – Departamento Nacional (Sesi/DN) e tendo como objeto o “fornecimento de equipamentos e sistema de projeção multimídia (Painel de led P 1.56mm), incluindo serviços de instalação, configuração, testes, treinamento e start-up do sistema e garantia, para o empreendimento do Sesi Lab no antigo Edifício Touring Club do Brasil, em Brasília, DF” (Contrato 1087). Entre as irregularidades suscitadas pelo autor da representação, mereceu destaque o fato de a empresa contratada haver ofertado, em sua proposta, “painel de led modelo LSBB015-GD, da fabricante LG, no valor final de R$ 5.564.091,01” e “controlador gráfico, modelo CVBA, também da LG”, contudo “entregou monitor da fabricante Ledwave, modelo KL1.5, e processadora modelo H15, da fabricante Novastar, que possuía valor estimado de R$ 2.400.000,00, ou seja, muito inferior ao ofertado inicialmente”, além do que “o equipamento substituto não atendia a todas as especificações técnicas exigidas no edital”. Ademais, tal alteração não teria sido formalizada mediante termo aditivo ao referido contrato. Instado a se manifestar, o Sesi/DN apresentou justificativas acerca dos indícios de irregularidades levantados, juntando também aos autos, entre outros documentos, cópias do contrato celebrado, da proposta vencedora da licitação, da carta enviada pela contratada solicitando a substituição dos produtos, da decisão administrativa que acatara a solicitação, bem como do relatório técnico que avaliara os equipamentos entregues. Quanto à ausência de formalização da alteração por aditivo, o Sesi justificou que, considerando “que os produtos ofertados são equivalentes tecnicamente entende-se que não há necessidade de aditivo contratual, uma vez que não foi contratada uma marca ou fabricante e sim uma solução tecnológica integrada conforme objeto do contrato”. Em relação a esse indício, a unidade técnica afirmou que a substituição ocorrera na fase de execução contratual e, levando em conta que a cláusula quarta do contrato consignara expressamente que o painel de led e o controlador gráfico seriam da marca LG, a substituição dos equipamentos por outros de marca diferente configura inconteste alteração contratual (“troca da marca por acordo entre as partes”), exigindo assim a celebração de termo aditivo, o que não se verificou, em inobservância ao art. 29 do Regulamento de Licitações e Contratos do Sesi (RLC/Sesi), que assim dispõe: “As alterações contratuais por acordo entre as partes, desde que justificadas, e as decorrentes de necessidade de prorrogação, constarão de termos aditivos.”. A unidade instrutiva também assinalou ser a jurisprudência do TCU “firme no sentido de que as alterações contratuais devem ser formalizadas por termos aditivos”, invocando, para tanto, o Acórdão 2504/2014-1ª Câmara, o Acórdão 2590/2012-Plenário e o Acórdão 1227/2012-Plenário. Acerca da carta enviada pela empresa contratada solicitando a substituição dos produtos, sob a alegação de que o produto substituto era de marca diversa, porém de modelo superior em características técnicas, e que o contratante teria outros benefícios com essa substituição, como prazo de entrega menor e padronização com equipamentos similares já existentes no ambiente do contratante, a unidade técnica retrucou que, consoante entendimento firmado no Acórdão 1033/2019-Plenário, embora possível a troca dos equipamentos ofertados, esta deve estar respaldada em justificativas que demonstrem a “inviabilidade de se seguir com o originalmente proposto”. Para ela, não foi o que aconteceu no caso concreto, haja vista que nem a empresa nem o Sesi informaram por qual motivo não fora possível entregar o equipamento que constara originalmente na proposta, focando tão somente nas supostas vantagens do equipamento substituto, “sem explicar o que teria acontecido com o equipamento substituído”. A unidade instrutiva destacou ainda que, conforme disposto no item 13.1.1 do Termo de Referência, era obrigação da contratada cumprir o objeto pactuado “nos termos e condições constantes do Contrato”, ou seja, tendo a marca do equipamento sido expressamente indicada na avença, “era obrigação da empresa entregar essa marca específica”. Na sequência, enfatizou que a justificativa acerca da impossibilidade de entregar o equipamento originalmente ofertado e a formalização da troca da marca mediante termo aditivo não seriam meras formalidades. Segundo ela, “a primeira justifica-se pelos princípios da impessoalidade e igualdade, previstos no art. 2º do RLC/Sesi, visto que permitir a uma empresa a troca da marca do equipamento ofertado em sua proposta, sem a devida justificativa, representa uma vantagem não concedida aos demais licitantes e, ainda, há reflexos no preço, uma vez que dois produtos tecnológicos de marcas diferentes, ainda que possuam as mesmas especificações técnicas, poderão ter preços diferentes”. Já a segunda “representa o respeito aos seguintes princípios previstos no art. 2º do RLC/Sesi: da legalidade, por ser uma exigência do art. 29 do RLC/Sesi; da vinculação ao instrumento convocatório, em função do disposto no item 13.1.1 do TR, acima citado; e da publicidade, por dar transparência à execução do contrato”. Não obstante, a unidade técnica ponderou que o Sesi, por precaução, promovera diligências para avaliar a adequação do equipamento substituto, requerendo o pronunciamento da “empresa contratada para dar suporte na execução do contrato”, a qual concluíra não ter havido prejuízo técnico com a substituição da marca dos equipamentos fornecidos. No que concerne à suposta diferença de preço entre a solução tecnológica prevista no edital (da marca LG) e a solução efetivamente utilizada (monitor da fabricante Ledwave e processadora da fabricante Novastar), o Sesi/DN informou que realizara a “avaliação do seu custo” por meio de pesquisa de preços por telefone, tendo constatado a compatibilidade dos preços de ambas as marcas. De acordo com o Sesi/DN, essa compatibilidade teria sido constatada “também em outubro de 2022, quando a CNI requereu cotações diretamente à LG e à Ledwave, para instalação de painéis de led em dois outros projetos, um com 248m² outro com 144m² de área. No primeiro projeto, que comportaria o painel de 248m², a LG fez cotação indicando o preço total de R$ 10.553.023,00 (painel com acessórios, estrutura e instalação). Para o outro projeto, de 144m², foi solicitada cotação da Ledwave, que indicou o preço específico de USD 9.486,40/m² exclusos acessórios, frete e instalação, os quais se adicionados totalizariam R$ 8.036.382,25 (considerando dólar a R$ 5,14). A partir desses valores, tem-se que o painel Ledwave custaria R$ 55.808,21/m² enquanto o painel LG R$ 42.552,51/m². Frisa-se que esses parâmetros de custos se referem a projetos distintos do ora examinado, assim pode haver distorções nos preços se fosse feita cotação específica para o objeto em tela.”. Por conseguinte, alegou o Sesi/DN que tal resultado seria mais um indicativo da compatibilidade entre os preços de ambos os equipamentos, “sendo o Ledwave (utilizado) a um custo ainda superior que o LG”. Diante disso, o Sesi/DN concluiu que não houve variação de preço significativa entre os equipamentos, que pudesse obstar a substituição pleiteada pela contratada. Ante os argumentos aduzidos, a unidade técnica considerou não ser possível afirmar a ocorrência de dano ao erário em virtude da substituição autorizada, no entanto, segundo ela, “haveria a possibilidade de ter selecionado uma proposta mais vantajosa caso tivessem sido previstas as especificações técnicas compatíveis com o equipamento Ledwave e se a pesquisa de preços tivesse sido mais abrangente, com a inclusão dos fabricantes dos produtos”. Em seu voto, o relator frisou, preliminarmente, que a troca dos produtos fora autorizada com fundamento em três pontos: “(i) o equipamento substituto apresentava três vantagens técnicas em relação ao substituído, quais sejam, ele seria fornecido com uma processadora que possui mais funcionalidades, em vez de uma controladora; menor distância entre pixels – 1,53mm contra 1,56mm –, que implica em melhor resolução; e menor consumo de energia – 560W/m² contra 600W/m²; (ii) vantagem operacional em razão de o Sesi já possuir outro equipamento da marca Ledwave, que resultaria em unificação da tecnologia implantada, facilitando a manutenção, troca de peças e geração de conteúdo; e (iii) antecipação do prazo de entrega em quinze dias”. Fora asseverado, ainda, que o equipamento substituto atenderia, em sua totalidade, às especificações técnicas da licitação. Apesar de considerar ausente a justificativa acerca da impossibilidade de se cumprir o objeto da forma originalmente proposta, continuou o relator, a unidade técnica acolhera os argumentos do Sesi/DN quanto à viabilidade técnica da modificação, manifestação com a qual concordava. Quanto à “alteração contratual sem a devida formalização por aditivo”, o relator também acompanhou a unidade instrutiva, enfatizando que, por restar consignado na cláusula quarta do contrato que o painel de led e o controlador gráfico seriam da marca LG, “a substituição desses equipamentos por outros de marca e/ou especificações diferentes configura alteração contratual”, a qual deveria ser precedida do correspondente termo de aditamento, o que não ocorrera, em desacordo, portanto, com o que dispõe o art. 29 do Regulamento de Licitações e Contratos do Sesi. Por derradeiro, anuiu ao entendimento da unidade instrutiva quanto à fragilidade das pesquisas de preço realizadas para subsidiar a análise econômica das alterações contratuais, eis que tiveram como base cotações oriundas de contatos telefônicos e parâmetros de preços de projetos distintos do objeto da licitação, “em desconformidade com os princípios previstos no art. 2º do Regulamento de Licitações e Contrato do Sesi e com a jurisprudência deste Tribunal”. Ao final, o relator propôs, e o colegiado decidiu, considerar procedente a representação, sem prejuízo de cientificar o Sesi/DN das seguintes “impropriedades/falhas identificadas no Pregão Presencial 27/2021 e no contrato dele decorrente (Contrato 1.087)”, com vistas à adoção de medidas internas para prevenção de outras ocorrências semelhantes: “9.2.1. alteração contratual sem a devida formalização por aditivo, em afronta ao art. 29 do Regulamento de Licitações e Contrato do Sesi e em desconformidade com os princípios da legalidade, da vinculação ao instrumento convocatório e da publicidade, previstos no art. 2º desse mesmo Regulamento, afrontando, ainda, a jurisprudência do TCU, a exemplo dos acórdãos 2.504/2014-TCU-1ª C, Relator Ministro Marcos Bemquerer, 2.590/2012-TCU-P, Relator Ministro Aroldo Cedraz e 1.227/2012-TCU-P, Relator Ministro Valmir Campelo”; “9.2.2. troca de produto sem a devida justificativa acerca da impossibilidade de se cumprir o originalmente proposto, em desconformidade com os princípios da impessoalidade e igualdade, previstos no art. 2º do Regulamento de Licitações e Contrato do Sesi e, também, em desacordo com a jurisprudência do TCU, a exemplo do Acórdão 1.033/2019-TCU-P, Relator Ministro Aroldo Cedraz”; “9.2.3. fragilidade das pesquisas de preço realizadas para subsidiar a análise econômica das alterações contratuais, haja vista que tiveram como base cotações oriundas de contatos telefônicos e parâmetros de preços de projetos distintos do objeto da licitação, em desconformidade com os princípios previstos no art. 2º do Regulamento de Licitações e Contrato do Sesi e com a jurisprudência deste Tribunal”. Acórdão 3332/2024 Segunda Câmara, Representação, Relator Ministro Augusto Nardes.