RESERVA DE CARGOS PARA PESSOA COM DEFICIÊNCIA
E PARA REABILITADO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
Atenção: abaixo temos dois documentos. O primeiro
é a decisão do PREGOEIRO. O segundo documento é um PARECER( PARECER -
DG/ASSEAD)
.
PRIMEIRO DOCUMENTO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO
Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300 - 7º B
- Bairro Praia de Belas - CEP 90010-395 - Porto Alegre - RS - www.trf4.jus.br
DECISÃO
Trata-se de procedimento licitatório instaurado
na modalidade pregão eletrônico, pelo critério de julgamento de menor preço,
com fornecimento parcelado, visando ao registro de preços de subsistemas de
armazenamento de dados (storage), incluindo serviços de instalação,
configuração e garantia por um prazo de 60 (sessenta) meses, nos termos
do edital 6914044, do Pregão Eletrônico nº 21/2022, sob a regência da Lei n.º
14.133/2021.
Conforme se depreende da Ata da sessão, doc.
6954056, houve 9 (nove) licitantes participando da sessão com vistas ao grupo
01, e 10 (dez), para o grupo 2, e ao final da fase competitiva a licitante Zoom
Tecnologia Ltda. Ficou melhor classificada com lance final de R$ 44.380.000,16
(quarenta e quatro milhões trezentos e oitenta mil reais e dezesseis
centavos) para o Grupo 1 e R$ 33.848.000,11 (trinta e três milhões
oitocentos e quarenta e oito mil reais e onze centavos) para o Grupo 2.
Os valores estimados pela Administração foram de
R$ 123.269.495,36 (cento e vinte e três milhões, duzentos e sessenta e nove mil
quatrocentos e noventa e cinco reais e trinta e seis centavos) para o
Grupo 1 e R$ 123.369.240,65 (cento e vinte e três milhões, trezentos e sessenta
e nove mil duzentos e quarenta reais e sessenta e cinco centavos) para o
Grupo 2.
Encaminhada a documentação pertinente da
licitante para a área técnica pelo Memorando 6949480, a mesma se manifestou
pelo atendimento do edital pela documentação e proposta da licitante vencedora,
doc. 6953091.
Concluído o certame, a licitante O2 Soluções em
Tecnologia Digital Ltda. manifestou tempestivamente intenção de recorrer das
decisões finais de julgamento de proposta e habilitação da licitante.
Concedidos e observados os prazos legais para
razões e contrarrazões das licitantes, os documentos foram encaminhados
tempestivamente via sistema Compras.Gov, e passa-se à análise de seus méritos.
Em suas razões de recurso, doc. 6960378, a
licitante O2 sintetiza sua irresignação pretendendo demonstrar que “a
recorrida não cumpre os requisitos de habilitação e não poderia ter participado
do pregão” e em relação à solução ofertada, que “a tecnologia fornecida
pela recorrida não atende o requisito de mitigação contra ataques de ramsomware
e deleção intencional de dados e não poderia ter a proposta aceita pela
contratante”.
No item 2 da peça recursal sustenta que a
recorrida não atenderia aos requisitos de habilitação pois declarou no campo
próprio do sistema o “aceite”, que gera o relatório 6949143, no qual consta:
"ii. Declarações para
fins de habilitação
Atendo aos requisitos de
habilitação previstos em lei e no instrumento convocatório. Inexiste
impedimento à minha habilitação e comunicarei a superveniência de ocorrência
impeditiva ao órgão ou entidade contratante.
Cumpro as exigências de
reserva de cargos para pessoa com deficiência e para reabilitado da Previdência
Social, previstas em lei e em outras normas específicas.”
Em atendimento à exigência do Edital, que em seu
item 8.3. previu:
“8.3. Para fins de
habilitação, a licitante também deverá apresentar a seguinte documentação:
[...]
8.3.6. declaração de
cumprimento as exigências de reserva de cargos para pessoa com deficiência e
para reabilitação da Previdência Social, previstas em lei e em outras normas
específicas;
[...]
8.3.9. As declarações
previstas neste item 8.3 deverão ser preenchidas pela licitante no sistema
Compras.gov.br e serão consultadas pelo pregoeiro durante a sessão, para
posterior juntada ao processo administrativo.”
Enquanto em “consulta simples e aberta ao sistema
do Ministério do trabalho verificamos que a Zoom não atende a esse requisito de
habilitação:” apresentando a certidão emitida pelo Ministério do Trabalho e
Emprego, juntada sob n.º 6983542, e concluindo que:
“Desta maneira a habilitação
da recorrida é inválida e a mesma deve ser inabilitadas dos lotes 1 e 2 deste
certame. A recorrida jamais poderia ter participado e não pode ser habilitada.”
No item 3 de suas razões, a recorrente sustenta o
não atendimento de requisito de proteção de dados pelas soluções ofertadas, já
que
“[...] a tecnologia ofertada pela
recorrida possui uma falha grave de implementação: ela permite a remoção dos
dados gerados pela ferramenta de proteção, dependendo do nível de acesso do
usuário. Não foram implementadas as mitigações necessárias, em especial do item
4.4.6.5.1.
Inicialmente, inclusive, a
recorrida indica a funcionalidade errada para tal missão. Ela indica
principalmente o documento “OceanStor Dorado 6.1.x HyperLock Feature Guide”
para comprovar tal funcionalidade.
Acontece que o documento
indica claramente que esta é uma funcionalidade para protocolos de arquivo,
como filesystems, NAS, CIFS/SMB. Não é uma funcionalidade para armazenamento de
block storage. Mas nosso foco não é nessa funcionalidade.
Após analisar a documentação
fornecida pela recorrida encontramos que, na verdade, a funcionalidade que
deveria atender o solicitado pelo edital para este tipo de funcionalidade seria
o HyperCDP. Pode ter havido algum engano da recorrida ao indicar a
funcionalidade errada (a recorrida até indica, de forma muito curta, o documento
para tal funcionalidade na comprovação do item 4.4.6.5.1). Mas isso pode ter
sido apenas um “pote de mel” para fazer os concorrentes indicarem uma não
conformidade que seria depois facilmente corrigida e explicada e desviando a
atenção do real problema que é o não atendimento da funcionalidade do edital.”
E prossegue com a explicação técnica de sua tese:
“Porém, é nesta funcionalidade
que reside o não atendimento ao requisito do edital. O documento “OceanStor
Dorado 6.1.x HyperCDP Feature Guide for Block.pdf” traz as informações técnicas
da feature.
Ao efetuar a leitura do
documento, identificamos que o HyperCDP é uma funcionalidade de Continuous Data
Protection (CDP). Não vamos aqui explicar a tecnologia, não é nosso objetivo.
Mas na página 15 do documento é citado um dos casos de uso para a
funcionalidade:
“You can use the latest
HyperCDP object to roll back data within several seconds. This protects data
against the following situations:
● Virus infection
● Misdeletion
● Malicious tampering
● Data corruption caused by
system breakdown
● Data corruption caused by
application bugs
● Data corruption caused by
storage system bugs”
“Você pode usar o objeto
HyperCDP mais recente para reverter dados em alguns segundos. Isso protege os
dados contra as seguintes situações:
● Infecção por vírus
● Exclusão incorreta
● Adulteração maliciosa
● Corrupção de dados causada
por falha do sistema
● Corrupção de dados causada
por bugs de aplicativos
● Corrupção de dados causada
por bugs no sistema de armazenamento”
Exatamente o que se espera de
uma funcionalidade como essa e é o que a contratante especificou para tal
funcionalidade.
Continuando a leitura do
documento, é descrito o processo de configuração, opções, parâmetros, entre
outros. É possível identificar que a imutabilidade em especial é realizada pelo
conceito de “secure snapshot” e tal conceito possui dois parâmetros básicos:
"Min. Protection Period:
Protection period of a HyperCDP object. HyperCDP objects within the protection
period cannot be deleted.
Automatic Deletion: After this
function is enabled, the system automatically deletes files whose protection
periods have expired”
“Min. Período de Proteção:
Período de proteção de um objeto HyperCDP. Os objetos HyperCDP dentro do
período de proteção não podem ser excluídos.
Exclusão Automática: Depois
que esta função é habilitada, o sistema exclui automaticamente os arquivos
cujos períodos de proteção expiraram.”
Porém, a funcionalidade tem
uma falha grave de implementação e justamente por isso não atende o solicitado
pelo item 4.4.6.5.1: Ela permite que um usuário com determinado nível de
permissão altere as propriedades de um objeto protegido, permitindo assim sua
alteração e/ou deleção. O procedimento para isso é claramente definido abaixo:
“If you want to disable the
secure snapshot function of HyperCDP objects or change the min. protection
period during the protection period, log in to the system using the serial port
as a security administrator and modify the HyperCDP object properties. For
details about the command, see change hyper_cdp general in Command Reference.
For details on how to create a security administrator, see "Creating a
Local User" in the Administrator Guide.”
“Se desejar desabilitar a
função de instantâneo seguro de objetos HyperCDP ou alterar o período mínimo de
proteção durante o período de proteção, faça login no sistema usando a porta
serial como administrador de segurança e modifique as propriedades do objeto
HyperCDP. Para obter detalhes sobre o comando, consulte alteração geral do
hyper_cdp em Referência de Comando. Para obter detalhes sobre como criar um
administrador de segurança, consulte "Criando um usuário local" no
Guia do Administrador.”
O texto citado se repete em
diversas partes do documento, sempre relacionado com a manipulação dos objetos
criados pelo HyperCDP.
Para nós é evidente que esse
problema é insuperável uma vez que o acesso via porta serial impossibilita os
métodos alternativos de proteção que o edital permite.
A questão é que a
especificação técnica do edital no item 4.4.6.5.1 é clara e foi muito
específica em relação a isso e não deixa margem de dúvidas: A imutabilidade dos
dados não pode ser alterada, independente do nível de acesso do usuário!
Isto não é verdade no
HyperCDP, onde um usuário com o privilégio correto poderia sim alterar as
propriedades de imutabilidade do objeto, permitindo assim sua alteração e/ou
remoção.”
E conclui os argumentos técnicos com:
“De forma clara, a tecnologia
usada no produto ofertado tanto no lote 1 quanto no lote 2 não atende a
especificação técnica no edital no item 4.4.6.5.1, visto que permite a
modificação da imutabilidade fornecida pelo secure snapshot, podendo assim
trazer sério risco ao processo de recuperação de desastres solicitado pela
contratante, conforme item 4.4.6.5:
“Deverá ter funcionalidade de
mitigação contra ataques de ransomware e deleção intencional de dados,
permitindo ao CONTRATANTE a restauração rápida dos dados criptografados ou
deletados, mediante uma das seguintes alternativas”
Como a contratante poderia
correr o risco de, em uma eventual necessidade de restauração de dados através
de objetos protegidos, descobrir que um administrador de segurança alterou o
período de retenção de um objeto necessário ao processo de recuperação de
dados? Entendemos que foi com esta preocupação que a contratante solicitou
estes itens.
Não houve questionamento sobre
esta especificação para estabelecer novas exceções ao tipo de acesso, assim, da
forma como o edital está especificado, o equipamento não pode oferecer a um
administrador apenas a possibilidade de eliminar objetos, independente do seu
modo de acesso.
A regra é clara, se isso é
permitido, apenas 2 administradores em simultâneo e com dupla autenticação
podem fazer isso e este equipamento não atende a isso.
Não existe caminho para
relativização disso através do ofício do formalismo moderado que é comumente
invocado.
Temos aqui 2 problemas claros
e objetivos:
- Houve erro na comprovação
técnica, com indicação de uma funcionalidade errada do storage em relação ao
edital e assim, não foi feita a comprovação técnica.
- A pesquisa ao material
técnico do edital mostra que a funcionalidade implementada pelo equipamento não
atende a especificação do edital.
É decerto que mesmo nossa
análise pode ser falha porque uma vez que a recorrida não apresentou a correta
demonstração técnica, fazendo, grosseiramente a indicação, intencional ou não,
de uma funcionalidade errada, não podemos nem analisar os argumentos desta e a
mesma fará isso sem que possamos retrucar.”
No item 4 de suas razões, a recorrente defende a
inabilitação da licitante vencedora pelo entendimento de que a sua declaração
de cumprimento das exigências de reserva de cargos para pessoa com deficiência
e para reabilitação da Previdência Social, previstas em lei e em outras normas,
seria falsa, considerando a consulta à certidão do Ministério do Trabalho, e
que o princípio da vinculação ao instrumento convocatório exige o cumprimento
da condição na data do certame, além disso, que tal irregularidade consiste em
vício insanável e tampouco sujeito a juízo de formalidade moderada.
E em sua conclusão, item 5, pretende ter
demonstrado a existência de erro na habilitação da recorrida, contrariando o
Edital; o não atendimento de uma funcionalidade técnica pela solução ofertada;
e que a consideração da exeqüibilidade da proposta vencedora se baseou em uma
manifestação da recorrida baseada em “emotividade”.
Por fim, pede “Por todo o exposto, requer esta
licitante que a empresa Recorrida seja considerada inabilitada devido a
documentação de Habilitação não atender a condição do edital”.
Em contrarrazões, doc. 6969276, a licitante Zoom
Tecnologia Ltda. defende a inconstitucionalidade da inabilitação com base na
comprovação exigida em Edital, pois “comprovou condições técnicas e econômicas
suficientemente aptas à garantia da segurança da futura contratação, cumprindo,
por conseguinte, as exigências máximas admitidas no texto constitucional (art.
37, XXI, CF/88).” Além disso, sustenta que a nova lei de licitações, n.º
14.133/2021, introduz nova lógica de prevalência do resultado sobre a forma, e
que sua proposta, cerca de R$ 19 milhões mais barata que a da recorrente, seria
a opção adequada ao atendimento do interesse público.
No item 1.1. de suas contrarrazões, a licitante
informa que o não atendimento da reserva de vagas para PcD foi uma situação
temporária e que já estaria sanada na data da apresentação de seus argumentos,
demonstrando documentalmente tal atendimento, e que tal desatendimento é
recorrente, pois:
“18. Como é cediço, qualquer
empresa obrigada à reserva de cotas prevista na Lei 8.213/91, encontra-se
suscetível de não preencher, temporariamente, o percentual previsto no art. 93,
o que se dá, fundamentalmente, pela própria dinâmica e fluidez do mercado de
contratações, sendo certo que, em qualquer situação, a tarefa de localizar um
candidato que preencha os requisitos da seleção é árdua e desafiadora até mesmo
para a melhor gestão de recursos humanos.
19. Essa transição temporária,
contudo, alheia à vontade do empregador, não tem o condão de, por si só,
caracterizar o descumprimento da obrigação legal, e deve ser temperada por
critérios de justiça e razoabilidade.”
No item 1.2. defende que a comprovação do
cumprimento da reserva de vagas para PcD e Reabilitados da Previdência deveria
ser flexibilizada diante de “os objetivos e o norte interpretativo da Lei
14.133/21”, que tal comprovação como condição de participação ou habilitação
seria inconstitucional e que atentaria contra diversos princípios:
“20. A discussão em torno da
reserva de cargos passa, preambularmente, pela mudança de cenário nas
aquisições públicas, proporcionada pela correta aplicação da Lei 14.133/21.
21. Indiscutivelmente a Nova
Lei de Licitações traz uma disruptura em relação ao regime tradicional das Leis
8.666/93 (Geral), 10.520/02 (Pregão) e 12.462/11 (RDC), no que diz respeito aos
objetivos do certame licitatório.
22. Tal disruptura passa quase
desapercebida numa primeira análise, devido ao fato de que, tocante ao rito
procedimental do certame, poucas questões foram, de fato, inovadoras. Cria-se
então uma mentalidade de que nada mudou no ordenamento jurídico.
23. Porém, num olhar mais
atento, verificar-se-á que a Nova Lei de Licitações tem o seu foco nos
objetivos do certame e não no rito procedimental propriamente dito, podendo
essa realidade ser muito bem visualizada no seu artigo 11, verbis:
‘Art. 11. O
processo licitatório tem por objetivos:
I - assegurar a
seleção da proposta apta a gerar o resultado de contratação mais vantajoso para
a Administração Pública, inclusive no que se refere ao ciclo de vida
do objeto;
II - assegurar tratamento
isonômico entre os licitantes, bem como a justa competição;
III - evitar
contratações com sobrepreço ou com preços manifestamente inexequíveis
e superfaturamento na execução dos contratos;
IV - incentivar a inovação
e o desenvolvimento nacional sustentável.
Parágrafo único.
A alta administração do órgão ou entidade é responsável pela governança das
contratações e deve implementar processos e estruturas, inclusive de gestão de
riscos e controles internos, para avaliar, direcionar e monitorar os processos
licitatórios e os respectivos contratos, com o intuito de alcançar os objetivos
estabelecidos no caput deste artigo, promover um ambiente
íntegro e confiável, assegurar o alinhamento das contratações ao planejamento
estratégico e às leis orçamentárias e promover eficiência, efetividade
e eficácia em suas contratações. Destacado.’
24. O dispositivo legal em
comento deixa claro que o processo licitatório tem um foco: assegurar um
excelente resultado para a sociedade, isto é, a seleção da proposta apta a
gerar o resultado de contratação mais vantajoso, garantindo, isonomia, justa
competição, preço justo e inovação. O que se deseja, em última instância, é
garantir eficiência, efetividade e eficácia da contratação.
25. Diferente, portanto, do
regime tradicional, onde o foco está na rigidez procedimental, isto é,
valoriza-se muito mais o rito do procedimento de seleção do fornecedor, do que
o resultado que se necessita alcançar: a boa compra pública.
26. Essa mudança de foco, tão
necessária para combater a má qualidade da compra pública, ao longo dos últimos
30 anos de vigência da Lei 8.666/93, é indispensável para a boa aplicação da
Nova Lei de Licitações, e também para a interpretação a ser dado ao edital, que
passa a ser muito mais um documento que reúne a modelagem e a boa estratégia de
seleção do fornecedor e da compra pública, do que um instrumento rígido ou até
mesmo acima do ordenamento jurídico.”
Cita ainda outros dispositivos da Lei 14.133/2021
como exemplos de um “norte interpretativo” que deveria atribuir “menos
exigências restritivas, porém mais exigências que garantam a qualidade do
objeto a ser contratado” e que a exigência de cumprimento de cota de vagas para
PcD se dá sobre empresas que empregam mais de 100 (cem) funcionários, e que
essas enfrentam dificuldades para preenchimento dessas vagas em diversas
situações transitórias, ilustrando com notícia do portal da câmara de deputados
tal dificuldade:
“33. Note-se que se trata de
obrigação que depende da vontade de terceiros – no caso, a pessoa portadora de
deficiência ou reabilitada da Previdência Social – não podendo a empresa ser
considerada uma descumpridora da Lei 8.213/91, pelo simples fato de que, numa
determinada temporalidade, encontra-se com o preenchimento abaixo do número
mínimo indispensável.
34. Este rigor, por certo,
atentaria contra a isonomia, que é um dos objetivos precípuos do certame para se
alcançar a justa competição e, por conseguinte, o resultado da contratação mais
vantajosa ao erário.
35. No caso, uma empresa que
emprega mais de 300 funcionários, como a Recorrida, e, portanto, possui um
importante papel socioeconômico, ficará desalijada do certame por uma situação
fática momentânea que não representa a sua realidade preponderante, que é de
cumprir as cotas previstas na legislação especial. Ao passo que empresas que
sequer empregam pessoas no quantitativo mínimo, como a Recorrente, seriam
consideradas aptas a contratar com a Administração Pública.
36. Veja-se que não há lógica
nesse raciocínio e a questão certamente deverá ser enfrentada na aplicação da
Nova Lei de Licitações, a qual, como visto, tem como base interpretativa a
busca dos objetivos indispensáveis ao alcance de uma contratação eficiente,
eficaz e efetiva.”
A recorrida sustenta ainda que o princípio da
razoabilidade deveria ser ponderado na aplicação da lei, evitando injustiças e
buscando o atendimento do interesse público já que:
“44. O presente caso tem
características singulares! O confronto de uma compra pública com economia de
mais de 19 milhões de reais, e o descumprimento, meramente
temporário, e não por culpa da Recorrida, da reserva de cotas para
deficientes e reabilitados da Previdência Social, em aparente infração ao art.
63, IV da Lei 14.133/21.
45. E nesse compasso, seria no
mínimo irrazoável desalijar a proposta de menor preço, apresentada por uma
empresa que emprega mais de 300 funcionários - por estar ela,
num momento transitório de busca de pessoas que preencham os critérios da
reserva - e contratar a Recorrente, que não desempenha papel
socioeconômico relevante, e por isso, encontra-se desobrigada da
reserva de cargos, e ainda apresenta proposta que onera a Administração Pública
em mais de 19 milhões.” (grifos no original)
Sinalizando, por fim, que a Constituição assegura
a isonomia em licitações e permite somente “exigências de qualificação técnica
e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações” (art. 37,
XXI) e que, além disso, uma interpretação “sistêmica da Lei 14.133/21,
denota-se que todas as outras políticas públicas de inclusão, foram feitas em
sede de contratação e não como requisito de habilitação”.
Em seu ponto 1.3. a recorrida sustenta que sua
defesa da exeqüibilidade da proposta não foi “emotiva” mas que destacou sua
experiência e contratos públicos anteriores, que possui certificações e cultura
de sustentabilidade, reduzindo seus custos e possui parceria duradoura com a fabricante
dos equipamentos.
A defesa do cumprimento dos requisitos técnicos é
feita no item 1.4., no qual a licitante recorrida informa em que documentos e
passagens é feita a demonstração do atendimento dos requisitos citados pela
recorrente:
“90. Desta feita, não cabe a
alegação de que a solução não atende ao requisito de imutabilidade, muito pelo
contrário, o que a solução realizar com o acesso do administrador local, via
portal serial, é a mudança ou ajuste de propriedades do secure sanpshot, bem
como da política de retenção, mas não a deleção de dados, veja-se:
“If you want to disable the
secure snapshot function of HyperCDP objects or change the min. protection
period during the protection period, log in to the system using the serial port
as a security administrator and modify the HyperCDP object properties.” Fonte:
OceanStor Dorado 6.1.x HyperCDP Feature Guide for Block.pdf (pág. 37)
91. Isto é, verifica-se nesse
caso, que o requisito de “imutabilidade que impeça alteração e deleção dos
dados” ocorre “independentemente do nível de acesso do usuário e/ou que possua
que possua mecanismo de execução de comando privilegiado”, conforme solicitado
no item editalício.
92. Mais. O Huawei OceanStor
Dorado permite a criação de mais de um usuário administrador da solução de
armazenamento, com perfis diferenciados, incluindo super administrators,
administradors, security administrators e outros [...]”.
Por fim, pede a recorrida Zoom que o recurso
apresentado pela recursante O2 tenha negado provimento, mantendo a sua proposta
classificada e a mesma habilitada.
Destacado o núcleo das razões e contrarrazões,
juntadas aos autos, informa-se que foi recebido, no dia 17/11/2023, e-mail
juntado sob n.º 6983554, em que uma pessoa identificada pelo endereço
jairo.silva151955@gmail.com, declara que a “A empresa Zoom Tecnologia
apresentou declaração falsa, ao declarar que cumpre com as cotas para pessoa
com deficiência, prevista no item 8.3.6 do edital, basta consultar o link https://certidoes.sit.trabalho.gov.br/”.
Instado a informar se agia em nome de alguma empresa, não foi obtida resposta.
Contudo, como a matéria foi também objeto das razões de recurso, será aqui
esgotada.
Informa-se, ainda, que a recorrente O2 encaminhou
e-mail e ofício em 27/11/2023, intempestivamente; portanto, visando “esclarecer
de maneira mais detalhada” questões técnicas mencionadas pela recorrida em suas
contrarrazões. Apesar de não ser admitida tal réplica, ou deveríamos abrir
oportunidade de uma tréplica, ambas não previstas, foi dada notícia à área
técnica sobre a mensagem, doc. 6983594.
É o que se tinha a relatar.
Com base no exposto, observam-se três pontos que
devem ser enfrentados na presente decisão:
I – Quanto à exeqüibilidade da proposta
vencedora;
II – Quanto ao cumprimento dos requisitos
técnicos exigidos no instrumento convocatório; e
III – Quanto ao cumprimento da condição de
habilitação prevista no item 8.3.6. do Edital.
I - Quanto ao primeiro:
A aferição da exeqüibilidade da proposta é regida
pelo item 7.11. do Edital:
“7.11. O pregoeiro poderá
realizar diligências para aferir a exequibilidade da proposta ofertada ou
solicitar à licitante da proposta classificada em primeiro lugar com valor
inferior a 50% (cinquenta por cento) do valor estimado da contratação para
comprovar:
7.11.1. que o custo da
licitante não ultrapasse o valor da proposta; e
7.11.2. a existência de custos
de oportunidades capazes de justificar o vulto da oferta.
7.11.3. Será desclassificada a
proposta da licitante que não demonstrar a exequibilidade da proposta.” (grifo
nosso)
Assim, constatado que a proposta melhor
classificada foi próxima de 36% do estimado para o Grupo 1 e 27% do estimado
para o Grupo 2, solicitou-se, em sede de diligência, manifestação da licitante
Zoom, e-mail 6953063, bem como manifestação da área técnica sobre a
compatibilidade dos valores com o mercado, Memorando 6949480.
Consultou-se, ainda, a Planilha Comparativa de
Preços, doc. 6897343, Planilha Comparativa de Atas, doc. 6816646, e, por fim, o
Estudo Técnico Preliminar, onde fica claro que o valor estimado para a
contratação, frente às Atas de Registro de Preços consultadas, ficou muito
próximo do valor final do pregão. O ETP, doc. 6669345, em seu item 6 – Análise
Comparativa de Custos, previu um investimento de cerca da R$ 78,5 milhões,
enquanto a proposta final da recorrida Zoom foi de aproximadamente R$ 78,2
milhões.
Além disso, a área técnica dispôs na Informação
6953091 que “Quanto à compatibilidade com os preços de mercado, embora o
presente pregão tenha obtido um resultado bastante abaixo da média
estimada, os preços da proposta são apenas um pouco abaixo dos melhores
resultados obtidos por órgãos que fizeram grandes aquisições, o que indica que
as propostas são exequíveis.”
Quanto à manifestação da licitante Zoom, através
da Carta 6953066, esta não acrescentou informação relevante para a decisão
sobre a exequibilidade de sua proposta.
II - Quanto ao segundo:
Impende esclarecer que o pregoeiro conduz o
procedimento licitatório conforme os preceitos legais e editalícios, não lhe
cabendo, todavia, uma análise dos aspectos técnicos ou quanto à conveniência e
oportunidade do processo, sujeitos à discricionariedade da autoridade
ordenadora de despesa competente.
Preliminarmente a Diretoria de Tecnologia da
Informação se manifestou quanto à aceitabilidade do objeto e proposta da
licitante vencedora, Informação 6953091, declarando que:
“Em atenção ao memorando 6949480,
e em relação à documentação apresentada pela empresa Zoom Tecnologia Ltda.,
esta Secretaria se manifesta conforme abaixo.
Proposta Comercial - documento
6949326 (substituído pelo 6953054, para correção de erro material).
Parecer: ATENDE às condições exigidas
no Edital do PE 21/2023 (6914044).
Proposta Técnica (e
planilhas de verificação) - documentos 6949334 e 6949343.
Parecer: ATENDEM ao objeto e
condições de habilitação técnica exigidos no Edital do PE 21/2023 (6914044).
Declarações de
Conformidade e Parceria - documento 6949378.
Parecer: ATENDEM às condições
exigidas no Edital do PE 21/2023 (6914044).
Atestados de
Capacidade Técnica - documento 6949393.
Parecer: ATENDEM às condições
exigidas no Edital do PE 21/2023 (6914044).”
Estabelecida a fase recursal e recebidas as
razões e contrarrazões das licitantes, solicitou-se nova manifestação da
competente área técnica, Memorando 6969529, à luz dos apontamentos trazidos
pela nova documentação:
“Encaminham-se os autos para
que se manifeste esta competente área técnica acerca das razões de recurso
apresentadas pela licitante recorrente O2 Soluções em Tecnologia Digital Ltda.,
doc. 6960378, bem como sobre as contrarrazões da licitante recorrida Zoom
Tecnologia Ltda., doc. 6969276, no que concerne aos aspectos técnicos das
argumentações.”
Ao que a DTI atendeu com a Manifestação 6973893:
“Em atenção ao Memorando
6969529, no que concerne aos aspectos técnicos das argumentações apresentadas
nas razões e nas contrarrazões, esta área técnica se manifesta conforme segue.
Recurso O2 Soluções
em Tecnologia Ltda. - Razões (6960378) / Contrarrazões Zoom Tecnologia
(6969276)
A empresa O2 afirma que o
equipamento proposto pela licitante Zoom não atende uma das funcionalidades
requeridas para a solução. No recurso, isto está agrupado sob o título "DO
NÃO ATENDIMENTO AO REQUISITO DE PROTEÇÃO DE DADOS. O subitem do edital que
trata da questão é o que segue:
4.4.6.5. Deverá ter
funcionalidade de mitigação contra ataques de ransomware e deleção intencional
de dados, permitindo ao CONTRATANTE a restauração rápida dos dados
criptografados ou deletados, mediante uma das seguintes alternativas:
4.4.6.5.1. Imutabilidade
que impeça alteração e deleção dos dados, independentemente do nível de acesso
do usuário e/ou que possua mecanismo de execução de comando privilegiado por
meio da aprovação de, no mínimo, dois usuários administradores da solução de
armazenamento e com duplo fator de autenticação;
4.4.6.5.2. Isolamento por
meios lógicos usando cópias protegidas, armazenamento de objetos na nuvem ou
por meio de um “air gap” físico;
4.4.6.5.3. A funcionalidade
em questão poderá ser externa (não nativa do sistema ofertado), podendo ser
composta por mais de um produto, desde que comprovadas as homologações de todas
as fabricantes envolvidas;
4.4.6.5.4. O fornecimento
de hardware computacional e armazenamento externo, caso necessários, bem como
serviços de implementação e configuração, deverão ser considerados para o
limite de capacidade exigida, respeitando os mesmos níveis de resiliência,
suporte e prazos de garantia desta especificação;
4.4.6.5.5. Neste caso todos
os custos acima, incluindo a manutenção da funcionalidade não nativa da
solução, deverão ser considerados pela CONTRATADA em sua proposta, não cabendo
ao CONTRATANTE o dispêndio de recursos extras para obter a funcionalidade
desejada;
4.4.6.5.6. Sendo a solução
“não nativa”, todos os componentes deverão ser atualizados (sistema
operacional, firmware, etc.) pela CONTRATADA, durante toda a duração da
garantia do equipamento principal.
4.4.6.6. Para a
funcionalidade de mitigação acima, a solução deverá permitir configuração
granular da proteção, permitindo definir o tempo entre cópias (RPO) e o tempo
de retenção para as cópias imutáveis.
Se nota, além do que foi
reproduzido no recurso, que o subitem tem mais detalhes. Detalhes que
demonstram que o edital é bem aberto sobre qual maneira o fabricante vai
utilizar para prover a mitigação contra ataques (de ransomware e deleção
intencional de dados). A recorrente alega que uma característica da solução
proposta pela Zoom faz com que esta não atenda ao solicitado no edital.
Reproduzimos abaixo (texto que é repetido várias vezes na documentação):
If you want to disable the
secure snapshot function of HyperCDP objects or change the min. protection
period during the protection period, log in to the system using the serial port
as a security administrator and modify the HyperCDP object properties. For
details about the command, see change hyper_cdp general in Command Reference.
For details on how to create a security administrator, see "Creating a
Local User" in the Administrator Guide.
Sem entrar em detalhes muito
técnicos, a "deficiência" apontada pela recorrente reside no fato de
que existe uma maneira de alterar a retenção dos dados, através da ação de um
único usuário (administrador de segurança). A maneira de fazer essa alteração é
seguindo o procedimento introduzido acima. Acontece que o procedimento acima
implica em uso da "porta serial" do equipamento.
Para explorar esta deficiência
é necessário que uma pessoa mal intencionada consiga acesso físico ao
equipamento (para o uso da porta serial). Ou seja, o atacante, além da
credencial de administrador de segurança do sistema, precisa passar pelo
credenciamento no tribunal, conhecer o caminho até a sala de data center, obter
credencial de acesso à sala segura do data center e, então, encontrar o
equipamento no data center para, enfim, acessar a porta serial. Só depois disto
seria possível realizar alterações que pudessem facilitar a exclusão de
arquivos (que antes eram configurados para serem imutáveis).
Ora, um atacante com acesso
físico ao data center não precisa se preocupar em alterar retenção de arquivos,
sendo que com um simples copo d’água ele conseguiria danificar um equipamento garantindo
assim a perda eficaz dos dados armazenados. Podemos perceber que assumir o
acesso físico do equipamento implica em outra avaliação de risco, pois é outro
cenário. O item em questão tem o objetivo primário de criar um controle lógico
de segurança para prevenir exclusão ou alteração indevida de arquivos mediante
um ataque cibernético. E, considerando esse contexto, a solução ofertada atende
o que é requerido, alcançando esse objetivo.
Por esses motivos, esta Área
Técnica entende que o equipamento da licitante Zoom Tecnologia Ltda. atende ao
item 4.4.6 (Segurança da Informação) e respectivos subitens, sendo, s. m. j.,
improcedente o recurso da empresa da empresa O2 Soluções em Tecnologia Digital
Ltda.”
III – Quanto ao terceiro:
A nova lei de licitações está em vigência desde
1º de abril de 2021 enquanto a lei antiga teve sua aplicação estendida até
30/12/2023 por força da L.C. 198/2023, o que tem levado a maioria dos órgãos
públicos a continuarem utilizando a Lei n.º 8.666/1993 pela segurança que representa
a utilização de uma norma conhecida e de jurisprudência consolidada.
Questões que estão sendo enfrentadas atualmente
nesta seara, o estão sendo sem exemplos que lhe sirvam de antecedente.
O dispositivo que exige a declaração de
cumprimento de reserva da vagas para PcD e reabilitados da Previdência Social
aparece como inovação da nova lei como requisito implícito de habilitação, pois
não consta no artigo 68 como parte da habilitação, mas como um requisito a ser
exigido na fase:
“Art. 63. Na fase de
habilitação das licitações serão observadas as seguintes disposições:
[...]
IV - será exigida do licitante
declaração de que cumpre as exigências de reserva de cargos para pessoa com
deficiência e para reabilitado da Previdência Social, previstas em lei e em
outras normas específicas.”
A Constituição Federal, artigo 37, XXI, prevê que
se exija das licitantes somente o necessário à demonstração da capacidade de
execução do objeto:
“XXI - ressalvados os casos
especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão
contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de
condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de
pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o
qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica
indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.”
Porém, a Carta Magna também é profícua no
estabelecimento de direitos fundamentais, chegando a estabelecer que é competência
concorrente da União, Estados, DF e Municípios, legislar sobre a proteção e
integração social das pessoas portadoras de deficiência.
E parece que foi essa opção a do legislador, ao
utilizar o novo regulamento de licitações para prever situações de
implementação de políticas públicas com fins sociais e de inclusão, até pela
dimensão que as compras públicas alcançam na economia brasileira, como leciona
Jacoby Fernandes:
“[...] a nova norma não trata
de licitações e contratos apenas, trata da contratação direta sem licitação
[...] dos efeitos das políticas públicas, como os egressos do sistema prisional
[...], as mulheres vítimas de violência doméstica [...], proteção do meio
ambiente [...]” (Contratação Direta sem Licitação, 2021, p. 26)
O que não contraria a Lei n.º 14.133/2021, que
prevê em seu artigo 5º:
“Art. 5º Na aplicação desta
Lei, serão observados os princípios da legalidade, da impessoalidade, da
moralidade, da publicidade, da eficiência, do interesse público, da probidade
administrativa, da igualdade, do planejamento, da transparência, da eficácia,
da segregação de funções, da motivação, da vinculação ao edital, do julgamento
objetivo, da segurança jurídica, da razoabilidade, da competitividade, da
proporcionalidade, da celeridade, da economicidade e do desenvolvimento
nacional sustentável, assim como as disposições do Decreto-Lei
nº 4.657, de 4 de setembro de 1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro).”
E parece que este ponto da fase recursal deve ser
encarado sob o aspecto da ponderação de princípios, que por representarem
segundo Ávila “normas imediatamente finalísticas, estabelecem um estado ideal
de coisas a ser buscado, que diz respeito a outras normas do mesmo sistema,
notadamente das regras. Sendo assim, os princípios são normas importantes para
a compreensão do sentido das regras”. (Teoria dos Princípios, 2016, p. 122)
Por um lado, legalidade, a vinculação ao
instrumento convocatório e desenvolvimento nacional sustentável:
A legalidade impõe à Administração o império da
lei, e, conforme Justen Filho, a existência de “disciplina legislativa prévia
instituindo a competência administrativa e fixando pressupostos, limites,
conteúdo e finalidade para a atuação da autoridade administrativa.”
(Comentários, 2021, p. 107) Assim, diante da previsão expressa na Lei n.º
14.133 da exigência de uma declaração na fase de habilitação, não há
interpretação diversa possível, além de exigi-la.
E na prática o sistema Compras.Gov exige de todos
os licitantes a concordância com o “termo de Aceite”, doc. 6949143, previamente
ao cadastramento da proposta. Sendo assim. Todos os licitantes que participam
do pregão prestaram a declaração exigida no art. 63, IV.
E o Edital espelhou essa exigência em seu item
8.3., ao tratar da habilitação, vinculando a Administração e os licitantes a
seus termos:
“8.3. Para fins de
habilitação, a licitante também deverá apresentar a seguinte documentação:
[...]
8.3.6. declaração de
cumprimento as exigências de reserva de cargos para pessoa com deficiência e
para reabilitação da Previdência Social, previstas em lei e em outras normas
específicas;
[...]
8.3.9. As declarações
previstas neste item 8.3 deverão ser preenchidas pela licitante no sistema
Compras.gov.br e serão consultadas pelo pregoeiro durante a sessão, para
posterior juntada ao processo administrativo.”
Ainda que formalmente a licitante recorrida tenha
cumprido a exigência de prestar a declaração via sistema, essa declaração,
conforme exposto por Justen Filho, tem presunção de veracidade relativa e
constatou-se, após consulta ao portal no Ministério do Trabalho, que no dia do
certame, a empresa não atendia a exigência legal.
Destaca-se que o procedimento licitatório contou
com prazos para questionamentos, amplamente utilizados pelos licitantes, com
mais de 16 mensagens de esclarecimento e teve prazo legal de impugnação
transcorrido in albis, Não tendo sido, tal redação atacada por esta via,
conforme consta dos autos.
Além disso, a opção legislativa de utilizar os
efeitos extraeconômicos das licitações para o incremento de iniciativas de
caráter sustentável, entendida a sustentabilidade em seu tripé social,
ambiental e econômico, é compatível com a defesa dos direitos fundamentais, e
as regras que promovem a efetividade das normas de proteção às pessoas com
deficiência.
Frise-se que a Nova Lei de Licitações não só
previu essa declaração como requisito de habilitação como previu, em seu artigo
92, XVII, que é obrigação contratual cumprir as exigências de reserva de cargos
para pessoa com deficiência e reabilitado da previdência social ao longo de
toda vigência contratual e, logo, obrigação da Administração fiscalizar tal
cumprimento.
Por outro lado, a razoabilidade e
proporcionalidade, interesse público, economicidade e eficiência:
A contrariu sensu, é sabido que a nova
disciplina de licitações para além dos seus princípios, já citados, previu como
objetivos dos processos licitatórios, art. 11:
“Art. 11. O
processo licitatório tem por objetivos:
I - assegurar a seleção da
proposta apta a gerar o resultado de contratação mais vantajoso para a
Administração Pública, inclusive no que se refere ao ciclo de vida do objeto;
II - assegurar tratamento
isonômico entre os licitantes, bem como a justa competição;
III - evitar contratações com
sobrepreço ou com preços manifestamente inexequíveis e superfaturamento na
execução dos contratos;
IV - incentivar a inovação e o
desenvolvimento nacional sustentável.
Parágrafo único. A alta
administração do órgão ou entidade é responsável pela governança das
contratações e deve implementar processos e estruturas, inclusive de gestão de
riscos e controles internos, para avaliar, direcionar e monitorar os processos
licitatórios e os respectivos contratos, com o intuito de alcançar os objetivos
estabelecidos no caput deste artigo, promover um ambiente
íntegro e confiável, assegurar o alinhamento das contratações ao planejamento
estratégico e às leis orçamentárias e promover eficiência, efetividade e
eficácia em suas contratações.”
No que aparenta ser um movimento, do formalismo
do regulamento anterior, para um maior foco nos resultados dos procedimentos.
Assim, não resta dúvida que a seleção da proposta mais vantajosa (inciso I),
assume relevância ao ser associada à previsão de evitar contratações com
sobrepreço (inciso III) e ao parágrafo único, que estabelece que à alta
administração cabe promover eficiência, efetividade e eficácia em suas
contratações.
Ao considerar a diferença de valor da proposta
vencedora para a da segunda colocada de cerca de R$ 19 milhões, não parece
razoável ou proporcional uma inabilitação por uma comprovação que, em última
análise, demonstra a posição da massa laboral de uma empresa em dado momento,
situação que pode ser afetada temporariamente por um pedido de demissão ou
falecimento, dentro de um mesmo mês e, portanto; fora do controle da empresa. A
certidão citada, doc. 6983542, traz em seu texto a informação que a mesma é
fornecida com base em dados que a própria empresa fornece:
“1. Esta certidão reflete tão
somente os dados constantes dos registros administrativos do eSocial. Esses
dados são declarados pelo próprio empregador, não havendo validação por parte
da Secretaria de Inspeção do Trabalho.”
Além disso, consulta da mesma certidão para a
recorrente, doc. 6983648, demonstra que aquela não pode ser emitida, visto que
esta não se enquadra na hipótese legal para exigência mínima de reserva de
cargos para PcD. Dos demais licitantes as certidões apontam 6 (seis) empresas
das quais não seria exigida comprovação de empregar PCD e 2 (duas) com número
inferior ao exigido.
Ou seja, em razão de uma licitante estar
empregando menos de 9 (nove) PcD, exigidos por lei, na data do pregão, se
levará à recusa de sua proposta de R$ 19 milhões mais econômica em prol de uma
licitante da qual não é exigida a reserva de sequer 1 (uma) vaga PcD. É essa
isonomia que atende ao interesse público? E ao interesse e direito ao trabalho
dos PcD’s?
Porém, considerando que eventual consideração
sobre a constitucionalidade do dispositivo, conforme argüido pela recorrida,
não é competência deste pregoeiro, considerando que as disposições do Edital
podem ser atacadas via impugnação, e não o foram, considerando que a
discricionariedade do agente público não pode ofender a legalidade e que o
Edital vincula as partes, e que a segurança jurídica é fator de estabilidade
social, entendo que a recorrida não cumpriu requisito formal de habilitação
Assim, conforme pontos I, II e III abordados
acima, pelas informações prestadas pelas licitantes e área técnica, decido:
Por fim, diante das razões acima expostas,
CONHEÇO do recurso interposto pela licitante O2 Soluções em Tecnologia
Digital Ltda., para DAR-LHE PROVIMENTO, inabilitando
a licitante Zoom Tecnologia Ltda., com fundamento no artigo
165 da Lei n.º 14.133/201.
Contudo, diante da complexidade do tema,
considerando a inexistência de jurisprudência sobre o assunto e que a decisão
final depende de juízo de ponderação entre princípios, como economicidade e
razoabilidade frente à legalidade, e que tal juízo seria manifestação da
vontade e decorrência do entendimento da Administração, submeto à autoridade
superior para análise da decisão acerca do exposto.
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SEGUNDO
DOCUMENTO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO
Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300 - Bairro
Praia de Belas - CEP 90010-395 - Porto Alegre - RS - www.trf4.jus.br
PARECER - DG/ASSEAD
Senhor Diretor-Geral:
Esta Corte instaurou procedimento licitatório na
modalidade pregão eletrônico, pelo critério de julgamento de menor preço, com
fornecimento parcelado, visando ao registro de preços de subsistemas de
armazenamento de dados (storage), incluindo serviços de instalação,
configuração e garantia por um prazo de 60 (sessenta) meses, nos termos
do edital 6914044, do Pregão Eletrônico nº 21/2022, sob a regência da Lei n.º
14.133/2021.
Por meio do Parecer (6905071) ASSEAD, esta
Assessoria em Assuntos Administrativos, com apontamento, aprovou os demais
aspectos jurídicos da documentação apresentada e opinou pelo prosseguimento da
licitação, o que foi acolhido pelo Despacho (6907418) desse Diretor-Geral e por
decisão do Exmo. Sr. Presidente (6913015).
A título de cotejo, importante referir que os
valores inicialmente estimados pela Administração foram de R$
123.269.495,36 (cento e vinte e três milhões, duzentos e
sessenta e nove mil quatrocentos e noventa e cinco reais e trinta e seis
centavos) para o Grupo 1 e R$ 123.369.240,65 (cento
e vinte e três milhões, trezentos e sessenta e nove mil duzentos e quarenta
reais e sessenta e cinco centavos) para o Grupo 2.
Conforme se depreende da Ata da sessão (6954056),
houve 9 (nove) licitantes participando da sessão com vistas ao grupo 01, e 10
(dez), para o grupo 2, e ao final da fase competitiva a licitante Zoom
Tecnologia Ltda. foi a melhor classificada, com lance final de R$
44.380.000,16 (quarenta e quatro milhões trezentos e oitenta mil reais e
dezesseis centavos) para o Grupo 1 e R$ 33.848.000,11 (trinta
e três milhões oitocentos e quarenta e oito mil reais e onze centavos)
para o Grupo 2.
Encaminhada a documentação pertinente da
licitante Zoom Tecnologia Ltda. para a Diretoria de Tecnologia da Informação
desta Corte, pelo Memorando 6949480, a referida área técnica
manifestou-se no sentido de que a referida empresa atendeu aos requisitos
constantes do edital (6953091), nos seguintes termos:
Em atenção ao memorando
6949480, e em relação à documentação apresentada pela empresa Zoom Tecnologia
Ltda., esta Secretaria se manifesta conforme abaixo.
Proposta Comercial - documento
6949326 (substituído pelo 6953054, para correção de erro material).
Parecer: ATENDE às condições
exigidas no Edital do PE 21/2023 (6914044).
Proposta Técnica (e
planilhas de verificação) - documentos 6949334 e 6949343.
Parecer: ATENDEM ao objeto e
condições de habilitação técnica exigidos no Edital do PE 21/2023 (6914044).
Declarações de
Conformidade e Parceria - documento 6949378.
Parecer: ATENDEM às condições
exigidas no Edital do PE 21/2023 (6914044).
Atestados de
Capacidade Técnica - documento 6949393.
Parecer: ATENDEM às condições
exigidas no Edital do PE 21/2023 (6914044).
Quanto à
compatibilidade com os preços de mercado, embora o presente pregão
tenha obtido um resultado bastante abaixo da média estimada, os preços da
proposta são apenas um pouco abaixo dos melhores resultados obtidos por órgãos
que fizeram grandes aquisições, o que indica que as propostas são
exequíveis. (GRIFADO)
A licitante O2 Soluções em Tecnologia Digital
Ltda. apresentou recurso (6960378), sustentando que “a recorrida não cumpre
os requisitos de habilitação e não poderia ter participado do pregão” e, em
relação à solução ofertada, que “a tecnologia fornecida pela recorrida não
atende o requisito de mitigação contra ataques de ramsomware e deleção
intencional de dados e não poderia ter a proposta aceita pela contratante”.
Quanto à alegação do não atendimento dos aspectos
técnicos pela recorrida Zoom Tecnologia Ltda., a Diretoria de Tecnologia da
Informação desta Corte afastou os argumentos da recorrente O2 Soluções em
Tecnologia Digital Ltda., concluindo que (a) a proposta comercial e técnica
(e planilhas de verificação), (b) as declarações de conformidade e
parceria, bem como (c) a compatibilidade com os preços de mercado da
licitante Zoom Tecnologia Ltda. atenderam às condições editalícias,
consoante demonstra a Informação 6953091 DTI. Novamente provocada a
manifestar-se, a referida área técnica asseverou que o equipamento da
licitante Zoom Tecnologia Ltda. atende ao item 4.4.6 (Segurança da Informação)
e respectivos subitens, sendo, s. m. j., improcedente o recurso da empresa O2
Soluções em Tecnologia Digital Ltda (Manifestação 6973893 DTI).
No item 4 das razões de recurso (6960378), a
recorrente O2 Soluções em Tecnologia Digital Ltda. igualmente defendeu a
inabilitação da licitante Zoom Tecnologia Ltda. por não atender condição do
edital consistente no cumprimento das exigências de reserva de cargos para
pessoa com deficiência e para reabilitado da Previdência Social, previsto
em lei, sustentando que essa irregularidade consiste em vício insanável e
tampouco sujeito a juízo de formalidade moderada. Pediu, ao final, que a
recorrida seja considerada inabilitada devido à documentação de habilitação não
atender à condição editalícia.
Por sua vez, a licitante Zoom Tecnologia Ltda.
apresentou contrarrazões (6969276), defendendo a inconstitucionalidade da
inabilitação com base na condição exigida em Edital, pois “comprovou condições
técnicas e econômicas suficientemente aptas à garantia da segurança da futura
contratação, cumprindo, por conseguinte, as exigências máximas admitidas no
texto constitucional (art. 37, XXI, CF/88).” Sustentou ainda que a nova lei de
licitações introduziu nova lógica de prevalência do resultado sobre a forma, e
que sua proposta, cerca de R$ 19 milhões mais barata que a da recorrente, seria
a opção adequada ao atendimento do interesse público.
No item 1.1. das contrarrazões, a recorrida
informou que o não atendimento da reserva de vagas para PcD foi uma situação
temporária e que já estaria sanada na data da apresentação dos seus argumentos,
demonstrando documentalmente o atendimento desse requisito, mediante os
documentos extraídos do e-Social, em anexo às "Contrarrazões Zoom"
(6969276). Asseverou que eventual não atendimento desse requisito pode ser
normal e recorrente, pois:
“18. Como é cediço, qualquer
empresa obrigada à reserva de cotas prevista na Lei 8.213/91, encontra-se
suscetível de não preencher, temporariamente, o percentual previsto no art. 93,
o que se dá, fundamentalmente, pela própria dinâmica e fluidez do mercado de
contratações, sendo certo que, em qualquer situação, a tarefa de localizar um
candidato que preencha os requisitos da seleção é árdua e desafiadora até mesmo
para a melhor gestão de recursos humanos.
19. Essa transição temporária,
contudo, alheia à vontade do empregador, não tem o condão de, por si só,
caracterizar o descumprimento da obrigação legal, e deve ser temperada por
critérios de justiça e razoabilidade.”
No item 1.2., defendeu a licitante Zoom
Tecnologia Ltda. que a comprovação do cumprimento da reserva de vagas para
PcD e Reabilitados da Previdência deveria ser flexibilizada diante de “(...)
objetivos e o norte interpretativo da Lei nº 14.133/21”, e que essa comprovação
como condição de participação ou habilitação é inconstitucional e atenta contra
diversos princípios:
“20. A discussão em torno da
reserva de cargos passa, preambularmente, pela mudança de cenário nas
aquisições públicas, proporcionada pela correta aplicação da Lei 14.133/21.
21. Indiscutivelmente a Nova
Lei de Licitações traz uma disruptura em relação ao regime tradicional das Leis
8.666/93 (Geral), 10.520/02 (Pregão) e 12.462/11 (RDC), no que diz respeito aos
objetivos do certame licitatório.
22. Tal disruptura passa quase
desapercebida numa primeira análise, devido ao fato de que, tocante ao rito
procedimental do certame, poucas questões foram, de fato, inovadoras. Cria-se
então uma mentalidade de que nada mudou no ordenamento jurídico.
23. Porém, num olhar mais atento,
verificar-se-á que a Nova Lei de Licitações tem o seu foco nos objetivos do
certame e não no rito procedimental propriamente dito, podendo essa realidade
ser muito bem visualizada no seu artigo 11, verbis:
‘Art. 11. O
processo licitatório tem por objetivos:
I - assegurar a
seleção da proposta apta a gerar o resultado de contratação mais vantajoso para
a Administração Pública, inclusive no que se refere ao ciclo de vida
do objeto;
II - assegurar tratamento
isonômico entre os licitantes, bem como a justa competição;
III - evitar
contratações com sobrepreço ou com preços manifestamente inexequíveis
e superfaturamento na execução dos contratos;
IV - incentivar a inovação
e o desenvolvimento nacional sustentável.
Parágrafo único.
A alta administração do órgão ou entidade é responsável pela governança das
contratações e deve implementar processos e estruturas, inclusive de gestão de
riscos e controles internos, para avaliar, direcionar e monitorar os processos
licitatórios e os respectivos contratos, com o intuito de alcançar os objetivos
estabelecidos no caput deste artigo, promover um ambiente
íntegro e confiável, assegurar o alinhamento das contratações ao planejamento
estratégico e às leis orçamentárias e promover eficiência, efetividade
e eficácia em suas contratações. Destacado.’
24. O dispositivo legal em
comento deixa claro que o processo licitatório tem um foco: assegurar um
excelente resultado para a sociedade, isto é, a seleção da proposta apta a
gerar o resultado de contratação mais vantajoso, garantindo, isonomia, justa
competição, preço justo e inovação. O que se deseja, em última instância, é
garantir eficiência, efetividade e eficácia da contratação.
25. Diferente, portanto, do
regime tradicional, onde o foco está na rigidez procedimental, isto é, valoriza-se
muito mais o rito do procedimento de seleção do fornecedor, do que o resultado
que se necessita alcançar: a boa compra pública.
26. Essa mudança de foco, tão
necessária para combater a má qualidade da compra pública, ao longo dos últimos
30 anos de vigência da Lei 8.666/93, é indispensável para a boa aplicação da
Nova Lei de Licitações, e também para a interpretação a ser dado ao edital, que
passa a ser muito mais um documento que reúne a modelagem e a boa estratégia de
seleção do fornecedor e da compra pública, do que um instrumento rígido ou até
mesmo acima do ordenamento jurídico.”
Outrossim, referiu a recorrida outros
dispositivos contidos na Lei nº 14.133/2021 como exemplos de um “norte
interpretativo” que deveria atribuir “menos exigências restritivas, porém mais
exigências que garantam a qualidade do objeto a ser contratado” e que a
exigência de cumprimento de cota de vagas para PcD se dá sobre empresas que
empregam mais de 100 (cem) funcionários, e que essas enfrentam dificuldades
para preenchimento dessas vagas em diversas situações transitórias, ilustrando
com notícia do portal da câmara de deputados essa dificuldade:
“33. Note-se que se trata de
obrigação que depende da vontade de terceiros – no caso, a pessoa portadora de
deficiência ou reabilitada da Previdência Social – não podendo a empresa ser
considerada uma descumpridora da Lei 8.213/91, pelo simples fato de que, numa
determinada temporalidade, encontra-se com o preenchimento abaixo do número
mínimo indispensável.
34. Este rigor, por certo,
atentaria contra a isonomia, que é um dos objetivos precípuos do certame para
se alcançar a justa competição e, por conseguinte, o resultado da contratação
mais vantajosa ao erário.
35. No caso, uma empresa que
emprega mais de 300 funcionários, como a Recorrida, e, portanto, possui um
importante papel socioeconômico, ficará desalijada do certame por uma situação
fática momentânea que não representa a sua realidade preponderante, que é de
cumprir as cotas previstas na legislação especial. Ao passo que empresas que
sequer empregam pessoas no quantitativo mínimo, como a Recorrente, seriam
consideradas aptas a contratar com a Administração Pública.
36. Veja-se que não há lógica
nesse raciocínio e a questão certamente deverá ser enfrentada na aplicação da
Nova Lei de Licitações, a qual, como visto, tem como base interpretativa a
busca dos objetivos indispensáveis ao alcance de uma contratação eficiente,
eficaz e efetiva.”
A licitante Zoom Tecnologia Ltda. sustentou
ainda que o princípio da razoabilidade deveria ser ponderado na aplicação da
lei, evitando injustiças e buscando o atendimento do interesse público, uma vez
que:
“44. O presente caso tem
características singulares! O confronto de uma compra pública com economia de
mais de 19 milhões de reais, e o descumprimento, meramente
temporário, e não por culpa da Recorrida, da reserva de cotas para
deficientes e reabilitados da Previdência Social, em aparente infração ao art.
63, IV da Lei 14.133/21.
45. E nesse compasso, seria no
mínimo irrazoável desalijar a proposta de menor preço, apresentada por uma
empresa que emprega mais de 300 funcionários - por estar ela,
num momento transitório de busca de pessoas que preencham os critérios da
reserva - e contratar a Recorrente, que não desempenha papel socioeconômico
relevante, e por isso, encontra-se desobrigada da reserva de cargos, e
ainda apresenta proposta que onera a Administração Pública em mais de 19
milhões.” (grifos no original)
Outrossim, aduziu que a Constituição assegura a
isonomia em licitações e permite somente “exigências de qualificação técnica e
econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações” (art. 37,
XXI) e que, além disso, por meio de uma interpretação “sistêmica da Lei nº
14.133/21, denota-se que todas as outras políticas públicas de inclusão foram
feitas em sede de contratação e não como requisito de habilitação”.
No ponto 1.3., a recorrida referiu que sua defesa
da exeqüibilidade da proposta não foi “emotiva” mas que destacou sua
experiência e contratos públicos anteriores, que possui certificações e cultura
de sustentabilidade, reduzindo seus custos e que possui parceria duradoura com
a fabricante dos equipamentos.
A defesa do cumprimento dos requisitos técnicos é
feita no item 1.4., onde a licitante Zoom Tecnologia Ltda. informou em
quais documentos e passagens foi demonstrado o atendimento dos requisitos
citados pela recorrente:
“90. Desta feita, não cabe a
alegação de que a solução não atende ao requisito de imutabilidade, muito pelo
contrário, o que a solução realizar com o acesso do administrador local, via
portal serial, é a mudança ou ajuste de propriedades do secure sanpshot, bem
como da política de retenção, mas não a deleção de dados, veja-se:
“If you want to disable the
secure snapshot function of HyperCDP objects or change the min. protection
period during the protection period, log in to the system using the serial port
as a security administrator and modify the HyperCDP object properties.” Fonte:
OceanStor Dorado 6.1.x HyperCDP Feature Guide for Block.pdf (pág. 37)
91. Isto é, verifica-se nesse
caso, que o requisito de “imutabilidade que impeça alteração e deleção dos
dados” ocorre “independentemente do nível de acesso do usuário e/ou que possua
que possua mecanismo de execução de comando privilegiado”, conforme solicitado
no item editalício.
92. Mais. O Huawei OceanStor
Dorado permite a criação de mais de um usuário administrador da solução de
armazenamento, com perfis diferenciados, incluindo super administrators,
administradors, security administrators e outros [...]”.
Por fim, pede a recorrida Zoom
Tecnologia Ltda. que o recurso apresentado pela recorrente O2 Soluções em
Tecnologia Digital Ltda. tenha provimento negado.
É o relatório. Opina-se.
Inicialmente, cumpre registrar que, por ocasião das
suas contrarrazões recursais (6969276), a empresa Zoom Tecnologia Ltda.
noticiou que o percentual de 3% de PcDs sobre o número de total colaboradores
foi recentemente alcançado, conforme demonstram os relatórios emitidos pelo
sistema e-Social em anexo.
De fato, os documentos extraídos do e-Social
junto às "Contrarrazões Zoom" (6969276) comprovam que a
licitante Zoom Tecnologia Ltda. emprega pessoas com deficiência ou
beneficiários reabilitados da Previdência Social em conformidade com o
percentual previsto no artigo 93 da Lei 8213/91, atendendo assim ao requisito
do edital, não obstante em momento posterior.
Por oportuno, a previsão contida no artigo 12,
III, da Lei nº 14.133/21 prevê que "o desatendimento de exigências
meramente formais que não comprometam a aferição da qualificação do licitante
ou a compreensão do conteúdo de sua proposta não importará seu afastamento da
licitação ou a invalidação do processo". A propósito, pode-se afirmar
que o referido dispositivo positivou e consagrou o "princípio do formalismo
moderado" há muito utilizado pelo Tribunal de Contas da União - TCU
no julgamento de casos análogos pertinentes a contratações, sempre tendo por
escopo a salvaguarda do interesse público. Veja-se.
O Tribunal de Contas da União tem entendido que o
"princípio do formalismo moderado" pela Administração Pública é
aquele que prescreve a adoção de formas simples e suficientes para propiciar
adequado grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos administrados,
promovendo, assim, a prevalência do conteúdo sobre o formalismo extremo,
respeitadas, ainda, as praxes essenciais à proteção das prerrogativas dos
administrados, tudo de acordo com o art. 2º, parágrafo único, incisos VIII e
IX, da Lei 9.784/1999, bem assim com o espírito da Lei de Licitações. Nesse
sentido, o Acórdão 357/2015 - TCU/Plenário, Relator Ministro Bruno Dantas, data
da sessão: 04-03-2015, verbis:
REPRESENTAÇÃO, COM PEDIDO DE
MEDIDA CAUTELAR. SUPOSTAS IRREGULARIDADES OCORRIDAS EM PROCEDIMENTO
LICITATÓRIO, RELACIONADAS À DESCLASSIFICAÇÃO INDEVIDA DE LICITANTE COM
PROPOSTA MAIS VANTAJOSA. VÍCIO INSANÁVEL NO MOTIVO DETERMINANTE DO ATO DE
DESCLASSIFICAÇÃO. NULIDADE. DETERMINAÇÃO. CIÊNCIA. 1. O
intuito basilar dos regramentos que orientam as aquisições pela Administração
Pública é a contratação da proposta que lhe seja mais vantajosa,
obedecidos os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da
moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da
vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes
são correlatos. 2. No curso de procedimentos licitatórios, a
Administração Pública deve pautar-se pelo princípio do formalismo moderado,
que prescreve a adoção de formas simples e suficientes para propiciar adequado
grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos administrados, promovendo,
assim, a prevalência do conteúdo sobre o formalismo extremo,
respeitadas, ainda, as praxes essenciais à proteção das prerrogativas dos
administrados. (Grifado)
O voto-condutor do acórdão proferido pelo
Ministro Bruno Dantas nesse caso paradigmático demonstrou que a
ocorrência de "falha formal" (intempestividade no encaminhamento da
planilha de custos ajustada) não poderia levar a Administração a prescindir de
oferta potencialmente mais favorável, sob pena de subversão do intuito basilar
dos regramentos que orientam as aquisições pela Administração Pública, qual
seja, a contratação da proposta que lhe seja mais vantajosa, consoante
excerto abaixo transcrito:
(...)
Conforme visto no relatório
precedente, cuidam os autos de representação formulada pela empresa Air Time
Engenharia e Instalações Ltda. acerca de possíveis irregularidades ocorridas no
Pregão Eletrônico 26/2014, lançado pelo Colégio Pedro II.
(...)
7. Como se pode
observar, a falha no preenchimento da planilha, motivação dada pelo pregoeiro
para recusar a proposta da segunda colocada no certame, foi sanada mediante
encaminhamento de nova planilha. Ainda assim, o Reitor se apega ao
argumento de que a nova planilha foi dirigida de maneira intempestiva, após a
decisão do recurso, e que ela teria sido substancialmente modificada em relação
à planilha original.
8. Diante desse
panorama, ao contrário do defendido pelo Reitor, não me parece razoável que, em
razão de suposto atraso, a administração furte-se em avaliar uma proposta
potencialmente mais vantajosa. Digo suposto porque, ao compulsar a ata
do certame, não é possível identificar qualquer fixação de prazo ou mesmo
solicitação dirigida à empresa Air Time Engenharia e Instalações Ltda. no
sentido de que apresentasse nova planilha devidamente corrigida. O único
registro, em ata, é o de recusa da proposta “conforme decisão do recurso”,
sendo que também não se verifica, no corpo do recurso, o estabelecimento de
prazo para envio de nova planilha. Na verdade, as contrarrazões da referida
empresa centraram-se na linha de que sua proposta original já contemplava os
custos questionados, o que não foi acatado pelo pregoeiro.
(...)
13. Todas essas
constatações materializam flagrante inconsistência no fundamento da
desclassificação da proposta em comento, maculando o ato levado a efeito pelo
pregoeiro.
14. Decerto, ainda que
pudéssemos admitir a hipótese de falha formal (intempestividade no
encaminhamento da planilha de custos ajustada), tal fato não poderia levar a
administração a prescindir de oferta potencialmente mais favorável, sob pena de
subversão do intuito basilar dos regramentos que orientam as aquisições pela
Administração Pública, qual seja, a contratação da proposta que lhe seja mais
vantajosa, obedecidos os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade,
da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da
vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes
são correlatos.
15. Sendo assim, o caso
atrairia, inequivocamente, o princípio do formalismo moderado, que prescreve a
adoção de formas simples e suficientes para propiciar adequado grau de certeza,
segurança e respeito aos direitos dos administrados, promovendo, assim, a
prevalência do conteúdo sobre o formalismo extremo, respeitadas, ainda, as
praxes essenciais à proteção das prerrogativas dos administrados, tudo de
acordo com o art. 2º, parágrafo único, incisos VIII e IX, da Lei 9.784/1999,
bem assim com o espírito da Lei de Licitações.
16. Portanto, diante
da ocorrência de falha no ato de desclassificação de licitante que havia
apresentado proposta potencialmente mais vantajosa, em razão de vício insanável
no motivo determinante daquele ato administrativo, cumpre ao TCU assinar prazo
para que o Colégio Pedro II adote medidas com vistas à anulação do referido
ato, bem assim daqueles que lhe sobrevieram. Consequentemente, fica a entidade
autorizada, caso haja interesse, a dar continuidade ao certame a partir da
etapa em que ocorreu o defeito identificado, prosseguindo ao exame de
aceitabilidade da proposta da empresa Air Time Engenharia e Instalações Ltda.,
à luz da nova planilha de custos por ela encaminhada.
(...) (Grifado)
No mesmo sentido, recente decisão daquela Corte
de Contas assinalou que o "princípio do formalismo moderado", não
fora observado por ocasião de um certame promovido pela UFPA (Pregão Eletrônico
- SRP 18/2021), onde houve a inabilitação indevida de licitante por não ter
apresentado documentação comprobatória de que possuía em seu quadro de
empregados o percentual mínimo de pessoas com deficiência ou beneficiários
reabilitados da Previdência Social, nos termos do art. 93 da Lei 8.213/1991,
resultando em seleção de proposta que não era a mais vantajosa para a
Administração:
REPRESENTAÇÃO. INDÍCIOS DE
IRREGULARIDADES OCORRIDAS NO PREGÃO ELETRÔNICO - SRP 18/2021 PROMOVIDO PELA
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ - UFPA. CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS DE NATUREZA
AUXILIAR. INABILITAÇÃO INDEVIDA DE LICITANTE RESULTANDO EM SELEÇÃO DE
PROPOSTA QUE NÃO ERA A MAIS VANTAJOSA PARA A ADMINISTRAÇÃO. ADOÇÃO DE
MEDIDA CAUTELAR PARA SUSPENDER AUTORIZAÇÕES DE ADESÕES À ATA. OITIVAS.
PROCEDÊNCIA. DETERMINAÇÕES CORRETIVAS. CIÊNCIA. ARQUIVAMENTO. (...)
9.2.1. inabilitação
indevida da licitante E. B. Cardoso Eireli, por não ter apresentado
documentação comprobatória de que possuía em seu quadro de empregados o
percentual mínimo de pessoas com deficiência ou beneficiários reabilitados da
Previdência Social, nos termos do art. 93 da Lei 8.213/1991, quando o
pregoeiro, na fase de julgamento da habilitação, já havia obtido certidão que
comprovava, naquela oportunidade, o atendimento da exigência, o que
resultou na seleção de proposta que não era a mais vantajosa para a
Administração, em afronta ao princípio do formalismo moderado e à
jurisprudência do Tribunal (Acórdão
357/2015-TCU-Plenário, Ministro-Relator Bruno Dantas; 2.003/2011-Plenário,
Ministro-Relator Augusto Nardes; 1.795/2015-Plenário, Ministro-Relator José
Mucio Monteiro; e 1.211/2021-Plenário, Ministro-Relator Walton Alencar
Rodrigues); (...) [TCU / ACÓRDÃO 762/2023 (Representação, Processo
013.022/2022-9) PLENÁRIO, Relator Ministro Augusto Sherman, data da sessão
19-04-2023]. (Grifado)
O caso concreto, mutatis mutandis,
igualmente reclama a aplicação do "princípio do formalismo moderado"
amplamente adotado pelo TCU ao julgar casos símeis, como visto, onde propostas
mais vantajosas ou econômicas à Administração acabam sendo afastadas pelos
pregoeiros em decorrência de indevidas inabilitações de licitantes por falhas
ou vícios formais que poderiam ser sanados ou superados no decorrer do processo
sem ocasionar prejuízo ao interesse público e aos partícipes do certame.
Na espécie, a proposta da recorrida Zoom
Tecnologia Ltda. foi cerca de R$ 19.000.000,00 (dezenove milhões)
mais barata que a da recorrente O2 Soluções em Tecnologia Digital Ltda.,
representando sem dúvida a opção mais adequada ao atendimento do interesse
público, de modo que, à luz do chamado "princípio do formalismo
moderado", é plenamente plausível possibilitar àquela o saneamento da
referida irregularidade formal com a apresentação de documento hábil que
demonstre o atendimento da exigência legal contida no art. 93 da Lei nº
8213/91, o que, diga-se de passagem, já foi providenciado pela referida
licitante com a juntada dos documentos extraídos do e-Social às suas
contrarrazões (6969276).
Na doutrina, o portal zenite.blog.br disponibilizou
o artigo Contratações públicas líquidas: a transição paradigmática
promovida pela Lei nº 14.133/21, publicado em 27 de novembro de 2023, de
autoria de José Anacleto Abduch Santos, trazendo considerações deveras
pertinentes ao caso em apreço, veja-se:
(...) "5º paradigma –
aproveitamento de propostas e de licitantes
A nova Lei determina a
superação do paradigma da prevalência da forma sobre a substância no que diz
respeito à análise de propostas e de documentos de habilitação, e tende para o
seu aproveitamento, à medida em que tal seja de interesse público.
Atente-se para que a norma
contida no art. 12, III preconiza que “o desatendimento de exigências
meramente formais que não comprometam a aferição da qualificação do licitante
ou a compreensão do conteúdo de sua proposta não importará seu afastamento da
licitação ou a invalidação do processo”. Aquela do art. 59 determina que
somente serão desclassificadas propostas que “contiverem vícios insanáveis”
(inciso I), ou que “apresentarem desconformidade com quaisquer outras
exigências do edital, desde que insanável” (inciso V). Há dever legal de
possibilitar o saneamento de vícios de proposta ou de documentos de
habilitação, para aproveitar aquelas que melhor atendam os interesses da
Administração.
Que se liquefaçam os velhos e
sólidos paradigmas estabelecidos pela velha Lei nº 8.666/93 para possibilitar a
aceitação e aplicação imediata dos excelentes novos paradigmas criados pela Lei
nº 14.133/21. O apego acrítico a sólidos paradigmas históricos produzirá
indesejável engessamento administrativo e inviabilizará o desenvolvimento de
todo o potencial inovador da nova Lei de Licitações.
Portanto, como decorrência da nova lei de
licitações e contratos (art. 12, III) e como corolário do princípio da
economicidade (art. 5º), ao administrador "há dever legal de possibilitar
o saneamento de vícios de proposta ou de documentos de habilitação, para
aproveitar aquelas que melhor atendam aos interesses da Administração"
(princípio do formalismo moderado).
Essa conduta exigida do gestor público, como
visto, vem ao encontro da nova redação contida no Decreto-Lei nº 4.657, de
04-09-1942, antiga Lei de Introdução do Código Civil Brasileiro - LICC, atual
Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (com redação dada pela Lei nº
12.376/2010), notadamente quanto ao que estabelece o seu artigo 20 e
seguintes.
Desse modo, com razão a licitante recorrida ao
defender que a exigência contida no artigo 93 da Lei nº 8213/91 exsurge como
uma obrigação que também depende da vontade de terceiros – no caso, a pessoa
portadora de deficiência ou reabilitada da Previdência Social preencher os
requisitos exigidos para o cargo e aceitar o emprego – não podendo a empresa
ser considerada uma descumpridora da Lei nº 8.213/91 pelo simples fato de que,
numa determinada temporalidade, encontra-se com o preenchimento de vagas de
PcDs abaixo do número mínimo indispensável.
E, diga-se de passagem, esse descompasso pode
ocorrer por inúmeros motivos, como demissão, aposentadoria, óbito ou até mesmo
por dificuldades na seleção de indivíduos aptos ao cargo ou ofício, por
exemplo, não devendo a empresa ser indiretamente penalizada em esferas diversas
por um fato ou fenômeno que eventualmente corre à sua revelia.
Entretanto, pode a empresa regularizar a sua
situação mediante futuras e novas contratações, e foi exatamente o que ocorreu
no caso concreto.
Por sua vez, oportuno e não menos importante é o
princípio da razoabilidade como norte à atuação do administrador público.
"O princípio da razoabilidade preconiza ser a interpretação jurídica uma
atividade que ultrapassa a mera lógica formal. Interpretar equivale a
valer-se do raciocínio, o que abrange não apenas soluções rigorosamente
lógicas, mas especialmente as que se configuram como razoáveis. O princípio da
razoabilidade não equivale à adoção da conveniência como critério hermenêutico.
O que se busca é afastar soluções que, embora fundadas na razão, sejam
incompatíveis com o espírito do sistema". (Marçal Justen Filho, em
Curso de Direito Administrativo, 9ª edição, 2013, RT, p.163). Grifado.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro leciona que
"Embora a Lei nº 9.784/99 faça referência aos princípios da razoabilidade
e da proporcionalidade, separadamente, na realidade, o segundo constitui um dos
aspectos contidos no primeiro. Isto porque o princípio da razoabilidade,
entre outras coisas, exige proporcionalidade entre os meios de que se utiliza a
Administração e os fins que ela tem de alcançar. E essa proporcionalidade deve
ser medida não pelos critérios pessoais do administrador, mas segundo padrões
comuns na sociedade em que vive; e não pode ser medida diante dos termos frios
da lei, mas diante do caso concreto. Com efeito, embora a norma legal deixe um
espaço livre para decisão administrativa, seguindo critérios de oportunidade e
conveniência, essa liberdade às vezes se reduz no caso concreto, onde os fatos
podem apontar para o administrador a melhor solução (cf. Celso Antônio
Bandeira de Mello, in RDP 65/27)", (Direito Administrativo, 32ª edição,
Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 108). Grifado.
A propósito, o novo regramento de licitações e
contratos (Lei nº 14.133/2021) estipula em seu artigo 5º que entre os
princípios a serem observados por ocasião da sua aplicação estão a razoabilidade,
a economicidade e a eficiência.
No âmbito da jurisprudência dos Tribunais
Superiores, não é diferente o entendimento sobre a razoabilidade como princípio
orientador da conduta do administrador público, veja-se:
ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL
PÚBLICA. LICITAÇÃO. CONTRATO DE CONCESSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO. EXPLORAÇÃO
ECONÔMICA DAS ATIVIDADES INERENTES AOS CEMITÉRIOS. EXIGÊNCIA EDITALÍCIA.
CAPITAL SOCIAL MÍNIMO ESCRITURADO. ART. 55, VI E XIII DA LEI N. 8.666/93.
SANEAMENTO POSTERIOR. NULIDADE DO CONTRATO NÃO DECRETADA. PRINCÍPIO DA
CONTINUIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO.
1. Os princípios que
norteiam os atos da Administração Pública, quando em confronto, indicam deva
prevalecer aquele que mais se coaduna com o da razoabilidade.
2. a 8. (omissis). (STJ,
RE nº 950.489-DF, Rel. Ministro Luiz Fux, julgamento 03-02-2011) (GRIFADO)
EMENTA ARGUIÇÃO DE
DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. REALIZAÇÃO DA 17ª RODADA DE LICITAÇÃO
DE BLOCOS PARA EXPLORAÇÃO E PRODUÇÃO DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL. AGÊNCIA
NACIONAL DO PETRÓLEO, GÁS NATURAL E BIOCOMBUSTÍVEL. ART. 6º, § 2º, DA RESOLUÇÃO
CNPE N. 17/2017. DISPENSA DA ELABORAÇÃO DE ESTUDOS AMBIENTAIS E DA AVALIAÇÃO
AMBIENTAL DE ÁREA SEDIMENTAR (AAAS). CABIMENTO. PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE.
ARGUMENTAÇÃO. COMPETÊNCIA REGULAMENTAR. CAPACIDADE TÉCNICA. CONTROLE JUDICIAL
DE POLÍTICA PÚBLICA. PEDIDO DE INTERPRETAÇÃO CONFORME À CONSTITUIÇÃO.
1. Ante os princípios da
separação dos poderes, da eficiência administrativa e da razoabilidade, cabe ao
Supremo atuar com cautela e com deferência à capacidade institucional do
administrador quanto às soluções encontradas pelos órgãos técnicos, tendo em
vista a elaboração e implementação de política pública de alta complexidade e
elevada repercussão socioeconômica. 2. e 3. (omissis).
(STF, ADPF 825, Rel. Ministro
Marco Aurélio, Rel. p/ acórdão Ministro Nunes Marques, julgamento 03-08-2021,
publicação 26-11-2021)
Por fim, vale o registro de que no primeiro
semestre de 2023 foi realizada Auditoria neste Tribunal Regional Federal pelo
Conselho da Justiça Federal - CJF, órgão que funciona junto ao Superior
Tribunal de Justiça, conforme determina o art. 105, §1º, II, da Constituição
Federal, cabendo-lhe exercer, na forma da lei, a supervisão administrativa e
orçamentária da Justiça Federal de 1º e 2º Graus, como órgão central
do sistema e com poderes correicionais, cujas decisões terão caráter
vinculante.
A Secretaria de Auditoria Interna - SAI/CJF
procedeu à auditoria de conformidade nesta Corte, nos processos e
procedimentos relacionados à contratação pública, gestão de frota de
veículos, gestão do conhecimento, execução e liquidação da folha de pagamento
de pessoal, com volume de recursos auditados na ordem de R$ 52.563.869,68
(cinquenta e dois milhões, quinhentos e sessenta e três mil, oitocentos e
sessenta e nove reais e sessenta e oito centavos), limitando-se ao período compreendido
entre janeiro de 2022 a março de 2023, cujo objetivo foi avaliar as
atividades, operações ou transações e atos de gestão relevantes dos
responsáveis, se estão em conformidade com as leis, regulamentos aplicáveis,
princípios administrativos e em consonância com as boas práticas adotadas na
Administração Pública Federal.
Logo, verifica-se a importância dos princípios
administrativos a orientar a conduta do administrador, cuja finalidade não é
outra senão o zelo ao patrimônio público.
No caso em exame, consequentemente, deverá o
gestor ponderar se faz sentido inabilitar uma licitante (vencedora) que ofertou
a proposta mais vantajosa à Administração (19 milhões de reais mais barata que
a da 2ª colocada), decidindo apenas com base em um formalismo engessado ou
extremo, inviabilizando que a irregularidade formal apontada seja sanada pelos
legítimos meios de que o sistema jurídico dispõe.
Assim, como o direito não é um sistema fechado e
isolado em si mesmo, em uma interpretação sistemática e teleológica pode-se
concluir que é razoável e proporcional utilizar o princípio do formalismo
moderado para buscar, na espécie, a preservação do interesse público.
Recomenda-se, portanto, que a Administração
mitigue - e não exclua - o rigorismo formal para possibilitar que a
irregularidade ou vício apontado seja sanado, a fim de economizar R$
19.000.000,00 (dezenove milhões de reais) com a presente contratação
pública, possibilitando, assim, o alcance de outro princípio tão importante e
fundamental, qual seja, o da economicidade (art. 5º da Lei nº 14.133/21).
Em virtude dos fatos e fundamentos acima
expendidos, esta Assessoria em Assuntos Administrativos entende como
juridicamente possível e legítimo considerar como sanada pela empresa Zoom
Tecnologia Ltda. a irregularidade formal apontada mediante a juntada do
documento extraído do e-Social, anexo às suas contrarrazões (6969276), onde
comprova, assim, o atendimento da exigência legal contida no art. 93 da
Lei nº 8213/91, devendo ser negando provimento ao recurso interposto pela
licitante O2 Soluções em Tecnologia Digital Ltda.
À consideração de Vossa Senhoria.