É pacífica na jurisprudência do Tribunal de Contas da União (Decisões nº 577/2001 e nº
111/2002 e nos Acórdãos nº 1.028/2001, nº 963/2004, nº 1.791/2006, todos do
Plenário.) que a planilha de custos e formação de preços
possui caráter acessório, subsidiário, numa licitação em que o critério de
avaliação das propostas é o de menor valor global.
O
Tribunal de Contas da União, ao interpretar o dispositivo em comento, entende
que pode haver a correção da planilha de custos desde que referida correção
preserve o valor global da proposta. Vejamos:
“32.
Trata-se de analisar se, no âmbito da Concorrência 1/2013, ora em comento, o
ato que desclassificou a representante, por ter detectado falhas em sua
proposta de preços, destoou dos princípios que regem as contratações públicas.
“33.
Para tal, deve-se verificar se a natureza dos erros de preenchimento na
planilha de preços da representante enquadram-se como meros erros materiais,
como alega, ou se travestem em erros impeditivos de oportunizar-se sua correção.
“34.
O erro material é tido como o erro de fácil constatação, cuja detecção dispensa
análise aprofundada, havendo flagrante desacordo entre a vontade da parte e
aquilo o que foi manifestado no documento. Exige a correção da proposta, uma
vez que retrata a inexatidão material, ou seja, reflete uma situação ou algo
que obviamente não ocorreu.
“35.
Conforme se verifica, as falhas em comento disseram respeito, comprovadamente,
à atualidade do valor do ticket-alimentação e ao cálculo do SAT, neste caso, tendo
havido erro em operação matemática. Em princípio, são erros facilmente
perceptíveis de preenchimento da planilha, sendo que a correção deles não
caracterizaria alteração do teor da proposta.
“36.
Ressalta-se que ambos os erros apontados na proposta da representante dizem
respeito a obrigações da contratada em pagar os devidos encargos trabalhistas,
que advém da norma legal (art. 71 da Lei 8.666/93), pouco importando para tanto
o indicado na planilha de custos anexa aos editais de licitação. Além disso, um
dos erros, uma vez corrigido, minoraria o valor da proposta. Quanto ao outro, a
representante comprometeu-se a assumir os custos, reduzindo o percentual da
margem de lucro.
“37.
Pelo que se verifica, a correção dos erros não macularia a essência da proposta,
não se vislumbrando prejuízos ao atendimento do interesse público. Não se
figura válido dizer que esse tipo de correção prejudicaria o êxito do processo
licitatório ou retardamento desmedido do início da prestação dos serviços, pelo
contrário, em um processo em que houve apenas duas concorrentes, faria com que
se buscasse a proposta mais vantajosa, ponderados os critérios de técnica e
preço, gerando economia de mais de R$ 1,8 milhão.
“38.
Nesse sentido, versa o art. 43, § 3º, da Lei 8.666/93:
É
facultada à Comissão ou autoridade superior, em qualquer fase da licitação, a
promoção de diligência destinada a esclarecer ou a complementar a instrução do
processo, vedada a inclusão posterior de documento ou informação que deveria
constar originariamente da proposta.
“39.
Quanto ao saneamento da proposta, o edital da Concorrência 1/2013 não é omisso,
prevendo no item 14.2 (peça 3, p. 46) que: A CPL e a Subcomissão Técnica,
conforme o caso, poderão relevar aspectos puramente formais nos documentos de
habilitação e nas propostas apresentadas pelas licitantes, desde que não
comprometam a lisura e o caráter competitivo da concorrência.
“40.
Sobre o assunto, o Voto do Acórdão 4.621/2009-2C é esclarecedor, inclusive,
contendo exemplo aplicável à situação analisada, em que houve erro de
preenchimento de planilha, cuja correção não acarretou aumento da proposta, uma
vez que coberta por diminuição na margem de lucro da empresa.
“Releva
ainda saber o procedimento a ser adotado quando a Administração constata que há
evidente equívoco em um ou mais dos itens indicados pelas licitantes.
“Não
penso que o procedimento seja simplesmente desclassificar o licitante. Penso
sim que deva ser avaliado o impacto financeiro da ocorrência e verificar se a
proposta, mesmo com a falha, continuaria a preencher os requisitos da
legislação que rege as licitações públicas - preços exequíveis e compatíveis
com os de mercado.
Exemplifico.
Digamos que no quesito férias legais, em evidente desacerto com as normas
trabalhistas, uma licitante aponha o porcentual de zero por cento. Entretanto,
avaliando-se a margem de lucro da empresa, verifica-se que poderia haver uma
diminuição dessa margem para cobrir os custos de férias e ainda garantir-se a
exequibilidade da proposta.
“Em
tendo apresentado essa licitante o menor preço, parece-me que ofenderia os
princípios da razoabilidade e da economicidade desclassificar a proposta mais
vantajosa e exequível por um erro que, além de poder ser caracterizado como
formal, também não prejudicou a análise do preço global de acordo com as normas
pertinentes.
“Afirmo
que a falha pode ser considerada um erro formal porque a sua ocorrência não
teria trazido nenhuma consequência prática sobre o andamento da licitação.
Primeiro, porque não se pode falar em qualquer benefício para a licitante, pois
o que interessa tanto para ela quanto para a Administração é o preço global
contratado. Nesse sentido, bastaria observar que a licitante poderia ter
preenchido corretamente o campo férias e de forma correspondente ter ajustado o
lucro proposto de forma a se obter o mesmo valor global da proposta. Segundo,
porque o caráter instrumental da planilha de custos não foi prejudicado, pois a
Administração pôde dela se utilizar para avaliar o preço proposto sob os vários
aspectos legais.
“Em
suma, penso que seria um formalismo exacerbado desclassificar uma empresa em
tal situação, além de caracterizar a prática de ato antieconômico. Rememoro
ainda que a obrigação da contratada em pagar os devidos encargos trabalhistas
advém da norma legal (art. 71 da Lei 8.666/93), pouco importando para tanto o
indicado na planilha de custos anexa aos editais de licitação.
“41.
No mesmo sentido, o Acórdão 2.371/2009-P determinou a certa entidade que se
abstivesse de considerar erros ou omissões no preenchimento da planilha de
custos e formação de preços como critério de desclassificação de licitantes,
por contrariar o artigo 3º da Lei 8.666/93 e a jurisprudência deste Tribunal
Acórdãos 2.104/2004, 1.791/2006 e 1.179/2008, todos Plenário, e Acórdão
4.621/2009, da 2ª Câmara.
“42.
No Relatório que acompanha a Decisão 577/2001-P, delineia-se a hipótese fática
ora apresentada, em que, constatado o erro, a licitante propõe-se a corrigi-lo,
arcando com os custos necessários para manter sua proposta global:
“Evidentemente
espera-se não haver diferenças entre a informação posta na planilha e aquela
exigida pela lei ou pelo acordo. Mas, e se houver? Só há duas alternativas,
cuja validade cabe discutir:
“1ª)
acata-se a proposta, mas o proponente tem que suportar o ônus do seu erro (que
resulta em uma oferta menos competitiva, se o valor informado for maior que o
exigido, ou em uma redução da margem de lucro inicialmente esperada, na
situação inversa); ou
“2ª)
desclassifica-se a proposta sumariamente, o que não deixa de ser uma medida
drástica, se considerarmos que a licitação não é um fim em si mesma, mas meio
para a Administração selecionar a oferta que lhe for mais vantajosa, dentro dos
limites de atuação estabelecidos pelo legislador.
“43.
Aponta-se, também, julgado convergente do Tribunal de Justiça do Distrito
Federal:
“DIREITO
ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. TOMADA DE PREÇOS. ERRO MATERIAL NA PROPOSTA. IRRELEVÂNCIA.
O ERRO MATERIAL CONSTANTE DA PROPOSTA MAIS VANTAJOSA PARA A ADMINISTRAÇÃO,
FACILMENTE CONSTATÁVEL, NÃO É ÓBICE À CLASSIFICAÇÃO DA MESMA. (TJDFT 5043398
DF, Relator: ANGELO PASSARELI, Data de Julgamento: 18/11/1999, 3ª Turma Cível,
Data de Publicação: DJU 09/02/2000 Pág. : 17)
“44.
Assim, embora esteja previsto no art. 48, I, da Lei 8.666/1993, que as
propostas que não atendam as especificações contidas no ato convocatório da
licitação devem ser desclassificadas, fato é que o rigorismo excessivo na
apreciação das propostas vem sendo mitigado, com fulcro em outros princípios,
tais quais os da proporcionalidade, da razoabilidade e da supremacia do
interesse público.
“45.
Esse último princípio não pode ser afastado, no presente caso, sob a alegação
de que malferiria o princípio da isonomia entre licitantes. Isso porque não se
está falando em oportunizar apresentação de proposta de preços nova, por uma
licitante, negando-se esse benefício à outra, mas apenas de correção de erros
materiais, que não impactam no valor global da proposta.
“46.
Ademais, diante de aparente conflito, não haveria que se mitigar o atendimento
do melhor interesse da Administração, que, com a ampliação da competitividade,
obteria proposta mais vantajosa.
“47.
No caso avaliado, verifica-se que a rejeição da proposta da representante
torna-se mais prejudicial ao interesse público, do que a sua manutenção,
inobstante os erros apontados em seu conteúdo.
[...]
“71.
Ao analisar os elementos constantes do processo, juntamente com as manifestações
do MEC e da única licitante classificada na concorrência (itens 18-31 desta
instrução), observou-se que a desclassificação da proposta da representante,
por erros preenchimento da planilha, não encontrou amparo nos princípios da
proporcionalidade, da razoabilidade e do interesse preponderante da
Administração nas contratações públicas.
“72. Os equívocos citados não foram substanciais, não alteraram o
teor da proposta, nem tampouco o seu valor global, motivo pelo qual, sem razão
afirmar-se que sua correção representaria oportunidade de apresentação de nova
proposta, ferindo o princípio da igualdade entre os licitantes (itens 32-52
desta instrução).”[2] .
No
mesmo sentido, colhem-se decisões do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e
Tribunal de Justiça de Santa Catarina:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO ADMINISTRATIVO.
LICITAÇÃO. PLANILHA DE CUSTOS E FORMAÇÃO DE PREÇO. CORREÇÃO
DE IRREGULARIDADE. VALOR DA PROPOSTA NÃO ATINGIDO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO.
PRINCÍPIO DO FORMALISMO MODERADO. - O deferimento de medida liminar em mandado
de segurança exige a presença dos requisitos do inciso III do art. 7º da Lei nº
12.016 /2009, com as ressalvas do § 2º. - O equívoco constante
da planilha de custos e formação de preço não interferiu na
proposta, nem causou prejuízo à administração ou aos demais licitantes. -
Observância do princípio do formalismo moderado, considerando a inexistência de
irregularidade que macule as condições de habilitação da impetrante. AGRAVO DE
INSTRUMENTO PROVIDO, DE PLANO.”[3].
E,
ainda:
“Agravo
de Instrumento. Mandado de Segurança. Licitação. Pregão Presencial.
Fornecimento de mão de obra capacitada para prestação de serviços de
jardinagem. Empresa inicialmente desclassificada do certame, mas que comprovou
por intermédio de recurso administrativo o cumprimento das disposições
editalícias. Apresentação de planilha de custos de despesas médico-hospitalares
em local diverso do estabelecido. Reavaliação da proposta apresentada.
Possibilidade. Ausência de majoração do preço global apresentado. Manutenção da
decisão interlocutória proferida no primeiro grau.
“Não é cabível excluir propostas vantajosas ou potencialmente
satisfatórias apenas por apresentarem defeitos irrelevantes ou porque o
'princípio da isonomia' imporia tratamento de extremo rigor. A isonomia não
obriga adoção de formalismo irracional (Marçal Justen Filho)
“Não se pode perder de vista que a finalidade precípua da licitação é a escolha da contratação mais vantajosa para a Administração Pública e, para atingi-la, não pode o administrador ater-se à rigorismos formais exacerbados, a ponto de afastar possíveis interessados do certame, o que limitaria a competição e, por conseguinte, reduziria as oportunidades de escolha para a contratação”[4].
“Não se pode perder de vista que a finalidade precípua da licitação é a escolha da contratação mais vantajosa para a Administração Pública e, para atingi-la, não pode o administrador ater-se à rigorismos formais exacerbados, a ponto de afastar possíveis interessados do certame, o que limitaria a competição e, por conseguinte, reduziria as oportunidades de escolha para a contratação”[4].
Importa
mencionar, ainda, que o Tribunal de Contas da União entende que a planilha de
preços é necessária para análise, pelo Administrador Público, da exequibilidade
dos valores cotados nas propostas apresentadas em um certame licitatório, de
forma a avaliar se o valor global ofertado será suficiente para a cobertura de
todos os custos da execução contratual, senão vejamos:
“[...] 52. Inicialmente, cabe esclarecer que alguns dos elementos
integrantes da planilha de custos são variáveis, e dependem da característica e
estrutura de custos de cada organização. Outros são decorrentes de lei ou
acordos coletivos, sendo responsabilidade da licitante informá-los
corretamente. Caso a planilha apresentada pelo licitante esteja dissonante do
previsto em lei, e ainda assim, for considerada exeqüível e aceita pela
Administração, caberá ao licitante suportar o ônus do seu erro.”[5].
"[...]
O TCU, concordando com o entendimento do órgão, destacou que eventual erro na
planilha teria de ser assumido pelo licitante. Segue o trecho do relatório da
Decisão 577/2001 - Plenário, integralmente acatado no voto, que a representante
expôs em suas alegações (fls. 11/13): [...] ‘b) o mecanismo de
convalidação previsto no edital é, a nosso ver, admissível. “Não há modificação
dos valores globais da proposta, sempre respeitados, em qualquer hipótese.
Ocorre que esse valor vem acompanhado de sua memória de cálculo, ou seja, da
planilha demonstrativa dos componentes do custo, entre os quais alguns que
decorrem de lei e de acordos coletivos. “Evidentemente espera-se não haver
diferenças entre a informação posta na planilha e aquela exigida pela lei ou
pelo acordo. Mas, e se houver? Só há duas alternativas, cuja validade cabe
discutir:
“1ª)
acata-se a proposta, mas o proponente tem que suportar o ônus do seu erro (que
resulta em uma oferta menos competitiva, se o valor informado for maior que o
exigido, ou em uma redução da margem de lucro inicialmente esperada, na
situação inversa); ou
”2ª)
desclassifica-se a proposta sumariamente, o que não deixa de ser uma medida
drástica, se considerarmos que a licitação não é um fim em si mesma, mas meio
para a Administração selecionar a oferta que lhe for mais vantajosa, dentro dos
limites de atuação estabelecidos pelo legislador. Dentre essas alternativas, a
[...] optou pela primeira: mantém a proposta, se verificar que, mesmo com a
diminuição do lucro, a oferta ainda é exeqüível.
Essa
decisão nos parece válida, já que:
“1º) o proponente continuará sujeito a cumprir a lei e os acordos
firmados; sua declaração contida na planilha não tem a faculdade de afastar a
incidência dessas obrigações; 2º) os valores globais propostos não poderão ser
modificados; a proposta obriga o proponente, a quem cabe assumir as
consequências de seus atos; e 3º) o procedimento previsto não fere a isonomia
entre os licitantes [...]”[6].
Assim,
tendo em vista o caráter acessório das planilhas orçamentárias, harmonizando-se
os princípios do julgamento objetivo e do princípio da vinculação ao
instrumento convocatório com a busca pela proposta mais vantajosa e a
necessidade de utilização do formalismo moderado, entende-se possível a
correção de erros formais e materiais de fácil constatação nas planilhas de
custos, em todas as modalidades de licitação, desde que não haja alteração do
valor global da proposta e essa se mantenha exequível.
Ademais,
corroborando o entendimento acima exposto, tem-se que as normas que regem o
processo licitatório devem(rão) sempre interpretadas em favor da ampliação da
disputa entre os participantes, desde que não comprometam o interesse da
Administração, a finalidade e a segurança da contratação.