quarta-feira, 21 de julho de 2021

Reequilíbrio econômico-financeiro

 

O mero descolamento do índice de reajuste contratual dos preços efetivamente praticados no mercado não é suficiente, por si só, para a concessão de reequilíbrio econômico-financeiro fundado no art. 65, inciso II, alínea d, da Lei 8.666/1993, devendo estar presentes a imprevisibilidade ou a previsibilidade de efeitos incalculáveis e o impacto acentuado na relação contratual (teoria da imprevisão).

Em auditoria realizada na Secretaria de Infraestrutura Hídrica do extinto Ministério da Integração Nacional, atual Ministério do Desenvolvimento Regional, e na extinta Secretaria de Estado da Infraestrutura, dos Recursos Hídricos, do Meio Ambiente e da Ciência e Tecnologia da Paraíba, atual Secretaria de Estado da Infraestrutura, dos Recursos Hídricos e do Meio Ambiente da Paraíba, no âmbito do Fiscobras 2017, com o propósito de fiscalizar as obras de construção do Canal Adutor Vertente Litorânea, no estado da Paraíba, a unidade técnica responsável apontou, entre outras ocorrências, sobrepreço decorrente de preços reajustados em patamar superior aos preços de mercado. Conforme o relatório de fiscalização, os preços dos serviços reajustados pelos índices contratuais não refletiram a efetiva variação dos custos de alguns insumos, especialmente do concreto e do aço, o que poderia resultar em desequilíbrio econômico-financeiro em desfavor da União”. Por sua vez, o relator considerou necessária uma avaliação mais detida do sobrepreço inicialmente apurado, assim como ajustes na análise (análise global considerando sobrepreços e subpreços, apropriação dos reajustes já efetuados com amparo na sua data-base). Após colher a manifestação preliminar do gestor e analisar as repercussões de maneira global, a unidade técnica considerou que remanesceria sobrepreço de R$ 24.510.486,85, representando 4,70% do valor atualizado de referência do contrato. O relator discordou da conclusão de que restara “comprovada a ocorrência de desequilíbrio econômico ou financeiro elevado no contrato, impondo onerosidade excessiva a uma das partes”. Asseverou que o mero descolamento do índice de reajuste contratual dos preços efetivamente praticados no mercado não seria suficiente, por si só, para ensejar a repactuação contratual, sendo imprescindível a ocorrência de fatos imprevisíveis, ou previsíveis, porém de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, de caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, a configurar álea econômica extraordinária e extracontratual, nos termos do art. 65, inciso II, alínea “d”, da Lei 8.666/1993. Ressaltou, ainda, que o TCU já delineara os contornos a serem observados para a aplicação da teoria da imprevisão em contratos administrativos, entre os quais se incluem a ocorrência de onerosidade excessiva (ou o impacto acentuado na relação contratual) retardadora ou impeditiva da execução do ajuste e a prova robusta (complexa e detalhada). O relator reiterou que o desequilíbrio econômico-financeiro apontado pela unidade instrutora, da ordem de 4,70% (junho/2016), aparentava situar-se nas variações ordinárias da flutuação de preços. Ponderou ainda que – diferentemente de situações em que o sobrepreço é caracterizado mediante parâmetros objetivos, como quando se utilizam sistemas referenciais de preço determinados por lei, em que não há percentuais toleráveis de sobrepreço – não há um critério objetivo para caracterizar desequilíbrio acentuado no contrato. Assim, frisou o relator que “repactuações contratuais decorrentes de desequilíbrio econômico-financeiro derivado de fórmulas de reajustes contratuais com base na teoria da imprevisão devem ser feitas com muita cautela, apenas quando indubitavelmente restar demonstrada onerosidade excessiva a uma das partes”. Concluiu, então, que “exigir a repactuação geral dos preços diante de pequenas variações dos índices em relação aos preços de mercado seria, em última análise, o mesmo que inviabilizar a utilização de índices, expressamente previstos no art. 40, inciso XI, da Lei 8.666/1993”. Finalmente, considerou que o achado “sobrepreço decorrente de preços reajustados superiores aos preços atuais de mercado nos Lote 2 e 3” deveria ser desconstituído, por ausência do pressuposto para reequilíbrio econômico-financeiro no caso do Lote 2 e por perda de objeto no caso do Lote 3, visto que o respectivo contrato fora encerrado. O Colegiado anuiu à proposta, dando ciência do acórdão à Secretaria de Estado da Infraestrutura, dos Recursos Hídricos e do Meio Ambiente da Paraíba.

Acórdão 4072/2020 Plenário, Auditoria, Relator Ministro Bruno Dantas.