quinta-feira, 23 de abril de 2015

O PREGÃO COMO MODALIDADE LICITATÓRIA

Verônica Vaz de Melo
Mestre em  Direito Público na linha de pesquisa "Direitos humanos, processos de integração e constitucionalização do Direito Internacional" pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Analista internacional graduadaem Relações Internacionaispela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Especialista lato sensuem Direito Públicopela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Advogada graduada pela Faculdade de Direito Milton Campos.
O PREGÃO COMO MODALIDADE LICITATÓRIA
A licitação é o gênero do qual as modalidades são espécies do procedimento administrativo licitatório que objetiva obter a melhor proposta para a Administração Pública, de acordo com as normas jurídicas e regras do Edital, visando a garantia do interesse público.
Cinco das modalidades licitatórias encontram-se dispostas no art. 22 da Lei de Licitações, quais sejam, concorrência, tomada de preços, convite, concurso e leilão. O pregão, sexta modalidade, foi disciplinado pela Lei nº 10.520 de 10 de julho de 2002.
Hely Lopes Meirelles relata que:
(...) nos Estados medievais da Europa usou-se o sistema denominado ´vela e pregão´, que consistia em apregoar-se a obra desejada e, enquanto ardia uma vela os construtores interessados faziam suas ofertas. Quando extinguia a chama adjudicava-se a obra a quem houvesse oferecido o melhor preço. MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e Contrato Administrativo. 13. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p.27.
A história do Pregão no Direito Brasileiro iniciou-se com o advento da Lei nº 9.472/97.
A Lei nº 9.472/97 (Lei Geral de Telecomunicações) dispôs sobre a organização dos serviços de telecomunicações, criação e funcionamento de um órgão regulador e outros aspectos institucionais, prevendo nos seus artigos 54 e 56:
Art. 54. A contratação de obras e serviços de engenharia civil está sujeita ao procedimento das licitações previsto em lei geral para a Administração Pública.
Art. 56. A disputa pelo fornecimento de bens e serviços comuns poderá ser feita em licitação na modalidade de pregão, restrita aos previamente cadastrados, que serão chamados a formular lances em sessão pública.
Parágrafo único. Encerrada a etapa competitiva, a Comissão examinará a melhor oferta quanto ao objeto, forma e valor.
Após este primeiro momento, a Lei Federal nº 9.986/00, dispondo sobre a gestão de recursos humanos das Agências Reguladoras, ampliou o âmbito de utilização do pregão para as demais agências reguladoras:
Art. 37. A aquisição de bens e a contratação de serviços pelas Agências Reguladoras poderá se dar nas modalidades de consulta e pregão, observado o disposto nos arts. 55 a 58 da Lei no 9.472, de 1997, e nos termos de regulamento próprio.
Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica às contratações referentes a obras e serviços de engenharia, cujos procedimentos deverão observar as normas gerais de licitação e contratação para a Administração Pública.
Posteriormente, a Medida Provisória nº 2.026/00 instituiu, no âmbito da União, em consonância com o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, o pregão como modalidade de licitação para aquisição de bens e serviços comuns. Essa Medida Provisória foi transformada na Medida Provisória nº 2.182/01 que foi reeditada por diversas vezes. Sobre este fato, Vera Scarpinella observa:
Uma das maiores dificuldades de acomodação jurídica do pregão não derivou apenas da novidade em matéria de licitação por ele trazida, mas da sua origem em medida provisória, suas sucessivas reedições e mudanças mensais no texto original. SCARPINELLA, Vera. Licitações na Modalidade de Pregão. São Paulo: Malheiros, 2003, p.37.
Tanto a Medida Provisória 2.026/00 quanto a 2.182/01 possuem esfera de abrangência restrita à União:
Artigo 2º da Medida Provisória 2.026/00 e 2.182/01:
Art. 2º Pregão é a modalidade de licitação para aquisição de bens e serviços comuns, promovida exclusivamente no âmbito da União, qualquer que seja o valor estimado da contratação, em que a disputa pelo fornecimento é feita por meio de propostas e lances em sessão pública.
Parágrafo único. Poderá ser realizado o pregão por meio da utilização de recursos de tecnologia da informação, nos termos de regulamentação específica.
Ademais, o artigo 22, XXVII da Constituição Federal de 1988 dispõe que:
Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
(...)
XXVII - normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998).
É interessante observar que a competência privativa, caso não haja norma geral feita pela União, impossibilita os outros entes da federação de legislarem sobre o assunto.
Sobre este tema, Marçal Justen Filho assevera que:
A opção de circunscrever a aplicação do pregão a contratações promovidas no âmbito federal é extremamente questionável. É inviável a União valer-se da competência privativa para editar normas gerais acerca de licitação cuja aplicação seja restrita à própria órbita federal (...). Por isso, deve reputar-se inconstitucional a ressalva contida no artigo 1º [02], admitindo-se a adoção da sistemática do pregão também por outros entes federativos. JUSTEN FILHO, Marçal. Pregão (comentários à legislação do pregão comum e eletrônico). São Paulo: Dialética, 2001, p.16.
Observa-se que, com a conversão da Medida Provisória 2.182/01 na Lei nº 10.520/02, o artigo 2º foi vetado. Neste artigo a União deveria disciplinar a esfera de abrangência da modalidade pregão para a União e demais entes da federação. Assim, diferentemente da Medida Provisória 2.182/01 que previa no seu artigo 2º a esfera de abrangência do pregão à União, a Lei nº 10.520/02 silenciou-se a respeito deste assunto, não dispondo sobre quais entes da federação estariam autorizados a utilizar-se do pregão, levando a interpretação majoritária de que todos os entes poderiam valer-se desta nova modalidade licitatória.
Com a edição da Lei nº 10.520/02, Toshio Mukai passou a entender que a criação do pregão como nova modalidade de licitação seria norma específica. Desta forma, os outros entes da federação poderiam editar, através de leis específicas, sua própria legislação dispondo sobre o pregão. (MUKAI, Toshio. Os municípios (e os Estados e o Distrito Federal) podem criar a modalidade de licitação pregão. BLC – Boletim de Licitações e Contratos. NDJ. São Paulo, ano XIV, nº 12, p.730, dezembro de 2001).
Ainda é importante ressaltar que as Medidas Provisórias, posteriormente convertidas na Lei nº 10.520/02, não revogaram a Lei no 8.666.
Assim, após o advento da legislação sobre a nova modalidade de licitação, pregão, é importante ressaltar que as outras modalidades previstas na Lei no 8.666/93 continuaram a vigorar no nosso ordenamento jurídico.
Observa-se que não é sempre possível utilizar o pregão em substituição às modalidades tomada de preço, concorrência e convite.
Assim, a modalidade pregão é regida, primordialmente pela Lei nº 10.520/02 e, subsidiariamente, pelas normas da Lei nº 8.666/93, como dispõe o art. 9º da Lei nº 10.520/02.
O pregão poderá ser presencial ou eletrônico. Em ambos casos, como dito anteriormente, aplicar-se-á a Lei nº 10.520/02 e, subsidiariamente, a Lei nº 8.666/93. Porém, em relação ao pregão presencial também se aplica o Decreto nº 3.555/00 e, em relação ao pregão eletrônico, aplica-se o Decreto nº5.450/05, de natureza regulamentar (art. 2º § 1º da Lei nº 10.520/02).
O pregão deve ser utilizado para as contratações em que o objeto seja bem ou serviço comum. Artigo 1º da Lei 10.520/05:
Art. 1º Para aquisição de bens e serviços comuns, poderá ser adotada a licitação na modalidade de pregão, que será regida por esta Lei.
Parágrafo único. Consideram-se bens e serviços comuns, para os fins e efeitos deste artigo, aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais no mercado.
Jessé Torres Pereira Junior observa que:
Em aproximação inicial do tema, pareceu que ‘comum’ também sugeria simplicidade. Percebe-se, a seguir, que não. O objeto pode portar complexidade técnica e ainda assim ser ‘comum’, no sentido de que essa técnica é perfeitamente conhecida, dominada e oferecida pelo mercado. Sendo tal técnica bastante para atender às necessidades da Administração, a modalidade pregão é cabível a despeito da maior sofisticação do objeto. PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres. Comentários à Lei das Licitações e Contratações da Administração Pública. 6 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p.1006.
Na modalidade pregão uma fase preparatória e outra externa, também conhecida como fase licitatória do pregão.
Diogenes Gasparini observa que:
Numa licitação tradicional nós temos duas fases: uma antes da publicação do edital que é chamada ‘fase interna’ ou ‘primeira fase’, e uma fase depois da publicação do edital que é chamada de ‘segunda fase’ ou ‘fase externa’. Poderíamos fazer aqui a mesma comparação: fase de preparação ou fase preparatória corresponderia à primeira fase, ou fase interna, da licitação tradicional. A fase licitatória do pregão seria a mesma segunda fase, ou fase de licitação, propriamente dita, da licitação tradicional. GASPARINI, Diogenes. Pregão, BLC – Boletim de Licitações e Contratos, no7, de julho de 2000,p.369.
Na fase preparatória, haverá a definição do objeto com a elaboração do projeto básico; avaliação econômica do objeto (orçamentação); trânsito pela disponibilização orçamentária; autorização para a realização da despesa; elaboração do instrumento convocatório (edital); expedição e publicação dos avisos; estabelecimento dos critérios de aceitação das propostas; estabelecimento de condições para habilitação; minuta de contrato – elaboração.
O primeiro ato da fase licitatória deve ser a publicação do aviso contendo definição precisa e clara do objeto, indicação do local, dia e horário para obter-se a integra do edital e o local onde ocorrerá o pregão. O aviso é o resumo do pregão, visando dar ciência aos interessados. Posteriormente, haverá a realização de atividades circunstanciais, ou seja, as atribuições peculiares conforme o tipo do pregão: presencial ou eletrônico. Neste caso, se o pregão for presencial, o credenciamento perante o pregoeiro. Posteriormente, a apresentação das propostas em sessão pública do procedimento do pregão; abertura das propostas e classificação das propostas; lances, aceitabilidade e melhor proposta; habilitação; recebimento de recursos e posterior remessa a autoridade superior; adjudicação.