Autor: Camila Cotovicz Ferreira
Categoria: Licitação, Terceirização
A exigência de apresentação de
atestados para fins de qualificação técnica em licitação, prevista no
art. 30, § 1º da Lei nº 8.666/93, tem como finalidade verificar se o
licitante possui condições técnicas necessárias e suficientes para, em
se sagrando vencedor do certame, cumprir o objeto de forma satisfatória.
Os atestados revelam a experiência
anterior do licitante na execução de objetos similares ao licitado, em
características, quantidades e prazos. A lógica que baseia a
qualificação técnica envolve uma presunção de capacidade. Segundo as
diretrizes legais, se reconhece que o sujeito que comprovar já ter
realizado um objeto equivalente ao licitado será presumido “apto” para
desenvolver o objeto da licitação, razão pela qual haverá de ser
habilitado.
Com base nisso, em um primeiro momento,
seria possível entender que quanto maior o grau de exigências, maior a
presunção de que aqueles que as cumprem são capazes de executar as
obrigações contratuais e, consequentemente, maior a segurança da
Administração.
Entretanto, o rigor exagerado na fixação
das exigências pode restringir a competitividade do certame, pois quanto
mais exigências, menor o número de pessoas aptas a cumpri-las. E o
pior, se nem todas as exigências forem justificáveis em vista do risco e
da complexidade envolvidos na contratação, tal restrição terá sido
imotivada.
Justamente por tal razão, com vistas a
ampliar a competitividade, a regra é aceitar o somatório de atestados
para fins de qualificação técnica. Mediante o somatório, faculta-se ao
interessado que não lograria êxito em demonstrar sua capacidade por meio
de um único atestado, que o faça conjugando experiências diversas.
Nesse sentido é o entendimento do TCU, cuja jurisprudência pacífica
considera possível o somatório de atestados independentemente de
previsão editalícia (TCU: Acórdão nº 1.983/2014-Plenário; Acórdão nº
1.231/2012-Plenário e; Acórdão nº 1.890/2006-Plenário).
Em consequência disso, o impedimento ao
somatório de atestados é medida excepcional que deve estar amparada em
justificativa de ordem técnica e exige vedação expressa no edital da
licitação.
É o caso, por exemplo, das licitações
para a terceirização de serviços, conforme entendeu o TCU. Em recente
julgado, o Plenário da Corte de Contas admitiu a restrição ao somatório
de atestados para a aferição da capacidade técnico-operacional das
licitantes em certame dirigido à contratação de mão de obra
terceirizada, ao argumento de que a execução sucessiva de objetos de
pequena dimensão não capacita a empresa para a execução de objetos
maiores. Veja-se trechos da decisão:
“[Voto]
(…)
12. Entretanto, o
mencionado acórdão não tratou especificamente da possibilidade de
comprovação da experiência técnica mediante a soma de atestados. É bem
verdade que, de acordo com a tradicional de jurisprudência desta Corte
de Contas, em regra, deve haver a permissão de que os requisitos
técnicos exigidos em licitações públicas sejam comprovados mediante a
apresentação de mais de um atestado.
13. Esse entendimento
geral, contudo, não afasta a possibilidade de que a restrição à soma de
atestados ocorra quando o objeto licitado assim exigir. A respeito, o TCU manifestou-se mediante o Acórdão 2.150/2008 – Plenário, subitem 9.7.2:
(…)
15. Nas situações de
terceirização de mão de obra, como já adiantado, busca-se averiguar a
capacidade das licitantes em gerir pessoal. Nesse sentido, o seguinte
trecho do voto condutor do Acórdão 1.214/2013-Plenário:
(…)
16. Sob essa ótica,
entendo que admitir a simples soma de atestados não se mostra o
procedimento mais adequado para se aferir a capacidade técnico
operacional das licitantes. Isso porque se uma empresa apresenta
sucessivos contratos com determinados postos de trabalho, ela demonstra
ter expertise para executar somente os quantitativos referentes a cada
contrato e não ao somatório de todos. Em outras palavras, a demanda
por estrutura administrativa dessa empresa está limitada aos serviços
exigidos simultaneamente, não havendo que se falar em duplicação dessa
capacidade operacional apenas porque determinado objeto executado em um
exercício é novamente executado no exercício seguinte.
17. Em suma, não há
porque, e aqui divirjo pontualmente da unidade técnica, supor que a
execução sucessiva de objetos de pequena dimensão capacite a empresa
automaticamente para a execução de objetos maiores. De forma
exemplificativa, a execução sucessiva de dez contratos referentes a dez
postos de trabalho cada não necessariamente capacita a empresa para a
execução de contratos abrangendo cem postos de trabalho.
18. Não é demais
rememorar que a jurisprudência desta Corte, em regra, é conservadora no
sentido de que a exigência técnico-operacional se limite a 50% do objeto
contratado. Ou seja, caso o objeto seja dimensionado para cem postos de
trabalho, as exigências editalícias devem se limitar a cinquenta
postos. Desta feita, ao se aceitar a simples soma de atestados,
estar-se-á se permitindo que uma empresa com experiência, ainda
utilizando do exemplo anterior, em gerenciar dez postos de trabalho
assuma um compromisso dez vezes maior com a administração pública.
(…)
20. Exceção a esse
entendimento deve ser feita quanto os diferentes atestados se referem a
serviços executados de forma concomitante. Nessa situação, para fins de
comprovação de capacidade técnico-operacional, é como se os serviços
fossem referentes a uma única contratação. Com efeito, se uma
empresa executa simultaneamente dez contratos de dez postos de serviços
cada, cabe a suposição de que a estrutura física da empresa é compatível
com a execução de objetos referentes a cem postos de serviços.
Vislumbra-se, inclusive, nessa situação hipotética, maiores exigências
operacionais para gerenciar simultaneamente diversos contratos menores
em locais diferentes do que gerenciar um único contrato maior (sempre
considerando que haja identidade entre o somatório dos objetos desses
contratos menores e o objeto desse contrato maior).” (TCU, Acórdão nº 2.387/2014, Plenário, Rel. Ministro Benjamin Zymler, j. em 10.09.2014)
Portanto, considerando o entendimento do
TCU somente em casos excepcionais será possível restringir, mediante
previsão editalícia, o somatório de atestados para efeito de comprovação
de qualificação técnica. Trata-se dos casos em que a complexidade do
objeto decorre da sua dimensão quantitativa, como na terceirização de
serviços, por exemplo. Nesses casos, não terá cabimento o somatório de
atestados, visto que a execução sucessiva de objetos de pequena dimensão
não capacita, necessariamente, a empresa para a execução de objetos
maiores. Todavia, ressalta-se, não se descarta, nessas hipóteses, a
possibilidade de somatório de atestados para contratos executados
concomitantemente.