Requisitos do parecer jurídico emitido nos processos de contratação pública: considerações do TCU
Autor: Camila Cotovicz Ferreira
O art. 38, inc. VI da Lei nº
8.666/93 prevê que o processo administrativo de contratação pública deve
ser instruído, entres outros documentos, com “pareceres técnicos ou
jurídicos emitidos sobre a licitação, dispensa ou inexigibilidade”. O
parágrafo único desse mesmo dispositivo estabelece, ainda, que “as
minutas de editais de licitação, bem como as dos contratos, acordos,
convênios ou ajustes devem ser previamente examinadas e aprovadas por
assessoria jurídica da Administração”.
As disposições tratam do controle interno
de legalidade dos atos da contratação, realizado pela assessoria
jurídica da Administração Pública contratante, cujo objetivo é avaliar a
compatibilidade dos atos administrativos produzidos no processo de
contratação pública com o sistema jurídico vigente. Pretende-se,
mediante esse exame prévio, evitar, ou ao menos reduzir, eventuais
questionamentos perante os órgãos de controle externo ou a constatação
posterior de vícios que comprometam o atendimento da necessidade da
Administração.
À assessoria jurídica compete, portanto,
analisar a legalidade e assistir a autoridade assessorada no controle da
legitimidade dos atos a serem praticados ou já efetivados, orientando a
atuação do administrador. Dessa avaliação deve resultar um parecer
jurídico que possibilite à autoridade o conhecimento das variáveis
necessárias para a tomada de decisão segura.
Sobre os efeitos do parecer jurídico, a
doutrina e a jurisprudência não possuem entendimento alinhado quando o
assunto está relacionado ao caráter vinculante ou opinativo do parecer,
nem mesmo quanto à responsabilização solidária da assessoria e do
administrador no caso de ocorrência de ilegalidade.
O TCU tem adotado entendimento no sentido
de que o parecer jurídico proferido em atenção ao disposto no art. 38
não se trata de ato meramente opinativo, mas serve de fundamento ao
posicionamento adotado pela autoridade competente, razão pela qual o
parecerista pode ser responsabilizado pelo conteúdo da manifestação
(Acórdão n.º 1337/2011-Plenário e Acórdão nº 5.291/2013 – 1ª Câmara).
(Leia mais no post “Da responsabilidade do parecerista em processos de
contratação à luz do entendimento do TCU” http://www.zenite.blog.br/da-responsabilidade-do-parecerista-em-processos-de-contratacao-a-luz-do-entendimento-do-tcu/).
Assim, para evitar a responsabilização
nos termos aduzidos, os integrantes das assessorias jurídicas devem
atuar com diligência no cumprimento dos seus deveres, atentando para o
conteúdo do parecer que resultará do exame jurídico dos atos da
Administração. A fim de atender à finalidade do art. 38 da Lei de
Licitações, é importante que todos os documentos que compõem o processo
de contratação sejam cautelosamente examinados e que, ao final dessa
análise, o parecerista indique, justificadamente, a aprovação ou não dos
referidos documentos.
Recentemente, o Plenário do TCU se
manifestou acerca do assunto no Acórdão nº 1.944/2014. Conforme constou
do Voto do Min. Relator, os pareceres jurídicos pró-forma, assim
entendidos aqueles que não efetivam a análise adequada de todos os
documentos que instruem o processo de contratação pública, contrariam as
determinações contidas no art. 38 da Lei de Licitações e a
jurisprudência da Corte de Contas. Veja-se trechos extraídos do decisium:
“Voto
(…)
25. Por outro lado, a partir da análise
mais aprofundada dos documentos vinculados aos referidos certames, e
ensejando a proposta de anulação dos procedimentos licitatórios, foram
constatadas as seguintes irregularidades:
a) adoção de pareceres jurídicos pró-forma; e
b) projeto de implantação das creches diferentes do aprovado pelo FNDE.
26. De fato, a utilização de pareceres
jurídicos sintéticos, de apenas uma página, com conteúdo genérico, sem
demonstração da efetiva análise do edital e dos anexos, em especial
quanto à legalidade das cláusulas editalícias, permitiu, no caso
concreto, a presença de itens posteriormente impugnados, inclusive por
meio da presente representação, e que foram alterados nos certames
subsequentes.
27. Este Tribunal já se posicionou
acerca da necessidade de os pareceres jurídicos exigidos pelo art. 38 da
Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, integrarem a motivação dos atos
administrativos, com abrangência suficiente, evidenciando a avaliação
integral dos documentos submetidos a exame (v. g.: Acórdão 748/2011-Plenário).” (TCU, Acórdão nº 1.944/2014, Rel. Min. André de Carvalho, j. em 23.07.2014)
Portanto, em conformidade com a
orientação jurisprudencial do TCU, é ilegal a adoção de pareceres
jurídicos sintéticos, com conteúdo genérico, sem a demonstração da
efetiva análise do edital e dos respectivos anexos. A Corte entende que
os pareceres jurídicos exigidos pelo art. 38 da Lei nº 8.666/93 integram
a motivação dos atos administrativos, razão pela qual devem apresentar
abrangência suficiente para tanto, evidenciando a avaliação integral dos
documentos submetidos a exame da assessoria jurídica da Administração.