Ainda existe uma
linha tênue entre quais são ou não as tarefas e responsabilidades do pregoeiro
e muita coisa acaba se misturando. Mas isso pode ser muito perigoso.
Primeiramente, é
importante verificar quais são as atribuições dadas ao pregoeiro pela normatização.
O Decreto 3.555/2000, que regulamenta o Pregão em âmbito federal, estabelece as
seguintes atribuições do pregoeiro em seu art. 9º:
Art. 9º - As
atribuições do pregoeiro incluem:
I - o
credenciamento dos interessados;
II - o recebimento
dos envelopes das propostas de preços e da documentação de habilitação;
III - a abertura
dos envelopes das propostas de preços, o seu exame e a classificação dos
proponentes;
IV - a condução
dos procedimentos relativos aos lances e à escolha da proposta ou do lance de
menor preço;
V - a adjudicação
da proposta de menor preço;
VI - a elaboração
de ata;
VII - a condução
dos trabalhos da equipe de apoio;
VIII - o
recebimento, o exame e a decisão sobre recursos; e
IX - o
encaminhamento do processo devidamente instruído, após a adjudicação, à
autoridade superior, visando a homologação e a contratação.
A professora,
advogada, especialista e consultora jurídica de licitações e contratos, Simone
Zanotello de Oliveira, diz que: “Da análise desse artigo, verificamos
que as atribuições do pregoeiro estão voltadas para a abertura e julgamento do
certame, etapas essas que fazem parte da fase externa da licitação. Não
verificamos na legislação atribuições ao pregoeiro relativas à fase interna,
tais como elaboração de termos de referência ou de editais. E esse raciocínio
vale também para as Comissões de Licitação. Isso ocorre para privilegiar o
princípio da segregação de funções. Esse princípio está voltado para a
necessidade de haver uma repartição de funções entre os agentes públicos
durante a realização de um processo, evitando atividades que sejam
incompatíveis entre si, notadamente as que envolvam execução e fiscalização”,
explica.
Conforme ela, essa
segregação de funções é importante para a segurança dos atores envolvidos no
processo. Quando uma mesma pessoa realiza todas as etapas de um processo, ela
fica mais vulnerável ao erro e, além disso, a detecção do erro também poderá
ficar prejudicada (temos dificuldade de verificar nossos próprios erros). “Por
outro lado, quando há várias pessoas envolvidas no processo, a subsequente
sempre acabará exercendo um certo papel de fiscalização em relação à ação
antecedente, facilitando a verificação de eventuais irregularidades”, afirma
Simone
Entendimento
do TCU
Para a professora,
portanto, as ações da fase interna deveriam ser providenciadas por agentes
diversos daqueles que atuarão na fase externa. Esse, inclusive, tem sido o
entendimento do Tribunal de Contas da União. Vejamos:
TCU –
Acórdão 2.389/2006 – Plenário -
O pregoeiro não pode ser responsabilizado por irregularidade em edital de
licitação, já que sua elaboração não se insere no rol de competências que lhe
foram legalmente atribuídas.
TCU –
Acórdão 686/2011 – Plenário –
Determinar ao órgão que não designasse para compor comissão de licitação o
servidor ocupante de cargo com atuação na fase interna do procedimento, em
atenção ao princípio da segregação de função.
TCU –
Acórdão 3381/2013 – Plenário -
Licitação. Representação. Segregação de funções. A atribuição, ao
pregoeiro, da responsabilidade pela elaboração do edital cumulativamente às
atribuições de sua estrita competência afronta o princípio da segregação de
funções adequado à condução do pregão, inclusive o eletrônico, e não encontra
respaldo nos normativos legais que regem o procedimento.
“Não
obstante essas exigências, sabemos que às vezes é difícil para o órgão ou
entidade promover essa segregação, em razão do quadro reduzido de servidores,
que faz com que haja um acúmulo de funções. Nesses casos, entendemos que os
órgãos de controle deverão ter bom senso, não punindo esses pregoeiros, mas
promovendo orientações a seus superiores, para que ampliem o quadro funcional
como forma de promover essa segregação. E enquanto isso não for possível, uma
ideia seria fazer uma espécie de segregação entre os próprios pregoeiros, ou
seja, aquele que elabora o edital passa para outro pregoeiro promover a
abertura, e vice-versa”, sugere Simone.
Mas a advogada
entende que no que tange à elaboração do Termo de Referência a questão é um
pouco mais complexa. “Como ele é o documento que dá início ao processo, deverá
ser elaborado pela unidade requisitante/demandante, que possui o conhecimento
técnico do objeto, necessário para a confecção do documento. A doutrina,
inclusive, sugere que haja uma elaboração multissetorial, quando possível,
envolvendo também outros setores, principalmente o de compras, que também
poderá contribuir para a elaboração”, diz Simone.
O fato é que
aquele que elabora e assina os documentos, passa a ser responsável por ele,
tanto no âmbito administrativo, quanto nas esferas cível e penal. Num Mandado
de Segurança, por exemplo, quem assina o edital torna-se a autoridade coatora,
e deverá prestar os esclarecimentos ao Poder Judiciário, podendo sofrer os
efeitos de uma eventual condenação. “Portanto, o conselho é: na medida do
possível, os agentes devem colocar em prática o princípio da segregação de
função quando da realização de um processo licitatório”, avisa Simone.
O advogado e
consultor jurídico de licitações e contratos públicos, Paulo Teixeira,
também explica que de acordo com o que dispõe a Lei Geral do Pregão e os
decretos que a regulamentam, o Pregoeiro é responsável pela fase externa do
Pregão, ou seja, todo o período que inclui desde a publicação da abertura do
certame até a adjudicação do objeto ao licitante vencedor.
“Assim, em estrita
análise normativa, a assinatura do Pregoeiro somente se faz necessária naqueles
atos que são de sua responsabilidade:1 - a emissão de respostas aos pedidos de
esclarecimentos e de impugnação, 2 - a ata de credenciamento e de
julgamento da sessão pública, 3 - o Julgamento dos recursos, quando
for o caso, e 4 - a Adjudicação“, afirma Teixeira.
No entanto,
Teixeira também afirma que é sabido que esta não é uma realidade em boa parte
das unidades administrativas, que desrespeitam o princípio da segregação das
funções, provocando os seus Pregoeiros a assumirem outras atividades como a
elaboração dos termos de referência e dos editais, que são documentos
elaborados durante a fase interna (preparatória) da licitação.
“Porém, tenho
sustentado que o Pregoeiro, em que pese seja ele responsável apenas pela fase
externa, não deve manter inércia quanto à fase interna, explico: ao identificar
que determinado edital, seus anexos ou minuta de contrato, estejam contendo
cláusulas ou exigências ilegais ou que afetem a ampla competitividade, deve sim
o Pregoeiro se manifestar quanto a tais exigências, uma vez que sendo mantidas,
provavelmente será ele o responsável, na fase externa, por responder aos
possíveis pedidos de impugnação”, aconselha Teixeira.
Mas Teixeira
concluiu dizendo que os riscos só ocorrem quando o processo é mal preparado,
mal motivado ou mal fundamentado. “A questão é que o servidor, que também
assume o papel de Pregoeiro, resta por ser (co-)responsável também pela fase
interna. Neste caso há que existir um controle ainda maior das decisões tomadas
durante a preparação do Pregão, que deve ser promovido por uma controladoria
interna ou assessoria jurídica, pois podem existir vícios processuais que não
foram observados por aquele servidor que assumiu toda a fase interna e externa
do Pregão”, conclui.
FONTE:
https://www.sollicita.com.br/Noticia/?p_idNoticia=11403&n=pregoeiro%20-deve%20-assinar%20-ou%20-n%C3%A3o?