A contratação de empresa para
gerenciar ou auxiliar a fiscalização de obra pública não exclui a
responsabilidade dos fiscais da Administração (art. 67, caput, da Lei
8.666/1993).
O
TCU instaurou representação, em cumprimento a determinação do Acórdão
2.330/2014-Plenário, para examinar
irregularidades apontadas em relatório de fiscalização da Controladoria-Geral
da União (CGU), concernentes aos contratos 410/2009 (contrato principal) e
881/2009 (contrato de supervisão a ele vinculado), celebrados pela
Superintendência Regional do Departamento Nacional de Infraestrutura de
Transportes do Estado do Ceará (Dnit/CE). O Contrato 410/2009 teve por objeto a
execução de obras de restauração e de aumento da capacidade na rodovia
BR-116/CE, segmento Km 478,2 - Km 545,7. O Contrato 881/20019 foi celebrado com
vistas à supervisão das referidas obras. A instrução dos autos apontou a
ocorrência de potencial dano ao erário em decorrência de: execução de serviços
sem respaldo contratual, pagamento por serviços desnecessários, substituição de
serviço sem autorização da contratante e pagamento a maior de item contratado.
Apontou, ainda, que o Dnit/CE, assim que tomou conhecimento das
irregularidades, adotara as medidas necessárias para elidir o débito, “entre as quais: readequação do projeto,
redução do valor do contrato, ajuste dos serviços previstos às novas
especificações e glosa e/ou estorno de valores correspondentes serviços
realizados em desacordo com os projetos executivos e o contrato”. Não
obstante a elisão do débito, a unidade técnica promoveu a audiência do
superintendente regional do Dnit/CE e do fiscal dos contratos. Ao examinar a
defesa do primeiro responsável, o relator observou que o superintendente
regional “atuou amparado no ateste de
medição efetuado pelo engenheiro a quem fora atribuída a fiscalização do
contrato. Não havia motivos para que desconfiasse das informações constantes do
relatório da medição, o qual também contava com atesto da empresa contratada
para a fiscalização da obra. Além disso, não foram apontadas circunstâncias que
recomendassem adoção de maiores cautelas em relação às medições do Contrato
410/2006 do que àquelas de dezenas de outros contratos sob responsabilidade da
regional”. Ademais, “milita a favor
do responsável o fato de ter adotado medidas que se mostraram suficientes a
evitar a consecução do dano, assim que tomou conhecimento do relatório
elaborado pelo órgão central do Sistema de Controle Interno”, razão por que
sugeriu o acolhimento das suas razões de justificativa. Com relação ao fiscal
dos contratos, o relator consignou que a responsabilidade dele “encontra-se suficientemente demonstrada nos
autos, por meio da caracterização da conduta irregular (ateste de itens de
serviço em desacordo com o projeto, sem respaldo contratual, não autorizados e
desnecessários), do resultado (pagamentos a maior à empresa contratada) e do
nexo de causalidade entre a conduta e o resultado (o ateste legitimou e
proporcionou pagamentos indevidos à contratada)”. A despeito de os serviços
pagos com base nas medições terem sido objeto de glosa, o relator asseverou que
o ateste do fiscal “expôs o Erário a
risco de prejuízo expressivo, que somente não se consumou em razão da atuação
da Polícia Federal e da CGU”. Tratando sobre as justificativas do fiscal
quanto à falta de estrutura do Dnit/CE para o bom desempenho da função, o relator
rebateu: “Não há como acolher a alegação
de que a incorreção do ateste justificou-se pela falta de estrutura material e
pessoal do órgão. Primeiro porque a falta de estrutura não está comprovada nos
autos. Segundo, porque não há provas de que ele tenha pleiteado reforço na
equipe nem aquisição de equipamentos. Terceiro, porque ele não opôs nenhuma
ressalva no seu ateste. Tampouco merecem acolhimento as justificativas
lastreadas em suposto excesso de atribuições. Tal condição poderia ser arguida,
na melhor das hipóteses, para justificar demora na execução das tarefas ou
pequenos lapsos na conferência de documentos, jamais para legitimar ateste
indevido. Se não tinha condições de aferir medições e cumprir a contento suas
atribuições, cabia ao fiscal do contrato expor a seus superiores tais
circunstâncias ou, no limite, solicitar seu afastamento. Jamais atestar
serviços em desacordo com o projeto, sem respaldo contratual, não autorizados e
desnecessários. Ao assim proceder, atraiu para si as consequências da inserção
de informações inverídicas nos relatórios de medição”. O relator afastou,
ainda, com base em precedentes do TCU, o argumento de que a responsabilidade do
fiscal poderia ser elidida pelo fato de haver empresa contratada para
supervisionar a execução das obras: “Não
tem sustentação a alegação de que a responsabilidade pelo acompanhamento das
obras estava integralmente a cargo da empresa supervisora. A contratação de
empresa para supervisão da execução de obra não lhe transfere a
responsabilidade do agente público incumbido do ateste, tampouco exime este de
responsabilidade”. O relator ressaltou, ao fim, que o pagamento deveria
ocorrer apenas após a devida liquidação da despesa, na forma da lei: “De acordo com o artigo 62, caput, da Lei
4.320/64, o pagamento da despesa deve ser efetuado após sua regular liquidação.
A liquidação da despesa é ato destinado a avaliar se as cláusulas contratuais
foram cumpridas, gerando, assim, a obrigação de pagamento para a Administração.
Destina-se a apurar o que, como, quanto e a quem pagar, para extinguir a
obrigação. É na fase de liquidação da despesa que o fiscal do contrato ganha
destaque, pois é ele quem fornece os elementos essenciais a informar o
ordenador de despesa a respeito do cumprimento do objeto contratual, para
pagamento à contratada. Não foi por outra razão que a Lei 8.666/1993
estabeleceu a obrigatoriedade de designação de representante da Administração,
para acompanhamento e fiscalização do contrato, ainda que contratados terceiros
para assisti-lo”. Arrematando o seu posicionamento, o relator afirmou que o
ateste do fiscal dos contratos “não
configurava mera formalidade, mas controle concomitante à execução contratual,
realizado em cumprimento à disposição legal expressa (art. 67 da Lei
8.666/1993)”. Dessa forma, propôs, e o colegiado acatou, considerar
procedente a representação, acolher as razões de justificativa apresentadas
pelo superintendente regional do Dnit/CE, rejeitar as do fiscal dos contratos e
aplicar a este a multa prevista no art. 58, inciso II, da Lei 8.443/1992, no
valor de R$ 10.000,00.
Acórdão
5562/2019 Primeira Câmara, Representação, Relator Ministro Walton Alencar
Rodrigues.