sábado, 10 de agosto de 2019

RESPONSABILIDADE DO FISCAL DO CONTRATO DA ADMINISTRAÇÃO


A contratação de empresa para gerenciar ou auxiliar a fiscalização de obra pública não exclui a responsabilidade dos fiscais da Administração (art. 67, caput, da Lei 8.666/1993).
O TCU instaurou representação, em cumprimento a determinação do Acórdão 2.330/2014-Plenário, para examinar irregularidades apontadas em relatório de fiscalização da Controladoria-Geral da União (CGU), concernentes aos contratos 410/2009 (contrato principal) e 881/2009 (contrato de supervisão a ele vinculado), celebrados pela Superintendência Regional do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes do Estado do Ceará (Dnit/CE). O Contrato 410/2009 teve por objeto a execução de obras de restauração e de aumento da capacidade na rodovia BR-116/CE, segmento Km 478,2 - Km 545,7. O Contrato 881/20019 foi celebrado com vistas à supervisão das referidas obras. A instrução dos autos apontou a ocorrência de potencial dano ao erário em decorrência de: execução de serviços sem respaldo contratual, pagamento por serviços desnecessários, substituição de serviço sem autorização da contratante e pagamento a maior de item contratado. Apontou, ainda, que o Dnit/CE, assim que tomou conhecimento das irregularidades, adotara as medidas necessárias para elidir o débito, “entre as quais: readequação do projeto, redução do valor do contrato, ajuste dos serviços previstos às novas especificações e glosa e/ou estorno de valores correspondentes serviços realizados em desacordo com os projetos executivos e o contrato”. Não obstante a elisão do débito, a unidade técnica promoveu a audiência do superintendente regional do Dnit/CE e do fiscal dos contratos. Ao examinar a defesa do primeiro responsável, o relator observou que o superintendente regional “atuou amparado no ateste de medição efetuado pelo engenheiro a quem fora atribuída a fiscalização do contrato. Não havia motivos para que desconfiasse das informações constantes do relatório da medição, o qual também contava com atesto da empresa contratada para a fiscalização da obra. Além disso, não foram apontadas circunstâncias que recomendassem adoção de maiores cautelas em relação às medições do Contrato 410/2006 do que àquelas de dezenas de outros contratos sob responsabilidade da regional”. Ademais, “milita a favor do responsável o fato de ter adotado medidas que se mostraram suficientes a evitar a consecução do dano, assim que tomou conhecimento do relatório elaborado pelo órgão central do Sistema de Controle Interno”, razão por que sugeriu o acolhimento das suas razões de justificativa. Com relação ao fiscal dos contratos, o relator consignou que a responsabilidade dele “encontra-se suficientemente demonstrada nos autos, por meio da caracterização da conduta irregular (ateste de itens de serviço em desacordo com o projeto, sem respaldo contratual, não autorizados e desnecessários), do resultado (pagamentos a maior à empresa contratada) e do nexo de causalidade entre a conduta e o resultado (o ateste legitimou e proporcionou pagamentos indevidos à contratada)”. A despeito de os serviços pagos com base nas medições terem sido objeto de glosa, o relator asseverou que o ateste do fiscal “expôs o Erário a risco de prejuízo expressivo, que somente não se consumou em razão da atuação da Polícia Federal e da CGU”. Tratando sobre as justificativas do fiscal quanto à falta de estrutura do Dnit/CE para o bom desempenho da função, o relator rebateu: “Não há como acolher a alegação de que a incorreção do ateste justificou-se pela falta de estrutura material e pessoal do órgão. Primeiro porque a falta de estrutura não está comprovada nos autos. Segundo, porque não há provas de que ele tenha pleiteado reforço na equipe nem aquisição de equipamentos. Terceiro, porque ele não opôs nenhuma ressalva no seu ateste. Tampouco merecem acolhimento as justificativas lastreadas em suposto excesso de atribuições. Tal condição poderia ser arguida, na melhor das hipóteses, para justificar demora na execução das tarefas ou pequenos lapsos na conferência de documentos, jamais para legitimar ateste indevido. Se não tinha condições de aferir medições e cumprir a contento suas atribuições, cabia ao fiscal do contrato expor a seus superiores tais circunstâncias ou, no limite, solicitar seu afastamento. Jamais atestar serviços em desacordo com o projeto, sem respaldo contratual, não autorizados e desnecessários. Ao assim proceder, atraiu para si as consequências da inserção de informações inverídicas nos relatórios de medição”. O relator afastou, ainda, com base em precedentes do TCU, o argumento de que a responsabilidade do fiscal poderia ser elidida pelo fato de haver empresa contratada para supervisionar a execução das obras: “Não tem sustentação a alegação de que a responsabilidade pelo acompanhamento das obras estava integralmente a cargo da empresa supervisora. A contratação de empresa para supervisão da execução de obra não lhe transfere a responsabilidade do agente público incumbido do ateste, tampouco exime este de responsabilidade”. O relator ressaltou, ao fim, que o pagamento deveria ocorrer apenas após a devida liquidação da despesa, na forma da lei: “De acordo com o artigo 62, caput, da Lei 4.320/64, o pagamento da despesa deve ser efetuado após sua regular liquidação. A liquidação da despesa é ato destinado a avaliar se as cláusulas contratuais foram cumpridas, gerando, assim, a obrigação de pagamento para a Administração. Destina-se a apurar o que, como, quanto e a quem pagar, para extinguir a obrigação. É na fase de liquidação da despesa que o fiscal do contrato ganha destaque, pois é ele quem fornece os elementos essenciais a informar o ordenador de despesa a respeito do cumprimento do objeto contratual, para pagamento à contratada. Não foi por outra razão que a Lei 8.666/1993 estabeleceu a obrigatoriedade de designação de representante da Administração, para acompanhamento e fiscalização do contrato, ainda que contratados terceiros para assisti-lo”. Arrematando o seu posicionamento, o relator afirmou que o ateste do fiscal dos contratos “não configurava mera formalidade, mas controle concomitante à execução contratual, realizado em cumprimento à disposição legal expressa (art. 67 da Lei 8.666/1993)”. Dessa forma, propôs, e o colegiado acatou, considerar procedente a representação, acolher as razões de justificativa apresentadas pelo superintendente regional do Dnit/CE, rejeitar as do fiscal dos contratos e aplicar a este a multa prevista no art. 58, inciso II, da Lei 8.443/1992, no valor de R$ 10.000,00.
Acórdão 5562/2019 Primeira Câmara, Representação, Relator Ministro Walton Alencar Rodrigues.