Somente é exigível a observância das
disposições do art. 49, § 3º, da Lei 8.666/1993 (contraditório e ampla defesa)
quando o procedimento licitatório, por ter sido concluído com a adjudicação do
objeto, gera direitos subjetivos ao licitante vencedor, ou em casos de
revogação ou de anulação em que o licitante seja apontado, de modo direto ou
indireto, como o causador do desfazimento do certame.
Representação
formulada ao TCU apontou possíveis irregularidades no RDC Eletrônico
425/2014-12, conduzido pela Superintendência Regional do Departamento Nacional
de Infraestrutura de Transportes (Dnit) no Estado de Goiás e no Distrito
Federal visando à “contratação integrada
de serviços de elaboração de projeto básico e de projeto executivo de
engenharia e de execução das obras de implantação e pavimentação da Rodovia
BR-080/GO, incluindo obras de arte especiais”. Entre as irregularidades
suscitadas, mereceu destaque a “revogação
da licitação sem motivação e sem abertura de prazo para o exercício do
contraditório pelos licitantes”. Ao apreciar a matéria, a unidade técnica
concluiu que não fora desarrazoada a decisão pela revogação do certame. Segundo
ela, vários precedentes do TCU abordaram os problemas derivados de
desatualização de projeto utilizado em licitações públicas e, no caso concreto,
“ainda que se trate de contratação
integrada na qual o contratado assume riscos decorrentes de elementos do
anteprojeto, há defasagem de mais de cinco anos entre as informações
geométricas (impactadas pela topografia) e de jazidas (impactadas pelo
cadastro), disponibilizadas aos licitantes e utilizadas para elaboração das
propostas, com grande probabilidade de que as propostas de preços apresentadas
pelos licitantes estejam dissociadas do objeto que será projetado e construído”.
Todavia, no que concerne à ausência de contraditório antes da decisão pela
revogação da licitação, o titular da unidade técnica propôs a oitiva do Dnit,
medida que, para a relatora, não seria necessária. Em seu voto, ao analisar as
disposições legais sobre o tema, a relatora se alinhou ao entendimento
consignado em deliberações do TCU, a exemplo do Acórdão
111/2007-Plenário, e do STJ, como o
Mandado de Segurança 7.017/DF, que apregoam ser necessário dar oportunidade de
contraditório e ampla defesa antes da revogação de licitação apenas quando já
se adjudicou o seu objeto. Por sua clareza, a relatora julgou oportuno
transcrever o seguinte excerto da ementa da mencionada decisão judicial: “(...) 3. Revogação de licitação em
andamento com base em interesse público devidamente justificado não exige o
cumprimento do § 3º, do art. 49, da Lei 8.666/93. 4. Ato administrativo com a
característica supramencionada é de natureza discricionária quanto ao momento
da abertura de procedimento licitatório. 5. Só há aplicabilidade do § 3º, do
art. 49, da Lei 8.666/93, quando o procedimento licitatório, por ter sido
concluído, gerou direitos subjetivos ao licitante vencedor (adjudicação e
contrato) ou em casos de revogação ou de anulação onde o licitante seja
apontado, de modo direto ou indireto, como tendo dado causa ao proceder o
desfazimento do certame”. Segundo a relatora, na situação sob exame,
prolongar a discussão sobre os procedimentos adotados no RDC Eletrônico
425/2014-12 poderia ir contra o princípio da eficiência e configurar maior
risco de prejuízo ao interesse público do que realizar nova licitação.
Ponderações dessa natureza, a seu ver, se alinhariam às recentes disposições
legais incorporadas ao Decreto-Lei 4.657/1942 (Lei de Introdução às Normas do
Direito Brasileiro) pela Lei 13.655/2018, em especial as do art. 22, segundo as
quais as dificuldades reais do gestor devem ser consideradas na interpretação
de normas sobre gestão pública, e as circunstâncias práticas envoltas à ação do
agente público avaliadas em decisão sobre regularidade de conduta ou validade
de ato ou contrato. Assim sendo, nos termos da proposta da relatora, o Plenário
decidiu considerar improcedente a representação.
Acórdão
2656/2019 Plenário, Representação, Relator Ministra Ana Arraes.