sexta-feira, 4 de setembro de 2020

É legal, para a comprovação da capacidade técnico-profissional de licitante, a exigência de quantitativos mínimos, executados em experiência anterior, compatíveis com o objeto que se pretende contratar, cabendo à Administração demonstrar que tal exigência é indispensável à garantia do cumprimento da obrigação a ser contratada.



Representação formulada ao TCU apontou possíveis irregularidades na Empresa de Planejamento e Logística S.A. (EPL), relacionadas à contratação de “serviços necessários à realização de estudos para subsidiar a desestatização do porto de Itajaí /SC, conforme condições e especificações constantes do Edital 7/2020”. Entre as irregularidades suscitadas, mereceu destaque o suposto vício do edital quanto às seguintes exigências quantitativas mínimas de comprovação da capacidade técnica para os profissionais das empresas licitantes: “i) profissional que tenha atuado na elaboração de modelagem econômico-financeira no escopo de Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental – EVTEA referente a instalações portuárias que tenham estado em operação, com movimentação anual de, no mínimo, 262.000 TEU, realizada no Brasil ou no exterior; ii) profissional que tenha atuado na elaboração de anteprojeto, projeto básico ou projeto executivo no escopo de Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental – EVTEA referente a instalações portuárias que tenham estado em operação, com movimentação anual de, no mínimo, 262.000 TEU, realizada no Brasil ou no exterior; iii) profissional que tenha atuado em atividades de assessoria jurídica com as seguintes características mínimas: prestação de serviço de due diligence jurídico em processos de FUSÕES E AQUISIÇÕES, no Brasil ou no exterior, no setor de infraestrutura, com ativo mínimo de R$ 352 milhões; iv) profissional que tenha atuado em atividades de avaliação ambiental no escopo de Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental – EVTEA referente a instalações portuárias que tenham estado em operação, com movimentação anual de, no mínimo, 262.000 TEU, realizada no Brasil ou no exterior”. Em sua instrução inicial, a unidade técnica chamou a atenção para o fato de que tal prática “poderia afrontar a Lei 8.666/1993, em seu art. 30, § 1º, inciso I, que define que a comprovação de capacitação técnico-profissional consiste na comprovação do licitante de possuir, em seu quadro permanente, na data prevista para entrega da proposta, profissional de nível superior ou outro devidamente reconhecido pela entidade competente. Ademais, tal profissional deve ser detentor de atestado de responsabilidade técnica por execução de obra ou serviço de características semelhantes, limitadas estas exclusivamente às parcelas de maior relevância e valor significativo do objeto da licitação, vedadas as exigências de quantidades mínimas ou prazos máximos”. Na oportunidade, alertou que a jurisprudência do TCU, em especial o Acórdão 2.521/2019-Plenário, acena no sentido de que a literalidade do mencionado dispositivo deve ser observada. Chamada aos autos, a EPL ponderou que o art. 30 § 1º, da Lei 8.666/1993 poderia trazer prejuízos para a eficiência da licitação se levada em conta apenas a sua literalidade e que, na licitação em tela, a qualidade técnica dos trabalhos seria imprescindível para o correto diagnóstico das condições do porto. Como exemplo, a EPL citou que o ‘Relatório de Transações’ objetivava diagnosticar a condição de competividade do porto de Itajaí frente a outros players presentes em sua área de influência, e que, caso o relatório fosse executado de maneira tecnicamente equivocada, “o processo de desestatização poderia sofrer com retrabalhos, a fim de corrigir os erros técnicos, ou mesmo levar a cenário onde toda a modelagem restasse prejudicada”. Após analisar as justificativas, a unidade técnica concluiu que, considerando os objetivos específicos da licitação, os requisitos quantitativos mínimos exigidos dos profissionais funcionariam como “garantia de porte adequado da experiência dos ativos humanos a serem utilizados na execução contratual pretendida”. Em seu voto, anuindo à manifestação da unidade instrutiva, o relator assinalou que o mínimo exigido (262.000 TEUs) de movimentação anual do terminal seria razoável, por se referir a quantitativo equivalente ao de um terminal de pequeno porte, e que o porto de Itajaí, só no primeiro semestre de 2020, movimentara 258.476 TEUs. Considerou igualmente razoável a exigência para o produto “due diligence jurídico” em serviços prestados em processos de fusão e aquisição (R$ 352 milhões), por se referir a 50% do ativo total declarado pela Superintendência do Porto de Itajaí à Antaq, em dezembro de 2018. Frisou, por fim, que o TCU possui precedentes no sentido de que, ao se exigir quantitativos mínimos para fins de comprovação da capacidade técnico-profissional das licitantes, a Administração deve apresentar a devida motivação dessa decisão administrativa, evidenciando que a exigência é indispensável à garantia do cumprimento da obrigação (Acórdãos 492/2006, 1.124/2013 [1.214/2013], 3.070/2013 e 534/2016, todos do Plenário), e que, no presente caso, foi demonstrado pelos estudos que balizaram a exigência e os quantitativos exigidos, que as exigências feitas, para habilitação técnico-profissional, de experiência em torno de 50%, estão no patamar entendido como razoável por esta Corte de Contas”, no que foi acompanhado pelos demais ministros.
Acórdão 2032/2020 Plenário, Representação, Relator Ministro-Substituto Marcos Bemquerer.