quarta-feira, 2 de junho de 2021

SERVIÇOS CONTINUADOS

O serviço de produção gráfica com vistas à realização do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) enquadra-se como serviço de natureza contínua (art. 57, inciso II, da Lei 8.666/1993), uma vez que reúne os requisitos da essencialidade, execução de forma contínua, longa duração e possibilidade de o fracionamento anual prejudicar a sua execução.

O TCU apreciou pedido de reexame interposto pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), contra o Acórdão 924/2019-Plenário, que considerou parcialmente procedente representação interposta por empresa licitante a respeito de irregularidades ocorridas em pregão eletrônico. O certame teve por objeto “a contratação de serviços de produção gráfica, em condições especiais de segurança e sigilo, envolvendo a diagramação, manuseio, embalagem, rotulagem e entrega, à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT, dos cadernos de provas e instrumentos de aplicação destinados à realização do Exame Nacional do Ensino Médio – Enem”. A decisão recorrida, entre outras providências, deu ciência ao Inep de que o serviço de produção e fornecimento de provas e materiais de aplicação para o Enem não se enquadraria como serviço de natureza contínua, para fins da renovação contratual conforme o inciso II do art. 57 da Lei 8.666/1993 e a Instrução Normativa SLTI/MPOG 2/2008. De acordo com a análise da unidade técnica, que se associou à linha defendida pela decisão combatida, a execução do referido serviço demandaria em média 75 dias, concentrados próximos ao encerramento do exercício, ou seja, teria duração limitada a parte de um exercício específico. Além disso, segundo a instrução, não seria razoável considerar que o fracionamento em períodos anuais, a exigir a realização de licitação em igual periodicidade, acarretaria a possibilidade de prejuízo à execução do objeto. Em seu voto, o ministro relator assinalou que o posicionamento da unidade técnica “foi adotado tendo por principal premissa o fato de a execução financeira do contrato para impressão de provas restringir-se ao período de apenas dois meses, desconsiderando a possibilidade de realização de atividades intermediárias e preparatórias pela gráfica contratada”. Observou, a seguir, a existência de questões incontroversas entre as razões recursais trazidas pelo Inep e a análise efetuada pela unidade técnica, sobre as quais destacou que “a essencialidade do serviço prestado decorre do fato de que a impressão das provas do Enem atende à necessidade pública permanente, a ser satisfeita anualmente. Já a execução de forma contínua refere-se à constatação de que tal serviço deve ser prestado anualmente por período de tempo indeterminado nos anos que se seguem. Por fim, o atributo da longa duração caracteriza-se por sua execução em mais de um exercício financeiro”. No entender do relator, “o cerne da controvérsia cinge-se à não satisfação do pressuposto relativo à possibilidade de que o fracionamento do serviço em períodos venha a prejudicar sua execução, o que impediria o reconhecimento de seu caráter de continuidade”. A esse respeito, o Inep alegou que os serviços prestados não se restringiriam às atividades de revisão e impressão das provas propriamente ditas, mas incluiriam também reuniões prévias, realizadas desde o mês de janeiro do ano de realização do Enem, como forma de viabilizar a prestação do serviço contratado de modo adequado. Para comprovar esse fato, trouxe documentos demonstrando a ocorrência de atividades de trabalho envolvendo a gráfica contratada durante todo o ano de 2018, ao longo do qual a empresa participou de diversas tarefas intermediárias, a exemplo de reuniões, testes de adaptação, simulados e melhorias de procedimentos com vistas a garantir a realização satisfatória do Enem daquele ano. Diante de tais evidências, o relator concluiu que “não se sustenta o entendimento defendido pela Serur de que a execução dos serviços gráficos contratados ater-se-ia ao interregno de 75 dias, período este concentrado no final do exercício, sendo crível a conclusão de que eventual fracionamento do serviço de impressão de provas contratado em períodos poderia trazer prejuízo a sua execução, o que lhe conferiria o atributo da continuidade”. Asseverou em reforço ao reconhecimento do requisito da continuidade que alguns serviços incluídos no bojo da contratação podem eventualmente perpassar o exercício a que a edição anual do Enem se refere, como acontecera no processo de impressão da prova do Enem 2019. Por último, o relator acolheu argumento do recorrente relacionado com a parte final do inciso II do art. 57 da Lei de Licitações, segundo o qual a prorrogação contratual deve ser realizada com vistas a permitir a obtenção de preços e condições mais vantajosas para a Administração. Nesse sentido, anuiu à “possibilidade de, em cenário que permita a prorrogação contratual, a gráfica contratada poder diluir, por diversos exercícios, seus custos envolvidos na formação de parque gráfico que atenda aos requisitos de sigilo e segurança exigidos, o que não ocorreria com a contratação anual de nova gráfica, que seria obrigada a computar esse tipo de custo em sua proposta de preço anual, em desfavor da administração pública”. A par dessas constatações, o Plenário do TCU conheceu do pedido de reexame interposto pelo Inep e, no mérito, deu-lhe provimento para tornar insubsistente o item da decisão recorrida que considerou irregular o enquadramento da contratação em tela como serviço de natureza contínua por infringir o inciso II do art. 57 da Lei 8.666/1993.

Acórdão 2545/2020 Plenário, Pedido de Reexame, Relator Ministro Vital do Rêgo.