Na contratação de prestadores de
serviços terceirizados não abrangidos por convenção coletiva de trabalho, é
indevida a fixação de salários pelo edital da licitação, consistindo em mera
estimativa o valor constante do orçamento de referência e não sendo permitida
a desclassificação de licitante por cotar salários inferiores ao estimado.
Representação
formulada ao TCU apontou suposta irregularidade no Pregão Eletrônico 2/2020,
promovido pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha,
campus Santo Ângelo, cujo objeto era a contratação de pessoa jurídica
especializada na prestação de serviços de tradutor/intérprete de libras. O
representante alegou que a entidade estimara em R$ 1.711,00 o salário base para
a função de intérprete, a partir de pesquisa de mercado, em virtude da
inexistência de convenção coletiva de trabalho para a categoria, e que, não
obstante o disposto no edital (“caso não seja utilizado CCT na formulação da
proposta, o valor do salário deve ser no mínimo igual ao cotado pela
Administração”), fora aceito valor inferior (R$ 1.325,00), sem análise de
custos e “sem parâmetros de acordos coletivos ou de sindicatos da categoria”.
Acrescentou ainda que a licitante vencedora não demonstrara a qual sindicato
sua atividade preponderante estaria vinculada para justificar a oferta de
salário inferior ao piso salarial estipulado pela entidade. No seu entender,
tal procedimento caracterizaria desvio de finalidade, julgamento subjetivo e
desvinculação das regras do edital, além de afronta aos princípios da
legalidade e da proporcionalidade. O representante enfatizou que, não estando a
categoria abrangida por CCT, a referência utilizada pela entidade para a
elaboração do orçamento estimado deveria refletir a realidade de mercado
vigente e que seria incabível aceitar salários inferiores à média de mercado e
à referência estimada pela entidade. Ressaltou também a existência do Sindicato
Nacional de Tradutores e de acordos coletivos firmados no âmbito do estado do
Rio Grande do Sul, os quais não teriam sido levados em conta nem como critério
de orçamentação nem como parâmetro de aceitabilidade de preços. Concluiu então
que não teria sido justificado o salário proposto pela vencedora. Ao apreciar a
matéria, o relator destacou, preliminarmente, que, no caso sob análise, “a
contratação não está regida por CCT”, situação em que a jurisprudência
majoritária do TCU acena no sentido do não cabimento da fixação de salários por
edital, consistindo tal indicação em mera estimativa e sem que isso importe em
desclassificação da licitante que cotar salários inferiores ao estimado.
Invocou, nesse sentido, o Acórdão 6022/2016-TCU-1ª
Câmara, por meio do qual decidiu o
Tribunal dar ciência à unidade jurisdicionada sobre a seguinte impropriedade: “inclusão
de cláusulas nos editais dos Pregões 4/2011 (Processo 3923/2010) e 4/2013
(Processo 1162/2012) com exigência de remuneração mínima para profissionais da
empresa prestadora de serviços, contrariando o disposto no art. 3º, § 1, inciso
I, da Lei 8.666/93, bem assim no art. 40, inciso X, da mesma Lei, além da
jurisprudência majoritária do TCU, que admite tal indicação de remuneração
somente como mera estimativa e sem importar em desclassificação da licitante
que cotar salários inferiores ao estimado”. Ainda sobre a exigência em
tela, o relator transcreveu excerto do voto condutor do Acórdão
481/2004-TCU-Plenário, no qual a
matéria, a seu ver, teria sido devidamente esclarecida, nos seguintes termos: “A
meu ver, a exigência em tela padece de vários defeitos. Em primeiro lugar,
efetivamente está-se estabelecendo preços mínimos, o que é vedado pela Lei de
Licitações, como já se anotou. Em segundo lugar, ficam comprometidos o caráter
competitivo da licitação e a obtenção da proposta mais vantajosa porque, ao
fixar valores mínimos para um dos componentes essenciais do preço em contrato
de terceirização de serviços (o salário), o edital força a elevação do preço
final e exclui os concorrentes que não se dispuserem a fazer frente a tais
valores. Ademais, essa disposição editalícia se constitui em invasão da
Administração Pública na esfera do particular, posto que interfere na política
de pessoal da empresa e nos termos dos contratos de trabalho negociados entre
empregador e empregado. Por fim, não custa frisar que a garantia de
profissionais qualificados e experientes na prestação do serviço deve-se dar
por exigência, no edital e no contrato, de requisitos de capacitação
técnico-profissional, e não de níveis mínimos de remuneração.”. Assim
sendo, nos termos da proposta do relator, o colegiado decidiu considerar
improcedente a representação.
Acórdão
9847/2021 Primeira Câmara, Representação, Relator Ministro-Substituto Weder de
Oliveira.