É possível a utilização de
credenciamento (art. 79, inciso II, da Lei 14.133/2021), inclusive por
empresas estatais, para contratação de serviço de gerenciamento e fornecimento
de vales alimentação e refeição, em substituição a licitação com critério de
julgamento pelo menor preço, inviabilizada para esse tipo de contratação após
a edição do Decreto 10.854/2021 e da MP 1.108/2021.
O Plenário do TCU apreciou representação acerca de
possíveis irregularidades em credenciamento realizado pela Empresa Brasileira
de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) para a contratação de empresa
especializada com vistas a prestação de serviços de gerenciamento,
implementação, administração e disponibilização de crédito em cartões
eletrônicos/magnéticos, nas modalidades refeição e alimentação, para os
funcionários da estatal. Após a fase de habilitação, foram autorizadas a
assinar contrato três empresas. A representante sustentou a ilegitimidade da
utilização do credenciamento para a contratação de fornecimento de vales
alimentação e refeição, invocando que haveria viabilidade de competição e que
não seria necessário o atendimento da demanda por várias empresas ao mesmo
tempo, condições necessárias ao emprego do credenciamento, à luz do art. 30,
inciso II, da Lei 13.303/2016. Argumentou, ainda, ser impossível a aplicação do
art. 79 da Lei 14.133/2021 às empresas estatais. Em sua instrução, a unidade
técnica, de um lado, destacou que o Decreto 10.854/2021 e a Medida Provisória
1.108/2021 proibiram o deságio na contratação de vales refeição e alimentação,
ou o uso de taxa de administração negativa aplicada sobre valor dos aludidos
benefícios, circunstância que inviabilizaria o emprego de licitação baseada no
critério de julgamento do menor preço, em que as empresas competiam ofertando
as menores taxas de administração. Por outro lado, entendeu que a opção pelo
julgamento de melhor técnica encontraria problemas no estabelecimento de
critérios de comparação e pontuação entre as empresas. Nesse cenário, o
credenciamento surgiria como alternativa para contratações como a examinada, em
que são selecionadas empresas que preenchem os requisitos previstos no edital,
ficando a efetiva escolha da contratada a cargo do usuário do serviço, conforme
hipótese prevista no art. 79, inciso II, da Lei 14.333/2021, aplicável de forma
analógica às estatais. Em seu voto, o relator destacou que “o credenciamento
tem sido a alternativa encontrada pela Administração Pública para contratar
serviços de gerenciamento e fornecimento de vales alimentação e refeição após a
proibição do emprego da taxa de administração negativa, veiculada no Decreto
10.854/2021 e na Medida Provisória 1.108/2021. Até então o objeto era licitado
pelo critério de julgamento do menor preço, e vencia a empresa que fornecesse a
menor taxa de administração, inclusive negativa. A impossibilidade de uso de
tal critério doravante impõe à Administração o dever de encontrar modelos
alternativos”. E prosseguiu: “embora não coincida com as hipóteses
ordinárias de inexigibilidade previstas na Lei 13.303/2016, tratadas no Acórdão 351/2010-TCU-Plenário, cujos pressupostos centrais são a impossibilidade de
competição e a necessidade da prestação de serviços por diversos prestadores
concomitantes, é necessário reconhecer a subsunção da situação ao
credenciamento previsto no art. 79, inciso II, da Lei 14.133/2021”. Para
reforçar o seu posicionamento, o relator transcreveu excerto do voto condutor
do Acórdão 533/2022-Plenário, segundo o qual, não obstante a Lei 14.133/2021 não
se aplicar às empresas regidas pela Lei 13.303/2006, “é razoável
admitir que as novas regras de flexibilização e busca de eficiência dos
processos seletivos para contratações públicas, ao serem aprovadas pelo Poder
Legislativo para aplicação no âmbito da administração direta, autárquica e
fundacional - de rito administrativo mais rigoroso -, podem, e devem, ser
estendidas, por analogia, às sociedades de economia mista, que, sujeitas ao
regime de mercado concorrencial, exigem, com mais razão, instrumentos mais
flexíveis e eficientes de contratação. Assim, embora o credenciamento não
esteja previsto expressamente na Lei 13.303/2006, é razoável admitir, na
espécie, a aplicação analógica das regras previstas nos arts. 6º, XLIII, e 79,
da Lei 14.133/2021 às empresas estatais”. Ao final, o relator concluiu não
haver impeditivo ao uso do credenciamento na forma realizada pela Infraero e o
colegiado, seguindo o voto do condutor do processo, conheceu da representação e
julgou-a improcedente.
Acórdão
5495/2022 Segunda Câmara, Representação, Relator Ministro Bruno Dantas.