quarta-feira, 19 de outubro de 2022

O PREGOEIRO NÃO PODE ELABORAR O EDITAL

 

A atribuição, ao pregoeiro, da responsabilidade pela elaboração do edital cumulativamente às tarefas de sua estrita competência afronta o princípio da segregação de funções e não encontra respaldo no art. 3º, inciso IV, da Lei 10.520/2002 nem no art. 17 do Decreto 10.024/2019.

Representação formulada ao TCU apontou possíveis irregularidades no Pregão Eletrônico 16/2020, promovido pelo Comando da Aeronáutica para contratação de empresa especializada em “serviços de manutenção preventiva e corretiva de veículos especiais e elos do Sistema de Prevenção e Combate a Incêndio da Força Aérea, em todo o território nacional”. Entre as irregularidades suscitadas, mereceu destaque a “elaboração do edital de pregão pela pregoeira, contrariando o artigo 3º, inciso IV, da Lei 10.520/2002, o artigo 17 do Decreto federal 10.024/2019 e os Acórdãos 3.381/2013 e 2.448/2019, ambos do Plenário. Em resposta à oitiva realizada nos autos, o órgão promotor do certame argumentou que, “ao elaborar o edital, a pregoeira não teria se imiscuído na elaboração das premissas mais sensíveis para a contratação, visto que tais condições fazem parte do Termo de Referência, elaborado por agente diverso”, e que, portanto, não haveria quebra do princípio da segregação de funções”. Ao analisar tal argumentação, a unidade instrutiva pontuou que, além de ir de encontro à jurisprudência do TCU, a elaboração do edital pelo pregoeiro aumenta os riscos oriundos da atribuição de atividades sensíveis à mesma pessoa, que, no caso em análise, seria “a de propor as regras da licitação e posteriormente julgar o certame segundo essas regras por ela mesma elaboradas”. Além disso, entendimento doutrinário estaria a apontar que, embora não haja, na lei do pregão, atribuição ao pregoeiro para elaborar o edital, “tal ausência não impede que a atribuição seja delegada ao pregoeiro pela autoridade superior ou pelo regulamento interno da organização” e que assim “haveria vantagem nesta delegação, pelo potencial aproveitamento da expertise do pregoeiro para o aperfeiçoamento da minuta”; essa mesma doutrina alerta que “há também um risco, pela ausência de segregação de funções entre o gestor da licitação (responsável pela condução do certame) e o autor das regras que balizarão o procedimento competitivo”. Em reforço ao seu posicionamento, a unidade técnica trouxe mais um argumento doutrinário, segundo o qual “não se encontra entre as atribuições exclusivas do pregoeiro a responsabilidade pela confecção e assinatura do Edital de Licitação, então, não é sua competência fazer, muito menos assinar”, e, caso ele venha a confeccionar o edital, “assumirá a responsabilidade por uma atribuição que não é sua e nem conferida legalmente”. Por fim, a unidade instrutiva assinalou que o Acórdão 686/2011-Plenário não recomenda designar, para compor a comissão de licitação, o servidor que atua na fase interna do procedimento licitatório, em observância ao princípio da segregação das funções, o qual “estabelece que o Agente Público que edita determinado ato, com vistas à sua imparcialidade no julgamento, não deve ser também responsável pela sua fiscalização”. Em seu voto, anuindo ao entendimento esposado pela unidade técnica, o relator enfatizou que a elaboração do edital do pregão “não se inclui entre as atribuições do pregoeiro, nos termos dos normativos que regem a matéria, além disso viola o princípio da segregação de funções, que deve permear toda a administração pública, sobretudo o processo de contratação, pois possibilita o controle das etapas do processo de pregão por setores/instâncias distintos”. Ao final, acolhendo a proposição do relator, o Plenário decidiu dar ciência ao Centro de Aquisições Específicas do Comando da Aeronáutica, com vistas à prevenção de outras ocorrências semelhantes, que a elaboração do edital pela pregoeira contrariou o art. 3º, inciso IV, da Lei 10.520/2002, o art. 17 do Decreto 10.024/2019 e os Acórdãos 3.381/2013 e 2.448/2019, ambos do Plenário.

Acórdão 2146/2022 Plenário, Representação, Relator Ministro Aroldo Cedraz.

INFORMATIVO DE LICITAÇÕES E CONTRATOS DO TCU – Nº 466