A omissão do art. 23, § 2º, da Lei
14.133/2021 quanto à possibilidade da realização de cotação local no caso de
obras e serviços de engenharia não deve obstar, por si só, a prática de
pesquisa local de valores de insumos para definição do preço estimado da
contratação, desde que sua adoção seja devidamente justificada e a vantagem em
relação ao sistema referencial de custos demonstrada pelo orçamentista, nos
termos do art. 8º do Decreto 7.983/2013, cuja aplicação no âmbito da referida
lei está autorizada pela IN Seges-ME 91/2022.
Ao
examinar o relatório da auditoria realizada no Departamento Nacional de
Infraestrutura de Transportes (Dnit) com o objetivo de “fiscalizar os
serviços de manutenção (conservação/recuperação) da BR-364/AC, referentes ao
segmento entre o km 274,20 e o km 490,60 e do acesso ao município de Manoel
Urbano/AC, abarcados pelos Contratos 667/2021 (lote 4) e 668/2021 (lote 5)”,
o Pleno do TCU, por meio do Acórdão
2178/2023-Plenário, tendo em vista a
“identificação de inconformidade na metodologia de obtenção dos preços de
referência dos principais insumos da obra, nos orçamentos do edital que
antecedeu os ajustes analisados”, deliberara por fixar prazo ao Dnit para apresentar ao Tribunal plano de ação “com as medidas a serem adotadas visando
adaptar os seus normativos e procedimentos à Lei 14.133/2021, especialmente aos
parâmetros previstos no art. 23, § 2º, para definição do valor estimado de
contratação, avaliando-se ainda a compatibilidade do art. 8º, parágrafo único,
do Decreto 7.983/2013 e a economicidade comparada com os valores da tabela
Sicro, acrescidos dos custos dos transportes até o local da obra, quando for o
caso”. Ao apreciar o monitoramento
do cumprimento da referida deliberação, o relator destacou, preliminarmente,
que a mencionada determinação decorrera da constatação da adoção de custos de
insumos pétreos, areia, aço, cimento e cal obtidos a partir de cotação local,
sem que tivesse sido formalmente demonstrada a vantagem desses custos em
relação àqueles constantes das tabelas do Sicro, considerando para ambos os
correspondentes custos de transporte. Segundo o relator, tal procedimento
estaria em conformidade com os normativos do Dnit, os quais não previam a
necessidade de comparação dos valores cotados com os do Sicro, nem a exigência
de demonstração da pertinência da cotação em relatório técnico, o que
contrariava os arts. 4º e 8º, parágrafo único, do Decreto 7.983/2013, que
estabelece regras e critérios para elaboração do orçamento de referência de
obras e serviços de engenharia, contratados e executados com recursos da União.
Além disso, as normas então vigentes dispunham que, na impossibilidade de
realizar a cotação, de maneira justificada, deveriam ser utilizados os valores
constantes do Sicro, mas não deveria ser incluído no cálculo o custo do
transporte comercial do insumo até o canteiro de obra. Nesse ponto, a equipe de
auditoria havia ressaltado que, como o preço dos insumos no Sicro reflete o
valor negociado nas capitais, o custo dos transportes até o canteiro das obras
mostrar-se-ia relevante nos casos de obras em locais distantes. O relator
destacou ter assinalado, quando da prolação do Acórdão 2178/2023 - Plenário,
que o art. 23, § 2º, da Lei 14.133/2021 - dispositivo da nova Lei de Licitações
e Contratos Administrativos que dispõe sobre os parâmetros a serem utilizados
para estimar o valor da contratação de obras e serviços de engenharia -
estabelece o uso do Sicro como primeiro parâmetro, todavia não menciona
expressamente a cotação local para esse fim. Na sequência, salientou que, em
atenção à sobredita deliberação, fora instituído pelo Dnit grupo de trabalho
com o objetivo de analisar, elaborar plano de ação e propor as medidas necessárias,
e ainda que, enquanto os autos se encontravam em análise no seu gabinete, a
entidade apresentara informações atualizadas, destacando-se a aprovação e a
publicação da Instrução Normativa 10/2024. No que
se refere ao atendimento do art. 23, § 2º, da Lei 14.133/2021, o relator pontuou que a recém aprovada instrução
normativa, no seu art. 3º, lista os documentos com as diretrizes e premissas
metodológicas que compõem o Sicro, e no seu art. 4º dispõe que “o SICRO, consoante o Manual de Custos de
Infraestrutura de Transportes, preconiza a realização de pesquisa local de
preços para os itens mais relevantes constantes da curva ABC de insumos quando
da elaboração de um orçamento, dado que os preços de referência divulgados por
esse sistema de custos são obtidos a partir da aplicação de tratamento de
estatísticos e metodologias de fechamento de preços coletados em campo, por
instituto de pesquisa especializado, os quais podem, eventualmente, não
incorporar a potencial economia de escala e as peculiaridades do local de
execução do objeto nos casos concretos, conforme preceitua o art. 23 da Lei n.º
14.133/2021”. O relator
observou que, ao se estimar o valor da contratação, que deverá ser
compatível com os valores praticados pelo mercado, o objetivo da previsão de realização
de pesquisa de preços em mercado local é garantir a incorporação de potencial
economia de escala e das peculiaridades do local de execução do objeto,
conforme previsto no citado dispositivo da Nova Lei de Licitações e Contratos.
Registrou, ainda, que a Instrução Normativa Seges-ME 91/2022 autoriza a
aplicação, no que couber, do Decreto 7.983/2013 para a definição do valor
estimado nos processos de licitação e de contratação direta de obras e serviços
de engenharia, de que dispõe o art. 23, § 2º, da Lei 14.133/2021, no âmbito da
Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional. Outrossim,
asseverou que, conforme o art. 4º do mencionado Decreto 7.983/2013, o custo
global de referência dos serviços e obras de infraestrutura de transportes deve
ser obtido a partir das composições dos custos unitários previstas no projeto
que integra o edital de licitação, menores ou iguais aos seus correspondentes
no Sicro. Já o art. 8º permite a adoção de especificidades locais ou de projeto
na elaboração das respectivas composições de custos unitários, desde que sua
pertinência seja comprovada por meio de relatório técnico elaborado por
profissional habilitado. Em complemento, assinalou que o parágrafo único deste
artigo prevê que os custos unitários de referência da Administração Pública
somente poderão exceder os do sistema de referência em condições especiais,
devidamente justificadas em relatório técnico elaborado por profissional
habilitado e aprovado pelo órgão gestor dos recursos ou pelo seu mandatário. O
relator afirmou também que na recente norma aprovada no Dnit, mais precisamente
no art. 10 da IN 10/2024, consta que o orçamentista deve comparar o custo do
binômio resultante da pesquisa local de preços dos insumos com o custo derivado
dos preços de referência dos insumos do Sicro, adotando a opção mais vantajosa
para o erário na elaboração do orçamento paradigma. E, caso o orçamentista
avalie que o binômio obtido a partir do preço de referência do Sicro não
reflita a potencial economia de escala, as particularidades do local de
execução do objeto ou o nível de preço praticado pelo mercado local do
empreendimento, ele “deverá adotar o binômio mais vantajoso ao erário
proveniente da pesquisa local de preços, desde que apresente as justificativas
que subsidiam a tomada de decisão (§ 3º)”. O relator inferiu, a partir das
informações apresentadas, “o entendimento do Dnit no sentido de que o
normativo ora em exame (IN 10/2024), que dispõe sobre a utilização dos
parâmetros estabelecidos no Sicro, trata da primeira referência a ser utilizada
para definição do valor estimado, no processo licitatório, consoante art. 23, §
2º, inciso I, da Nova Lei de Licitações: composição de custos unitários menores
ou iguais à mediana do item correspondente do Sicro, para serviços e obras de
infraestrutura de transportes”, cabendo lembrar, nas palavras do relator, “que
referido dispositivo menciona, ainda, nos incisos II a IV, outros parâmetros a
serem seguidos, na seguinte ordem: utilização de dados de pesquisa publicada em
mídia especializada, de tabela de referência formalmente aprovada pelo Poder
Executivo federal e de sítios eletrônicos especializados ou de domínio amplo,
desde que contenham a data e a hora de acesso; contratações similares feitas
pela Administração Pública, em execução ou concluídas no período de um ano
anterior à data da pesquisa de preços, observado o índice de atualização de
preços correspondente; e pesquisa na base nacional de notas fiscais
eletrônicas, na forma de regulamento”. O relator arrematou então que,
apesar de não ter sido expressamente prevista a realização de cotação local no
caso de contratação de obras e serviços de engenharia, para ele, a princípio, “a
omissão, por si só, não deva obstar a prática de pesquisa local de preços,
desde que sua adoção seja devidamente justificada e a vantagem em relação ao
Sicro demonstrada, nos termos do art. 8º do Decreto 7.983/2013”.
Reconheceu, especialmente em situações como a examinada, envolvendo cotação de
insumos para execução de obra no interior do Estado do Acre, que, de fato, os
valores constantes da tabela do Sicro podem não refletir a potencial economia
de escala e as peculiaridades do local de execução do objeto, previstas no art.
23, caput, da Lei 14.133/2021, e que “a jurisprudência acerca da Nova
Lei de Licitações está incipiente e, com o tempo, essa e outras questões serão
aprofundadas e se consolidarão”. Nada obstante, considerando o achado
apontado na auditoria que originara a prefalada determinação, concluiu que o
Dnit alterou seus procedimentos a fim de realizar a comparação dos custos
obtidos a partir da pesquisa local de preços de insumos com os do Sicro
adicionados aos custos de transporte. Ademais, o normativo aprovado prevê a
realização da comparação entre o custo do binômio obtido a partir da pesquisa
local de preços de insumos e aquele constante do Sicro, bem como a apresentação
das justificativas que subsidiam a tomada de decisão, caso o orçamentista
entenda que o binômio considerando o preço de referência divulgado pelo Sicro
não observa a potencial economia de escala e as peculiaridades do local de
execução do objeto, ou mesmo o nível de preço praticado pelo mercado local. Por
conseguinte, diante da apresentação de plano de ação pelo Dnit e das
providências efetivadas, o relator propôs, e o Plenário decidiu, “considerar
cumprida a determinação do item 9.1 do Acórdão 2.178/2023-Plenário”.
Acórdão
136/2025 Plenário, Auditoria, Relator Ministro-Substituto Augusto
Sherman.