sábado, 3 de outubro de 2015

ERROS DE PLANILHA - ENTENDA O REGIME DE EMPREITADA





 


Número Interno do Documento:




Colegiado:


Plenário


Relator:


VALMIR CAMPELO


Processo:




Sumário:


ADMINISTRATIVO. ESTUDO SOBRE APLICAÇÃO DO REGIME DE EMPREITADA POR PREÇO GLOBAL NA CONTRATAÇÃO DE OBRAS PÚBLICAS. DETERMINAÇÃO À SEGECEX. CIÊNCIA DA DELIBERAÇÃO ADOTADA AO MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO ORÇAMENTO E GESTÃO. ARQUIVAMENTO


 


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3. Exemplo de posicionamento jurisprudencial controverso é o tratamento a ser dado aos termos aditivos nesse regime de execução. Existe um entendimento de que, em EPG, os aditivos resultantes de omissões do orçamento ou do projeto não seriam devidos, tendo em vista que a obra foi contratada por preço certo e global, cabendo à empreiteira encontrar as formas de concluir a obra a contento. O relatório que originou o Acórdão 2.163/2011 - TCU - Plenário é um exemplo deste entendimento:

...o edital de licitação apresenta disposição para que nenhum pagamento adicional seja efetuado em remuneração a serviços que sobrevierem durante a execução das obras, mas que sejam necessários para a perfeita execução dos projetos apresentados no certame (...). Em função disso, determina ainda que as licitantes executem minucioso estudo do local, dos projetos e das especificações antes da apresentação da sua proposta.

Nessa linha, o empreiteiro não teria direito a solicitar aditivos contratuais de quantidades nos casos de quantitativos subestimados por erros que pudessem ter sido detectados ainda durante o processo licitatório.

No aditivo em análise, aparentemente diversos itens decorrem da previsão inadequada de quantitativos, que poderiam ter sido verificados no projeto ou ainda em visita ao local da obra. Dessa maneira, cabe à Agsep, considerando a avaliação aqui descrita, identificar os serviços que podem ou não ser regularmente incluídos no termo aditivo a ser firmado. (Acórdão 2.163/2011 - TCU - Plenário - trecho do relatório; destaques acrescidos).


No aditivo em análise, aparentemente diversos itens decorrem da previsão inadequada de quantitativos, que poderiam ter sido verificados no projeto ou ainda em visita ao local da obra. Dessa maneira, cabe à Agsep, considerando a avaliação aqui descrita, identificar os serviços que podem ou não ser regularmente incluídos no termo aditivo a ser firmado. (Acórdão 2.163/2011 - TCU - Plenário - trecho do relatório; destaques acrescidos).

4. Destaque-se a crescente importância da EPG para as contratações de obras públicas, tendo em vista a recente edição da Lei 12.462/2011, que instituiu o Regime Diferenciado de Contratações Públicas - o RDC. O artigo 8º da Lei estatui expressamente que o regime de EPG deve ser preferencialmente adotado para a contratação de obras e serviços de engenharia:

Art. 8o Na execução indireta de obras e serviços de engenharia, são admitidos os seguintes regimes:

I - empreitada por preço unitário;

II - empreitada por preço global;

III - contratação por tarefa;

IV - empreitada integral; ou

V - contratação integrada.

§ 1º Nas licitações e contratações de obras e serviços de engenharia serão adotados, preferencialmente, os regimes discriminados nos incisos II, IV e V do caput deste artigo. (destaque acrescido).

5. Em 18 de julho de 2012, a Lei 12.688 estendeu a possibilidade de utilização do Regime Diferenciado às obras do PAC, ampliando a importância da compreensão do regime de empreitada por preço global.

6. Outro dispositivo legal que tem trazido importantes critérios aplicáveis ao regime de EPG é a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). A redação do art. 102, § 6o da última LDO (Lei 12.708/2012) vem sendo repetido há alguns anos, com a seguinte redação:

§ 6o No caso de adoção do regime de empreitada por preço global, previsto no art. 6º, inciso VIII, alínea "a", da Lei no 8.666, de 1993, devem ser observadas as seguintes disposições:

I - na formação do preço que constará das propostas dos licitantes, poderão ser utilizados custos unitários diferentes daqueles fixados no caput, desde que o preço global orçado e o de cada uma das etapas previstas no cronograma físico-financeiro do contrato, observado o § 7o, fique igual ou abaixo do valor calculado a partir do sistema de referência utilizado, assegurado ao controle interno e externo o acesso irrestrito a essas informações para fins de verificação da observância deste inciso;

II - o contrato deverá conter cronograma físico-financeiro com a especificação física completa das etapas necessárias à medição, ao monitoramento e ao controle das obras, não se aplicando, a partir da assinatura do contrato e para efeito de execução, medição, monitoramento, fiscalização e auditoria, os custos unitários da planilha de formação do preço;

III - mantidos os critérios estabelecidos no caput, deverá constar do edital e do contrato cláusula expressa de concordância do contratado com a adequação do projeto básico, sendo que as alterações contratuais sob alegação de falhas ou omissões em qualquer das peças, orçamentos, plantas, especificações, memoriais e estudos técnicos preliminares do projeto não poderão ultrapassar, no seu conjunto, 10% (dez por cento) do valor total do contrato, computando-se esse percentual para verificação do limite do § 1º do art. 65 da Lei no 8.666, de 1993;

IV - a formação do preço dos aditivos contratuais contará com orçamento específico detalhado em planilhas elaboradas pelo órgão ou entidade responsável pela licitação, mantendo-se, em qualquer aditivo contratual, a proporcionalidade da diferença entre o valor global estimado pela administração nos termos deste artigo e o valor global contratado, mantidos os limites do art. 65, § 1º, da Lei no 8.666, de 1993;

V - na situação prevista no inciso IV deste parágrafo, uma vez formalizada a alteração contratual, não se aplicam, para efeito de execução, medição, monitoramento, fiscalização e auditoria, os custos unitários da planilha de formação do preço do edital, assegurado ao controle interno e externo o acesso irrestrito a essas informações para fins de verificação da observância dos incisos I e IV deste parágrafo; e

VI - somente em condições especiais, devidamente justificadas em relatório técnico circunstanciado, elaborado por profissional habilitado e aprovado pelo órgão gestor dos recursos ou seu mandatário, poderão os custos das etapas do cronograma físico-financeiro exceder o limite fixado nos incisos I e IV deste parágrafo, sem prejuízo da avaliação dos órgãos de controle interno e externo.

7. Desse modo, este estudo tem a finalidade de consolidar os entendimentos relativos a esse regime de execução contratual, bem como orientar os auditores e as unidades técnicas do TCU a respeito. Ressalte-se que as orientações aqui apresentadas estão em consonância com as diretrizes de um grupo de trabalho formado por representantes das quatro Secretarias de Fiscalização de Obras, cujas conclusões foram aprovadas pelo Comitê de Coordenação e Fiscalização de Obras - CCO (reunião realizada em 16 de agosto de 2012).

II - CARACTERIZAÇÃO DA EMPREITADA POR PREÇO GLOBAL

8. Antes de iniciar a análise da empreitada por preço global, faz-se neste tópico uma breve introdução sobre o tema, apresentando a diferenciação entre a empreitada por preço global e a empreitada por preços unitários.

9. A Lei 8.666/1993 elenca os seguintes regimes de execução contratual: empreitada por preço global, empreitada por preço unitário, tarefa ou empreitada integral. Pela letra da lei, não fica claro como e quando utilizar cada um dos regimes de execução por empreitada definidos pelo legislador.

10. A escolha do regime de execução da obra não é decisão de livre arbítrio do gestor, visto que deve ser pautada pelo interesse público e estar sempre motivada, pois impactará as relações entre contratado e contratante, as medições do contrato firmado, seus aditivos, entre outros fatores relacionados à gestão do empreendimento contratado. Decorre desse entendimento a constatação de que não existe, em tese, um regime de execução melhor que outro, e sim um regime que, no caso concreto, melhor atende ao interesse público.

II.i Empreitada por preço global

11. De acordo com a Lei 8.666/1993, utiliza-se a empreitada por preço global quando se contrata a execução da obra ou serviço por preço certo e total. Esse regime é indicado quando os quantitativos dos serviços a serem executados puderem ser definidos com precisão. Por isso, pressupõe uma definição minuciosa de todos os componentes da obra, de modo que seus custos possam ser estimados com uma margem mínima de incerteza.

12. O artigo 47 da Lei 8.666/1993 exige que, nas contratações por preço global, a Administração disponibilize, junto com o edital, todos os elementos e informações necessários para que os licitantes possam elaborar suas propostas de preços com total e completo conhecimento do objeto licitado. Em outras palavras, deve haver projeto básico com alto grau de detalhamento, com o objetivo de minimizar os riscos a serem absorvidos pela contratada durante a execução contratual, o que resulta, por conseguinte, em menores preços ofertados pelos licitantes. A contratada poderá arcar com eventuais erros ou omissões na quantificação dos serviços, situação em que, em regra, não teria direito a aditivos contratuais de quantidades em caso de quantitativos subestimados por erro que pudesse ter sido detectado durante o processo licitatório.

13. Na empreitada por preço global, a remuneração da contratada é feita após a execução de cada etapa, previamente definida no cronograma físico-financeiro. As medições de campo das quantidades realizadas devem ser precisas apenas o suficiente para definir o percentual executado do projeto. Essa particularidade facilita a fiscalização da obra, já que esse critério de medição não envolve necessariamente o levantamento preciso dos quantitativos dos serviços executados.

14. Além disso, cabe ao fiscal assegurar a execução da obra em absoluta conformidade com o projeto e as especificações técnicas. Nesse sentido, não podem ser admitidos pagamentos por serviços executados em desconformidade com o estipulado, ensejando superfaturamento por serviços não executados ou por qualidade deficiente.

II.ii Empreitada por preço unitário

15. Segundo a Lei de Licitações e Contratos, a empreitada por preço unitário consiste na contratação da execução da obra ou do serviço por preço certo de unidades determinadas. É utilizada sempre que os quantitativos a serem executados não puderem ser definidos com grande precisão.

16. Portanto, em que pese não ser necessário um grau de detalhamento de projeto no mesmo nível das empreitadas por preço global, o conceito de projeto básico definido no art. 6º da Lei 8.666/1993 deve ser respeitado com rigor.

17. Entretanto, não se deve pressupor que a existência de maior imprecisão nos quantitativos dos serviços implique, por si só, deficiência do projeto básico. Convém ressaltar que, mesmo em projetos bem elaborados, há serviços cujos quantitativos estão intrinsecamente sujeitos a um maior nível de imprecisão, como é o caso de serviços de movimentação de terra em rodovias e barragens. Por isso, recomenda-se que essas tipologias de obras sejam contratadas no regime de empreitada por preço unitário.

18. A remuneração da contratada, nesse regime, é feita em função das unidades de serviço efetivamente executadas, com os preços previamente definidos na planilha orçamentária da obra. Assim, o acompanhamento do empreendimento torna-se mais difícil e detalhado, já que se faz necessária a fiscalização sistemática dos serviços executados. Nesse caso, o contratado se obriga a executar cada unidade de serviço previamente definido por um determinado preço acordado. O construtor contrata apenas o preço unitário de cada serviço, recebendo pelas quantidades efetivamente executadas.

19. Em decorrência da ausência do risco de variação de quantitativos para o construtor, um contrato celebrado no regime de preços unitários pode ter um preço final ligeiramente menor. Porém, isso não significa, necessariamente, que esse regime de execução seja o mais econômico para a Administração, devido aos maiores custos decorrentes da fiscalização do contrato.

20. A precisão da medição dos quantitativos é muito mais crítica no regime de empreitada por preço unitário do que em contratos a preços globais, visto que as quantidades medidas no campo devem ser exatas, pois corresponderão, de fato, às quantidades a serem pagas. Portanto, as equipes de medição do proprietário devem ser mais cuidadosas e precisas em seus trabalhos, porque as quantidades medidas definirão o valor real do projeto.

21. O valor final do contrato sob o regime de empreitada por preço unitário pode oscilar para mais ou para menos, em relação ao originalmente contratado, em função da precisão das estimativas de quantitativos dos serviços.

22. Entende-se que na empreitada por preço unitário, pequenas variações de quantitativos de alguns serviços, para mais ou para menos, não demandam a formalização de um aditivo, desde que o valor final executado fique inferior ao valor contratado originalmente. Em que pese haver alguns precedentes do Tribunal contrários a tal entendimento, por exemplo, os Acórdãos Plenários 282/2008 e 1655/2010, considera-se que o pagamento dos serviços com pequenas discrepâncias em relação aos quantitativos originalmente estimados não infringe o art. 60 da Lei 8.666/93 e não pode ser caracterizado como contrato verbal. Afinal, há um contrato previamente formalizando o ajuste e, na empreitada por preço unitário, os quantitativos presentes na planilha orçamentária poderão variar para mais ou para menos, pois apenas os preços unitários foram ajustados entre as partes.

23. Os quadros a seguir, extraídos e adaptados do Roteiro de Auditoria de Obras Públicas do TCU, aprovado pela Portaria SEGECEX n. 38, de 08/11/2011, demonstram resumidamente, as vantagens, desvantagens e indicação de utilização do regime de empreitada por preço global e de empreitada por preço unitário:

EMPREITADA POR PREÇO UNITÁRIO

VANTAGENS DESVANTAGENS INDICADA PARA:

- Pagamento apenas pelos serviços efetivamente executados;

- Apresenta menor risco para o construtor, na medida em que ele não assume risco quanto aos quantitativos de serviços (riscos geológicos do construtor são minimizados); e

- A obra pode ser licitada com um projeto com grau de detalhamento inferior ao exigido para uma empreitada por preço global ou integral. - Exige rigor nas medições dos serviços;

- Maior custo da Administração para acompanhamento da obra;

- Favorece o jogo de planilha;

- Necessidade frequente de aditivos, para inclusão de novos serviços ou alteração dos quantitativos dos serviços contratuais;

- O preço final do contrato é incerto, pois é baseado em estimativa de quantitativos que podem variar durante a execução da obra;

- Exige que as partes renegociem preços unitários quando ocorrem alterações relevantes dos quantitativos contratados; e

- Não incentiva o cumprimento de prazos, pois o contratado recebe por tudo o que fez, mesmo atrasado. - Contratação de serviços de gerenciamento e supervisão de obras;

- Obras executadas "abaixo da terra" ou que apresentam incertezas intrínsecas nas estimativas de quantitativos, a exemplo de:

- Execução de fundações, serviços de terraplanagem, desmontes de rocha, etc.;

- Implantação, pavimentação, duplicação e restauração de rodovias;

- Canais, barragens, adutoras, perímetros de irrigação, obras de saneamento;

- Infraestrutura urbana;

- Obras portuárias, dragagem e derrocamento;

- Reforma de edificações;

- Poço artesiano.



EMPREITADA POR PREÇO GLOBAL

VANTAGENS DESVANTAGENS INDICADA PARA:

- Simplicidade nas medições (medições por etapa concluída);

- Menor custo para a Administração Pública na fiscalização da obra;

- Valor final do contrato é, em princípio, fixo;

- Restringe os pleitos do construtor e a assinatura de aditivos;

- Dificulta o jogo de planilha; e

- Incentiva o cumprimento de prazo, pois o contratado só recebe quando conclui uma etapa. - Como o construtor assume os riscos associados aos quantitativos de serviços, o valor global da proposta tende a ser superior se comparado com o regime de preços unitários;

- Tendência de haver maior percentual de riscos e imprevistos no BDI do construtor; e

- A licitação e contratação exige projeto básico com elevado grau de detalhamento dos serviços (art. 47 da Lei 8.666/1993). - Contratação de estudos e projetos;

- Elaboração de pareceres e laudos técnicos;

- Obras e serviços executados "acima da terra" que apresentam boa precisão na estimativa de quantitativos, a exemplo de:

- Construção de edificações; e

- Linhas de Transmissão.



III - DA OPÇÃO PELO REGIME DE EPG

24. Como visto, o regime de EPG ganhou enorme importância no âmbito das contratações de obras públicas, notadamente após o surgimento do RDC e sua extensão às obras do PAC, tornando nítida a preferência que a Lei deu ao regime de EPG em detrimento do regime de empreitada por preço unitário (EPU). Na verdade, a lei instituidora do RDC exige que, ao optar pelo regime de EPU, o gestor justifique a inviabilidade da utilização dos demais regimes (Lei, 12.462, art. 8º, § 2º). Portanto, a lei dá ao gestor o poder-dever de verificar se, em cada caso, é pertinente a adoção do regime de empreitada por preço global.

25. No regime de empreitada por preço global contrata-se a execução da obra ou do serviço por preço certo e total (Lei 8.666/93, art. 6º, VIII, "a"). Nessa linha, mostra-se interessante para obras cujo objeto, por sua natureza, possa ser projetado com margem mínima de incerteza acerca das variáveis intervenientes, de modo que o custo global, e o das etapas que o constituem, estejam estimados, também, com uma maior precisão. Em outras palavras:

(...) o regime de execução de empreitada por preço global é recomendado para obras de construções novas em que o projeto básico contemple todos os elementos e serviços a serem contratados, em nível de informação suficiente para que os licitantes possam elaborar suas propostas de preços com total e completo conhecimento do objeto da licitação e contenham sólido estudo de viabilidade técnica e legal, justificando e consolidando todas as etapas do objeto. [ CROCE, J., MELLO, S. & AZEVEDO, W., Decisão por Empreitada Global ou Unitária em Obras Públicas de Reformas de Edificações - Monografia apresentada ao departamento de engenharia civil da PUC-RJ, 2008]

26. Nesse contexto, convém mencionar o caput do art. 5º do PLS 56/2011, de autoria do Senador Pedro Taques, que tramita no Senado Federal e trata de normas relacionadas à responsabilização na contratação de obras públicas. O referido projeto de lei traz importantes contribuições sobre as condições para utilização da empreitada por preço global:

Art. 5º A empreitada por preço global, prevista no art. 6o, inciso VIII, alínea "a", da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, deve ser utilizada quando se contrata a execução da obra ou serviço por preço certo e total, exigindo que os quantitativos dos serviços a serem executados possam ser definidos com precisão, pressupondo-se uma definição minuciosa de todos os componentes da obra. (destaques acrescidos).

27. PINI & CARVALHO também defendem a necessidade de maior definição da obra como requisito para a contratação em regimes de empreitada por preço global:

Assim, o regime de preço global (mais favorável ao contratante) deveria ser adotado, em situações de elevado grau de definição da obra.

(...)

Há que se considerar também a incompatibilidade de regimes de contratação com os graus de definição do que se quer executar. Executar uma obra por regime de preço global, com muitas indefinições, implicará conflito entre as partes. O preço estará subdimensionado, sob a óptica do construtor, para suportar os diversos serviços presumíveis, os quais o contratante supostamente julgaria estarem considerados no preço ofertado. Sob a óptica do contratante, o preço terá uma onerosidade excessiva porque o construtor tende a abranger, no preço ofertado, valores para cobrir presumibilidades que possam ocorrer ao longo do processo de execução da obra. [CARVALHO, Luiz F. e PINI, Mario S., Como remunerar fatos presumíveis?Artigo obtido em: http://www.infraestruturaurbana.com.br/solucoes-tecnicas/14/artigo256272-2.asp em 10/10/2012.]

28. Conforme LIMMER [LIMMER, Carl Vicente - Planejamento, Orçamentação e Controle de Projetos e Obras, 1997, Editora LTC, p. 158], na contratação por preço global (contrato de preço fixo, com valor imutável em moeda constante), pressupõe-se uma definição minuciosa de todos os componentes da obra, de modo que seus custos possam ser estimados com uma margem mínima de incerteza.

29. Em resumo, pode-se afirmar que a conveniência de se adotar o regime de empreitada por preço global diminui à medida que se eleva o nível de incerteza sobre o objeto a ser contratado.

30. Nas obras civis, uma das principais fontes de incertezas reside nas características geotécnicas do solo no qual será implantado o empreendimento. Tal incerteza aumenta consideravelmente em função da extensão de área do empreendimento. Assim, por exemplo, as incertezas relativas às características geotécnicas de um sítio que será alagado por uma barragem, ou de uma estrada que será implantada em uma extensão de 100 km, são evidentemente maiores do que as incertezas que cercam a execução de uma edificação que será erguida em um terreno confinado de dimensões 100 m x 100 m, cuja prospecção do subsolo pode ser realizada com nível de precisão até mesmo maior do que o recomendado em norma técnica, se disso resultar em precisão maior do projeto.

31. Em outro entendimento, o Tribunal tem considerado, por exemplo, que a utilização de empreitada por preço global em obras de restauração e manutenção rodoviárias é inadequada, conforme se deduz do Acórdão 3.260/2011:

9.2. dar ciência ao Dnit de que:

9.2.1. embora o regime de empreitada por preços globais tenha previsão explícita da Lei de Licitações e, em razão disso, não se possa considerá-lo propriamente ilegal, as obras de restauração e manutenção rodoviária, por suas características, e considerando o histórico de desalinhamento dos projetos ao art. 47 da Lei 8.666/93, não são indicadas para esse regime de contratação;(Acórdão 3.260/2011 - TCU - Plenário)

32. Em suma, conclui-se que, a princípio, não é recomendável que todas as obras sejam licitadas pelo regime de empreitada por preço global. Caberá ao gestor diligente avaliar a situação concreta e, se for o caso, especialmente quando houver incertezas consideráveis em relação ao objeto, justificar a não aplicabilidade do regime de EPG àquela obra.


IV - DA PRECISÃO DO PROJETO BÁSICO

33. Como dito anteriormente, o regime de execução de empreitada por preço global, mostra-se interessante para obras em que o objeto, por sua natureza, pode ser quantificado com alto grau de precisão, de modo que o custo global e o custo das etapas que compõem a obra sejam estimados com uma margem mínima de incerteza.

34. Da afirmação anterior, decorre a necessidade da existência de um projeto básico com alto grau de detalhamento, com o objetivo de minimizar os riscos e os preços ofertados pelos licitantes, que arcam com eventuais erros ou omissões na quantificação de cada serviço. A própria Lei 8.666/93, no art. 47, enfatiza essa necessidade:

Art. 47. Nas licitações para a execução de obras e serviços, quando for adotada a modalidade de execução de empreitada por preço global, a Administração deverá fornecer obrigatoriamente, junto com o edital, todos os elementos e informações necessários para que os licitantes possam elaborar suas propostas de preços com total e completo conhecimento do objeto da licitação.

35. A existência de projeto básico completo é uma exigência para qualquer contratação de obras públicas. Caso o regime de contratação seja o de EPG, a completude e a precisão do Projeto Básico ganham importância ainda maior. Essa característica é apontada como uma desvantagem na utilização da EPG.

36. No regime de EPG, o projeto básico deve conter informações para permitir que as medições sejam feitas de modo adequado, assim entendido como sendo feitas por etapas. Desse modo, é imprescindível, na contratação por EPG, uma definição clara e inequívoca das etapas físicas que constituem o todo. Tais elementos é que permitirão o estabelecimento de marcos para cada uma dessas etapas, ao término das quais caberão os pagamentos. Essas medidas facilitarão o monitoramento e o controle das obras por parte de quem as fiscalizará.

37. A importância de um projeto básico é tamanha, que a sua qualidade pode influenciar diretamente o custo final da obra. Imagine-se, por exemplo, que numa concorrência em EPG os licitantes deparem com um projeto básico flagrantemente incompleto e/ou impreciso. É certo que se trata de uma situação em que a probabilidade de ocorrerem imprevistos é elevada, de modo que os concorrentes poderão incluir algumas contingências nos preços ofertados. Desse modo, há uma tendência de que o preço da empreitada, nesse caso, tenha um valor maior do que teria se fosse adotado o regime de empreitada por preço unitário. Nesse sentido, vale observar a argumentação de Marçal Justen Filho:

Pretende-se que a empreitada global imporia ao particular o dever de realizar o objeto, de modo integral, arcando com todas as variações possíveis. Vale dizer, seriam atribuídos ao contratado os riscos por eventuais eventos supervenientes, que pudessem elevar os custos ou importar ônus imprevistos inicialmente. Essa concepção é equivocada. (...) Se a Administração não definir precisamente o objeto que será executado, cada licitante adotará interpretação própria (...) as propostas não serão compatíveis entre si. (...) Poderia imaginar-se que todos os licitantes incluiriam em suas propostas verbas destinadas a fazer face a essas eventualidades (...) as propostas teriam valor mais elevado.(...) Outra alternativa é que todos ou alguns dos licitantes resolvessem correr o risco e formulassem proposta não comportando imprevistos. Se esses viessem a ocorrer, a execução do objeto se tornaria inviável (...). [FILHO, Marçal J., Comentários à lei de licitações e contratos administrativos,11 ed. São Paulo, Dialética, 2005]

38. CAMPELO & CAVALCANTE (2012) também entendem que em regimes de empreitada por preço global "está implícita a necessidade de um projeto básico preciso e bem fundamentado, sob pena de sub ou sobreavaliar os encargos realmente necessários para a finalização da obra". [CAMPELO, Valmir e CAVALCANTE, Rafael J., Obras públicas - comentários à jurisprudência do TCU, Belo Horizonte, editora Fórum, 2012]

39. Por fim, destaque-se a forma pela qual o critério de escolha regime de EPG é descrito por CROCE, MELLO & AZEVEDO:

Conforme inicialmente suposto, a escolha do Regime de Execução Contratual, deve ser pautada nos seguintes aspectos: o tipo do objeto a ser executado, o nível de precisão do Projeto Básico e seus respectivos estudos técnicos preliminares, a análise do adequado regime de medições e pagamentos, a qualidade dos serviços a serem executados e a eficiência da fiscalização a ser alcançada. [CROCE, J., MELLO, S. & AZEVEDO, W., Op. Cit ]

40. Ante todas essas considerações doutrinárias, é de relevo notar que o entendimento jurisprudencial do TCU não trata a deficiência do projeto básico como irregularidade meramente formal, principalmente em obras executadas por preço global, em que eventuais divergências de quantitativos dos serviços previstos invariavelmente causarão prejuízos a uma das partes contratantes. E se a Administração Pública deixa de estabelecer, de maneira adequada, o conjunto de elementos suficientes para caracterizar o que pretende contratar, não há torneio possível, pois, em verdade, serão oferecidas propostas para alguma coisa que não se sabe ao certo o que efetivamente é: trata-se de um pressuposto lógico do certame.

41. Nesse caso, as consequências são absolutamente nefastas, pois essa imprecisão possibilita o oferecimento de propostas com valores que podem ser ínfimos, inexequíveis de plano, ou então propostas com valores muito acima daqueles que efetivamente se poderiam conseguir, caso estivesse bem delineado o objeto da contratação a ser entabulada.

42. Não custa salientar que quanto maior a precisão e a quantidade de informações disponíveis para a composição do preço global de uma obra, maiores são as probabilidades de o procedimento licitatório resultar na escolha da proposta mais vantajosa para a Administração. Além disso, e principalmente, maiores são as chances de uma boa execução contratual, tendo em vista que o licitante tem a completa noção do que será executado.

43. Por reiteradas vezes, o TCU tem determinado a anulação de certames licitatórios maculados por deficiências de projeto básico. Por exemplo, no recente Acórdão 2.819/2012 - Plenário, o TCU entendeu que a existência de deficiências graves no Projeto Básico impossibilita a adequada descrição dos serviços que serão implementados na obra, comprometendo o certame a ser realizado, tendo em vista que tal procedimento afasta da licitação empresas que optam por não correr o risco de apresentar um orçamento elaborado sem a necessária precisão, havendo, portanto, prejuízo à competitividade do certame e à contratação da proposta mais vantajosa pela Administração Pública, o que enseja a nulidade da concorrência efetivada.

44. É oportuno também reproduzir outros entendimentos do Tribunal sobre o assunto:

4. As licitações para execução de obras somente podem ser iniciadas quando se dispuser de projeto básico ou executivo devidamente atualizado e em perfeitas condições de ser executado, estando vedada a aprovação de relatórios de revisão do projeto que o ignore ou o desvirtue total ou parcialmente, ressalvada alterações pontuais sem grandes repercussões financeiras, devendo a eventual inépcia do projeto, constatada após a licitação, acarretar a anulação da licitação e do contrato decorrente, bem como a punição, em processo administrativo regular, de todos os agentes responsáveis pela incorreção do projeto. (Sumário do Acórdão 1874/2007 - Plenário).

5. Até que ocorra o equacionamento dessa grave falha administrativa, restará à Corte de Contas, sempre que confrontada com a prática por tudo perniciosa da revisão contratual indiscriminada, perquirir minudentemente de suas verdadeiras intenções e aplicar as cominações previstas em lei a todos os responsáveis pelas alterações indevidas, inclusive, se for o caso, os autores de projetos ineptos. Além disso, é bom lembrar que, nos exatos termos do art. 7º, § 6º, da Lei 8.666/1993, são nulos de pleno direito os atos e contratos derivados de licitações baseadas em projeto incompleto, defeituoso ou obsoleto, devendo tal fato ensejar não a alteração do contrato visando à correção das imperfeições, mas sua anulação para realização de nova licitação, bem como a responsabilização do gestor faltoso. (Voto condutor do Acórdão 353/2007 - Plenário).

V - DAS MEDIÇÕES EM EPG

45. Desde que seja atendida a premissa da confecção projeto básico bem detalhado, fator importante para que determinado contrato possa ser adequadamente licitado nesse regime, as medições devem ser realizadas por etapas ou parcelas, de acordo com o estabelecido no cronograma físico-financeiro a respeito da evolução física da obra.

46. Assim, as medições devem ser realizadas a partir da conclusão do avanço físico de cada etapa (definida prévia e objetivamente no edital) e somente após a conclusão daquele marco físico que a caracteriza, conforme explicitado a seguir, pelo inciso II, do § 6º, do art. 102 da LDO 2013:

II - o contrato deverá conter cronograma físico-financeiro com a especificação física completa das etapas necessárias à medição, ao monitoramento e ao controle das obras, não se aplicando, a partir da assinatura do contrato e para efeito de execução, medição, monitoramento, fiscalização e auditoria, os custos unitários da planilha de formação do preço;

47. O parágrafo único do art. 5º do já mencionado PLS 56/2011 reforça esse entendimento:

Parágrafo único. No caso de adoção do regime de empreitada por preço global aplicam-se as seguintes disposições específicas:

I - o contrato deverá conter cronograma físico-financeiro que descreva em termos da execução da respectiva obra ou serviço todas as etapas, subetapas, parcelas, trechos ou subtrechos necessários à medição, ao monitoramento e ao controle das obras;

(...)

III - as medições deverão ser feitas por etapas, subetapas, parcelas, trechos ou subtrechos, previamente definidos no cronograma físico-financeiro;

48. Da mesma forma, CROCE, MELLO & AZEVEDO explicam como deve ser feita a medição nesse tipo de contrato.

Podemos exemplificar que, caso seja adotado o regime de execução global, as medições serão realizadas pela simples conferência das etapas/percentuais constantes do cronograma elaborado quando da elaboração do projeto básico, sem qualquer levantamento dos serviços efetivamente realizados. [CROCE, J., MELLO, S. & AZEVEDO, W., Op. Cit ]

49. Pelo fato de a medição do serviço executado ser feita por etapa e não por quantitativos de serviços, exige-se um menor esforço de fiscalização por parte do órgão contratante, se comparada com a empreitada por preço unitário, diminuindo os custos de fiscalização da obra. De acordo com CAMPELO & CAVALCANTE:

Nas empreitadas por preço global, (...), medem-se as etapas de serviço, de acordo com o cronograma físico-financeiro da obra ou mediante o estabelecido no instrumento convocatório. Em exemplo prático, terminadas as fundações, paga-se o valor global das fundações; feita a estrutura, remunera-se o valor respectivo previsto para essa etapa da obra; concluída determinada fase da obra, com marco previamente estipulado, paga-se o montante correspondente; até chegar ao final da empreitada, que deverá corresponder a valor total ofertado para o objeto como um todo, no ato da licitação.

Trata-se, portanto, de um esforço fiscalizatório muito menor, no que se refere a verificação em pormenores quantitativos de cada serviço. Não se fazem necessárias avaliações individualizadas de quantidades. Logicamente que em tal procedimento está implícita a necessidade de um projeto básico preciso e bem fundamentado, sob pena de sub ou sobreavaliar os encargos realmente necessários para a finalização da obra. [CAMPELO, Valmir e CAVALCANTE, Rafael J., Op. Cit ]

50. SARIAN (2012) também menciona essa característica da gestão de um contrato em regime de empreitada por preço global:

Claro se faz que o regime de preço global é aquele que, se materializado com base em projeto básico bem elaborado, representa maior facilidade de gerenciamento pela administração, visto possibilitar o pleno conhecimento do valor final do empreendimento e o pagamento por etapa da obra concluída (...). [ALTOUNIAN, Cláudio S., Obras Públicas - licitação, contratação, fiscalização e utilização, 3 ed, Belo Horizonte, Fórum, 2012]

51. Desse modo, supondo que a medição efetivamente ocorra por etapas ou parcelas, os responsáveis pela elaboração ou aprovação do projeto básico devem ser responsabilizados nos casos de superestimativas dos quantitativos contratados, assim como o gestor que optou pelo regime por preço global sem garantir a existência de um projeto básico preciso e adequado.

52. O fiscal do contrato, por não ter obrigação de identificar os quantitativos efetivamente executados, não deve ser responsabilizado nos casos de projetos superdimensionados, a não ser quando se tratar de distorções relevantes que puderem ser verificadas de plano, durante o acompanhamento da execução da obra. Em suma, prevalece o entendimento constante do Acórdão 1.874/2007 - TCU - Plenário:

Falece de fundamentação legal e respaldo técnico a elaboração de planilhas orçamentárias de obras públicas com injustificada superestimativa dos quantitativos dos serviços previstos. Não se pode deixar à fiscalização do contrato a tarefa de reter os quantitativos excedentes uma vez que ela própria deve estar sujeita aos controles internos ditados naturalmente pelo projeto da obra, que se constitui no referencial físico e financeiro do empreendimento. (Acórdão 1.874/2007 - TCU - Plenário - sumário).

53. Entretanto, apesar do entendimento do Acórdão 1.874/2007 - TCU - Plenário e do suposto menor esforço de fiscalização em EPG, deve-se atentar para as outras funções da fiscalização, extremamente importantes para a boa gestão dos recursos públicos, como, por exemplo, a verificação da aderência entre o que foi executado na obra e os projetos, a qualidade dos serviços executados, a aplicação de penalidades, o cumprimento dos prazos etc.

54. Nesse aspecto, o fiscal do contrato também pode ser responsabilizado por pagamentos indevidos quando a execução da obra ocorre em desconformidade com o projeto, como no exemplo de uma edificação cuja especificação dos serviços previa a execução das fôrmas da estrutura com chapa de madeirit plastificada, mas as fôrmas que foram efetivamente executadas utilizaram chapas de madeirit resinadas. Em tal situação, a fiscalização contratual teria o dever de observar a não-conformidade da obra executada com o seu projeto ou especificação.

VI - DA ADMISSIBILIDADE DE ADITIVOS EM EPG

55. Como regra geral, mas sempre de modo justificado, admite-se aditivo em contratos regidos por qualquer regime de execução contratual, haja vista que a Lei 8.666/93 não fez nenhuma distinção ou ressalva sobre o assunto:

Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos:

I - unilateralmente pela Administração:

a) quando houver modificação do projeto ou das especificações, para melhor adequação técnica aos seus objetivos;

b) quando necessária a modificação do valor contratual em decorrência de acréscimo ou diminuição quantitativa de seu objeto, nos limites permitidos por esta Lei;

II - por acordo das partes:

(...)

d) para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual.

56. Também, não se deve perder de vista a harmonização entre o art. 65 e o art. 58 do Estatuto das Licitações:

Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de:

I - modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às finalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado;

§ 1º As cláusulas econômico-financeiras e monetárias dos contratos administrativos não poderão ser alteradas sem prévia concordância do contratado.

§ 2º Na hipótese do inciso I deste artigo, as cláusulas econômico-financeiras do contrato deverão ser revistas para que se mantenha o equilíbrio contratual.

57. O fundamento norteador dos mencionados dispositivos legais é o inciso XXI, do art. 37 da Constituição Federal que, entre outros comandos, preconiza que devem ser mantidas as condições efetivas da proposta, em atendimento ao princípio da vedação ao enriquecimento sem causa, tanto do particular quanto da Administração.

58. Desse modo, parece não haver dúvidas de que nos casos em que a Administração demanda as alterações, ou acontecem "fatos imprevisíveis", o aditivo é devido, em respeito ao multicitado "equilíbrio contratual". As maiores celeumas doutrinárias ocorrem, na verdade, quando o contratado solicita o aditivo com o argumento de que houve erro de projeto, de orçamento ou de quantitativos quando da licitação. Exemplo dessa controvérsia é tratado no livro de CAMPELO & CAVALCANTE:

Questão polêmica - e de posicionamento jurisprudencial conflitante no TCU - é o tratamento a ser dado aos termos aditivos contratuais em um ou outro regime de execução contratual. Existe um entendimento - do qual discordamos - que nas empreitadas globais os aditivos provenientes de omissões do orçamento (ou mesmo do projeto) não seriam devidos. Igualmente, por ter se contratado uma obra por preço certo e global, os meios para se atingir aquele objetivo ficariam a cargo da empreiteira, não devendo a Administração imiscuir-se nesses assuntos, no que se refere ao quantum remuneratório devido. [CAMPELO, Valmir & CAVALCANTE, Rafael J., Op. Cit ]

59. Posicionamento diferente é apresentado por SARIAN:

Na empreitada global, a licitante vencedora se compromete a realizar o serviço por preço certo e total, ou seja, assume o risco de eventuais distorções de quantitativos a serem executados a maior do que os previstos no contrato. Por outro lado, a Administração também assume o risco em pagar serviços cujas quantidades foram avaliadas em valor superior no momento da licitação. O que importa é o preço ajustado. [ALTOUNIAN, Cláudio S., Op. Cit]

60. Do exposto acima pode se concluir, sinteticamente, que as situações em que se discute a possibilidade de celebração de aditivos em EPG dividem-se em dois grupos:

a) alterações de projeto propostas pela administração, fatos imprevisíveis e demais situações previstas na alínea "d" do inciso II do art. 65 da lei de Licitações;

b) alterações contratuais decorrentes de erros de orçamentação, projetos ou quantitativos.

61. A situação descrita no item "a" acima não merece maiores comentários, decorrendo de interpretação literal e direta do art. 65 da Lei 8.666/93. Embora o tema possa despertar algumas discussões doutrinárias, é pacífico no âmbito do tribunal o entendimento de que são situações em que é obrigatória a celebração de termo aditivo ao contrato de obra pública. Sempre que o escopo contratual for alterado será exigida sua formalização mediante termo aditivo, respeitados os limites legais. É o caso, por exemplo, de uma edificação licitada a partir de um projeto básico prevendo sua implantação em dez pavimentos. Se em virtude de necessidade superveniente da administração contratante houver a alteração do projeto, incluindo-se, por exemplo, a execução de uma nova guarita, obviamente será exigido ajuste no valor contratual adequando-o ao novo projeto, independentemente do regime de execução contratual utilizado.

62. Já a hipótese mencionada no item "b" supracitado, principal motivo que ensejou a realização do presente estudo, como visto, é muito controversa. Há situações em que os erros de orçamentos, projetos e quantitativos são de pequena monta, enquanto há outras em que as diferenças de quantitativos são relevantes para o contrato. Assim, é necessária uma abordagem mais pormenorizada, como se verá a seguir.

VII - ALTERAÇÕES CONTRATUAIS REFERENTES A ERROS E OMISSÕES NO ORÇAMENTO.

63. Preliminarmente, cumpre destacar que em caso de pequenas alterações quantitativas em cada item ou serviço, em que o contratado solicite o aditivo, não há cabimento em concedê-lo. Ora, se a medição da obra é feita por etapas, o fiscal do contrato não é capaz de verificar pequenas variações, para mais ou para menos, em itens ou serviços isolados. Caso ele opte por medir o serviço, para avaliar a pertinência do pleito, será obrigado a medir todos os serviços da mesma forma, para verificar aqueles em que o contratado está ganhando. Isso descaracterizaria completamente o regime de empreitada por preço global, tornando-o idêntico à empreitada por preço unitário, com a onerosa a atividade de medição dos quantitativos de cada serviço.

64. Atribuir as mesmas características da empreitada por preços unitários à empreitada por preço global mostra-se algo absolutamente despropositado sob qualquer forma de interpretação estabelecida pela hermenêutica jurídica. Afinal, se fossem o mesmo instituto, o legislador não teria tido o cuidado de defini-los separadamente e de estabelecer algumas regras especiais aplicáveis ao caso da empreitada por preço global, por exemplo, a prevista no art. 47 da Lei 8.666/93.

65. Também é relevante observar que, sob um prisma do direito comparado, os regimes de preço global e preço unitário são previstos nas legislações de diversos países, sempre com nítidas diferenças entre ambos. Não procede, portanto, a interpretação doutrinária de pagar os quantitativos efetivamente executados na empreitada por preço global, pois essa é a característica da empreitada por preços unitários.

66. Ante o exposto, no caso de pequenas variações de quantitativos, parece-nos mais adequado o entendimento de SARIAN. Ou seja, paga-se exatamente o preço ajustado, nem mais nem menos.

67. Portanto, trataremos a seguir de alterações contratuais referentes a erros e omissões relevantes para o orçamento global da obra, pois, nesses casos, outras considerações se fazem necessárias, pois os riscos que envolvem os contratos administrativos são divididos, doutrinariamente, em álea ordinária e álea extraordinária. Esta, por sua vez, divide-se em álea administrativa e álea econômica.

68. A álea ordinária corresponde aos riscos normais de qualquer empreendimento e que devem ser suportados pelo contratado, como é o caso das pequenas variações de quantitativos, não. ensejando qualquer cobertura por parte do contratante, nos casos em que o contrato é celebrado no regime de preço global. A jurisprudência é pacífica ao atribuir o ônus das áleas ordinárias ao contratado [Por exemplo, o Acórdão nº 2005/0066286-7 de Superior Tribunal de Justiça, 2ª Turma, 17 de Abril de 2008 RECURSO ESPECIAL Nº 744.446 - DF (2005/0066286-7)RELATOR:MINISTRO HUMBERTO MARTINS]. Caso se permitisse a revisão pretendida, estar-se-ia beneficiando a contratada em detrimento dos demais licitantes que, agindo com cautela, apresentaram propostas coerentes com os ditames do mercado e, talvez por terem quantificado criteriosamente todos os serviços previstos no projeto, considerando-os em suas propostas, não apresentaram valor mais atraente.

69. A álea administrativa corresponde aos atos da administração, não como parte da relação contratual, mas sim como ente no exercício de seu poder extroverso (nos dizeres de Marçal Justen Filho), de imperium. A tais situações se aplica a teoria do fato da administração, o que acarreta integral indenização pelo contratante, uma vez que, por ato da Administração, houve desequilíbrio na equação econômico-financeira gerando indevido ônus ao contratado, o qual não deve ser por ele suportado.

70. A álea econômica corresponde a fatos globalmente considerados, conjunturais, naturais, cuja etiologia acaba por ser desconhecida, tais como as crises econômicas, desastres naturais e oscilações de câmbio. A tais situações se aplica a teoria da imprevisão, ensejando a partilha entre o contratante e o contratado dos prejuízos decorrentes de tais fatos. São situações às quais os contraentes não hajam dado causa e que provocam profundo desequilíbrio da equação econômico-financeira, acabando por tornar extremamente onerosa a execução do contrato para uma das partes.

71. Dessa forma, as grandes variações dos quantitativos, decorrentes de erros ou omissões nos orçamentos que não pudessem ser detectados pelas licitantes, podem ser considerados como álea extraordinária, enquadrando-se na teoria da imprevisão.

72. Ante o exposto, para melhor entendimento da matéria, o desenvolvimento do tema será dividido em dois tópicos: orçamentos-base com quantitativos subestimados e orçamentos-base com quantitativos superestimados.

VII.i - Orçamentos com quantitativos subestimados.

73. Diante de quantitativos relevantes subestimados no orçamento base da licitação, ou omissões perceptíveis (entendidas como itens que estariam incluídos no serviço contratado por uma exigência lógica do próprio serviço ou pela inclusão em qualquer outro item do projeto básico: projetos, especificações, memoriais, etc.), há uma corrente doutrinária que sustenta a inadmissibilidade da celebração de aditivos. CROCE, MELLO & AZEVEDO, do TCE-RJ, compartilham do mesmo raciocínio:

Ou seja, a empresa contratada receberá o valor certo e total para execução de toda a obra. Será responsável pelos quantitativos e o valor total só será alterado se houver modificações de projetos ou das condições pré-estabelecidas para execução da obra, sendo as medições feitas por etapas dos serviços concluídos.

Na contratação pelo regime de empreitada por preço global, como o pagamento é por etapa, conhecida e cotada pelo contratado, a princípio, não é admitido, salvo modificação do escopo, aumento do valor contratado para a etapa, inibindo a prática lesiva, por parte do Contratado de aumentar as quantidades dos serviços da etapa para benefício próprio, prejudicando o orçamento total da obra ou serviço. [CROCE, J., MELLO, S. & AZEVEDO, W., Op. Cit ]

74. Sobre caso de omissão perceptível, em que o item estava no projeto, mas foi omitido do caderno de especificações, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal se pronunciou da seguinte forma sobre um caso concreto:

Não se justifica a cobrança por serviços extraordinários, se a obra foi contratada por preço global, máxime se o item questionado achava-se claramente previsto no edital e nas plantas, apesar de omitido no caderno de especificações. Dúvida que o empreiteiro poderia ter dirimido antes de se habilitar para a licitação. [TJDF. APC nº 3696195-DF. Registro do Acórdão nº 83421. DJ 17.abr.1996.p.5.588]

75. Pelo exposto, pode se concluir que a admissibilidade da celebração de aditivos em obras contratadas pelo regime de preço global, sob o argumento de quantitativos subestimados ou omissões é situação excepcionalíssima, aplicável apenas quando não fosse possível ao licitante identificar a discrepância no quantitativo do serviço com os elementos existentes no projeto básico. Essa tendência encontra-se positivada pela LDO 2013 (art.102, § 6º, inc. III):

III - mantidos os critérios estabelecidos no caput, deverá constar do edital e do contrato cláusula expressa de concordância do contratado com a adequação do projeto básico, sendo que as alterações contratuais sob alegação de falhas ou omissões em qualquer das peças, orçamentos, plantas, especificações, memoriais e estudos técnicos preliminares do projeto não poderão ultrapassar, no seu conjunto, 10% (dez por cento) do valor total do contrato, computando-se esse percentual para verificação do limite do § 1º do art. 65 da Lei no 8.666, de 1993;

76. Ainda assim, o caso concreto pode revelar situações em que fique demonstrada a razoabilidade da pretensão do contratado ao solicitar o aditivo. Nesse caso, seria cabível o aditivo desde que respeitadas as seguintes regras:

a) A alteração do contrato manterá a proporcionalidade da diferença entre o valor global estimado pela administração e o valor global contratado.

77. Esse é o conceito de manutenção do desconto original determinado pelo art. 102, § 6º, IV da LDO 2013. Nesse sentido, vale à pena mencionar o Acórdão 1.245/2004 - TCU - Plenário:

Sob pena de responsabilização dos agentes envolvidos, mantenha estrita observância ao equilíbrio dos preços fixados no contrato (...) em relação à vantagem originalmente ofertada pela empresa vencedora, de forma a evitar que, por meio de aditivos futuros, o acréscimo de itens com preços supervalorizados (...) viole os princípios administrativos" (Acórdão 1.245/2004 - TCU - Plenário).

78. Na mesma orientação se encontra o seguinte trecho do voto condutor do Acórdão 1.755/2004 - TCU - Plenário:

Nesse sentido, entendo que o original equilíbrio econômico-financeiro de um contrato pode ser extraído da diferença percentual observada entre o valor global da proposta e o constante do orçamento-base do órgão licitante. Isso não oblitera a necessidade de prévia verificação da compatibilidade entre o preço orçado pela Administração e o preço de mercado. (Acórdão 1.755/2004 - TCU - Plenário).

b) O resultado da licitação não seria alterado se os novos quantitativos fossem aplicados às demais propostas.

79. Ora, não é possível aceitar aditivo que fira essa condição, tendo em vista o respeito aos princípios da igualdade e o da seleção da proposta mais vantajosa para a Administração Pública, insculpidos no art. 3º do estatuto das licitações. O já citado voto condutor do Acórdão 1.755/2004 - TCU - Plenário trouxe caso concreto em que o resultado da licitação seria alterado com os itens acrescentados pelo aditivo:

Com a supressão ou redução de quantitativos de itens de trabalho com preços unitários vantajosos para Administração, sobressaíram, com maior peso relativo, na planilha orçamentária, os serviços com custos unitários mais onerosos ao Erário. Além disso, pelo aditivo, foram acrescentados itens de trabalho com preços unitários acima dos valores de mercado, tornando patente o desequilíbrio da relação em desfavor da Administração. Por tal razão, a oferta global da empresa ARG Ltda. perderia a vantagem comparativa e deixaria de ser a melhor classificada em relação aos demais concorrentes. (Acórdão 1.755/2004 - TCU - Plenário).

80. Outro exemplo de serviço incluído na licitação que foi posteriormente excluído do contrato e, como consequência, alterou o resultado do certame, pode ser visto no voto condutor do Acórdão 1.797/2007 - TCU - Plenário:

9. No que diz respeito à irregularidade descrita na alínea "c" (presença do item "sistemas de cloração" na licitação para obras civis da adutora, posteriormente excluído), a inclusão inicial no certame e a exclusão posterior no contrato do referido item se deu em benefício da contratada em detrimento das demais licitantes, com ferimento, portanto, ao princípio da igualdade (art. 3º da Lei 8.666/93), levando-se em conta que sem esse item a contratada não teria vencido o certame, conforme anotado na instrução transcrita no Relatório precedente. (Acórdão 1.797/2007 - TCU - Plenário - trecho do voto)

81. A própria LDO 2013, no § 5º do já citado art. 102, aborda o tema da manutenção da vantagem da proposta vencedora da licitação ante à da segunda colocada:

I - a diferença percentual entre o valor global do contrato e o preço obtido a partir dos custos unitários do sistema de referência utilizado não poderá ser reduzida, em favor do contratado, em decorrência de aditamentos que modifiquem a planilha orçamentária;

II - em casos excepcionais e devidamente justificados, a diferença a que se refere o inciso I deste parágrafo poderá ser reduzida para a preservação do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, devendo ser assegurada a manutenção da vantagem da proposta vencedora ante à da segunda colocada na licitação e a observância, nos custos unitários dos aditivos contratuais, dos limites estabelecidos no caput para os custos unitários de referência;

c) A alteração não supera o limite de 10% previsto no art. 102, § 6º, III da LDO 2013 e nem o limite de 25% (ou 50% para o caso de reformas) previsto na Lei 8.666/93 (nesse último caso, consideradas quaisquer outras alterações).

d) O serviço incluído não previsto em contrato ou a quantidade acrescida que foi originalmente subestimada pelo orçamento base da licitação não são compensados por eventuais distorções a maior nos quantitativos de serviços que favoreçam o contratado.

82. Essa exigência tem como fundamento a tese de que equilíbrio econômico-financeiro do contrato deve ser sempre analisado de forma global, procedendo-se as compensações entre os ganhos e perdas do contratado. Pode-se realizar uma analogia com o conceito de compensação entre preços superestimados e preços subestimados presentes na jurisprudência do TCU, por exemplo, nono voto condutor do Acórdão 388/2004 - TCU - Plenário:

É cediço o entendimento deste Tribunal que, estando o preço global no limite aceitável dado pelo orçamento da licitação, as discrepâncias de preços existentes, devido à ausência de critério de aceitabilidade de preços unitários, apenas causam prejuízos quando se realizam aditivos em que são acrescidos quantitativos para itens de serviço cujos valores eram excessivos em relação aos demais licitantes e suprimidas as quantidades daqueles itens cujos preços eram vantajosos para a administração contratante. (Acórdão 388/2004 - TCU - Plenário - trecho do voto)

83. Contribui para o esclarecimento da questão o seguinte trecho do sumário do Acórdão 1.551/2008 - TCU - Plenário:

3. Na avaliação econômica do contrato, o eventual sobrepreço existente deve ser apurado de forma global, isto é, fazendo-se as compensações do preços excessivo de alguns itens com os descontos verificados em outros, principalmente se os preços são os mesmos oferecidos na licitação da obra e se pode constatar que a proponente sopesou de forma diferenciada o custo dos diversos serviços, tirando proveito das possíveis vantagens comparativas, desde que de forma legítima. Situação diversa ocorre com itens eivados de ilegalidade, tais os que apresentaram modificação sensível dos parâmetros eleitos na licitação, justificando a impugnação individual do item anômalo. (Acórdão 1.551/2008 - TCU - Plenário - trecho do sumário)

84. Por analogia aos entendimentos apresentados acima, na avaliação econômica de um contrato por preço global, eventual subestimativa de quantitativo de um determinado serviço, pode ser compensada por outros serviços, cujos quantitativos estão superestimados. Caberá, então, ao gestor avaliar a íntegra da planilha orçamentária, sempre que for demandado pelo contratado a aditar um contrato por preço global com a alegação de que os quantitativos de determinados serviços estão superestimados.

e) A execução do serviço "a mais", suportada apenas pelo contratado, inviabilizaria a execução contratual.

85. O equilíbrio econômico-financeiro (ou equação econômico-financeira) é assim definido por Hely Lopes Meirelles:

O equilíbrio financeiro ou equilíbrio econômico do contrato administrativo, também denominado equação econômica ou equação financeira, é a relação que as partes estabelecem inicialmente, no ajuste, entre os encargos do contratado e a retribuição da Administração para a justa remuneração da obra, do serviço ou do fornecimento. Em última análise, há a correlação entre o objeto do contrato e sua remuneração, originariamente prevista e fixada pelas partes em números absolutos ou em escala móvel. Essa correlação deve ser conservada durante toda a execução do contrato, mesmo que alteradas as cláusulas regulamentares da prestação ajustada, a fim de que se mantenha a equação financeira ou, por outras palavras, o equilíbrio econômico-financeiro do contrato (Lei 8.666, de 1993, art. 65, I, "d", e § 6º) [MEIRELES, Hely Lopes; Licitação e Contrato Administrativo, 11ª ed, atualizada por Eurico de Andrade Azevedo et alii, São Paulo, Malheiros, 1996, p.165]. (grifos acrescidos).

86. Daí já se extrai a conclusão de que a equação econômica e financeira é definida no momento em que a contratada apresenta a sua proposta. Exatamente nessa linha, Marçal Justen Filho apresenta a seguinte consideração:

A equação econômico-financeira delineia-se a partir do ato convocatório. Porém, a equação se firma no instante em que a proposta é apresentada. Aceita a proposta pela Administração, está consagrada a equação econômico-financeira dela constante. A partir de então essa equação está protegida e assegurada pelo Direito [FILHO, Marçal J., Op. Cit ].

87. Assim, a insuficiência da remuneração é apenas um dos requisitos do desequilíbrio econômico-financeiro, que terá de se somar a outros para que se legitime a alteração do contrato administrativo. Por exemplo, pode-se demonstrar que o valor referente ao quantitativo subestimado supere a taxa de risco mais a de lucro previstas no BDI apresentado pelo contratado. Nesse caso, deixar o serviço acrescido inteiramente por conta do contratado poderia desequilibrar o contrato, já que a totalidade de sua remuneração seria consumida pelo novo encargo. Tal situação poderia culminar na paralisação da obra por incapacidade da contratada em continuá-la. Ressalte-se que a vedação ao enriquecimento sem causa serve tanto ao particular quanto à Administração Pública.

88. Dando seguimento à sua lição, afirma Marçal Justen Filho:

O restabelecimento da equação econômico-financeira depende da concretização de um evento posterior à formulação da proposta, identificável como causa do agravamento da posição do particular. Não basta a simples insuficiência da remuneração. Não se caracteriza rompimento do equilíbrio econômico-financeiro quando a proposta do particular era inexequível. A tutela à equação econômico-financeira não visa a que o particular formule proposta exageradamente baixa e, após vitorioso, pleiteie elevação da remuneração. Exige-se, ademais, que a elevação dos encargos não derive de conduta culposa imputável ao particular. Se os encargos tornaram-se mais elevados porque o particular atuou mal, não fará jus à alteração de sua remuneração [FILHO, Marçal J., Op. Cit ].

89. Assim, deve-se demonstrar que a subestimativa do quantitativo não é mera álea ordinária ou empresarial, a qual está presente em qualquer tipo de negócio; trata-se do risco que todo empreendedor corre por desenvolver uma atividade econômica no mercado (instável por sua própria natureza), que, previsível, deve ser suportado exclusivamente pelo particular.

90. Percebe-se da doutrina trazida à baila que alterações nos quantitativos de serviços, por si só, não constituem hipóteses de álea extraordinária senão quando decorridos de algum evento imprevisível ou, se previsível, incalculável, cuja natureza inegavelmente fática torna imperiosa sua comprovação.

VII.ii - Orçamentos com quantitativos superestimados.

91. Caso a Administração Pública identifique quantitativos superestimados, ela deve proceder, de ofício, (e em observância aos princípios da economicidade, moralidade e probidade administrativas) à alteração contratual para reduzir os quantitativos inadequados, ajustando o montante total ao valor real.

92. Essas regras decorrem do fato de que, se a medição for feita por etapas (e não por quantidades unitárias), haverá por consequência uma assimetria de informações entre o contratado e a Administração Pública. Afinal, o fiscal, já que mede por etapas, não estará medindo as quantidades (não terá com saber, portanto, quanto foi executado exatamente), mas o particular sabe o quanto ele executa qualquer que seja o regime. O Tribunal já se pronunciou a respeito de situação de quantitativos superestimados:

O fato de se tratar de contratação por preço global não assegura a nenhum contratado o direito de receber por produto não utilizado. (Acórdão 363/2007 - TCU - Plenário - trecho do voto).

93. Ademais, quantitativo superestimado é um dos fatores causadores do superfaturamento de obras públicas, de modo que permiti-lo pode configurar ato de improbidade administrativa, nos termos dos artigos 10 e 11 da Lei 8429/92 (lei de improbidade administrativa). Tal conduta também pode ser enquadrada como crime, conforme o art. 96, incisos IV e V do Estatuto das Licitações.

94. Todavia, em situações excepcionais, em que o contratado pleiteie a não redução do valor global do contrato, alegando ter compensado o superdimensionamento de quantitativos de outras formas ao oferecer o valor global da sua proposta, pode-se admitir excepcionalmente o pleito desde que:

a) em análise global, o quantitativo artificialmente elevado foi compensado por outros preços e quantitativos subestimados de forma que reste cabalmente demonstrado que o preço global pactuado representa a justa remuneração da obra, considerado o orçamento de referência da Administração ajustado.

95. Mais uma vez convém usar a analogia para compreender a situação. O trecho do Acórdão 1.887/2010 - TCU - Plenário, embora trate mais uma vez de compensação entre itens com sobrepreço e subpreço, ilustra bem uma possível consequência de se proceder a uma alteração contratual para redução de quantitativos sem uma análise mais cuidadosa:

...se os preços globais estão compatíveis com os de mercado, a existência de determinados itens com sobrepreço deve ser correspondida pela existência de itens cujos preços estão abaixo dos de mercado, havendo assim uma compensação entre os valores desses dois diferentes grupos de insumos. Assim, a redução dos valores dos itens com sobrepreço afetaria o equilíbrio econômico-financeiro da contratação e possibilitaria o auferimento de vantagens indevidas por parte da Administração. (Acórdão 1.887/2010 - TCU - Plenário)

96. De mesma forma, a supressão daqueles quantitativos que estão superestimados, sem a devida recomposição dos serviços cujos quantitativos estão subestimados, comprometeria o equilíbrio econômico-financeiro do contrato, propiciando o enriquecimento ilícito do órgão contratante.

c) a alteração do contrato de forma a reduzir os quantitativos daquele item inviabilizaria a execução contratual. Por exemplo, demonstrando que o valor reduzido supera a taxa de risco mais a de lucro, previstas no BDI de referência da Administração, bem como as discrepâncias a maior que costumam existir entre os valores extraídos dos sistemas referenciais de preços e os verdadeiros preços de mercado.

97. Aqui vale a mesma argumentação dos parágrafos 85 a 90 acima. Adicionalmente, existe a tendência de que os preços dos materiais e serviços contidos em tabelas de custo padrão estejam em um patamar superior aos seus preços reais de mercado. Muitos sistemas adotam valores médios ou medianos das coletas realizadas como paradigma de preços de mercado. No entanto, os insumos são efetivamente adquiridos pelo menor preço pesquisado e não pelo preço médio ou mediano. Tal distorção recebeu a denominação de "efeito cotação", em trabalho realizado pelo Instituto Nacional de Criminalística da Polícia Federal. [FILHO, Laércio de Oliveira e Silva; LIMA, Marcos Cavalcanti e MACIEL, Rafael Gonçalves - Efeito barganha e cotação: fenômenos que permitem a ocorrência de superfaturamento com preços inferiores às referências oficiais - Revista do Tribunal de Contas da União. Brasil. Ano 42. Número 119, 2010]

98. As tabelas de custo tampouco consideram condições negociais entre construtoras e fornecedores, tais como prazos maiores para pagamento, parcelamento das compras e descontos.

99. Assim, ao elaborar o orçamento que servirá de base para o procedimento licitatório, o gestor tem o dever de se balizar em pesquisas do mercado local, considerando adequadamente os descontos possíveis em face de compras em grande quantidade. Em outras palavras, deve considerar a natural ausência de descontos para compras em grande escala em qualquer sistema de preços referenciais, em virtude de tais sistemas não considerarem as possibilidades de significativas reduções nos custos de fornecimento de materiais e equipamentos, oriundas de negociações diretas com fabricantes ou grande revendedores. As economias de escala existentes na compra de grandes quantidades de material causam uma distorção, entre os preços referenciais e os preços efetivos de mercado, denominada de "efeito barganha" pelo estudo o Instituto Nacional de Criminalística.

100. Por consequência, as margens de segurança existentes nos preços dos sistemas referenciais da Administração Pública também devem ser consideradas na avaliação das exceções que este estudo ora está apresentando.

101. Ante o exposto, sintetizando-se as considerações apresentadas nas condicionantes elencadas nos parágrafos precedentes, foram considerados os seguintes fundamentos:

a) respeito ao princípio da igualdade e da seleção da proposta mais vantajosa;

b) vedação ao enriquecimento sem causa da administração e do contratado

c) necessidade de preservação do equilíbrio econômico financeiro do contrato;

d) a premissa de que, em EPG, a análise global do contrato (e do equilíbrio contratual) prevalece sobre a aferição de itens unitários.

VIII - LICITAÇÕES EM EPG COM ORÇAMENTO BASE COM ERROS DE QUANTITATIVOS.

102. Em licitações por EPG é importante destacar a obrigação de que o licitante, ao verificar erros de quantitativos no orçamento-base do órgão contratante, questione a comissão de licitação acerca do problema e, caso não obtenha o devido esclarecimento, exerça o dever-direito de impugnar o edital de licitação, em consonância com o art. 41, § 2º, da Lei 8.666/93, uma vez que a alteração de quantitativos na proposta, em desacordo com o orçamento-base, não pode ser admitida, sob pena de ofensa ao princípio da isonomia. Cabe ressaltar que o Art. 7º, §§ 4º e 6º, da mesma Lei, fundamenta a anulação da licitação quando os quantitativos estiverem errados:

§4º É vedada, ainda, a inclusão, no objeto da licitação, de fornecimento de materiais e serviços sem previsão de quantidades ou cujos quantitativos não correspondam às previsões reais do projeto básico ou executivo.

(...)

§6º A infringência do disposto neste artigo implica a nulidade dos atos ou contratos realizados e a responsabilidade de quem lhes tenha dado causa.

103. Nesse sentido, pode-se mencionar o voto condutor do Acórdão 353/2007 - TCU - Plenário já apresentado no presente estudo.

104. A não impugnação por parte do licitante, mesmo tendo conhecimento de eventuais erros de quantitativos, ensejaria um risco muito grande ao contrato, tendo em vista a cláusula de concordância expressa com o projeto básico, insculpida no art. 102, §6º, III, da LDO 2013, já citada anteriormente.

105. Em atenção ao princípio da vinculação ao instrumento convocatório, o tratamento a ser dado no caso de, posteriormente, ser constatada relevante discrepância, a maior ou a menor, nos quantitativos previstos na planilha orçamentária deverá também observar a regra estabelecida no edital de licitação.

XIX - CONCLUSÕES

106. A escolha do regime de execução da obra não é decisão de livre arbítrio do gestor. Deve se pautar no interesse público e estar sempre motivada. Decorre desse entendimento que não existe regime de execução melhor que o outro, mas aquele que melhor atende ao interesse público no caso concreto.

107. Adota-se a empreitada por preço global, em regra, quando for possível definir com precisão os quantitativos dos serviços a serem executados na obra.

108. É irregular a admissão de proposta ofertada pelo licitante contendo especificações de serviços e respectivas quantidades destoantes do orçamento-base da licitação. Caso o licitante identifique erro de quantitativos no orçamento-base, deve impugnar os termos do edital de licitação.

109. Regra geral, são admissíveis aditivos contratuais no regime de execução contratual por preço global nos casos de alterações de projeto propostas pela administração, fatos imprevisíveis e demais situações previstas na alínea "d" do inciso II do art. 65 da lei de Licitações (manutenção das condições efetivas da proposta).

110. Nos contratos celebrados no regime de preço global, quando executados com pequenas variações de quantitativos em seus serviços, paga-se exatamente o preço global ajustado, nem mais nem menos.

111. Para os casos em que houve subestimativa relevante dos quantitativos de alguns serviços e a contratada pleiteie aditivo por acréscimo de quantitativos ou inclusão de serviços novos, em regra os aditivos são vedados, pelo motivo de tal fato se constituir álea ordinária.

112. Nos casos em que os quantitativos foram superestimados, a Administração Pública deve, de ofício, promover sua adequação mediante celebração de aditivo contratual. Admite-se que a contratada pleiteie a não redução do valor global do contrato comprovando haver outros serviços cujos quantitativos estão subestimados, promovendo-se a compensação entre os montantes financeiros.

113. Em caso de quantitativos subestimados no orçamento, eventuais pleitos do contratado poderão ser atendidos de forma excepcionalíssima, desde que preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos e que não haja outra regra prevista no contrato ou edital:

a) a alteração do contrato manterá a proporcionalidade da diferença entre o valor global estimado pela administração e o valor global contratado;

c) o resultado da licitação não seria alterado se os novos quantitativos fossem aplicados às demais propostas, em observância aos princípios da igualdade e da seleção da proposta mais vantajosa;

d) a alteração não supera o limite de 10% previsto no art. 102, § 6º, III da LDO 2013 nem o limite de 25% (ou 50% para o caso de reformas) previsto no § 1º do art. 65 da Lei 8.666/93 (neste último caso, consideradas quaisquer outras alterações).

e) o novo serviço incluído no contrato ou a quantidade acrescida, que foi originalmente subestimada, não são compensados por eventuais distorções a maior nos quantitativos de outros serviços, que favoreçam o contratado;

f) a execução do serviço "a mais" pelo contratado inviabilizaria a execução contratual caso o aditivo não fosse aceito. Por exemplo, demonstrando-se que o acréscimo pleiteado supere a taxa de risco mais a de lucro previstas no BDI referenciado contratado, bem como os valores de eventuais distorções a maior existentes nos custos obtidos em sistemas referenciais da Administração Pública (efeitos cotação e barganha) que não foram eliminados no processo licitatório.

114. Em caso de quantitativos superestimados no orçamento, eventuais pleitos do contratado para não redução dos valores contratados poderão ser atendidos de forma excepcionalíssima, desde que preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos e que não haja outra regra prevista no contrato ou edital:

a) demonstração, em análise global, de que o quantitativo artificialmente elevado foi compensado por outros preços e quantitativos subestimados de forma que reste cabalmente demonstrado que o preço global pactuado representa a justa remuneração da obra, considerando o orçamento de referência da Administração ajustado; e

b) a alteração do contrato de forma a reduzir os quantitativos daquele item inviabilizaria a execução contratual. Por exemplo, demonstrando-se que o valor a ser reduzido supera a taxa de risco mais a de lucro previstas no BDI referenciado contratado, bem como os montantes originados de eventuais distorções a maior existentes nos custos obtidos em sistemas referenciais da Administração Pública (efeitos cotação e barganha) que não foram eliminados no processo licitatório.

X - PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO

115. Ante o exposto, submete-se o presente processo à consideração superior com as seguintes propostas de encaminhamento:

I) determinar à Segecex que oriente as unidades técnicas deste Tribunal a considerar em suas fiscalizações de obras e serviços de engenharia os seguintes entendimentos:

a) a escolha do regime de execução contratual pelo gestor deve estar fundamentada nos autos do processo licitatório;

b) adota-se a empreitada por preço global, em regra, quando for possível definir com precisão os quantitativos dos serviços a serem executados na obra;

c) é irregular a admissão de proposta ofertada pelo licitante contendo especificações de serviços e respectivas quantidades destoantes do orçamento-base da licitação, cabendo ao licitante, no caso de identificar erros de quantitativos no orçamento-base do certame, impugnar os termos do edital de licitação.

d) são admissíveis aditivos contratuais no regime de execução contratual por preço global nos casos de alterações de projeto propostas pela administração, nos casos de fatos imprevisíveis, entre os quais a impossibilidade de o licitante constatar as eventuais discrepâncias de quantidades com base nos elementos presentes no projeto básico, bem como nas demais situações previstas na alínea "d" do inciso II do art. 65 da lei de Licitações.

e) em contratos executados no regime de empreitada por preço global, no caso de aditivos celebrados em virtude de erros ou omissões no orçamento, deverão ser observados os seguintes entendimentos:

e.1) quando os contratos forem executados com pequenas variações de quantitativos em seus serviços, a administração contratante deve pagar exatamente o preço global ajustado, nem mais nem menos.

e.2) em regra, os aditivos não são admissíveis, tendo em vista a cláusula de expressa concordância do contratado com o projeto básico, prevista no art. 102, § 6º, inc. III, da LDO 2013, bem como a natural variação de quantitativos na empreitada por preço global constituir-se em álea ordinária do contratado;

e.3) excepcionalmente, em caso de quantitativos com relevantes subestimativas no orçamento, demonstrada a razoabilidade do pedido de aditivo formulado pela contratada, deverão ser atendidas cumulativamente as seguintes regras para o deferimento do pleito pela Administração, desde que não haja regra diversa prevista no instrumento convocatório ou no contrato celebrado entre as partes:

e.3.1) a alteração do contrato deverá manter a proporcionalidade da diferença entre o valor global estimado pela administração e o valor global contratado;

e.3.2) o resultado que seria obtido licitação, com os quantitativos efetivos de serviços, não poderá ser modificado se os novos quantitativos fossem aplicados às propostas dos demais licitantes, em observância aos princípios da igualdade e da seleção da proposta mais vantajosa para a Administração;

e.3.3) a alteração contratual decorrente não supera o limite de 10% previsto no art. 102, § 6º, III da LDO 2013 e no e no art. 42, §4º, III, do Decreto 7.581/2011, nem o limite de 25% (ou 50% para o caso de reformas) previsto no § 1º do art. 65 da Lei 8.666/93, neste último caso, consideradas quaisquer outras alterações;

e.3.4) o novo serviço incluído no contrato ou a quantidade acrescida no serviço cujo quantitativo foi originalmente subestimado não são compensados por eventuais distorções a maior nos quantitativos de outros serviços que favoreçam o contratado;

e.3.5) a execução do serviço "a mais" pelo contratado inviabilizaria a execução contratual caso o aditivo não fosse aceito, por exemplo, demonstrando-se que o acréscimo pleiteado supera a remuneração e todas as contingências previstas em sua proposta, bem como o montante de eventuais distorções a maior existentes nos custos obtidos em sistemas referenciais da Administração Pública (efeitos cotação e barganha) que não foram eliminados no processo licitatório.

e.4) em caso de quantitativos superestimados no orçamento, eventuais pleitos do contratado para não redução dos valores contratados poderão ser atendidos de forma excepcionalíssima, desde que preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos e que não haja outra regra prevista no contrato ou edital:

e.4.1) demonstração, em análise global, de que o quantitativo artificialmente elevado foi compensado por outros preços e quantitativos subestimados de forma que reste cabalmente demonstrado que o preço global pactuado representa a justa remuneração da obra, considerando o orçamento de referência da Administração ajustado; e

e.4.2) a alteração do contrato de forma a reduzir os quantitativos daquele item inviabilizaria a execução contratual, por exemplo, demonstrando-se que o valor a ser reduzido supere a remuneração e as contingências detalhadas na composição do BDI apresentado pelo contratado, bem como os montantes originados de eventuais distorções a maior existentes nos custos obtidos em sistemas referenciais da Administração Pública (efeitos cotação e barganha) que não foram eliminados no processo licitatório.

II) encaminhar cópia da deliberação que vier a ser adotada, acompanhada do relatório e voto que a fundamentam, ao Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão, para que informe as diretrizes que serão adotadas pelo Tribunal de Contas da União nas fiscalizações de obras e serviços de engenharia aos demais órgãos e entidades da administração pública federal;

g) arquivar o presente processo.

É o relatório


Voto:


VOTO

Inicialmente, registro que atuo nestes autos em razão de sorteio, com fundamento no art. 19 da Resolução TCU 175/2005, por tratar-se de processo de matéria administrativa.

Examino, nesta oportunidade, estudo sobre o regime de empreitada por preço global - EPG - desenvolvido pela Secretaria de Fiscalização de Obras Aeroportuárias e de Edificação (SecobEdificação) -, com vistas a uniformizar procedimentos de fiscalização atinentes a objetos executados mediante o regime de empreitada por preço global, de modo a apresentar diretrizes e orientar os auditores do Tribunal sobre o tema.

Julgo de extrema importância a matéria aqui tratada. É sabido que, não raro, a empreitada por preço global, por suas particularidades, quando não assentada em ambiente de regras claras, tem gerado um clima contratual de insegurança, em terreno infértil para abalizar o bom andamento dos contratos e, consequentemente, garantir o sucesso das contratações.

A experiência haurida pelas auditorias realizadas por esta Corte em obras e serviços sob esse regime tem identificado tanto o desvirtuamento do instituto (com a medição como se preço unitário fosse) como também a aplicação distorcida do art. 65 da Lei de Licitações, no que se refere às condições para a prolação de termos aditivos aos contratos. As repercussões vão desde o superfaturamento até o abandono dos contratos, afora os infindáveis litígios judiciais.

Nesse viés, tendo em vista que a jurisprudência do TCU não delineia, com precisão, as regras para aplicação do instituto, de todo oportuno dotar o corpo técnico desta Casa de um instrumento objetivo para melhor subsidiar suas fiscalizações. Também é salutar, tendo em vista a contribuição do Tribunal para a melhoria da Administração Pública, orientar os gestores sobre os preceitos e riscos a serem observados nesse tipo de contratação.

Feita a contextualização, organizo este voto de modo a desvendar aspectos essenciais para o julgamento da proposta da unidade instrutiva:

caracterização da diferença entre o regime de empreitada global e o regime de empreitada por preços unitários;

identificação dos elementos que motivem, de acordo com as características de cada objeto, a preferência da adoção de empreitada por preço global, em detrimento da empreitada por preço unitário;

fundamentação dos elementos exigíveis no projeto básico de um e outro instituto;

esclarecimento das condições para a realização de termos aditivos em empreitadas por preço global, tanto no que se refere à eventuais modificações no projeto da obra, como também quando constatados erros ou omissões no orçamento contratado.

Passo a abordar cada item em específico.

II

O primeiro passo, neste deslinde meritório, é definir os regimes. Nos termos do art. 6º, inciso V, da Lei 8666/93:

a) empreitada por preço global - quando se contrata a execução da obra ou do serviço por preço certo e total;

b) empreitada por preço unitário - quando se contrata a execução da obra ou do serviço por preço certo de unidades determinadas;

A acepção abrigada na Lei de Licitações indica que ambos os institutos destinam-se a contratar a execução de obra ou serviço por "preço certo", pré-avaliado e de modo judicioso. No preço global, contudo, tal oferta para execução do objeto deve se fazer em razão do todo (preço certo e total), como entidade una; concisa. No preço unitário, tal "preço certo" será realizado em termos de unidades pré-determinadas que compõem esse todo. Intui-se nesse último instituto, pela diferença redacional, que o objeto é visto como uma soma de várias parcelas; de frações que, juntas, formarão a unidade. A empreitada por preços unitários é o conjunto de retalhos vistos, cada qual, de maneira individual na contratação, de maneira a formar a totalidade.

Na prática, tendo em vista que ambos os regimes podem levar à realização do mesmo objeto, a diferença encontrar-se-á, basicamente, na maneira de como serão realizadas as medições - e nos riscos assumidos pela contratada em razão dessa distinção na forma de pagamento. Nas empreitadas por preço unitário, mede-se cada unidade de serviço e os pagamentos far-se-ão mediante a multiplicação das quantidades executadas pelos seus respectivos preços unitários. O memorial de medições - peça necessária e fundamental para a regular liquidação de despesas - trará, em detalhes, a fundamentação dessas quantidades, para cada item constante do orçamento contratado.

Nas empreitadas por preço global, de outro modo, medem-se as etapas de serviço de acordo com o cronograma físico-financeiro da obra ou mediante as etapas objetivamente estabelecidas no instrumento convocatório. Em exemplo prático, terminadas as fundações, paga-se o valor global das fundações; feita a estrutura, remunera-se o valor previsto para essa etapa; concluída determinada fase da obra, com marco previamente estipulado, retribui-se o montante correspondente; até chegar ao final da empreitada, que deverá corresponder ao valor total ofertado para o objeto como um todo, no ato da licitação (preço certo e total).

Trata-se, em consequência, em algum termo, da transferência de imprecisões quantitativas para o particular, como ainda, de um esforço fiscalizatório menor, no que se refere à verificação em pormenores dos quantitativos de cada serviço. Embora os cuidados com a qualidade do objeto permaneçam, não se fazem necessárias avaliações meticulosas e individuais de quantidades. Ao executar, por exemplo, um piso cerâmico de uma obra em uma empreitada por preço unitário, uma vez que se contrata um preço por unidades determinadas, pega-se a trena e se mede exatamente o que foi feito. Se as medidas indicarem que se executarem 100,5 m2, 100,5 m2 serão pagos (e não 100 m2). No preço global, de outro modo, como se contratou a obra por preço certo e total (se não houver modificação de projeto), uma vez que o piso da sala foi feito, remunera-se o previsto em contrato - ou exatamente 100 m2.

Em verdade, a forma de medir os serviços feitos nas empreitadas globais deve ser precisamente estipulado no instrumento convocatório. Pode-se pactuar que as medições serão realizadas de acordo com o término de determinada etapa da obra (como o piso), ou proporcionalmente ao cronograma físico-financeiro do empreendimento, sem a necessidade de medir "na trena" cada filigrana realizada. O edital e o instrumento de contrato devem ser cristalinos acerca de tais critérios; sob pena de o preço global se transformar em um preço unitário, porque, na ausência de regra, os serviços serão medidos um a um. Uma orientação específica aos auditores quanto a este ponto é cabida, visto que tal omissão nas licitações são casos comuns.

É óbvio, nesse caso, que se o projeto contiver imprecisões relevantes e se tal peça fundamental não abrigar todos os seus elementos exigidos em lei, as empreitadas globais embutem um risco maior para o construtor (como também para administração). Projetos incompletos repercutirão em consequências ainda mais nefastas nas empreitadas globais. É a primeira porta para a celeuma contratual. As contratadas solicitarão aditivos para compensar as omissões orçamentárias. A Administração argumentará que o preço foi contratado para a totalidade, não para a fração. E seguirão todas as mazelas decorrentes desse clima de insegurança.

De tal conclusão, tomada a partir dessas eventuais imponderabilidades de quantitativos que os objetos possam carregar intrinsecamente, já se pode intuir em que objetos se faz mais vantajoso se utilizar de um ou de outro regime; o que buscarei explicitar adiante.


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VI

Sem dúvida, o ponto mais controverso sobre a prática contratual nas empreitadas globais encontra-se na discussão sobre a viabilidade de prolação de termo aditivo em casos de erros ou omissões do orçamento.

Discute-se, se, nesse regime, a contratada é automaticamente responsável por todo e qualquer risco proveniente de erros de quantificação de serviços no projeto básico. Se a afirmativa for correta, mesmo que se constate, durante a execução contratual, que determinado serviço foi sub ou superavaliado, o particular (ou o ente público, conforme o caso) deve assumir o ônus dessa omissão (ou se beneficiar dela), tendo em vista que a contratação foi ajustada para preço certo e total.

A unidade instrutiva entende que, em extrato, se a falha for de pequena monta, tendo em vista o que dispõe o art. 6º, inciso VIII, alínea 'a', nenhum aditivo seria devido. Caso contrário, a empreitada por preço global iria se transformar em uma empreitada por preço unitário, caindo em letra morta na lei - em desarranjo com a boa hermenêutica. Por justeza, todos os outros serviços haveriam de passar pela mesma "auditoria", e as medições seriam realizadas uma a uma.

Por outro lado, ainda segundo o relatório prévio, quando os erros forem relevantes, no intuito de não inviabilizar a continuidade do contrato, as condições contratuais poderiam ser revistas. Nessa hipótese, em uma visão proporcional, as imprecisões em diferentes itens da planilha não poderiam se compensar. Os limites de aditamento estabelecidos no art. 65, § 1º da Lei 8.666/93 e no art. 102 da LDO (10% para erros ou omissões e empreitadas globais) igualmente haveriam de ser respeitados. Existe, em paralelo, a proposta de tolerar aditivos unicamente em casos de fatos imprevisíveis, inclusive no que se refere à "impossibilidade de o licitante constatar as eventuais discrepâncias de quantidades com base nos elementos presentes no projeto básico".

De maneira sintética, a proposta redundaria em uma objetivação de que, se o erro não for "constatável" previamente e for superior ao percentual de risco estabelecido no BDI, haverá de se prolatar o aditivo, desde que não haja compensação com outros itens e desde que não extrapolados os limites contratuais.

Passo, então, a ajuizar os fundamentos da proposta.

A dicotomia em questão está em balancear a idealização da empreitada global com a vedação do enriquecimento sem causa. Não seria concebível que falhas na elaboração do edital redundem, com justa causa, em um superfaturamento. Tampouco a Administração poderia se beneficiar de erro que ela própria cometeu, pagando por um produto preço relevantemente inferior que o seu justo preço de mercado. Erro preliminar da própria Administração, independentemente do tipo de empreitada, não pode redundar em ganhos ilícitos; porque se ilícito for, o enriquecimento de uma parte, em detrimento de outra, sem causa jurídica válida, faz-se vedado.

A depender do "erro", não obstante a assunção de riscos quantitativos pela contratada (decorrente pela própria forma global de medição), pode haver um vício intransponível no edital, a ser necessariamente corrigido. Erro não é sinônimo de imprecisão (esta sim tida como álea ordinária nas empreitadas globais).

Procurarei aclarar a questão ao aplicar, supletivamente, a teoria geral dos contratos. Segundo o art. 884 da Lei 10.406/2002 (Código Civil Brasileiro):

Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.

Analiso, pois, essa "justa causa" ou "causa jurídica válida". Não haverá enriquecimento ilícito se houver razão lícita que fundamente o ganho. E a legitimidade de qualquer contrato perpassa pela livre manifestação de vontade - sempre pautada pela boa-fé.

Se materializado um vício nesse requisito subjetivo de livre manifestação de vontade, o acordo pode estar fadado à anulação. Em aplicação direta ao que se discute, quando identificado um erro hábil a induzir a uma noção inexata sobre o negócio, que, se constatado anteriormente, influenciaria nessa "livre manifestação de vontade", o próprio desiderato da avença é maculado - aquilo que deu causa ao ajuste. Se estivesse expresso que, na verdade, os encargos para o adimplemento do contrato eram superiores, a vontade poderia ser expressa de outro modo; e a oferta poderia ser outra.

Como ensina Sílvio de Salvo Venosa (Direito Civil: parte geral. São Paulo: Atlas, 2004. Pg. 433 a 436):

O erro manifesta-se mediante compreensão psíquica errônea da realidade, ou seja, a incorreta interpretação de um fato (...)

O primeiro vício de consentimento é o erro, com as mesmas consequências da ignorância. Trata-se de manifestação de vontade em desacordo com a realidade, quer porque o declarante a desconhece (ignorância), quer porque tem representação errônea dessa realidade (erro) (...)

Quando o agente paga preço desproporcional ao real valor da coisa, sob certas circunstâncias, estaremos perante hipótese de lesão (...)

Esses vícios afetam a vontade intrínseca do agente e a manifestação de vontade é viciada. Se não existisse uma dessas determinantes, o declarante teria agido de outro modo ou talvez nem mesmo realizado o negócio.

Consta, ainda, do art. 138 do Código Civil:

Art. 138. São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio.

Um erro é substancial quando tem papel preponderante na formação de vontade. Caso se soubesse a verdadeira natureza do negócio, o acordo seria realizado sob outra égide. É o caso de falhas na definição das qualidades essenciais do objeto; ou que possam influir de maneira relevante na formação de vontades (art. 130 do CCB).

Ao contrário, o erro acidental diz respeito à qualidades secundárias; acessórias. Por isso, não conduz à anulação do negócio jurídico, porque, "além de não incidir especificamente sobre a declaração de vontade, não possui relevância econômica" (Kumpel, Vitor Frederico. Direito Civil, direito dos contratos, 3. São Paulo: Saraiva 2008).

O erro substancial, entretanto, para que se possa pensar na anulabilidade do trato, deve atravessar um juízo de escusabilidade; qualquer pessoa normal poderia ter cometido (parte final do art. 138 do Código Civil). Aplica-se, aqui, o princípio da boa-fé objetiva. Novamente citando Sílvio Venosa, "o erro grosseiro, facilmente perceptível pelo comum dos homens, não pode ser idôneo para autorizar a anulação do ato. O princípio geral é do homem médio. Trata-se do conceito do homem médio para o caso concreto. Assim, poderá ser anulável o negócio para um leigo em um negócio, para o qual admitiria o erro de um técnico na matéria".

Essa teoria geral tem perfeita incidência com o que se discute. Erros relevantes (substanciais) na informação disponibilizada aos licitantes têm o potencial de anular o certame, tanto pela indução errônea acerca da real dimensão do objeto, como pela consequência mediata de não conduzir à "melhor oferta", objetivo primordial de qualquer licitação.

Na realidade, aquele erro, se constatado tempestivamente antes da abertura dos envelopes, levaria à alteração compulsória da planilha orçamentária, com reabertura de prazo aos concorrentes, em poder de autotutela, para reavaliarem o seu preço (art. 53 da Lei 9.784/99 e art. 21, § 4º c/c art. 49 da Lei de Licitações). Quando identificado, durante a execução contratual, para convalidação desse vício, um aditivo contratual faz-se cabível (art. 55 da Lei 9.784/99).

Pequenos lapsos na quantificação dos serviços (até certo ponto comum, visto que cada orçamentista não apresentaria, nas vírgulas, quantidades idênticas), levando em conta a característica das empreitadas globais - em estabelecer imprecisões quantitativas como álea ordinária da contratada -, não conduzem à mácula no procedimento licitatório, tanto por não afetar essa "livre manifestação de vontade", como, principalmente, por não inviabilizarem a obtenção da "melhor proposta".

Tal visão também se harmoniza com a teoria administrativa, em sobrelevar o que pode ser chamado de "fato novo", legítimo para ensejar a revisão contratual, capaz de sanear - ou convalidar - aquela anulabilidade. Se aquele erro praticado pela Administração não podia ser percebido pela empresa média, pode-se classificá-lo como evento posterior, em álea extraordinária, não derivado de conduta culposa do particular, em congruência com a teoria de imprevisão. A aplicação do art. 65 da Lei de Licitações, em densificação ao disposto no art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, faz-se compulsória.

Segundo Marçal Justen Filho, em publicação já citada:

O restabelecimento da equação econômico-financeira depende da concretização de um evento posterior à formulação da proposta, identificável como causa do agravamento da posição do particular. Não basta a simples insuficiência da remuneração (...). A tutela à equação econômico-financeira não visa a que o particular formule proposta exageradamente baixa e, após vitorioso, pleiteie elevação da remuneração. Exige-se, ademais, que a elevação dos encargos não derive de conduta culposa imputável ao particular. Se os encargos tornaram-se mais elevados porque o particular atou mal, não fará jus à alteração de sua remuneração. (grifei)

De toda essa digressão, resume-se que, de pequenos erros quantitativos, não decorrerão termos aditivos em empreitadas globais, por se tratarem de erros acidentais, incapazes de interferir na formação de vontades e, principalmente, na formação de proposta a ser ofertada, a ser tida como a mais vantajosa. Indicação contrária também tornaria o regime de empreitada global em desuso, posto que, na prática, toda obra seria executada como se preço unitário fosse.

Erros de materialidade relevante (por erros substanciais) sujeitam-se a um juízo acurado de valor, que envolverá, também, além das consequências financeiras - em termos de materialidade - a avaliação culposa da contratante, em um juízo de boa-fé objetiva.

Na realidade, quando a Administração erra ao subestimar consideravelmente as quantidades (e consequentemente, preços), a ponderação acerca da nulidade da relação contratual - a ser eventualmente convalidada via termo aditivo - deve se pautar pela exigibilidade da percepção da falha pela parte lesada (a contratada); até mesmo para evitar um dolo negativo do particular, com o objetivo de obter proveito próprio.

Não significa dizer, em paralelismo, que se detectadas superestimativas relevantes, consideradas imperceptíveis às licitantes - e, portanto, com ausência de culpa do particular - não estaria evidenciada nulidade (a "autorizar o superfaturamento"). Nesses casos, aplicam-se imperativamente outros princípios fundamentais do direito público (como o da economicidade e o da obtenção da maior vantagem). O erro do agente da Administração pode ser considerado inescusável, em seu dever de moderar a contratação sob os preços de mercado. Nesta situação, o contrato superfaturado seria uma nulidade a ser corrigida de forma imediata.

Existem, ainda, outras questões. Mesmo em caso de evidência de culpa do particular nas subestimativas, afora a imprecisão na avaliação dessa responsabilidade -, existe a culpa concorrente da Administração. Em atenuante, a própria administração incorreu no erro, como também todos os outros licitantes que não impugnaram o edital. Ademais - e isso é o mais importante - a avaliação de nulidade deve tocar, primeiro, no interesse público primário a ser tutelado. Não se admitiria interromper um ajuste, mesmo se constatada a obviedade do erro, em casos onde exista prejuízo maior de patrimônio ou à vida das pessoas. Pode estar em jogo, também, a própria continuidade do serviço público; ou interesses secundários superiores.

Não é uma equação simples. Na verdade, em razão dessas inúmeras interveniências, cada caso concreto apresentará solução distinta. Creio ser tarefa hercúlea positivar as quase infinitas possibilidades desse mundo real.

Justamente para facilitar esse juízo e de modo a conferir segurança jurídica aos contratos é que entendo que os instrumentos convocatórios devem explicitar, com precisão, o que virá a ser intitulado como "erro substancial". Creio que a ausência dessas disposições seja o motivo dos infindáveis litígios administrativos e judiciais envolvendo empreitadas por preço global.

Em exemplo, os contratos podem, com simplicidade, objetivar que erros unitários de quantidade de até 10% não sejam objeto de qualquer revisão. Menos que isso, esses erros acidentais serão álea ordinária da contratada. Para que não haja incontáveis pedidos de reequilíbrio decorrentes de serviços de pequena monta, pode-se, ainda, definir que somente serviços de materialidade relevante na curva ABC do empreendimento incorrerão como tarja de "erro relevante". Mantém, assim, a lógica da medição por preço global, ao mesmo tempo em que se veda o enriquecimento sem causa de qualquer das partes, sem ferir o princípio fundamental da obtenção da melhor proposta. Situação parecida foi tomada por esta Corte ao apreciar o Acórdão 2.929/2010-Plenário, quando julgou regular cláusula semelhante. Acredito que outras soluções sejam possíveis.

Prefiro esse regramento objetivo, a ser estabelecido pela própria Administração, que a proposta da SecobEdificação em definir, genericamente, que erros substanciais serão os que ultrapassarem as previsões de contingências e riscos no BDI das contratadas. Bastaria o particular cuidadoso, por exemplo, superestimar a sua administração central, ou mesmo seus custos diretos, de maneira a diminuir ao máximo seus lucro e contingências formais declarados. A tolerância seria menor para justificar revisões. Na prática, estaria se criando outro problema.

Também não julgo adequada a regra universal, recorrentemente observada em auditorias, de que "todo e qualquer erro será risco da contratada". Tal opção, avalio, não é a que mais atende o interesse público, por menos garantir a "melhor proposta" como resultado do certame. Tais falhas capitais implicam a apresentação de preços para uma obra desvinculada do objeto real pretendido. O valor ofertado deve se referir ao empreendimento almejado, não ao negócio fictício licitado. Ademais, pelo que discorri, haveria dúvidas quanto à legalidade da licitação feita sob esse erro substancial. Se ignorada a boa-fé objetiva, em avaliação do licitante médio e diligente, tal cláusula carregaria conteúdo de lesividade que, por excessiva, também se predisporia à anulação.

E não se alegue que os "quantitativos reais" jaziam nas pranchas gráficas disponíveis aos licitantes. O poder público, na fase interna da licitação, dispôs de meses para avaliar corretamente as quantidades. Não se pretenda que, em alguns dias, em empreendimentos que não raramente ultrapassam a centena de milhões de reais, os particulares tenham as mesmas condições de devassar os quantitativos tal qual os gestores poderiam fazê-lo. Existe, no mínimo, uma indução ao erro, a pesar nessa avaliação de boa-fé objetiva.

A assunção desmedida de riscos provenientes de erros tampouco se faz interessante para o poder público. Constatada a omissão na avaliação de fração fundamental da obra, o empreiteiro pode não ter condições financeiras de adimplir o contrato. A "quebra" da licitante não é boa para a Administração, que também errou na avaliação daquela parcela importante da obra. Decorrerão, afora o atraso ou a paralisação da obra, infindáveis litígios judiciais.

O contrato administrativo não deve, afinal, ser um joguete em que o licitante que primeiro encontrar o erro sagrar-se-á vencedor. Um ambiente de justeza e segurança inibe os chamados aventureiros; em outra mão, atrai boas empresas, aptas a atenderem o chamamento licitatório com seriedade e responsabilidade.

Somente nos casos concretos em que os editais não estabeleçam essas regras é que a equipe de fiscalização procederá, em uma valoração justa, a licitude da prolação do termo aditivo. Sem prejuízo de notificar o órgão licitante que tais parâmetros se fazem compulsórios.

O juízo de valor nas subestimativas incluirá a envergadura do erro em relação ao valor global da avença, em comparação do que seria exigível incluir como risco/contingência em uma proposta para o regime de empreitada global, como também da exigibilidade de identificação prévia da falha pelas licitantes, à luz, ainda, dos princípios da vedação ao enriquecimento sem causa, da isonomia, da vinculação ao instrumento convocatório, do dever de licitar, da autotutela, da proporcionalidade, da economicidade, da moralidade, do equilíbrio econômico-financeiro do contrato e do interesse público primário.

Por esse motivo, no essencial, ponho-me de acordo com a proposta da unidade técnica, ressalvando que a regra deva ser o estabelecimento objetivo, em matriz de riscos adequada, da tolerância de erro quantitativo a ser admitida. Quando omisso o regramento no edital, a equipe de fiscalização deve notificar os gestores para que, doravante, as disponha, em prestígio à segurança jurídica, à isonomia, e a obtenção da melhor proposta.

VII

Termino ao comentar o impacto dos entendimentos aqui tratados em licitações regidas pelo Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), a que se refere a Lei 12.462/2011. Por força do disposto no art. 2º, inciso II; no art. 8º, § 1º; no art. 39; no art. 45, inciso I, alínea 'b' e no art. 63, todos da Lei 12.462/2011, a decisão prolatada tem inteira aplicação com o novo instituto.

Faço um parêntese, apenas, para comentar o regime de contratação integrada em que, compulsoriamente, é aplicado o preço global. Como disse, em obras que carreguem uma imprecisão intrínseca de quantidades, é preferível a utilização do preço unitário, em razão da majoração relevante dos riscos a que estaria exposta a contratada.

Existe na contratação integrada, entretanto, outros objetivos e vantagens. Como inscrito no voto condutor do Acórdão 1.510/2013-Plenário, de minha relatoria, "as características do objeto devem permitir que haja a real competição entre as contratadas para a concepção de metodologias/tecnologias distintas, que levem a soluções capazes de serem aproveitadas vantajosamente pelo Poder Público". Ainda, "Os ganhos advindos da utilização da contratação integrada devem compensar esse maior direcionamento de riscos aos particulares. Essa demonstração é o cerne para a motivação da vantagem para utilizar o novo regime".

Significa que, não obstante essa maior assunção de riscos, mesmo em objetos imprecisos, caso se demonstre a vantagem de transferir as soluções e metodologias construtivas à contratada, em termos técnicos e econômicos, não está automaticamente descartada a utilização dessa nova modalidade contratual. Caberão, no entanto, todas as ressalvas - com ainda mais gravame - no que se refere à objetivação dos riscos com relação a imprecisões de projeto (no caso anteprojeto), como também às demais responsabilidades a serem suportadas pelo particular.

Ante o exposto, voto por que seja adotado o Acórdão que ora submeto à apreciação deste Plenário.

TCU, Sala das Sessões Ministro Luciano Brandão Alves de Souza, em 31 de julho de 2013.

VALMIR CAMPELO

Ministro Relator


Acórdão:


VISTOS, relatados e discutidos este processo administrativo constituído com vistas a uniformizar procedimentos de fiscalização atinentes a objetos executados mediante o regime de empreitada por preço global, de maneira a apresentar diretrizes e orientar os auditores deste Tribunal sobre o tema.

ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão do Plenário, ante as razões expostas pelo Relator, em:

9.1. determinar à Segecex que oriente às unidades técnicas desta Corte a observarem as seguintes disposições em suas fiscalizações de obras e serviços de engenharia executadas sob o regime de empreitada por preço global, a serem aplicadas de acordo com as circunstâncias de cada caso concreto:

9.1.1. a escolha do regime de execução contratual pelo gestor deve estar fundamentada nos autos do processo licitatório, em prestígio ao definido no art. 50 da Lei 9.784/99;

9.1.2. os instrumentos convocatórios devem especificar, de forma objetiva, as regras sobre como serão realizadas as medições, a exemplo de pagamentos após cada etapa conclusa do empreendimento ou de acordo com o cronograma físico-financeiro da obra, em atendimento ao que dispõe o art. 40, inciso XIV, da Lei 8.666/93;

9.1.3. a empreitada por preço global, em regra, em razão de a liquidação de despesas não envolver, necessariamente, a medição unitária dos quantitativos de cada serviço na planilha orçamentária, nos termos do art. 6º, inciso VIII, alínea 'a', da Lei 8.666/93, deve ser adotada quando for possível definir previamente no projeto, com boa margem de precisão, as quantidades dos serviços a serem posteriormente executados na fase contratual; enquanto que a empreitada por preço unitário deve ser preferida nos casos em que os objetos, por sua natureza, possuam uma imprecisão inerente de quantitativos em seus itens orçamentários, como são os casos de reformas de edificação, obras com grandes movimentações de terra e interferências, obras de manutenção rodoviária, dentre outras;

9.1.4. nas situações em que, mesmo diante de objeto com imprecisão intrínseca de quantitativos, tal qual asseverado no item 9.1.3. supra, se preferir a utilização da empreitada por preço global, deve ser justificada, no bojo do processo licitatório, a vantagem dessa transferência maior de riscos para o particular - e, consequentemente, maiores preços ofertados - em termos técnicos, econômicos ou outro objetivamente motivado, bem assim como os impactos decorrentes desses riscos na composição do orçamento da obra, em especial a taxa de BDI - Bonificação e Despesas Indiretas;

9.1.5. a proposta ofertada deverá seguir as quantidades do orçamento-base da licitação, cabendo, no caso da identificação de erros de quantitativos nesse orçamento, proceder-se a impugnação tempestiva do instrumento convocatório, tal qual assevera o art. 41, § 2º, da Lei 8.666/93;

9.1.6. alterações no projeto ou nas especificações da obra ou serviço, em razão do que dispõe o art. 65, inciso I, alínea 'a', da Lei 8.666/93, como também do art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, repercutem na necessidade de prolação de termo aditivo;

9.1.7. quando constatados, após a assinatura do contrato, erros ou omissões no orçamento relativos a pequenas variações quantitativas nos serviços contratados, em regra, pelo fato de o objeto ter sido contratado por "preço certo e total", não se mostra adequada a prolação de termo aditivo, nos termos do ideal estabelecido no art. 6º, inciso VIII, alínea "a", da Lei 8.666/93, como ainda na cláusula de expressa concordância do contratado com o projeto básico, prevista no art. 13, inciso II, do Decreto 7.983/2013;

9.1.8. excepcionalmente, de maneira a evitar o enriquecimento sem causa de qualquer das partes, como também para garantia do valor fundamental da melhor proposta e da isonomia, caso, por erro ou omissão no orçamento, se encontrarem subestimativas ou superestimativas relevantes nos quantitativos da planilha orçamentária, poderão ser ajustados termos aditivos para restabelecer a equação econômico-financeira da avença, situação em que se tomarão os seguintes cuidados:

9.1.8.1. observar se a alteração contratual decorrente não supera ao estabelecido no art. 13, inciso II, do Decreto 7.983/2013, cumulativamente com o respeito aos limites previstos nos §§ 1º e 2º do art. 65 da Lei 8.666/93, estes últimos, relativos a todos acréscimos e supressões contratuais;

9.1.8.2. examinar se a modificação do ajuste não ensejará a ocorrência do "jogo de planilhas", com redução injustificada do desconto inicialmente ofertado em relação ao preço base do certame no ato da assinatura do contrato, em prol do que estabelece o art. 14 do Decreto 7.983/2013, como também do art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal;

9.1.8.3. avaliar se a correção de quantitativos, bem como a inclusão de serviço omitido, não está compensada por distorções em outros itens contratuais que tornem o valor global da avença compatível com o de mercado;

9.1.8.4. verificar, nas superestimativas relevantes, a redundarem no eventual pagamento do objeto acima do preço de mercado e, consequentemente, em um superfaturamento, se houve a retificação do acordo mediante termo aditivo, em prol do princípio guardado nos arts. 3º, caput c/c art. 6º, inciso IX, alínea "f"; art. 15, § 6º; e art. 43, inciso IV, todos da Lei 8.666/93;

9.1.8.5. verificar, nas subestimativas relevantes, em cada caso concreto, a justeza na prolação do termo aditivo firmado, considerando a envergadura do erro em relação ao valor global da avença, em comparação do que seria exigível incluir como risco/contingência no BDI para o regime de empreitada global, como também da exigibilidade de identificação prévia da falha pelas licitantes - atenuada pelo erro cometido pela própria Administração -, à luz, ainda, dos princípios da vedação ao enriquecimento sem causa, da isonomia, da vinculação ao instrumento convocatório, do dever de licitar, da autotutela, da proporcionalidade, da economicidade, da moralidade, do equilíbrio econômico-financeiro do contrato e do interesse público primário;

9.1.9. avaliar a conveniência e a oportunidade de, em seu relatório de fiscalização, propor ao Colegiado, com base no art. 250, inciso III do Regimento Interno do TCU, recomendação à jurisdicionada, para que, doravante, inclua nos editais cláusula a estabelecer, de forma objetiva, o que será objeto de aditamentos durante a execução da avença, bem como a definição do que venha a ser "subestimativas ou superestimativas relevantes", a que se refere o subitem 9.1.8 supra, como, por exemplo, o estabelecimento de percentuais de tolerância quantitativa admitida em cada item do orçamento que torne descabida a celebração de aditivo, como, ainda, a necessidade de que a imprecisão se refira a serviço materialmente relevante do empreendimento (avaliado de acordo com a metodologia ABC), em prestígio ao princípio da segurança jurídica, como ainda do art. 6º, inciso VIII, alínea "a" c/c art. 47, art. 49 e art. 65, inciso II, alínea "d", todos da Lei 8.666/93;

9.2. nos contratos executados mediante o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), aplicam-se, no que couber, os entendimentos expressos nesta decisão, por força do disposto no art. 2º, inciso II; art. 8º, § 1º; art. 39; art. 45, inciso I, alínea "b" e art. 63, todos da Lei 12.462/2011, como também no Acórdão 1.510/2013-Plenário, mormente no que se refere à necessidade de estabelecer uma matriz de riscos, a explicitar as exatas responsabilidades e encargos a serem assumidos pelos particulares - inclusive no que se refere a erros quantitativos;

9.3. encaminhar cópia deste Acórdão, acompanhado do relatório e do voto que o fundamentam ao Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão e ao Conselho Nacional de Justiça, para que informe aos demais órgãos e entidades da Administração Pública Federal e do Poder Judiciário o inteiro teor desta decisão;

9.4. arquivar o presente processo


Entidade:


Órgão: Tribunal de Contas da União


Interessado:


Interessado: Tribunal de Contas da União


Representante do MP:


Não atuou


Unidade técnica:


Secretaria de Fiscalização de Obras Aeroportuárias e de Edificação (SecobEdificação)


Advogado:


não há


Declaração de voto:


Ressalto desde logo minha anuência com o percuciente trabalho presidido pelo Relator, eminente Ministro Valmir Campelo.

O modelo de abordagem do tema empreendido por Sua Excelência inspira-me a adotá-lo no âmbito do TC 033.616-2011-6, isso porque entendo que este Tribunal deva preencher, de uma vez por todas, uma lacuna que vejo no controle da qualidade de obras públicas, sendo a Empreitada por Preço Global uma oportunidade para tratarmos minuciosamente do tema, discutindo, por exemplo, aspectos relacionados à acessibilidade, a riscos de acidentes, à durabilidade e resistência dos materiais, sustentabilidade ambiental dos empreendimentos, e outros elementos, tais como padrões de acabamento e aspectos estéticos, ou ainda, isolamento acústico de edificações, problemas esses que não apenas impactam no erário, mas que também causam perplexidade quando se comparam os custos de determinadas obras que têm sido auditadas por esta Corte de Cotas e a qualidade do que é entregue à sociedade.

Assim sendo, além dos aspectos formais inerentes ao controle procedimental, entendo que este Tribunal deva centrar esforços na avaliação qualitativa de resultados, sob a lógica da oferta de serviços adequados aos cidadãos. É chegada a hora de não mais se ler o artigo 3º Lei 8.666/1993 e, especificamente, a expressão "mais vantajosa para a Administração" de maneira reducionista, interpretando-a como sendo meramente aquisições de menor preço.

Com tais observações, enaltecendo mais uma vez o trabalho comandado pelo Ministro Valmir Campelo, acompanho o Voto e a minuta de Acórdão apresentados por Sua Excelência.

Sala das Sessões, em 31 de julho de 2013.

AROLDO CEDRAZ

Ministro


Quórum:


13.1. Ministros presentes: Aroldo Cedraz (na Presidência), Valmir Campelo (Relator), Raimundo Carreiro, José Jorge, José Múcio Monteiro e Ana Arraes.

13.2. Ministros-Substitutos convocados: Augusto Sherman Cavalcanti e Marcos Bemquerer Costa.

13.3. Ministro-Substituto presente: André Luís de Carvalho


Data da sessão:


31/07/2013