Representação
autuada com base em documentos encaminhados pelo extinto Tribunal de Contas dos
Municípios do Estado do Ceará veiculou supostas irregularidades ocorridas em
licitações e contratos financiados com recursos federais oriundos do Sistema
Único de Saúde (SUS) no Município de Crato/CE. A principal irregularidade
apontada dizia respeito à falta de prévio procedimento licitatório nas
contratações de entidades privadas para a prestação de serviços de saúde no
âmbito do SUS, em regime complementar ao Poder Público, em aparente afronta ao
art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal e ao art. 2º da Lei 8.666/1993. A
unidade técnica constatou que o município realizara chamamento público para
credenciamento de entidades prestadoras de serviços na área de saúde, mas que
isso não afastava a obrigatoriedade de se fazer licitação, nas modalidades
previstas no art. 22 da Lei 8.666/1993, ou de se justificar a contratação
direta mediante a inexigibilidade constante do art. 25 da referida lei, razão pela
qual sugeriu a aplicação de multa ao prefeito e aos secretários municipais de
saúde. Ao apreciar o caso, o relator, inicialmente, observou que a Constituição
Federal possibilita às instituições privadas participarem do SUS de forma
complementar. Nesse sentido, continuou: “Considerando
que compete à direção nacional do SUS promover a descentralização para as
unidades federadas e para os municípios, dos serviços e ações de saúde,
respectivamente de abrangência estadual e municipal, segundo o art. 16, inciso
XV, da Lei 8.080/1990, foram editadas diversas normas de descentralização,
inclusive aquelas voltadas especificamente para normatizar a contratação de
serviços de saúde por gestores locais do SUS, com indicação de cláusulas
necessárias que devem constar nos correspondentes contratos”. Entre as
normas editadas, o condutor do processo destacou o Manual de Orientações para
Contratação de Serviços no SUS, elaborado pelo Ministério da Saúde, que previa
a possibilidade de chamamento público e inexigibilidade de licitação para a
contratação de serviços de saúde, sendo que “no caso da inexigibilidade de licitação, o referido Manual de
Orientações exemplifica que ela pode ocorrer quando houver incapacidade de se
instalar concorrência entre os licitantes, como no caso de haver somente um
prestador apto a fornecer o objeto a ser contratado, ou na hipótese de o gestor
manifestar interesse de contratar todos os prestadores de serviços de seu
território de uma determinada área desde que devidamente especificada no edital”.
Sobre o ponto, o relator ressaltou que a jurisprudência do TCU tem aceitado que
o credenciamento é hipótese de inviabilidade de competição não relacionada
expressamente no art. 25 da Lei 8.666/1993, adotada, entre outras hipóteses,
quando a Administração tem por objetivo dispor da maior rede possível de
prestadores de serviços. Ressaltou, ainda, que nessa situação a inviabilidade
de competição não decorre da ausência de possibilidade de competição, mas sim
da ausência de interesse da Administração em restringir o número de
contratados. O relator concluiu afirmando que “quando a licitação for inexigível porque o gestor manifestou o
interesse de contratar todos os prestadores, ele poderá adotar o procedimento
de chamada pública, por meio da abertura de um edital e chamar todos os
prestadores que se enquadrem nos requisitos constantes do edital para se
cadastrarem e contratarem com a Administração Pública. Tem-se por claro que a inexigibilidade, no
presente caso, não se deu pela singularidade do objeto, mas sim pelo interesse
de contratar todos os prestadores de serviços na área de saúde que atendessem
os requisitos do edital de chamamento”. Com esse entendimento, e diante da
comprovada realização do devido chamamento público, com o credenciamento das
entidades, o relator propôs e o Colegiado decidiu acolher as razões de
justificativa apresentadas pelos responsáveis.
Acórdão
784/2018 Plenário, Representação, Relator Ministro-Substituto Marcos
Bemquerer.