quarta-feira, 24 de junho de 2020

A fixação, para fins de habilitação, de percentual de patrimônio líquido mínimo em relação ao valor estimado da contratação (art. 31, §§ 2º e 3º, da Lei 8.666/1993) deve ser justificada nos autos do processo licitatório, realizando-se estudo de mercado com vistas a verificar o seu potencial restritivo, sob pena de violação ao art. 3º, § 1º, inciso I, do Estatuto de Licitações.



Representação formulada ao TCU apontou possíveis irregularidades no Pregão Eletrônico 1/2019, conduzido pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e tendo por objeto a contratação de “serviços de produção gráfica, em condições especiais de segurança e sigilo, envolvendo a disponibilização de ambiente seguro com capacidade produtiva adequada para diagramação, impressão, manuseio, embalagem, rotulagem e entrega à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT, dos cadernos de provas e materiais administrativos, destinados à realização de Exames, Avaliações e Aplicações de Pré-Testes do INEP, com a disponibilização de insumos e equipamentos”. Entre as irregularidades suscitadas, mereceu destaque o suposto direcionamento do certame em razão da “exigência contida no subitem 9.7.2.2 do edital, que estabelece, como critério de habilitação, patrimônio líquido (PL) de 5% do valor estimado da contratação, de R$ 186.122.160,42, que é mais restritivo que o verificado no processo de contratação de serviços gráficos para o Enem (que teria previsto o percentual de 1,5%, ante o valor estimado de R$ 147.836.496,33 e não teria sido atingido pela então vencedora do certame)”. Realizada a oitiva do Inep, a autarquia apresentou os seguintes esclarecimentos: i) “o percentual respeitaria o limite do § 3º do art. 31 da Lei 8.666/1993 e foi deliberado por meio de reunião técnica com a equipe de planejamento da contratação, considerando o valor da contratação, da ordem de R$ 180 milhões de reais, e a necessidade de a gráfica a ser contratada possuir saúde financeira compatível”; e ii) “a exigência atinge somente as licitantes que apresentem índices econômicos iguais ou inferiores a 1 em qualquer dos índices de liquidez geral, solvência geral e liquidez corrente, de modo a assegurar à administração as condições necessárias à efetiva execução dos serviços”. Apesar de considerar razoável o argumento de se exigir percentual superior de PL em caso de não atingimento dos índices de liquidez pelo licitante, a unidade técnica ponderou que, considerando os resultados do Pregão 6/2016, relativos ao Enem, em que a vencedora, então considerada uma das maiores gráficas do país, não teria comprovado percentual de 1,5% do valor estimado de R$ 147.836.496,33, classificando-se por meio de dispositivo editalício alternativo, é provável que o percentual seja de difícil alcance pelos integrantes do mercado”. Em seu voto, o relator endossou que, embora, em tese, seja razoável exigir percentual superior de patrimônio líquido em caso de não atingimento dos índices de liquidez pelo licitante, “há que se ter em mente a realidade do mercado”. E justamente o resultado do Pregão 6/2016, relativo ao Enem, em que a vencedora, então considerada uma das maiores gráficas do país, não teria comprovado percentual de PL de 1,5% do valor estimado de R$ 147.836.496,33, seria, a seu ver, “um bom indicativo a ser considerado”. Nesse sentido, deveria o Inep realizar “consulta a potenciais prestadores”, no intuito de “harmonizar a segurança desejada à realidade do mercado gráfico, de modo a evitar restrição indevida à concorrência”. Nos termos da proposta do relator, o Plenário decidiu considerar procedente a representação, sem prejuízo de determinar à entidade a adoção de providências no sentido de limitar a execução do contrato decorrente do Pregão Eletrônico 1/2019 aos “serviços inadiáveis e apenas durante o período necessário à realização de novos certames destinados à sua substituição”, em razão, entre outras irregularidades, da “exigência, como critério de habilitação, de patrimônio líquido de 5% do valor estimado da contratação, sem a realização de estudo de mercado com vistas a verificar o seu potencial restritivo, em afronta ao disposto no inciso I do § 1º do art. 3º da Lei 8.666/1993”.
Acórdão 1321/2020 Plenário, Representação, Relator Ministro Benjamin Zymler.