quinta-feira, 25 de fevereiro de 2021

O órgão ou a entidade promotora do certame não deve obstar a participação de empresa licitante com fundamento na existência de ocorrências impeditivas indiretas de licitar constantes do Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores (Sicaf) sem que haja elementos suficientes para evidenciar que a sua constituição teve por objetivo burlar penalidade aplicada a outra sociedade empresarial e sem que seja dada oportunidade à interessada para manifestação prévia (art. 29 da IN-Seges/MPDG 3/2018).

 

O órgão ou a entidade promotora do certame não deve obstar a participação de empresa licitante com fundamento na existência de ocorrências impeditivas indiretas de licitar constantes do Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores (Sicaf) sem que haja elementos suficientes para evidenciar que a sua constituição teve por objetivo burlar penalidade aplicada a outra sociedade empresarial e sem que seja dada oportunidade à interessada para manifestação prévia (art. 29 da IN-Seges/MPDG 3/2018).

Representação formulada ao TCU por sociedade empresária apontou possíveis irregularidades em pregão eletrônico promovido pelo Distrito Sanitário Especial Indígena Parintins (DSEI/Parintins) com vistas à “contratação de serviços de limpeza, conservação e higienização, com fornecimento de mão de obra e todos os materiais e equipamentos necessários, a serem executados nos prédios pertencentes ao DSEI/Parintins”. Entre as irregularidades suscitadas, mereceu destaque a recusa, pelo pregoeiro, da proposta da representante com base em “ocorrência impeditiva indireta”. Em resposta ao recurso interposto pela representante no âmbito do processo licitatório, o pregoeiro teria destacado dois elementos que comprovariam a ligação entre ela e outra sociedade empresária anteriormente sancionada: o “documento de justificativa”, apresentado pela representante no curso do pregão, subscrito por pessoa integrante do quadro societário de ambas as sociedades, e os atestados de capacidade técnica relativos a serviços prestados pela primeira à segunda. Em sua instrução, a unidade técnica demonstrou que, conquanto à época do certame essa pessoa não mais integrasse o quadro societário de nenhuma das duas empresas, existiriam fortes vínculos familiares entre elas: “sócios de uma e outra empresas são irmãos e residem no mesmo endereço, que também é o endereço da segunda empresa”. Sob a ótica da unidade técnica, ainda que incontestáveis, tais vínculos não eram de conhecimento do pregoeiro e, mesmo que fossem, não bastariam para caracterizar burla à penalidade aplicada à segunda empresa. Sopesando que o contrato decorrente do pregão está em execução e que a interrupção do serviço causaria prejuízo ao órgão, a unidade instrutiva sugeriu fosse tão somente determinado ao DSEI/Parintins que se abstivesse de prorrogar o contrato. Em seu voto, o relator ressaltou, preliminarmente, que, quando da aplicação da penalidade e do certame em questão, o sócio mencionado já não fazia parte de nenhuma das duas empresas. Na sequência, destacou que, apesar de contundentes os indícios de vínculo entre as duas sociedades, eles não permitiriam conclusão no sentido de que a representante participara do certame com o propósito de burlar a sanção aplicada à outra empresa. Isso porque “as sociedades foram fundadas e passaram a apresentar o atual quadro societário antes da aplicação da sanção”. Além disso, não haveria “informações de transferência de acervo técnico entre as duas sociedades” após a aplicação da penalidade. O relator considerou ainda que, nas circunstâncias dos autos, os erros praticados pelo pregoeiro não seriam de “gravidade suficiente para resultarem em punições nem em determinação para extinção antecipada de contrato em execução”. E arrematou: “Não há como afirmar, desde logo, que a prorrogação do contrato contraria o interesse público. Trata-se de questão a ser avaliada e decidida, fundamentadamente, pelo DSEI/Parintins, por ocasião do término de cada ano de contrato, tendo em vista os preços então praticados pelo mercado e a qualidade do serviço prestado pela contratada”. Nos termos da proposta do relator, o colegiado decidiu considerar parcialmente procedente a representação, sem prejuízo de dar ciência ao órgão acerca das seguintes falhas identificadas no pregão: I) “recusa de proposta de licitante com fundamento na existência de ocorrências impeditivas indiretas de licitar constantes do cadastro da empresa no Sicaf, em desacordo com o entendimento constante dos Acórdãos 2.218/2011-TCU-1ª Câmara e 1.831/2014-TCU-Plenário, ou seja, sem que houvesse elementos adicionais suficientes para caracterizar possível tentativa de burla à penalidade de inidoneidade e de impedimento de contratar ou licitar com a Administração Pública, por intermédio de constituição de outra sociedade empresarial pertencente aos mesmos sócios e que atue na mesma área”; II) “desclassificação de proposta de licitante com base na existência de ocorrências impeditivas indiretas de licitar constantes do cadastro da empresa no Sicaf, sem convocação prévia do licitante para sobre elas se manifestar, em desacordo com o que prevê art. 29 da Instrução Normativa Seges/MPDG 3/2018, de 26/4/2018”.

Acórdão 534/2020 Primeira Câmara, Representação, Relator Ministro Walton Alencar Rodrigues.